A Primeira Família de Esther escrita por Giullia Lepiane


Capítulo 8
Babá


Notas iniciais do capítulo

Chegamos à metade da história! Obrigada por acompanharem até aqui e continuem lendo a segunda metade!
Boa leitura!
P.S. Gente, ainda não tive tempo de responder os comentários mais recentes, porque estava ocupada terminando o capítulo, mas logo mais eu respondo!



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A escola foi evacuada.

Um aluno, Brian Thompson, acabara de falecer da maneira mais horrível possível dentro do território escolar: Tropeçou na mochila da menina que sentava à sua frente, Esther Sullivan, quando estava indo até a mesa do professor com uma tesoura nas mãos, e a ponta desta atravessou sua garganta quando ele caiu. Até os policiais e os enfermeiros da ambulância ficaram horrorizados ao ouvir a história, contada pelo professor de artes da turma, Sr. Victor Smith.

 Todos os alunos da Lincoln Elementary School receberam a ordem de guardarem o material e irem para o pátio. Quando os pais chegavam para buscá-los, encontravam seus filhos assustados, até em prantos no caso de alguns da segunda série, e enquanto as crianças os esperavam, os professores de cada classe tentavam manter as turmas unidas e fingir que estava tudo bem.

Esther não parecia muito enternecida com tudo aquilo, mas talvez sua expressão séria se devesse a um possível choque. Ela estava abraçando sua irmã Mandy, que estava chorando, e murmurando para ela se acalmar.

Foi assim que Eliza encontrou as duas filhas quando foi até a escola buscá-las.

- Mandy! Esther! – Ela exclamou, abraçando as duas ao mesmo tempo. Logo em seguida se virou para a Srta. Johnson, responsável pela turma delas. – Posso levá-las?

A professora assentiu.

Como o carro da família estava com Rick, as três voltaram para casa de táxi. Eliza perguntava o tempo inteiro para Esther se ela estava bem. Ela preferiria que a menina estivesse na mesma situação que Mandy a tão desprovida de emoções como estava. Aquilo não era normal.

- É porque ela não gostava do Brian, mamãe. – Contou-lhe mais tarde Mandy, quando Eliza perguntou para ela se Esther havia comentado algo sobre o incidente.

Aquilo a incomodou a ponto de pedir para Rick, quando ele chegou em casa, para falar com ela.

Ele concordou. Já vinha percebendo que Esther conversava mais com ele do que com a mãe. E apesar de parte dele achar isso frustrante pela sua esposa, outra parte se sentia até mesmo meio lisonjeada. Rick queria ser alguém com quem a filha pudesse sempre contar.

Por isso, logo depois, ele estava entrando no quarto dela.

- Esther, nós precisamos conversar. – Ele já foi falando para a garota que estava sentada diante de seu cavalete, pintando. Ao que seus olhos pousaram no desenho feito pela metade, ele franziu o cenho. – É o Brian?

Rick tinha visto o menino na televisão. Uma reportagem sobre a morte dele passara há pouco. Ver que Esther o estava pintando o deixou impressionado, e não da maneira positiva. Por que ela estava pintando um garoto morto?

Mas logo resolveu relaxar quanto a isso. Provavelmente ela estava pintando-o porquê não conseguia tirá-lo da cabeça, como ninguém daquela escola conseguia.

- É. – Esther respondeu-lhe, sem parar a atividade.

 - A Mandy está muito abalada por causa do quê aconteceu com ele hoje. Como você está, Esther? – Ele perguntou, sentando na cama dela.

- Estou bem. – Ela enfim parou e deixou o pincel no suporte. Virou para o pai. – Não há motivos para chorar a morte dele. Brian está no céu agora.

Rick não soube o que dizer por um momento. Foi uma resposta totalmente inesperada.

    - Sim, ele está. Mas você não ficou nem um pouco assustada com o que aconteceu?

- Acidentes acontecem.

- Eu sei, mas, bem, ele tropeçou na sua mochila.

- E daí? – Esther de repente soou como se estivesse na defensiva. Ela pegou o pincel e voltou a pintar durante alguns segundos em que os dois ficaram em silêncio. Então, travou sua mão e encarou o quadro como se estivesse pensando seriamente em algo. Com um suspiro, voltou a pousar o pincel no suporte e a se virar. – Desculpa, papai. Acho que fiquei sim meio abalada.

