O Livro Da Bruxa escrita por Vega Sage


Capítulo 4
Quadrado


Notas iniciais do capítulo

A magia esta no ar e a amizade esta aqui para te fazer voar em um mundo diferente e muito divertido.Chamado Realidade ou Fantasia...



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/323717/chapter/4


Fui visitá-la novamente na tarde seguinte.

Após os cumprimentos,ela pegou um guardanapo de papel e colocou-o sobre a mesinha.

–Hoje gostaria de mostrar-lhe algo importante.Empreste-me sua caneta-pediu.

Entrei-lhe a caneta,e ela começou a desenhar algumas linhas retas.

Eu estava decidido a não mais me surpreender com o que ela dissesse ou fizesse,mas não pude deixar de admirar a firmeza de sua mão ao executar o desenho.

Quando terminou,tinha criado a figura de um quadrado com duas diagonais.

–O que este desenho significa para você?-perguntou,mostrando-me sua obra.

–É algum tipo de teste para avaliar meu perfil psicológico ou posso responder sem medo de ser analisado?-perguntei,tentando ganhar tempo.

–Apenas gostaria de saber o que você vê nele-tranquilizou-me.

–Aparentemente é um quadrado com duas diagonais...Acertei?

Ela esboçou um sorriso,percebendo minha tensão em responder algo inteligente.

–Não existe certo nem errado.É somente um desenho.

Ela parecia estar se divertindo com a minha preocupação.

–Quando você o vê como um quadrado com diagonais,que pensamentos vêm à sua mente?-perguntou.

–Quer realmente saber isso?-indaguei,tentando ganhar mais algum tempo.

–Só se você não quiser contar-respondeu,divertindo-se com as minhas evasivas.

–Então vamos lá-declarei decidido-Esse desenho me faz lembrar de um problema de geometria...Estou angustiado imaginando se a próxima pergunta será sobre o valor de algum ângulo ou o cálculo da distância entre dois pontos.Acho que não são lembranças muito boas do tempo da escola-concluí.

Ficamos alguns segundos em silêncio.

–Não precisa ficar angustiado.Vou salvá-lo desta situação...A figura pode ser o desenho de um envelope.Consegue vê-lo?

Olhei novamente para o papel.

Como num passe de mágica,o problema de geometria havia desaparecido e lá estava o desenho de um envelope.Nenhuma linha havia mudado,mas a figura era outra.

Não consegui disfarçar e sorri como uma criança deslumbrada.Sempre gostei muito de mágicas e,quando vi o envelope,foi como se tivesse visto um elefante saindo de uma caixa de fósforos.

–Ah,é um envelope.Não pude percebê-lo da primeira vez,mas agora...

–Que tipo de pensamentos este envelope lhe traz?-perguntou,séria.

–Envelope...envelope...-fingi procurar algo na memória.

–Não faça cena.Quando você viu o envelope,algo surgiu em sua mente.Afinal,não é a primeira vez que você vê um envelope.Já existem ideias associadas a ele.Você só está ganhando tempo porque não tem certeza se quer me contar,não estou certa?

Tinha sido apanhado.Parecia impossível tentar despistá-la.

–Está bem,confesso.Lembrei-me de um amiga que mora em outra país.Conheci-a numa viagem que fiz há cerca de quinze anos.Trocamos muitas cartas antes de ela se casar.Sempre quando vejo um envelope lembro-me dela...Tem certeza de esta figura não é um teste para revelar minhas características psicológicas?

–Pare de se preocupar em não se expor.Você ainda não percebeu que eu não preciso de nenhum teste psicológico para descobrir o que quero?Sou uma bruxa.Sei tudo a seu respeito.Até mesmo pontos que você próprio desconhece.Estou apenas lhe mostrando algo para facilitar seu caminho,portanto pare de relutar e aprenda.

Eu não conseguia distinguir quando ela estava falando sério de quando dizia algo só para me atiçar.

Será que ela acreditava ser realmente uma bruxa?Ou tinha dito aquilo apenas para me provocar?Sua aparência frágil e a idade ocultavam uma mente brilhante,capaz de manter o controle em qualquer situação.Ela era o tipo de pessoa que eu gostaria de ter ao meu lado caso entrasse em alguma encrenca.

