Diários escrita por Tai Bluerose


Capítulo 3
Diários de Ciel 2: Diferentes Amigos, Diferentes Amizades


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas lindas ^^Bem...esse cap não saiu como planejado...comecei a escrever hoje e terminei ele agora...não queria demorar mais, então....aqui está....Obrigada a todos que comentaram e um super beijo para Sarah Okumura, GabiNyan, Perona e Ryu, obrigada por favoritarem...espero que gostem...Boa leitura.



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Diários de Ciel 2:

Diferentes Amigos, Diferentes Amizades

As aulas de Ciel começaram uns quatro meses após o último registro que eu transcrevi. Os trechos a seguir apresentarão as interações de Ciel nesse colégio. Coloquei apenas os trechos que julguei mais importantes. Quando encontrar [...], saberá que eu suprimi do relato partes que achei sem grande importância, como descrição de aulas, de professores ou trabalhos escolares. Em alguns momentos, Ciel poderá citar nomes de alunos que sem dúvida eram seus colegas de turma, mas não dá nenhuma informação a mais sobre eles. Observe a diferença de tempo entre um trecho e outro para melhor compreensão.

Segue os diários.

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2 de setembro de 1888

Hoje foi o meu primeiro dia no Instituto Griffiths.

Meu pai e eu fizemos uma longa viagem de charrete, pois o internato não fica no centro da cidade. Passamos por várias terras e casas de campo. Casas grandes e de gente importante. Algumas propriedades pareciam com a nossa. A única diferença é que nossa casa ficava no meio da floresta, numa área mais próxima do centro e aquelas casas tinham plantações. Depois de passarmos por uma plantação de macieiras, finalmente chegamos ao terreno do internato.

Papai pediu que eu não ficasse dizendo “internato”, segundo ele, meu tom de voz ao dizer “internato” o fazia se sentir um mau pai. Na hora, um sentimento maldoso me fez achar que era assim que ele deveria se sentir mesmo, mas eu sei que ele está fazendo o que é melhor para mim. Vincent é um bom pai, me orgulho dele. Eu é que sou mimado e birrento. Morro, mas não admito isso a ele.

O Internato... ou melhor, o Instituto é um prédio bem grande, maior que nossa casa em Londres, além disso, o Instituto possui um terreno vasto. Fomos recebidos pelo diretor, Theodore Griffiths, homem robusto e velho que nos levou ao seu escritório e falou o que pareceu ser horas. Eu deixei de prestar atenção depois de dez minutos de falação sobre regras e burocracias. Fingi estar atento. O diretor Griffiths parece ser um homem muito mais severo e rígido que mister Sumerly.

Depois de acertar tudo com o Diretor, papai se despediu de mim e partiu.

– Veja pelo lado bom filho, fará novos amigos!

Acho que esse foi o momento mais difícil até agora.

Ver a charrete partir sem mim.

Confesso que senti uma imensa vontade de sair correndo e gritando para que papai não me abandonasse aqui. Mas achei que seria uma atitude infantil demais para um menino de doze anos.

Voltei para o prédio e o Diretor chamou um aluno para ser meu guia. Um dos melhores alunos do Instituto, segundo o mister Griffiths.

William T. Spears, 17 anos, levou-me até o andar dos dormitórios. Havia três grandes quartos com vinte camas cada um. O Dormitório Alfa para os alunos menores com idade entre 11 e 12 anos, o Dormitório Beta para alunos entre 13 e 15 e o Dormitório Delta para alunos entre 16 e 18. William disse que havia outro dormitório no lado sul do prédio, o Dormitório Ômega para professores e auxiliares. William mostrou minha cama no Dormitório Alfa, no qual ficarei até completar 13 anos, e começou a guiar-me pela escola, apresentando os alunos, as estalagens e as regras.

Ele falou tão rápido que quase não o acompanho, tive a impressão de que eu era um estorvo para ele.

Minhas obrigações incluem acordar cedo, arrumar minha cama, cuidar de minha higiene pessoal e me vestir sozinho. Devo estar na mesa na hora do café e da janta, atrasos não são permitidos nas refeições, nem nas aulas. Devo chegar sempre antes de o mestre entrar em sala.

