Capítulo 23 - Ela é Minha!

– Duvido que você vá até aquela lojinha ali e seduza o atendente para ele lhe dar uma Arak. - Ruby disse sorrindo provocadoramente para mim.

Ela apontava na direção de uma loja de conveniência de um posto que parecia estar fechado, apenas a loja Frish Food, que tinha uma aparência até mais ou menos, embora não fosse um lugar que eu normalmente comeria, estava aberta.

Franzi as sobrancelhas.

– Por que eu tenho de arranjar bebida pra você?

– Não é questão de trazer bebida, só quero esfregar na cara de algumas pessoas que você não passa de uma mimada. Aposto que está com nojo de entrar lá.

– Eu não estou com nojo de entrar lá. - Semicerrei os olhos, quase disparando na direção da tal loja. Odiava quando as pessoas me desafiavam a algo dizendo que você não consegue fazer.

– Está sim, filhinha de papai.

– Acho melhor vocês duas pararem com isso. - Intrometeu-se Jason.

O ignorando, ergui as sobrancelhas e empinei o nariz em um gesto de superioridade para Ruby. Antes que eu pudesse pensar direito, comecei a caminhar em direção a loja.

Para variar, o frio de Londres castigava a minha pele seminua e para piorar, estava descalça.

Ouvi todos falarem coisas atrás de mim, mas continuei andando.

À medida que me aproximava, conseguia ver o que havia por trás das portas de e paredes de vidros. Um garoto que não mais que dezoito anos estava detrás de um balcão, os olhos fixos em um ponto que não era eu (Ainda bem). O avaliei bem antes de pensar em como eu conseguiria uma garrafa de Arak, estatura mediana, cabelo preto e raspado dos lados. Não era feio.

Estiquei meu braço para empurrar a porta de vidro, atraindo a atenção do garoto que arregalou os olhos quando me viu, me medindo da cabeça aos pés. Respirei fundo.

Eu realmente teria aberto a porta para falar com ele, juro que teria o feito se meu ombro não tivesse sido puxado bruscamente, fazendo-me tirar a mão da maçaneta prateada e comprida e girar parcialmente o corpo.

– Já ouviu falar em brincadeiras? Porque era isso que Ruby estava fazendo quando disse para você conseguir uma bebida. - Blake falou com a expressão carregada de raiva e outra coisa que eu não consegui distinguir.

– Ruby não estava brincando, ela me desafiou.

Blake revirou os olhos como sempre fazia quando nós conversávamos e eu falava alguma coisa considerada idiota pra ele, que era basicamente nove das dez palavras que eu dizia em uma frase.

Controlei-me para não olhar descaradamente seu corpo vestido apenas em uma cueca boxer preta.

– Você poderia estar sendo estuprada agora mesmo. - Fez um aceno - a boca torcida indicando que se encontrava irritado - com a cabeça para o garoto do balcão que ainda me encarava.

– Durmo todo dia na mesma casa que você e até hoje não fui estuprada, acho que depois disso estou imune a esse tipo de coisa.

Pela primeira vez em todo o nosso longo currículo de discussões, consegui fazer com que Blake ficasse calado com os olhos azuis faiscando enquanto me encarava diretamente.

Virei a cabeça para o outro lado, ficando corada de repente. Era uma droga estar apaixonada por ele.

Querendo quebrar o momento tenso, girei meu corpo totalmente para a porta de vidro, a abrindo rapidamente. Praticamente corri na direção onde tinha caixas e caixas de bebidas alcoólicas. Essas para minha sorte não estavam muito longe.

– Quanto custa? - perguntei escorando-me no balcão tentando ser o mais simpática que conseguia e não ter um ataque de nervos pela minha falta de roupas.

– Oito dólares.

De perto o garoto era bonitinho, mas nada que pudesse ser comparado a Blake. Falando nisso, onde ele tinha se metido?

– Puxa, - Fiz um biquinho com a boca tentando ser sexy, só tentando mesmo, realizar essa proeza era algo impossível para mim. - eu estou sem dinheiro aqui.

– Há outras formas de pagamento. - Olhou sugestivamente para mim.

Quando ele inclinou-se sobre o balcão arregalei os olhos afastando-me. Eu não posso fazer isso! Que tipo de puta eu sou para fazer algo assim? Eu não consigo.