Isso deixou Rick mais tranquilo.

- Tudo bem, minha querida. Eu entendo. – Ele se levantou. – Se você quiser conversar mais, pode ir falar comigo. Eu vou te deixar pintar.

- Obrigada. – Ela agradeceu, enquanto ele ia até a porta. E quando Rick estava para sair, ela chamou: - Papai?

- Sim?

- Eu te amo.

- Eu também te amo, Esther.

E ele saiu do quarto disposto a falar para Eliza que a reação de Esther quanto à morte de Brian fora diferente da de Mandy porque elas eram pessoas diferentes. Porém, que ambas eram garotas absolutamente normais.

*********

As aulas da escola voltavam normalmente na quinta-feira, apesar do incidente do dia anterior. Entretanto, Rick e Eliza deixaram que eu e Amanda faltássemos.

Passar o dia brincando com ela foi aborrecedor, mas menos mau que passá-lo na escola com dezenas de outras crianças.

Na sexta-feira nós tivemos de ir. Na aula, a Srta. Johnson não falou nem uma vez de Brian, e os alunos pareciam estar superando muito bem o ocorrido.

E no sábado houve aquela exposição de artes de Leon, na qual eu e Amanda não podíamos ir.

Leon ficou falando nisso do momento em que acordou até a hora de sair para o evento, que começava às quatro da tarde. Ele estava muito empolgado, como se estivesse indo ganhar um prêmio ou algo do tipo.  Eu nunca o vira tão sorridente.

E esperava não ver de novo. Que coisa mais insuportavelmente exagerada.

A babá da família, Ashley – uma adolescente meio baixa e magra demais, com dezesseis ou dezessete anos de idade e um piercing no queixo – chegou minutos antes de eles saírem. Amanda ficou feliz ao vê-la, e vice-versa. De acordo com Ashley, ela também ficou feliz em me conhecer.

Ela trouxe alguns jogos de tabuleiro, como se Amanda já não tivesse toneladas de brinquedos. A primeira coisa que fez, uma vez sozinha conosco, foi despejar todas as peças de um quebra-cabeça do Snoopy na mesa da sala de jantar e perguntar:

- Vamos montar o quebra-cabeça?

Amanda aceitou, mas eu falei que ia ficar no meu quarto. E subi antes que ela pudesse insistir, ou qualquer coisa.

Assim, enquanto elas estavam brincando na sala, eu fiquei deitada na minha cama observando todas as pinturas que eu tinha feito desde que cheguei à casa dos Sullivan – agora, já faz precisamente uma semana – e que estavam espalhadas pelo quarto inteiro.

O meu desenho mais recente era o de Brian. Ele estava sobre a minha escrivaninha, ao lado de um desenho da Lincoln Elementary, de um do orfanato onde eu estava na Rússia e alguns de uns animais aleatórios. Presos às paredes, tinha as pinturas que eu fiz de todos os Sullivan.

A melhor parte de desenhar era poder fazer em imagens o que eu tinha de me segurar para não fazer de verdade. Sangue, membros decepados, olhos perfurados. Tudo isso nos meus desenhos, e, no entanto, invisível às outras pessoas.

Eu poderia passar o dia inteiro aqui olhando.

Uma hora, porém, acabei me lembrando da pintura de cobra que eu tinha há mais ou menos um mês atrás, e que Rick havia me contado que Leon tinha uma cobra de estimação. Com ele fora de casa junto dos pais e Amanda com Ashley montando quebra-cabeças, me pareceu um excelente momento para ir conferir isso.

Levantei-me e saí do quarto. Do corredor, dava para ouvir as vozes delas vindas do andar de baixo:

- Mandy, você viu onde está este pedaço da casinha?

- Não...

- Por que não separamos todas as pecinhas vermelhas?

- Tá bom!

Fui até o quarto de Leon, que ficava entre o meu e o banheiro. Como eu esperava, a porta estava destrancada, e eu pude entrar com facilidade.

Me fechei lá dentro e olhei ao redor.

O quarto era verde escuro e todos os móveis eram marrons, de modo que isso, somado às cortinas fechadas fazia parecer mais tarde do que realmente era. Assim como no meu quarto, havia um cavalete e desenhos espalhados por toda a parte, mas mesmo assim era um local organizado. O único objeto fora do lugar era um skate, abandonado perto do armário.

E logo avistei o aquário com a cobra, encostado em uma parede.