O terreno do Instituto possui um campo para prática de exercícios, um para jogos, um para equitação, há estábulos com cavalos. Há jardins e um pequeno bosque. Não posso andar pela escola depois da hora de dormir, nem sozinho nem acompanhado. Não é permitido sair dos limites do colégio, nem dois alunos ou mais se afastarem da vista dos Supervisores.

Achei estranho isso, há supervisores em cada canto desse lugar, sempre vigiando os alunos. William disse-me que o diretor Griffiths não tolera desobediência, vandalismo e imoralidade, por isso há vigias por todo o lugar, e além desses, há os Inspetores de Campus, alunos escolhidos pelo próprio Diretor para manter os alunos na linha e informar os Supervisores sobre qualquer atitude suspeita. Inspetores de Campus... Eu os chamaria de delatores lambe botas. Os professores vigiam os alunos nas salas, os Supervisores vigiam os corredores e os Inspetores vigiam os alunos nos lugares em que nem os professores e nem os Supervisores estão.

William é um Inspetor de Campus.

Os alunos, bem, todos me cumprimentaram, mas não falei com ninguém depois.

Estão dizendo que é hora de dormirmos.

Talvez amanhã seja um dia melhor. Boa noite, mãe... Onde você estiver agora.

8 de setembro de 1888

Os alunos dos dormitórios não se misturam muito. Os alunos mais velhos nos tratam como se fossemos pirralhos, confesso que alguns até são, mas nem todos, eu definitivamente não sou. E os menores acham os mais velhos metidos. E eles são mesmo! Não sei se os alunos do Dormitório Delta são mais espertos que qualquer um do Alfa ou do Beta, mas sem dúvida são os mais sortudos, logo sairão daqui. Eu terei que esperar mais uns sete anos aqui. Sete!

10 de setembro de 1888

Acho que fiz um amigo. Pelo menos acredito que sim.

O nome dele é Alois Trancy. Tem olhos azuis como a água do mar, seu cabelo é dourado e tem rosto de anjo. Possui um bom humor e um jeito alegre. Tem treze anos, está no Dormitório Beta. Ele veio puxar conversa comigo quando todos estavam no jardim. Perguntou algumas coisas sobre a aula e falou muito sobre ele. É do tipo vaidoso, já percebi. O fato é que não saiu do meu lado o dia todo. Senti-me um pouco zonzo e aborrecido em alguns momentos, Trancy é tão expansivo quanto Lizzy, mas sua companhia é melhor do que estar só.

21 de setembro de 1888

Em alguns momentos Alois lembra-me a Elizabeth. Ele costuma ser gentil e agradável, mas também sabe ser irritante e chantageador. Penso que os pais dele o mimaram em excesso, pois sempre deseja que tudo seja como ele quer. Pensa que pode mandar em mim só porque é mais velho e maior. Só agora percebo como suas emoções são inconstantes. Sua companhia torna-se insuportável quando discute com um aluno do dormitório dele, o Claude que deve ter uns 15 anos; Alois fica irado e desconta a raiva em qualquer um – geralmente eu –, logo depois está falando com Claude novamente, com palavras de puro mel, só para ser enxotado novamente. Sinceramente não entendo por que Alois deseja tanto ser amigo desse garoto arrogante.

Mas não é só isso que me causa desagrado na pessoa do meu colega. Há algo nele que me incomoda. Sobretudo seus modos exagerados e seus trejeitos de menina. Abraça-me em excesso, mesmo eu tendo repetido infinitas vezes que odeio que me toquem. Quantas vezes eu recebi reclamações dos supervisores por culpa dele. Alois sabe que é proibido, mas ainda assim insiste em tomar caminhos pelos quais os Supervisores não passam, insiste em ir para locais longe dos olhares dos Inspetores de Campus. A vigilância constante incomoda, mas Alois costuma ser mais atrevido em seus agrados quando estamos a sós. Não gosto disso, tenho a impressão de que fazemos algo errado.

Ontem, William chamou-me em particular.

– Pequeno Phantomhive, tu ainda és jovem e ingênuo, e percebo que não tens a maldade de seu amigo, por isso não serei severo contigo. Mas não se deixe influenciar pelo Trancy, sabes que ele sempre é repreendido. Certamente não desejará que seu pai receba reclamações suas. O Diretor não tolera proximidades exageradas, portanto atenta-te para sua amizade com Trancy. Você me compreende?

