– Você está queimando em febre, serio filha. Sai de debaixo dessas cobertas, anda! – ela nem esperou eu revidar e puxou meu cobertor. – e tira essa meia e essa calça – ela abriu meu armário, e tirou um short e um chinelo de lá, jogou pra mim. – Já venho com seu remédio! – e saiu correndo.

Sim, eu tenho uma mãe muito desesperada, coitada. É só uma febre, nada demais.

Vesti a porcaria do short batendo os joelhos de frio, e me sentei na cama.

– Toma, bebe – ela me entregou um copo com água e uma coisinha amarela. É, deve ser aquela droga de remédio amargo que ela me obriga a tomar sempre. Tomei, fazendo uma careta nada agradável, e me deitei na cama de novo.

– Nada de dormir – minha mãe me puxou – vamos lá pra baixo.

– Tudo bem, você quem manda – fui arrastada até a cozinha. Me sentei na mesa, e minha mãe foi para a lavanderia.

Hum, lavanderia me lembra ontem, e ontem me lembra Emilio. Nada bom.

Continuei sentada na cadeira da cozinha, olhando. De repente, vejo uma camisa de uniforme jogada no chão da lavanderia. E não, não pertence a mim, porque deve caber umas duas Julias lá dentro.

Fiquei olhando pra blusa – até parece que ela vai vir até minhas mãos flutuando – e pensando em algum modo de tirar ela dali sem minha mãe perceber, hum, difícil.

Me levantei, e fui até lá. Peguei uma roupa que estava perto da blusa, em cima da bancada, e sem querer – aham – joguei no chão. Me abaixei pra pegar, e aproveitei pra pegar as duas ao mesmo tempo.

Minha mãe se virou.

– O que foi?

– Nada, só deixei cair aqui, já peguei, tchau mãe! – disse, tentando escapar dali.

– Não, me da aqui, deixa eu lavar – ela estendeu a mão.

Fedeu, o que faço agora? Entrego a blusa, ou saio correndo? Tá, é melhor entregar.

Coloquei as duas blusas em suas mãos, e cruzei os dedos nas costas.

“não repara, não repara, não repara, por favor, não repara” – eu repetia e repetia, torcendo pra lerdice da minha mãe funcionar nesse momento.

Ela separou as duas blusas, e ficou olhando pra blusa do uniforme. Virou, revirou, virou de novo, e foi até a etiqueta.

Fez uma cara pensativa.

– Julia, que estranho, hum... você veste tamanho 14, porque essa blusa aqui é P adulto? – ela perguntou, olhando fixamente para meus olhos. Fiquei nervosa, muito nervosa, não consigo mentir com as pessoas me encarando assim, principalmente minha mãe.

– Ah mãe, é...

– Do Emilio? – ela virou a blusa e me mostrou as iniciais E.E.

Pera ai. Quem teria a ideia de colocar iniciais numa blusa de uniforme? Ele está no maternal? Cara, que infantil, isso é coisa que as mãe fazem no terceiro período, pelo amor. Isso é inútil, e também acaba comigo agora.

– Ah... acho que sim – mordi a boca.

– E, o que ela está fazendo aqui? – me encarou.

– Ué, num sei...

– Sabe sim Julia. Me diga A-G-O-R-A. – respirou – o que o Emilio estava fazendo aqui dentro de casa só com você e sem camisa? – e então ela começou a me encarar. Não acredito nisso.

– É. Hum... num sei, pergunta pra ele?

– Não, você sabe – ela ficou nervosa.

– Mãe, já disse que não sei! – respondi.

– Sabe sim. Julia, eu quero a verdade, a verdade – ela me encarou, e desligou a água que escorria da torneira do tanque. Pois é, ficou preto.

– Mãe, eu não sei, pergunta pra ele. Porque eu fiquei a tarde inteira dormindo, no MEU QUARTO.

– Ah é? E ele também lavou suas roupas que eu encontrei dentro da máquina de lavar ontem? – To fudida. Porque minha mãe não pode ser lerda como sempre foi, agora? E, eu acabo de contar uma mentira. Tá, uma meia mentira, mas eu menti pra minha mãe, e ela acabou de descobrir e agora não sei o que falar, o que fazer, não sei se eu saio correndo, se eu grito, ou se eu me jogo no chão fingindo um desmaio.

Huum, nada mal. Não, não posso fazer isso, se for pra discutir agora tem que ser agora, porque minha mãe irada ninguém merece.

– Ainda estou esperando sua resposta... – ela disse, cruzando os braços.

– Mãe, olha, não é nada demais, eu vou te falar a verdade – não vou não. – foi assim... – respirei.

– Hun – ela resmungou, virando a cabeça um pouco pro lado, me encarando.

– Foi assim, eu estava lavando roupa ne, ai o Emilio chegou aqui e... – pausa pro meu pensamento meio lerdinho – ai ele me deu um susto, e eu joguei água nele. E ai, ele jogou água em mim. E ai eu joguei água nele de novo. E ele jogou água em mim de novo. E eu joguei de novo. E ele de novo. E eu joguei de novo. E ele jogou mais uma vez.

– Já entendi essa parte, continua – ela continuava me encarando.

– Tá bom... Ai depois de muitas jogadas de água, ele estava com a camisa toda molhada ne. Ai, ele tirou, e sem querer esqueceu aqui, foi isso – respirei fundo e dei um sorriso de orelha á orelha.

– Espero que não esteja mentindo pra mim – ela disse franzindo a testa. É, acho que ela pensou umas besteirinhas nisso, hum.

– Não estou – sorri de canto, e me virei. – vou pra cama mãe, minha cabeça está doendo, e acho que estou mais quente ainda, - terminei de me virar, e fui andando em direção á porta.

– Não entre debaixo das cobertas, ok? – ela sorriu.

– Tá mãe – gritei.

Fui até meu quarto, e fechei a porta. Me deitei na cama, e apaguei a luz. Me virei pro canto, e dormi, com um pouco de dificuldade, mas dormi.

You'll never get her, you'll never gonna get that girl (8)

Dei um pulo da cama. Peguei meu celular, e desliguei o despertador, tacando ele na poltrona como de costume. Minha cabeça estava estourando, eu estava suada, que nojo. Mas ainda continuava quente, resolvi chamar minha mãe.

– Mãe?! – percebi uma certa dificuldade ao falar. Minha voz saiu fina, quase escassa. Comecei a repetir, até a voz sair um pouco mais alta. Ninguém respondeu.

Me levantei da cama, e fui até minha escrivaninha. Havia um bilhete.