–Ah,uma bruxa!É a primeira vez que tenho uma bruxa como professora.Pensando bem,acho que já tive algumas professoras bruxas;elas adoravam me deixar para exame no final do ano.

Fiz uma careta,como se tivesse algo azedo na boca.

–Entretanto,não acredito que você seja uma daquelas professoras bruxas.Talvez seja mais como uma bruxa professora,não é?Espero não ficar de recuperação na sua matéria.Não estou mais em idade de fazer provas nas férias.

–Não se preocupe.Não será esse o caso-comentou.

–Também gostaria que você contasse as coisas que sabe a meu respeito que ainda não sei.Eu economizaria um bom dinheiro de analista-argumentei.

–Vou fazer melhor do que isso:vou mostrar-lhe como descobri-las por si mesmo.Melhor que dar o peixe é ensinar como se pesca,não é o que me diz o ditado?

Ela pegou novamente a folha de papel e retomou o ar professoral.

–Vamos brincar um pouco mais com a nossa figura.O que mais você consegue ver neste desenho?

–Não sei,deixe-me pensar.

Fiquei olhando para o desenho durante quase um minuto,mas não conseguia me concentrar.Só via o envelope ou o problema de geometria.

O silêncio era absoluto,e minha ansiedade crescia com o passar do tempo.Ela permanecia serena.Tive a impressão de que,se eu ficasse mais um ano olhando para figura,ela esperaria.Era como jogar xadrez.O próximo movimento era me,e ela apenas aguardava para ver o que eu faria.

Olhei para ela pedindo socorro.

–Não estou conseguindo...Preciso de ajuda-admiti,envergonhado.

–Que tal uma ampulheta?Sabe o que é uma ampulheta,não é?

–Claro que sei.É um tipo de relógio feito de vidro no qual se coloca areia.Quando virado de cabeça para baixo,a areia escorre lentamente da parte superior para a inferior.

Decidi temperar um pouco mais nossa conversa.

–Lembro-me de que tive uma quando vivi em Roma na época do Império,mas isso foi numa de minhas outras vidas-ironizei,querendo ver qual seria sua ração.

–É bom saber que você se lembra de outras vidas.Será útil para aproveitar melhor esta-rebateu,desarmando-me.

Fiquei sem ação.

–Agora volte para a figura e veja se consegue achar a ampulheta-ordenou.

Obedeci e tornei a olhar para o desenho.

A mágica ocorreu novamente.Numa fração de segundo,o envelope se transformou numa ampulheta.Vi os dois cones de vidro formados pelos triângulos superior e inferior e o suporte de madeira formado pelas linha laterais.Mais uma vez não consegui conter a expressão de quem vê um milagre acontecer bem diante dos olhos.

Senti que ela observava divertida meu deslumbramento.

–Que pensamentos a ampulheta lhe traz?-perguntou no exato instante em que algumas imagens surgiam em minha mente.

Deixei as ideias fluírem.

–Vejo um alquimista medieval colocando um frasco no fogo e virando a ampulheta para marcar o tempo.É madrugada.Ele está só em seu laboratório e sonha com o dia em que será capaz de produzir o elixir da longa vida e se tornar imortal.

Fiquei surpreso com as ideias que eu mesmo acabara de expor.

–Parabéns,está ficando poético e soltando um pouco mais de imaginação.Isso é muito bom.Assim nosso trabalho fica mais divertido,não acha?

Era uma legítima professora estimulando um aluno pelo acerto.

–Obrigado.Acho que estou começando a pegar o jeito-agradeci e fiz uma reverência,como um ator no final da peça.

–Então vamos continuar...O que mais você consegue ver no desenho?

–Tem outra coisa para ser vista aí?-duvidei.

–Só depende de você.O que acha?

Depois de ter recebido os parabéns,não pretendia,sob nenhuma hipótese,passar um atestado de falta de imaginação.Olhei para a desafiadora figura e procurei uma nova abordagem.

Concentrei-me durante algum tempo tentando achar uma solução.De repente,tive um estalo.-Ah,já sei...Estou vendo uma porteira.É,sim,é uma porteira-concluí,entusiasmado com a minha descoberta.

Ela apenas olhou para mim e sorriu.

–Agora você quer saber o que a porteira me faz lembrar,não é?-continuei.

Ela balanço levemente a cabeça,concordando.

