Fugindo De Um Erro escrita por Luana Brasil


Capítulo 6
Capítulo 6 - Processo nº 152409




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No dia seguinte obrigaram-nos a usar calça jeans, tênis e uma blusa branca escrita de cor preta: “Doutor Lourdes K. Abrigo”.

-Eu to horrível!- Exclamei.

-Ao menos seu esmalte combina com a blusa. – Lindsay disse fazendo-me rir enquanto entravamos no ônibus.

Quando chegamos ao Central Park vimos que havia outras pessoas além de nós. Devia ter mais ou menos umas 25 famílias.  Sentei-me em um dos bancos do parque e fiquei lá curtindo uma brisinha que assoprava contra meu rosto.

-O Megan, você conhece esse cara?- Lindsay chamava-me.

Quando abri meus olhos vi um rosto do qual eu sentia saudades:

-Vincent! - Eu corri e o abracei.

Ele entregou-me um papel que tinha todas as informações sobre o processo judicial que envolvia meu irmão e eu: O tipo do processo, o dia, hora e local. O número do processo era 152409. Eu sorri e disse espantada:

-Como você conseguiu isso?

-Eu tenho as minhas fontes.

-Megan, - Lindsay disse - Agora você pode impedir que te tirem do seu irmão. E você sabe que se precisar da minha ajuda é só dizer.

-Mas espera... - Eu interrompi- Como vamos chegar lá?

Vincent colocou a mão no queixo estralou os dedos e disse:

-Já sei! Onde é janela mais baixa do abrigo?

-A do refeitório. - Lindsay afirmou.

-Então é o seguinte – Vincent começou a explicar o plano- por volta das quatro horas vocês tem que estar no refeitório. Quando eu estiver por perto eu vou assobiar e bater palmas. Vocês pulam e nós vamos para o cartório do Brooklyn. Entramos lá e perguntamos a sala por “curiosidade”. Então você vai lá e fala tudo que tiver que falar.

-Espera- Lindsay interrompeu- Você acha que eles vão dar uma informação dessas só porque nós estamos pedindo? A não ser que um de nós seja um profissional de direito eles não vão nos dizer nada.

-A não ser- Vincent disse olhando para Lindsay- que você coloque um terninho, faça um coque e ponha um óculos. Você vai ficar como uma advogada de verdade.

-Tá bom, mas onde vamos arrumar um terninho e um óculos?- Lindsay perguntou confusa.

-Deixa comigo - Vincent disse sorrindo.

No dia do processo por volta das 10h da manhã eu e Lindsay fomos ao refeitório e encontramos a cozinheira, uma mulher negra e um pouco acima do peso, sentada em uma das mesas tomando algo que parecia ser um chá.

-Posso ajudar vocês?- Ela perguntou com um sorriso simpático no rosto.

-Sim. - Lindsay disse- Nós gostaríamos se varrer o chão da cozinha após o lanche da tarde.

-Gostaríamos?- Eu perguntei e Lindsay deu uma cotovelada de leve no meu braço- É gostaríamos.

-Nossa meninas. Muito obrigada pela ajuda. Estejam aqui às cinco horas e nós vamos limpar esse refeitório.

-Não, você não entendeu. - Eu disse- Nós estamos querendo que você tenha uma tarde de folga. Nós duas podemos varrer essa cozinha.

Ela nos deu um grande abraço.

-O meu Deus. Vocês duas são mesmo dois anjos. Então até as cinco e muito obrigada.

Nós duas saímos pela porta do refeitório rimos e fomos até o nosso quarto.

Às cinco horas fomos até a cozinha. A cozinheira nos entregou as vassouras e saiu.

-Lindsay quantas horas?

-Cinco. Ele já vai chegar.

Comecei a ouvir alguns assobios e depois ouvi palmas. Era ele. Lindsay pegou uma cadeira e pôs a cadeira ao pé da janela. Nós sentamos no parapeito da janela. Ela segurou minha mão e nós pulamos. Caímos de mau jeito, mas não nos machucamos, pois estávamos de calça jeans Nos levantamos, puxamos o Vincent e corremos. Lindsay e eu entramos no primeiro beco que vimos com a sacola a onde estavam as roupas que o Vincent havia trazido. Eu a ajudei a trocar de roupa. Ela terminou e nos fomos em direção ao cartório do Brooklyn.

Paramos do outro lado da rua e Vincent perguntou:

-E nos dois Lindsay?

-Já sei!- Ela disse estralando os dedos.

Entramos no cartório com a Lindsay segurando com uma mão o meu braço e com a outra o braço do Vincent. Paramos em frente à recepcionista e Lindsay perguntou:

-Eu preciso saber onde está sendo realizado o processo 152409. Estas pestes fugiram de lá.

A recepcionista sem nem nos olhar disse:

-Sala 127.

