Olhei a porta na minha frente e quase pude sentir lágrimas nos olhos.

– É aqui. – falei abrindo a porta e entrando na sala tendo que me esforçar por um momento para não tropeçar em meus próprios pés.

A sala era pequena, com uma mesa velha abandonada em um canto e várias teias de aranha nas paredes, havia também várias caixas vazias, uma única janela no alto grande o suficiente para um homem do tamanho de Ross poder passar por ela, mas a janela estava em um ponto muito alto para que mesmo em cima da mesa eu não conseguisse alcançá-la, eu odiava minha baixa estatura.

– Vamos sair pela janela, eu sou baixinha demais para chegar nela e as caixas não aguentam meu peso se as colocar na mesa, é por isso que preciso de você para me ajudar. – murmurei indicando a janela.

Ross fechou a porta atrás de nós e passou o olhar vagamente pela sala antes de olhar a janela. Vi algo diferente brilhar em seus olhos azuis.

– Bem... - falou andando até a mesa que estava posicionada abaixo da janela quebrada – Parece que vai dar para sair.

Mordi o lábio nervosamente, agora estávamos aqui, perto da liberdade, senti a esperança renascer em mim, algo que eu realmente não me deixava ter a algum tempo, que foi desde a última vez que tentei escapar.

– Eu vou primeiro.

Meu coração parou, e tive que serrar os punhos para controlar o tremor em minhas mãos, mesmo que a lamina da faca estivesse quase cortando minha pele.

– Por que você vai primeiro? – perguntei deixando a desconfiança que sentia clara em minha voz.

Ele me lançou um olhar de desdém antes de falar, seus ombros erguidos, a arma ainda firme em suas mãos.

– Porque uma coisinha pequenininha como você poderia se machucar caso pulasse da janela de uma altura de quase três metros.

– E como eu vou conseguir sair se você não estiver aqui? – perguntei quase em pânico, minhas mãos tremendo ainda mais agora e minha respiração começando a ficar irregular.

Eu podia jurar que o vi revirar os olhos.

– Vou achar alguma lixeira alta o suficiente subir em cima dela e então vou puxar você. – falou ele com confiança já subindo em cima da mesa fazendo-a ranger sobre seu peso.

Senti meu sangue gelar. Ele iria me deixar aqui, ele simplesmente iria embora e me deixaria aqui, então Jerry voltaria e encontraria dois de seus homens mortos e outros dois machucados, então ele iria me bater pelo que eu fiz, assim como fez da ultima vez que tentei fugir, mas agora era ainda pior porque eu tinha deixado seu precioso refém fugir.

Vi Ross se pendurar na janela com agilidade. Senti meu medo crescer a cada parte dele que desaparecia pela janela, para longe da minha vista.

– Fizemos um trato, Ross, não esqueça que fizemos um maldito trato! – praticamente gritei para ele - Você não pode me deixar aqui. – murmurei essa ultima parte.

Sua única resposta foi um bufo antes de passar completamente pela janela, consegui ouvir o baque de quando ele caiu no chão do lado de for, o som de seus passos se afastando e logo mais não escutei nada.

Pisquei com força, pela primeira vez eu realmente estava com vontade de chorar, mas não iria me dar ao luxo de chorar, estava acabado, eu preferia morrer antes de deixar Jerry me pegar novamente.

Avancei até a mesa e me sentei nela sei me importar com a sujeita, senti o aço frio da minha faca suja de sangue contra minha pele. Fechei os olhos por um momento e então com um suspiro os abri novamente e olhei para o X que estava marcado na minha calça jeans gasta, para os piratas o X era o local no mapa onde estava escondido o tesouro, para mim o X indicava o local onde eu deveria enfiar a faca, o mesmo local onde eu atingi Bobby. Eu era corajosa o suficiente cortar minha própria garganta e muito menos de enfiar a faca na minha barriga ou cortar meus pulsos, não sabia o porquê, mas enfiar a faca na artéria parecia a solução mais fácil para mim, eu iria sangrar e morrer em poucos minutos, uma morte simples e sangrenta, e o melhor de tudo? Seria apenas um golpe.

Deus iria me perdoar por tirar minha própria vida?

Lara sempre me disse que Deus condenava aqueles que recusavam a benção da vida, aqueles que tiravam a própria vida, será que ele tinha perdoado a ela? Será que eu seria condenada ao inferno por isso? Ou o inferno já era o próprio mundo em que eu vivia?

Posicionei a ponta da faca no local encima do X e fechei os olhos, soltei o fôlego.

Pensei rapidamente em toda minha vida, em como eu era usada para passar formulas de drogas, pensei sobre Lara me ensinando a ler vários anos atrás, Lara me dando vários livros escondidos, livros que eu lia de noite, eu poderia lembrar de cada detalhe de Jerry me surrando por ter sido uma menina má, dele me forçando a ver cada uma das torturas que ele fazia com seus inimigos, lembro das vezes que tentei fugir, e lembro de todas as vezes que Jerry me dava aquele sorriso cruel e agradecia pelo meu serviço.

Eu não tive uma vida, meu mundo era aquele maldito galpão onde eu apenas saia quando Jerry precisava de mim e sempre acompanhada de quatro de seus homens, eles ficavam de tocaia, sempre por perto enquanto eu me encontrava com o informante e passava todas as informações que ele queria, fazendo tudo que me era ordenado. Jerry nunca confiou na tecnologia, não gostava de telefones ou e-mail, para ele tudo aquilo o iria deixar mais vulnerável, mas ele não via nenhum mal em câmeras de segurança. E agora eu iria me libertar de tudo isso, iria morrer, iria desistir.

Senti-me fraca e covarde, mas eu não tinha mais vontade de viver se fosse para continuar assim, nesse lugar. Não, isso não seria fraqueza ou covardia, Lara não tinha sido covarde ao se matar, ela tinha sido corajosa, tinha sido forte e aceitado que sua vida nunca mudaria, que o melhor seria a morte.

Agora era minha vez de ser corajosa.