–Estou me lembrando do sítio do meu tio.Lá havia uma porteira igual a essa.Fui para lá algumas vezes.Quando chegávamos,era preciso descer do carro par abri-la.O sítio foi vendido há muitos anos.Tenho boas recordações daquela época.

As lembranças chagavam velozes,e continuei divagando sem restrições.

–Era muito agradável dormir com o barulho doa grilos e acordar com o canto dos galos.Também havia uma pequena cachoeira perto de casa.Tomei banho nela algumas vezes.A água era gelada,deliciosa...Mas foi há muito tempo.Não faria isso de novo.Especialmente depois de ter aprendido que é possível contrair esquistossomose em lagos contaminados.Ela levantou uma sobrancelha quando falei sobre a esquistossomose.

–Dessa vez você começou com poesia,mas foi trazido rapidamente à realidade pelos seus conhecimentos médicos.Pensar em esquistossomose quebrou todo o encanto.Certos conhecimentos,às vezes,nos atrapalham-concluiu.

–Mas evitam que a esquistossomose nos pegue-rebati.

–Também impedem que tomemos banhos de cachoeira,não é?

Ela colocou o desenho de lado antes de prosseguir.

–Não estou dizendo que devemos nos arriscar de modo insensato,mas com um pouco de bom senso podemos assumir alguns riscos e tornar a vida muito mais interessante...Ao beijar alguém,você também pode contrair uma doença.Contudo,qual é a graça de passar a vida sem beijar e ser beijado?

–Tem razão.Como disse o poeta,"O porto é um lugar mais seguro para um barco,mas ele não foi feito para ficar lá;seu destino é navegar"-declamei.

Ela bateu palmas.

–Parece que retomei a inspiração poética,não é?

–A palavra "poeta" vem do grego e significa "aquele que faz".Comparar pessoas a barcos ou avida a uma pintura é típico da poesia.Ela permite estabelecer semelhanças entre coisas diversas.Também possibilita ver a mesma situação por diferentes perspectivas.

Ela pegou o papel e mostrou-me o desenho.

–Brincar com esta figura é uma forma de exercitar esta capacidade.Se soubermos utilizá-la,poderemos perceber as maravilhas ocultas em nosso rotina e modificarmos nossa vida.

Uma nota de melancolia insinuou-se em sua voz,e ela começou a falar como se estivesse conversado consigo mesma.

–Infelizmente esse nosso dom é pouco utilizado.É o motivo pelo qual as pessoas se tornam angustiadas e insatisfeitas.Elas deixam atrofiar a capacidade de se maravilhar com o mundo.Não conseguem ver os tesouros que estão todo o tempo bem diante dos próprios olhos.

De repente,como se tivesse sido apanhada distraída durante o trabalho,retomou a disposição anterior.

–O que mais você consegue ver aqui?-disse,indicando o desenho.

–Ainda há outras possibilidades nesta figura?-perguntei incrédulo.

Ela colocou o papel de lado.

–Tem razão,não vamos exagerar.Você já tem o suficiente para pensar por hoje.É hora de descansarmos.Amanhã é sábado,você virá me visitar?

–Amanhã é meu dia de folga.Outro médico está encarregado de visitá-la.Entretanto,se você permitir,virei apenas para conversarmos.Posso chegar no início da noite.Aceita?

–Será um prazer.Mas devo avisá-la de que o horário de visitas deste hospital é até as dezessete horas.Se você chegar no início da noite,não poderá entrar-disse,num tom maroto.

–Vou lhe contar um segredinho.Tenho isso para mostrar na portaria-sussurrei,apontando para o meu crachá.-Eles pensarão que sou médico e me deixarão entrar mesmo fora do horário.

–Ah,muito bem...Só espero não despertar ciúme em nenhuma esposa ou namorada pelo fato de você vir me visitar no sábado à noite.

–Pode ficar tranquila.Estou completamente solteiro e não tenho nenhum outro compromisso.

Era verdade.Eu tinha terminado havia pouco tempo um relacionamento de vários anos e estava tentando me manter longe dos compromissos sérios.Tinha passado minha últimas noites de sábado sozinho,comendo pizza e ouvindo músicas em meu apartamento.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não percam PERSPECTIVAS.
o proximo capitulo sera enfeitiçar ate seus pais.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Livro Da Bruxa" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.