– Hã...

– Você é muito gostosa. - disse as palavras lentamente enquanto dava a volta no balcão.

Engoli em seco dando dois passos para trás. Desesperada, virei a cabeça para onde meus amigos deveriam estar, mas não conseguia ver muita coisa lá fora.

O garoto ergueu a mão para segurar meu ombro, mas antes que pudesse fazer isso cambaleou para trás, a mão no lado direito do rosto por conta do soco que tinha acabado de levar e resmungou Quem é esse filho da mãe?.

O filho da mãe era Blake, sua boca era uma linha torta e suas sobrancelhas estavam franzidas, demonstrando sua irritação. Convenientemente aparecendo sempre que eu precisava.

Sem dar tempo para o balconista pensar direito, agarrou-o pelo colarinho.

– Não diga que ela é gostosa, porque ela é minha.

Prendi a respiração sem acreditar no que Blake tinha acabo de dizer.

– Cara, ela estava dando em cima de mim.

Blake empurrou o garoto em cima de uma pilha em pirâmide de enlatados que se encontrava próxima. Nem preciso dizer que fez uma baita barulheira.

Eu ainda estava parada, sem reação quando ouvi passos em um dos corredores da pequena loja. Olhei desesperada para Blake que também parecia ter ouço os passos.

– O que está acontecendo aqui? - Um policial saiu do corredor de doces segurando uma caixa de rosquinhas (Clichê) e ficou alternando os olhares entre nós três.

– Esse louco começou a bater em mim do nada. - disse o garoto levantando-se do amontoado de enlatados e ajeitando sua blusa.

– Espere... - O policial olhou de Blake para mim e refez o processo parando o olhar em mim. - Eu conheço vocês.

Oh meu Deus! Era o policial que tinha nos levado para a delegacia no dia em que eu fui andar de skate e quebrei o braço. Agora eu possuía uma ficha criminal graças a Blake e pelo jeito seria acrescentado nela atentado ao pudor e desordem pública.

E ainda por cima eu vestia apenas roupas íntimas!

– Você é o jovem que estava dirigindo sem carteira de motorista e você a namorada dele.

– Ele não é meu namorado!

– Sophie... Acho melhor nós darmos o fora daqui. - falou Blake começando a andar para a saída.

O segui sem tirar os olhos do policial que parecia ter se tocado que estávamos fugindo e começou a correr em nossa direção.

Saí em disparada porta a fora, avistando a uns quinze metros meus amigos, Ruby, Ethan e Jason.

– Corram! - gritei o mais alto que pude.

– O que? - gritou Dallas de volta.

– Voltem aqui seus delinquentes!

Olhei para trás vendo o policial correndo há uns cinco metros de mim, cada vez mais perto. Blake me ultrapassou e eu tentei correr mais rápido.

Finalmente percebendo o policial correndo atrás de nós, os outros também começaram a correr. Eu os seguia sem saber pra onde íamos. Correndo daquele jeito o meu frio passaria logo.

– Mas que porra vocês fizeram pra esse cara estar correndo atrás de nós? - Ethan falou enquanto corria.

– Olhe para como nós estamos vestidos e você irá saber a resposta. - Dallas respondeu diplomaticamente por mim e Blake.

Para o meu azar o oficial estava em boa forma, isso não pareceu ser problema para nenhum dos garotos nem Annie, apenas para mim e Ruby e eu ainda corria mais devagar que ela.

Quando tudo isso acabasse eu iria precisar urgentemente de uma massagem nos meus pés.

Arfei quase parando de correr, mas a vontade de manter minha ficha limpa ou quase limpa foi maior e aos tropeções continuei.

– Quando virarmos aquela esquina nós nos separamos, é o mais inteligente a se fazer. - falou Ethan e ninguém protestou.

Eu teria protestado se conseguisse falar sem bufar a cada palavra que dizia, não queria ficar sozinha no meio da rua e de sutiã e calcinha. Por isso, assim que viramos a esquina eu parei de correr.

Fui puxada bruscamente para um beco. Pega de surpresa, meus pés embolaram-se uns nos outros e eu fui em direção ao chão levando a pessoa que tinha me puxado junto comigo. O corpo de Blake imprensou o meu fazendo com que eu ficasse com dificuldades para respirar.