Agora não consigo parar de pensar nisso. Fazer amigos era mais fácil na Índia. Essa escola tem regras que não entendo.

27 de setembro de 1888

Às vezes, Alois me irrita profundamente, tanto que me pergunto por que ainda ando com ele, talvez por falta de outros amigos. De anjo, ele só tem a aparência. Gosta de provocar e o faz inconsequentemente. Todos aqui o veem com maus olhos, eu achava que era por suas provocações e brincadeiras tolas, mas Ford disse-me que os outros alunos não aprovam o jeito afeminado dele. Nunca achei que isso fosse um problema, é o jeito dele.

Ele me irrita por outras razões, ultimamente discutimos a todo o momento. Hoje, Alois teve a audácia de aprontar uma troça imperdoável comigo.

Ele queria vingar-se do Claude por alguma coisa que o mais velho fez ou disse, Alois não me explicou direito a razão. Aproveitou que todos os outros alunos desciam para o almoço e puxou-me para seu dormitório, Beta, contando-me seu plano. Teve a brilhante ideia de derramar tinta nos livros do garoto, antes que ele voltasse ao quarto para pegá-los. Tentei convencê-lo a desistir da ideia estupida, que só lhe arranjaria confusão. Ele chamou-me de velho rabugento e começamos a discutir novamente. Não sei exatamente como, mas o vidro de tinta para escrever caiu da mão do Alois manchando de preto as cobertas da cama próxima a nós e todo o chão. Tirei um lenço do bolso e tentei limpar a sujeira. Ao ouvir passos, Alois fugiu. Ele fugiu! Que covarde!

O dono da cama, que foi justamente a pessoa que voltou para o quarto, encarou-me com incredulidade. E o pior de tudo, tratava-se de Sebastian Michaelis. Michaelis é um dos melhores alunos do Instituto Griffiths. Um dos mais populares e mais inteligentes; embora esteja no Dormitório Beta, anda mais com os alunos do Delta. Tem apenas 15 anos, mas se porta com a maturidade e a elegância de um adulto. Alunos como Michaelis não falam com alunos do Alfa. De fato, nunca tinha falado com ele. Que excelente maneira de interagir com os veteranos.

– Por que fizeste isso? – ele perguntou espantado.

Eu não sabia onde por minha vergonha, balbuciei mil desculpas, explicando que não fora de propósito. Ele olhou nos meus olhos, sério. Seus olhos castanhos me fizeram tremer. No mesmo momento, Thompson, um menino linguarudo daquele dormitório, estancou na porta, viu toda a sujeira e saiu correndo para contar aos Supervisores.

– Vai embora! Não sabes que é proibido entrar num dormitório que não é o seu? Vai!

Fiquei tão atordoado que o obedeci. Eu deveria ter ficado e ajudado, era minha obrigação. Mas no momento em que ele me mandou sair, a única coisa que consegui fazer foi levantar e sair correndo para o meu dormitório. Qual a consequência da minha falha?

Pensaram que Michaelis fosse o responsável pela bagunça, e por alguma razão ele não mencionara meu nome, talvez não o soubesse, mas poderia descrever minha pessoa. Obrigaram-no a limpar tudo e ainda ganhou um castigo extra. Dawson contou-me que essa foi a primeira vez que Michaelis ficou de castigo desde que entrou nessa escola.

Ele deve me odiar agora.

Disse ao Alois que não queria mais ser amigo dele. Por essa e outras coisas. Discutimos novamente. Ele ficou realmente chateado.

Estou sozinho novamente.

28 de setembro de 1888

[...]

Eu estava na biblioteca, à tarde, fazendo meus deveres. Levantei para procurar um livro sobre história grega. Quando voltei para a minha mesa, havia um lenço limpinho e dobrado sobre ela. O lenço tinha as minhas iniciais. Lembrei-me que era o lenço que eu tinha usado para tentar limpar a tinta no dormitório do Alois. Devo ter esquecido ele lá. Com certeza Michaelis tinha o devolvido, e limpo, coisa que eu não fiz com os cobertores dele. Procurei-o entre as estantes. Ele estudava tranquilamente umas duas estantes depois de mim. Escrevi um bilhete para ele pedindo desculpa novamente e agradecendo pelo lenço. Imaginei que ele não quisesse ver a minha cara, então, assim como ele tinha feito, esperei que ele se afastasse e coloquei o bilhete dentro do caderno de lições dele.