Ela estava completamente imóvel, então supus que estava dormindo. Era parecida com a do meu desenho. Eu gostei de vê-la.

Porém, não gostei de ouvir a voz de Ashley vinda do corredor chamando por mim, após alguns segundos.

Fiquei esperando para ver se parava. Será que ela tinha entrado no meu quarto? Visto que eu não estava lá?

Por fim, concluí que não dava para ficar no quarto de Leon esperando e nem sair disfarçadamente. Eu não fiz algo por aqui que me obrigue a ser sorrateira.

Saí normalmente, e olhei para Ashley, que batia na porta de meu quarto, com uma inocência infantil.

- Estou aqui.

- O que você estava fazendo no quarto de Leon? – Ela perguntou, com a voz esganiçada.

- Estava vendo a cobra.

- Ah. Bem, eu e a Mandy vamos brincar de pega-pega no quintal. Você quer vir com a gente?

- Não. Quero ficar no meu quarto.

- Mas você estava no quarto de Leon.

- Bom, a casa é minha.

Ashley cruzou os braços, desagradada com o fora. Mas decidiu fingir que não o ouviu.

- Oras, vamos, Esther. Vai ser legal. Vem. – Ela estendeu o braço e pegou meu pulso. Maldita seja.

A minha fita. A fita que eu uso amarrada neste pulso poderia escorregar se ela me puxasse.

A minha reação foi parecida com a de quando achei que Eliza fosse encontrar minha bíblia: Tirei a mão com violência e fui para trás;

- Não encosta! – Berrei.

- Esther! – Agora sim Ashley ficou verdadeiramente chocada – Eu vou contar isso para os seus pais!

Não fiquei para brigar. Entrei no meu quarto, batendo a porta.

Pude ouvir os passos dela se afastando escada abaixo.

Eu estava muito nervosa. Caí de joelhos no chão, contando mentalmente, já que diziam que esta era uma boa técnica para se acalmar. Não funcionou, e eu levantei, fui até minha cama, agarrei meu travesseiro e o joguei com força contra uma parede.

Ele bateu no desenho de Amanda, e ambos caíram no chão. Desabei no meu colchão, onde pude abafar um grito.

Depois disso, comecei lentamente a relaxar. A Ashley estava errada. Ela não ia contar o que aconteceu para Rick e Eliza. Eu não ia deixar que isso acontecesse.

Sentei na cama, e olhei pela janela do quarto. Em pouco tempo, deu para vê-la saindo com Amanda para o quintal.

E então pensei em algo que podia dar certo.

Fui ao quarto de Leon novamente, mas dessa vez não era pela cobra, e sim por algo que eu vi quando fui pela primeira vez: O skate.

Peguei-o de seu canto perto do armário, e saí do quarto com ele debaixo do braço.

Desci as escadas, e fui em direção à porta de entrada da casa.

O que eu ia fazer seria algo parecido, e ao mesmo tempo, completamente diferente do que fiz com Brian.

Fui para a sala de jantar. Eu poderia executar o meu plano se a porta para o quintal estivesse fechada, pois seria só abri-la. Mas facilitou que ela estivesse entreaberta quando eu cheguei.

Dava para ouvir claramente Ashley e Amanda brincando lá fora. Elas estavam perto, passando pela porta diversas vezes. Mas sem me ver aqui em momento algum, pois eu pude me esconder atrás da porta.

A visão que eu tinha do quintal, escondida, era péssima. Contudo, tinha uma noção do que estava acontecendo. Pude saber quando elas iam passar, Ashley primeiro, depois Amanda. Pude colocar o skate de Leon no chão, e por um pé nele. E, quando chegou o momento mais oportuno – quando elas estavam chegando, mas ainda não podiam ver se eu jogasse algo na frente delas – empurrei o skate. Não fiz isso com força, então ele rolou para fora da porta e não parou muito distante.

  Mas não deu tão certo quanto eu achei que daria. Porque Ashley reparou, e desviou no último segundo.

E foi Amanda quem tropeçou, e caiu batendo a cabeça com força no chão, sangue escorrendo imediatamente.


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Notas finais do capítulo

Ei, fãs de Percy Jackson que leem a fic!
Eu ficaria muito contente se vocês pudessem ler minha one-shot "Monomania". Segue-se o link:
http://fanfiction.com.br/historia/359842/Monomania
E até o capítulo 9!