– Por que parou de correr? Você é estúpida? - Ralhou Blake, os  olhos expressando irritação e preocupação.

– Sai de cima de mim! - falei com um tom de voz alterado.

– Eu acabei de te salvar e é assim que você fala comigo? - Ergueu a sobrancelha.

– Nossa realmente, você me salvou somente para me matar com o seu peso de obeso. - falei segurando seus ombros na tentativa de tirá-lo de cima de mim.

– Fique quieta.

Estava com o rosto virado, tinha medo do que aconteceria se eu o encarasse, seus olhos sempre me deixavam destorneada.

– Você me trouxe para um beco fedorento e cheio de lixo. - Reclamei mais irritada comigo mesma por esperar que, aproveitando a situação em que nos encontrávamos, ele me beijasse.

– Sem as suas infantilidades agora, Sophie.

– SAI DE CIMA DE MIM, SEU ANIMAL - você está só de cueca e não estou aguentando ficar tão perto de você, completei mentalmente.

– CALA A BOCA, O POLICIAL VAI NOS OUVIR!

– EU NÃO SOU UM OBJETO DE POSSE SEU PRA SER SUA! - Desabafei uma coisa que eu queria ter dito desde que Blake havia falado que eu era dele para o balconista.

– O que? - Parou de gritar, parecendo verdadeiramente confuso.

– Na loja. - falei como se esclarecesse tudo. - Você disse que eu era sua.

– Eu não disse isso.

– Sim, você disse. - Senti alguma coisa dentro de mim afundar. Parecia até que eu queria chorar, o que era totalmente ridículo, eu não esperava mesmo que ele dissesse "Sim, eu falei aquilo porque eu quero que você seja minha."

– Não, eu não disse.

Pela primeira vez desde toda aquela situação, virei meu rosto para olhá-lo diretamente. Ele estava tão perto que tive a sensação de eu nossos narizes encostavam.

Blake franziu a testa me observando atentamente, talvez percebendo uma coisa que nem mesmo havia consigo.

– Quando sairmos daqui nós iremos direto para sua casa e você vai me dar um banho. - falei rapidamente, querendo mudar de assunto, desviar sua atenção.

Um lampejo de malícia passou pelo seu rosto e ele arqueou uma sobrancelha sugestivamente.

Corei percebendo a frase mal formulada que eu havia acabo de falar e cobri meu rosto com a mão, envergonhada.

– Não foi isso que eu quis dizer. - falei com a voz falhada. Não iria dizer mais nenhuma palavra, senão acabaria dizendo outra besteira.

Blake abriu a boca para falar algo, mas depois a fechou, optando por ficar calado.

Depois de um tempo Blake saiu de cima de mim o que foi um grande alívio. Aquele menino era muito pesado, apesar de não ser gordo, tudo que ele tinha eram músculos.

– Acho que já podemos ir.

– Onde será que estão os outros?

– Já devem estar voltando para nossa casa. - Comentou distraidamente enquanto olhava para os lados certificando-se de que era seguro sair daquele beco nojento.

Saímos de lá e seguimos o caminho em completo silêncio, eu apenas o seguia já que não fazia ideia em que lugar estávamos.

– Nunca mais faça isso de novo, ok? - disse Blake passando a mão na nuca, não parando de andar.

– O quê?

– Você sabe... Se eu não estivesse lá ele poderia ter te agarrado à força...

– Ah sim, o herói da história.

– Eu te salvei de quase ser estuprada, um obrigado seria bem vindo.

– Eu não pedi pra você dar um soco no garoto, você fez isso porque quis. - Isso era verdade, mas isso não quer dizer que eu não tenha gostado do seu gesto protetor.

– Valeu pelo aviso, da próxima vez deixo você ser estuprada e quem sabe morta. - falou irritado acelerando o passo e me deixando um pouco para trás.

Parece que esse menino vive numa TPM eterna.

Logo chegamos em casa, por sorte não tínhamos ido muito longe, pois estava me encolhendo de frio. Apenas Ruby e Jason não haviam chegado.

A primeira coisa que fiz depois de todos perguntarem se estávamos bem, o que tinha acontecido e essas coisas, foi vestir a roupa mais quente que tinha, descendo para a sala vendo que Ruby e Jason haviam chegado. Aparentemente eles tinham conseguido outra bebida porque a garrafa já era passada de mão em mão.