[...]



30 de setembro de 1888

Antes de eu vir para cá, meu pai disse que me ensinará a caçar nas férias. Mamãe fará um piquenique. Os dias parecem anos.

3 de outubro de 1888

Sinto-me extremamente só. Se não fosse eu uma criatura tão tímida e pouco expansiva, já teria feito mais amigos.

5 de outubro de 1888

No café, quando passei pela mesa do Dormitório Beta, percebi que os olhos do Michaelis me seguiam. Mas não dei importância. O restante do dia foi tedioso como sempre.

Depois das aulas, quando estamos liberados para andar pelos jardins, caminhei até um salgueiro-chorão e ali me sentei para ler. Sozinho como de costume.

– Phantomhive, lembra-se de mim? Sebastian. Posso sentar-me aqui?

Era Michaelis quem falava. Como não lembraria? Nem imaginava que ele soubesse meu nome. Apenas assenti. Ele sentou-se a minha frente sob a sombra do salgueiro, tinha um livro nas mãos, mas não o abriu.

– É verdade que morava na Índia?

– Hum, sim. Respondi inseguro.

– Como era lá? O que mais gostava?

As perguntas pegaram-me de surpresa, não esperava que ele quisesse saber algo assim e a meu respeito. Desde que cheguei a Londres, ele foi a primeira pessoa a me perguntar sobre a Índia, a primeira pessoa interessada em saber do que eu mais gostava lá e se sentia saudades. Ao contrário de Alois que só falava sobre si mesmo, Claude e os outros alunos, Sebastian fez várias perguntas sobre mim e eu respondi timidamente. É fácil e confortável conversar com ele. Arrisquei algumas perguntas sobre ele e ele as respondeu prontamente.

Agora sei que Michaelis não é nobre, sua família é burguesa. O pai conseguira uma fortuna ao investir nessas carruagens que andam sem cavalos. Ele disse que cada vez mais pessoas estão comprando. Michaelis tem quatro irmãs mais novas, Josefine, Corina, Annabel e Alice. Sei até que a pequena Alice é sua favorita. É estranho que em apenas uma tarde me tornei tão próximo de alguém com quem nunca tinha falado.

Ele é diferente do que eu imaginei. Imaginei que ele fosse metido a intelectual como o Spears ou arrogante como Claude. Mas Michaelis tem uma personalidade agradável e atraente, nem infantil nem adulto, é gentil e educado. Queria ser como ele; olhos castanhos.

Pedi desculpas pelo ocorrido com a tinta, mas ele disse que não havia problema.

– Às vezes, coisas boas acontecem em consequência de coisas ruins. Se você não tivesse derramado a tinta talvez não estivessemos conversando agora.

Pensei em dizer que na verdade Alois tinha feito aquilo, mas Trancy já tem problemas demais.

[...]



15 de outubro de 1888

Virou uma brincadeira nossa, isto é, de Sebastian e minha. Como estamos em dormitórios diferentes e em turmas diferentes, só podemos nos ver à tarde no jardim, assim como era com Trancy. O único momento em que nos vemos fora isso é no café e na biblioteca antes de irmos para as salas. Sebastian escreve-me um bilhete, o guarda em um livro e, ao levantar-se para pegar um livro na estante, deixa o livro com o bilhete sobre a minha mesa. Eu leio e escrevo a resposta, devolvendo o livro com a mesma maneira misteriosa e cautelosa com a qual me foi entregue.

O divertimento está em entregar a mensagem sem ser notado pelo bibliotecário ou pelos outros alunos. No início, o conteúdo dos bilhetes eram coisas bobas, comentários irônicos de Sebastian, ele tem certa habilidade para o sarcasmo; anedotas de um humor inteligente que me faziam rir, crítica a alguns professores, sobretudo o bibliotecário que tirava uma soneca enquanto fingia ler uma bíblia de Gutemberg, ou mesmo combinando o local em que nos encontraríamos no jardim, coisas bobas.