-Obrigada. Venham moleques.

Entramos em um corredor que tinha varias portas grandes com placas de metal em cima que mostravam quais salas havia ali dentro. Quase no final do corredor vimos à placa “120-128” e ali entramos. A Lindsay correu na frente e começou a olhar as salas do fundo e eu e o Vincent olhamos as do começo do corredor.

-Achei! É está aqui! – Lindsay chamou.

Virei-me e disse segurando carinhosamente o rosto de Vincent:

-Isso é por tudo que você fez por mim.

Dei-lhe um beijo carinhoso, na boca, e fui em direção a Lindsay e com uma das mãos em meu ombro ela disse:

-Boa sorte amiga.

Um homem, que parecia ser um advogado, abriu a porta e gritou:

-Que alvoroço é esse? Segurança!

Um dos seguranças do cartório apareceu e segurou o Vincent por trás e o advogado eu havia nos descoberto segurou o braço da Lindsay. Eu empurrei a porta e todos da sala olharam para mim, inclusive meu irmão, e eu gritei para o juiz:

-Você não pode fazer isso!- Alguém agarrou meus braços por trás, mas eu continuei gritando brava:- Você não pode me tirar do meu irmão- Lágrimas corriam pelo meu rosto e eu continuei a falar mais baixo- Você não pode me tirar da minha família.

O homem que me agarrou por trás me tirou da sala, mas soube mais tarde que depois que sai o advogado do meu irmão disse:

-Meritíssimo, acho que seria mais adequado se adiarmos esse julgamento e deixarmos a adolescente Megan Victoria Hawkins participar.

-Concebido- Ele bateu o martelo- Um novo processo será realizado daqui a três dias.

No carro dos seguranças do cartório estávamos Lindsay e eu.

-Acabou! Não acredito que deu tudo errado. - Eu disse muito triste.

Lindsay me abraçou e disse:

-Calma Megan tudo vai melhorar. Você vai ver.

Quando chegamos ao abrigo, Lindsay e eu fomos encaminhadas para a sala da coordenadora.

-Eu não posso acreditar nisso. Como vocês puderam fugir do abrigo... Para nada? Vocês duas agora vão freqüentar o nosso psicólogo duas vezes por semana durante um mês. Carmen - Ela disse a ajudante dela que estava do lado da porta - Leve elas para a sala do psicólogo imediatamente.

A sala onde o psicólogo atendia os abrigados era no fim de um corredor e perto da porta havia três cadeiras. Sentei-me em uma delas e Lindsay entrou na sala.

Meia hora depois ela saiu e fez um sinal com a cabeça, mostrando que eu já podia entrar. Quando entrei tive uma surpresa: O psicólogo do abrigo era o Pânico que ao me ver exclamou:

-Megan! O que você ta fazendo aqui? Pensei que estivesse com seu irmão.

-Os tiras me pegaram, mas e você, o que faz aqui?

-Eu trabalho aqui querida.

-Mas e a banca?

-Eu sou amigo do dono e naquele dia ele havia viajando então eu fiquei lá tomando conta. Bom o que te traz a minha sala?

-Eu fugi do abrigo para impedir a audiência que iriam me tirar do meu irmão e como da pra perceber eu não consegui.

-Bem, qualquer outra pessoa iria te dizer que o que você fez foi errado, mas eu discordo. Sabe, entendo bem a sua situação.

-Entende?- Perguntei confusa.

-É. Quando eu tinha dez anos eu morava com a minha irmã só que houve uns probleminhas e aí me tiram dela. E então eu vim pra cá: o Doutor Lourdes K. Abrigo. Ela vinha me visitar todos os dias, mas faltando dois dias para que eu completasse 14 anos ela não veio. Não me preocupei, mas quando me dei conta já havia se passado quatro anos que não a via mais. Ao sair daqui fui atrás dela e não a encontrei. Fui até a pólicia prestar queixa de desaparecimento. O policial que me atendeu mexeu nos registros do computador e me disse: “Meu jovem, a senhorita Nathália Anne Williams morreu há quatro anos.” Por um bom tempo essas palavras me afligiram e é por isso que hoje eu tenho síndrome do pânico. Nesse dia eu senti vontade de fugir.

A síndrome que Peter possuía funcionava da seguinte maneira: Se alguma mulher que lembrasse sua irmã tentasse se aproximar, ele começava a ouvir vozes que o perturbavam e o faziam gritar desesperadamente o nome de Nathália. 4

-Foi exatamente isso que eu quis fazer quando meus pais e meus avos morreram.