Apenas com muita insistência de Annie bebi um gole ou dois, e isso foi o suficiente para me fazer ficar um pouco tonta.

Todos estavam praticamente bêbados, até Dallas, mas o pior era Jason que jogava cantadas para Annie a todo instante. Acho que ele não se lembrava de como o soco dela pode ser dolorido. Dallas não estava gostando nem um pouco disso o que só fez aumentar minhas suspeitas de que algo estava acontecendo entre meus dois amigos.

Depois que a bebida acabou, eles decidiram que dormiriam aqui. Ótimo, agora minha casa virou pensão.

Ethan e Nate se acomodaram em um quarto enquanto Ruby implorava, faltando apenas ajoelhar no chão, para ficar no quarto de Blake, mas este recusou o que me deixou inexplicavelmente feliz. Ela ficou em outro quarto e Jason gentilmente se ofereceu para dividir o quarto com ela.

Ao ver que assim que Jason disse que dormiria no mesmo quarto que ela, Ruby parou de reclamar e pareceu felizinha até demais. O-F-E-R-E-C-I-D-A.

– Você não vai dormir no mesmo quarto que ela. - Blake falou com um tom de tédio.

– Mas eu não quero dormir sozinha - A oferecida disse manhosamente. - Me deixe dormir com vocês, então.

– Epa, epa orgia não. - Ethan, um dos mais bêbados ali, disse rindo logo em seguida.

Annie parecendo cansada (De fato, uma novidade) me puxou pelo pulso, nos levando para o meu quarto.

Dormir quando se está de porre é uma coisa muito, muito produtiva, mas claro, você tem que ter uma melhor amiga pra te acordar quando o que você mais quer é hibernar durante toda a semana.

– Me deixa dormir. - Resmunguei cobrindo minha cabeça com o cobertor, o que não foi muito útil já que Annie estava dormindo ao meu lado e ao invés de me sacudir, começou a cutucar minha barriga. - Ai, ai!

– O que acha de pregarmos uma peça nos meninos?

– Você só pode estar de brincadeira comigo. Sério que me acordou só pra isso?

– Larga de ser chata, vem. Vamos precisar de pasta de dente, marcador permanente, gel, cola e glitter.

A primeira vítima da insanidade de Annie foi Ruby. A garota ainda estava de calcinha e sutiã, o que contribuiu para o sorriso cruel no rosto de Annie, ela aproximou-se da cama escrevendo com a caneta permanente a palavra vadia soletrada em sua barriga, passou gel no seu cabelo deixando-o completamente bagunçado.

– Perfeito!

Fomos para o quarto de hóspede onde os garotos estavam, todos quase desmaiados. Em Ethan, que se encontrava deitado em cima do tapete, de barriga para cima, ela desenhou florzinhas por todo seu tórax finalizando com um pouco de glitter e no seu antebraço direito escreveu "Sou da mamãe", com a intenção de fazer parecer uma tatuagem.

Nate foi a próxima vítima, ficando com um ridículo bigode de gato e colocou pasta de dente no queixo fazendo uma barbicha, por fim contornou seus mamilos com pasta de dente. Na base das costas de Jason desenhou uma seta apontando pra baixo, - mais especificamente, apontando para sua bunda - e escreveu "Muito usada".

Não consegui conter o riso e Annie me acompanhou.

Dallas ficou com gel e glitter no cabelo e desenhos de pequenos corações no braço, fez um óculos em seu rosto com a caneta permanente.

– Pode deixar esse comigo - disse quando foi a vez de Blake, e Annie me deu um olhar encorajador do tipo "Essa é a minha garota".

Escrevi um grande "BICHA" em seu peito, passei cola por cima e joguei glitter. A pasta de dente foi parar em praticamente todo o rosto e não contente com isso, esfreguei um pouco no seu cabelo. Desenhei um arco-íris em seu braço e finalizei minha obra de arte com uma seta em sua barriga que apontava para baixo e dizia "Pequeno e mole".

Tudo bem que esse último foi Annie quem disse pra eu fazer, não teria coragem de pensar em algo tão vergonhoso assim.

Saímos rindo pensando na diversão que seria quando eles acordassem no outro dia. Depois disso pude finalmente ter algum descanso desabando em minha cama.