Agora, os bilhetes são mais elaborados. Três vezes escreveu para mim um trecho que achou interessante em um livro que leu. Duas vezes escreveu a estrofe de um poema sobre a vida e outro sobre amizade, era tão belo o poema, que perdi dois dias nos livros de poesia procurando um poema decente que pudesse mandar em resposta, sim, porque virou uma espécie de competição dar uma resposta decente e culta ao outro; encontrei um que julguei a altura dos que ele tinha me enviado e escrevi. Depois ele me corrigiu dizendo que o poema que eu escolhera não falava sobre amizade em si, mas sobre amor. Mas ele havia adorado o poema mesmo assim. Ele percebeu que minha interpretação poética não era lá muito boa, e bondosamente ofereceu-se para me dar aulas particulares, o pagamento: histórias indianas que a ama Meena contava-me.

Agora temos uma desculpa para conversarmos no jardim. Os Supervisores estão sempre importunando os alunos, controlando a distância que sentam uns dos outros, o comportamento, o conteúdo das conversas e até o tempo que passam juntos. Então sempre que algum supervisor ou aluno vem nos questionar, Sebastian responde: “estou dando aulas particulares a ele”. E a julgar pela minha média baixa de antes, e boas notas de agora, julgo que não há dúvidas quanto a veracidade das palavras dele.

[...]



28 de outubro de 1888

Passei a manhã inteira sem ver a figura de Sebastian. Cheguei a imaginar que estivesse se escondendo de mim para irritar-me ou que tivesse deixado o colégio sem sequer se despedir. Procurei-o por todas as salas e nos jardins, fui até a enfermaria, pois poderia estar acamado e doente enquanto eu lhe fazia mau juízo.

Soube, mais tarde, que meu amigo estava de castigo na sala do diretor Griffiths. Passei o resto do dia imaginando que travessura ele teria feito, pois não é do feitio dele quebrar as regras e, até hoje, a única vez que ficara de castigo foi por minha culpa. Tive que engolir minha curiosidade até às seis da tarde quando ele finalmente terminou a sua pena.

– Aquele infeliz do Griffiths me fez escrever “Não devo roubar” tantas vezes que até perdi as contas. Depois, antes de liberar-me para o jantar, mandou que eu rezasse dez Pais Nossos para pedir perdão a Deus. Deus já puniu alguém por roubar maçãs?

– Acho que Adão e Eva.

– Oh! Tens razão. Então irei para o inferno. – dizia ele brincando.

Estávamos no Dormitório Beta, no qual eu não deveria estar. Escutava a reclamação de meu amigo enquanto esperava ele se aprontar para o jantar. Todos já estavam no refeitório e logo dariam por nossa falta.

Sebastian contou que algum Inspetor de Classe contou ao Diretor que ele havia saído dos limites do Instituto para roubar maçãs no terreno vizinho. Ri da situação incomum e hilária em que meu amigo tinha se metido. Quis saber por que raios ele tentou roubar maçãs se poderia muito bem mandar uma mensagem ao seu pai pedindo que lhe enviasse uma cesta delas.

– Porque demoraria muito até ele enviar, além disso, o estoque de maçãs da escola acabou e só comprarão no mês que vem. E você as queria muito, não é?

Quando ele me disse a razão da sua empreitada maluca não pude acreditar. Uns três dias atrás, estávamos deitados no jardim, admirando as macieiras decoradas de frutos vermelhinhos e suculentos. Naquele momento, eu disse que daria qualquer coisa para provar uma. Naquele dia, eu não tinha me alimentado direito, tudo para terminar um dever de matemática; os alunos do Alfa tiveram um treino físico puxado, eu estava exausto e contava os segundos para o jantar. Não preciso dizer que ao dizer que desejava as maçãs eu estava pensando mais com a barriga do que com a mente, nem me lembrava de ter dito tal coisa. Não imaginei que ele tivesse levado a sério, nem que faria tal coisa para agradar-me. Senti-me culpado, pois agi exatamente como Eva pondo a vida de Adão em risco, e Sebastian fora novamente repreendido por minha causa. Mas, ao mesmo tempo, senti uma vaidade inexplicável.