-E eu ia fazer isso, mas minha irmã sempre me dizia: “É inútil fugir de um problema só porque você sente medo de enfrentá-lo.”- Ele me olhou e sorriu- A vida é como uma escada muito alta Megan, quando conseguimos, nós subimos um degrau e quando sentimos medo ou alguma coisa nos impede de continuar Deus nos ajuda a continuar subindo, pois Ele não lhe da essa “escada”- Ele fez aspas com os dedos e dizendo “escadas” ele se referia a vida- para você ficar apenas observando o alto. Claro que não. Ele lhe da essa escada para que você vá até o fim, pois Ele sabe que você é capaz.

Ele sorriu para mim e eu retribui.

-Você falando assim até parece poeta. - Ele riu- E quer saber você fez eu me sentir melhor apesar de tudo. Obrigada.

Nós conversamos bastante e tenho certeza que sai muito mais aliviada, mas a aquela audiência ainda me afligia.

                                            ٭٭٭

No dia seguinte tive que me arrumar para poder ir assistir aula, no abrigo mesmo.  Em minha outra escola não fazia as atividades, não prestava atenção no professor e sempre aprontava, mas na hora da prova eu me dava bem. Quis fazer diferente no abrigo.

Eu e a Lindsay fomos para a sala onde uma professora nos esperava. Ela era muito diferente das professoras que eu tinha antes: tinha por volta de seus 25 anos, era bonita, simpática e muito legal. Seu nome era Melina e ela nos ensinava todas as matérias.

Prestei toda atenção na aula e pela primeira vez eu gostei de ir à aula.

Quando Lindsay e eu saímos da sala encontramos com o Pânico que veio em nossa direção.

-Ei Megan, tenho uma coisa aqui que você vai gostar – Ele me entregou um envelope feito com folha de caderno.

-O que é isso?- Eu perguntei.

-É uma carta... Do Vincent. Ele me pediu para te entregar. Eu tenho que ir pra minha sala. Tchau meninas.

Li ali mesmo a carta e achei muito legal ver que ele realmente se importava comigo. Na carta perguntou-me se eu estava bem e me contou que estava de castigo por estar aprontando na escola. Disse também que teria no Central Park uma feira de Rock e também que se eu não fosse ele iria comprar uma lembrancinha para mim.

Quando acabei de ler, nós voltamos para o nosso quarto e assim que chegamos lá a Lindsay colocou os cadernos na penteadeira, se atirou na cama e disse:

-Nossa! Como eu preciso de descanso. Estudar acaba comigo. Ainda bem que amanhã não tem aula.

-Não tem não?

_____________

4 As informações sobre a síndrome de ansiedade ou síndrome do pânico aqui mostradas não tem fundamento cientifico.

-Não amanhã a Melina vai precisar viajar lá pra Rochester e ainda não sabe quando volta. Amém! - Eu ri sentada na penteadeira enquanto arrumava meu cabelo. – Meg, você não sabe o que me disseram.

-Não sei mesmo.

-Então escuta: sabe a Ginger?

-Aquela sem noção? Sei.

-Ela foi adotada. Tenho muita pena dos pobres coitados que adotaram ela. E não tem aquelas amiguinhas dela? Elas foram transferidas de abrigo.

-Foram pra qual?

-Eu sei lá. Só espero que seja bem longe daqui, tipo lá em Manhattan.- “Como é longe” pensei.

-Você é mal Linds, e sabia que Manhattan é distrito aqui de Nova York?

-É. Eu sei. Foi o primeiro lugar que eu pensei. Eu peguei um jogo bem legal. Quer jogar?

-Que jogo?

-Leilão de arte®. Eu chamei dois amigos pra jogarem também.

-Pode ser.

Pouco depois chegou em nosso quarto um casal de irmãos gêmeos: Raphael e Gabrielle.  Os dois eram moreninhos de cabelo preto e todos dois eram super gente boa.

Sentamos no meio do quarto e pegamos as fichas de dinheiro, quadros e seus preços. Depois que tudo estava pronto Lindsay que era o banco começou a mostrar os quadros e nós começamos a dar lances.

-Um.

-Dois.

-Três e meio.

-É seu.

Em uma das jogadas eu estava distraída e os lances estavam sendo dados.

-Um

-Dois.

-Três.

-Dez- Eu disse sem querer.

-É seu - Raphael disse espantado.

-Não! Foi sem querer. Eu estava distraída.

-Agora já era.-Ele disse rindo.

-Assim não vale.

Lindsay e Gabrielle não agüentaram e dispararam a rir da minha distração.

Nós continuamos jogando até as 10h quando deu o toque de recolher.

Eu e Lindsay nos deitamos e quando eu abri os olhos ela estava me olhando ainda rindo:

-Dez.- Ela riu de novo- Depois dessa você nunca mais vai falar dez de novo.

-Ai meu Deus... Vai dormir Lindsay- Eu brinquei- esquece esse dez.

-Ta bom dormir eu vou, mas esquecer não vou não.

Ela riu de novo depois foi dormir.

Aquele havia sido um dos dias mais legais em que estive ali no abrigo.


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