Segurei a destra dele entre minhas mãos e fiz uma massagem.

– Prometa-me; nunca mais irá fazer uma loucura dessas para atender aos meus caprichos, poderás deixar-me mal acostumado.

– Não é para isso que serve os amigos? ...És muito gentil, Ciel.

Ele agradeceu a massagem com um sorriso; seus olhos castanhos me fizeram corar.

Um Supervisor pegou-nos sozinhos e com umas boas broncas nos escorraçou para o refeitório. Na sala de jantar, nós fomos cada um para a mesa de nossos respectivos dormitórios. Entre as cabeças dos alunos, ele sorriu para mim e pôs-se a conversar com seus colegas, umas quatro cadeiras ao lado de Sebastian, Trancy sorria alto com outros meninos. Eu, em minha mesa, comi minha refeição em silêncio.

Não consigo parar de pensar na loucura de Sebastian. Será que ele já está dormindo agora? Se eu tivesse 13 anos, estaria no dormitório Beta, mas até eu chegar lá, Sebastian já estará no Delta.

Ele é um bom amigo e deve gostar mesmo de mim.

26 de novembro de 1888

Hoje, após as aulas, nos encontramos no jardim. Não houve palavras entre nós. A tarde estava agradavelmente quente, não como na Índia, mas o calor acariciava levemente a nossa pele. Talvez a ultima tarde quente antes do inverno. Nossos pés comprimiam a grama. Um passo após o outro seguíamos destino nenhum.

Silentes.

Quando as vozes dos nossos colegas não podiam mais ser compreendidas devido à distância que percorremos, paramos e sentamos ali mesmo, naquele chão coberto de verde. Apoiei-me nas costas dele e ele nas minhas. Ficamos olhando o tempo, olhando o vento, olhando o céu. Apenas nós dois. Sozinhos. Longe dos olhares debochados dos colegas, dos olhares desconfiados dos Inspetores e dos olhares de acusação dos professores e Supervisores. Quando ele falou, foram duas ou três frases no máximo, comentando sobre tarde agradável. Apenas concordei com ele.

Nuvens branquinhas brincavam no céu, assumindo todas as formas que nossas imaginações podiam lhes dar. Sob elas nos deitamos, de barriga pra cima, apoiando as cabeças nos braços, tranquilos, como se repousássemos em nosso próprio leito. Vez ou outra, eu arriscava uma espiada no rosto dele. Ele fitava a imensidão azul com o semblante sereno. Os traços perfeitos de seu rosto juvenil pareciam destacar-se mais ao sol. Ah! Como eu o invejo e o admiro. Sim o admiro muito, pois é uma excelente pessoa. Queria ser assim como ele, expansivo, agradável e caloroso. Sou retraído, quieto e frio, nem sei como ele suporta minha presença.

Estar perto dele e vê-lo tão tranquilo em minha companhia provoca em meu interior um estado de contentamento que não sei explicar. Ultimamente tenho que controlar minhas emoções. De outra forma, pareceria um parvo ao andar sorrindo todo o tempo pelos corredores da escola. E o que pensariam os outros amigos dele? O que eu não daria para que ele fosse apenas MEU amigo... e de mais ninguém. Sim, porque eu o tenho em grande estima, e ao contrário dos demais nessa instituição, eu o vejo como ele é: Sebastian; e não “o filho de um magnata burguês”. Assim como ele enxerga quem eu sou: Ciel; e não “o filho do Conde Phantomhive”.

Não há entre nós os preconceitos que a sociedade nos impõe, nem a forma diferenciada com a qual os alunos tratam uns aos outros, baseando seus afetos e suas atenções na influencia que o pai de cada um exerce, no dinheiro e no sangue azul. Para nós isso não importa. Por isso acredito que nossa amizade seja verdadeira e pura.

Uma amizade única.

O que mais poderia ser?


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Notas finais do capítulo

Então? o que acharam? bom..mais ou menos..ruim...dicas, criticas são bem vindascomentem por favor....Obrigada a todos que leram até aqui.kissusTai Bluerose =^.^=