Mudança De Planos escrita por Clara Ferler


Capítulo 27
Não se pode mudar o passado, então viva o presente


Notas iniciais do capítulo

Agradeço a todos os cometários e recomendações, e eu vou mesmo postar a nova fic, mas assim que eu terminar essa. Bjs! Boa leitura.



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–Onde estamos indo? – Perguntei observando ela me puxar pelo braço para algum lugar pela rua. Ela se virou ficando de frente pra mim, e falou:

–Te mostrar... O que ainda não viu.

–Hein? Da pra ser mais específica, por favor? – Ela deu uma risadinha e se virou novamente pra mim.

–Eu pensei que em vez de ficarmos a toa na sua casa poderíamos nos divertir em algum lugar, quer dizer, aqui é São Paulo, você sabe que essa é uma das maiores cidades do mundo, não sabe?

–Hm... – Pensei. Nunca tinha parado pra reparar nisso. Tanto tempo se passou desde que cheguei aqui que minhas ações não passaram de casa, escola e televisão.

–Essa cidade não tem apenas o bairro do Limoeiro.

–Tudo bem, mas como você mesma disse, essa é uma cidade enorme, tem vários lugares pra visitar. Pra onde vamos?

–Sabe... Quando eu era... – Ela pensou na palavra certa pra dizer.

–Chata? – Ousei perguntar. – Arrogante? Exibida? Uma total e completa...

–Tá, tá, eu já entendi. – Me interrompeu tentando não ficar brava. – Quando eu era tudo isso que você falou – fez uma cara de deboche. – Eu costumava visitar vários lugares com Tony e o pessoal. Por isso achei bem legal te mostrar.

–Mas por quê? – Perguntei. – Não tem mais os seus amiguinhos pra vir passear com eles? – Conclui rindo, mas ela não riu, foi aí que eu me toquei que eu falei de mais. – Desculpa. – Disse á ela.

–Tudo bem. Eu não fiquei chateada.

–Então... Aonde vai me levar?

–Pra começar. Longe do bairro do Limoeiro. Você tem que sair daqui, até parece que mora no subúrbio. – Ela riu, eu aproveitei pra rir também. – Vem comigo!

Quando notei que estávamos indo para a garagem da casa dela, logo protestei:

–Não, não, eu não admito isso! – Ela se virou pra me encarar. – Não é só porque está me guiando neste momento que você vai dirigir. Eu me ofereço pra dirigir, ok? – E a puxei de volta pra minha casa pra pegarmos o meu carro.

–Não isso não é justo! Eu quero dirigir. – Ignorei e continuei o caminho a levando comigo.

–Você é louca, vai nos matar dirigindo. – Brinquei. Ela riu também.

–Tá bom, mas é só dessa vez! – Disse ela.

Quando entramos no carro Miata vermelho, pensei o quanto eu não o uso, fale sério, eu acho que não uso ele faz séculos, a última vez que o percebi foi quando o colocaram junto com a mudança quando viemos pra cá, mas fiquei orgulhoso de ter ele.

–Esse é o seu carro? – Mônica me perguntou.

–É.

–Nada mal. – Respondeu impressionada.

–Valeu. – Me fiz de metido. Abri a porta pra ela entrar e depois a fechei quando ela se sentou no banco ao meu lado. Fiz o mesmo gesto e liguei o motor. Abri a porta da garagem e comecei a dirigir devagar pra ela ter tempo de me falar aonde íamos. Ela foi me guiando, me dizendo aonde virar, até que segui em uma rua reta, o vento batia no meu rosto, podia sentir o cheiro bom do ar livre entrando em minhas narinas, e via os grafites coloridos nas paredes da rua, era tudo tão maravilhoso, como eu pude deixar de aproveitar tudo aquilo?

–Está com fome? – Ela me perguntou.

–Você tá brincando? – ironizei – São dez da manhã e ainda não tomei meu café da manhã. É claro que estou com fome.

–Que bom. – Ela disse sorrindo.

Finalmente chegamos ao nosso destino. Mônica me pediu pra estacionar em um lugar perto dali, eu fiz como ela mandou.

–É aqui? – Perguntei.

–Sim. – Ela me guiou até o outro lado da rua onde parei pra apreciar aquela estrutura enorme. – Você nunca veio aqui?

–Nunca – Dei de ombros.

–Pois devia.

–Que lugar é esse?

–É o mercado municipal da cidade. Aqui tem de tudo. – Ela olhou pra mim. – Inclusive comida.

–Isso! – Comemorei alegre. Mônica começou a rir enquanto eu dançava ali na calçada.

–Para com isso seu doido. – Me agarrou me fazendo parar de dançar. – Hahaha. – Eu observei ela rir, o jeito como os dentinhos da frente apareciam junto com as covinhas, tudo a deixava linda. Ela levantou o rosto, droga ela tinha me pego no flagra olhando pra ela.

–O que foi? – Perguntou agora não rindo mais.

–Hm... Nada. Agente pode comer logo, eu estou com fome. – Disfarcei.

–Tá bom. – Eu a segui subindo as três escadas que havia ali antes de entrar naquele maravilhoso salão. Tudo era tão incomum, as paredes e o teto pareciam estruturas de um palácio, aquilo era bem antigo, mas ainda assim tão bonito. Tinha frutas e restaurantes por toda a parte.

–Gostou?

–É incrível! – Falei.

–Quem construiu fez isso há muito tempo, por isso as estruturas deste porte, mas são muito bonitas, hoje em dia não se vê coisas como essa. – Me explicou. Eu olhei pra ela e ela prosseguiu. – Sua mãe nunca pensou em te trazer pra conhecer esses lugares quando chegaram aqui em São Paulo?

–Não. – Pensei em dizer mais alguma coisa além daquela simples resposta, mas a verdade é que não sabia o que dizer. Ela resolveu não insistir. Andamos mais um pouco, eu observei tudo em minha volta, como era lindo.

–Ei Mônica! – Uma voz a chamou. Nós nos viramos e vimos Magali sentada junto com Quim em um lugar onde vendia petiscos do mar, ela mesma estava com quatro espetos de camarão na mão, enquanto Quim conversava com o vendedor.

–O que ela tá fazendo aqui? – Perguntei pra Mônica.

–E por que a surpresa? – Ela disse indo em direção á ela sendo seguida por mim.

–Cebola? O que faz aqui? – Magali perguntou quando nos aproximamos.

–Ele veio comigo. – Mônica respondeu.

–A tá... Mas vocês não estavam sem se falar?

–Estávamos, mas hoje decidimos fazer algo diferente, nós só estamos andando e curtindo um pouco. – Ela respondeu sem graça, ignorando a cara de confusa da Magali.

–Tudo bem então.

–Oi. E aí Cebola! – Cumprimentou Quim assim que parou de falar com o vendedor.

–Oi. – Respondi. Nisso, o celular de Quim tocou.

–Alô? – Uma voz irreconhecível zuniu no telefone. – Hm... Não. É eu estou com a Magali sim, por quê? Eu faço o que eu quiser e você não manda em mim, eu não sou mais a pessoa de antes ok? Eu não tenho mais que seguir as suas ordens, eu ainda sou seu amigo, mas não é por isso que tenho que ser tratado como seu escravo. – Novamente aquela voz irreconhecível – Agente se fala depois, tudo bem? Tchau. – Ele desligou o telefone e olhou pra Mônica. Magali logo tomou a frente e perguntou.

–Quem era?

–Era o Tony. – Droga, aquele nome que eu tinha tentado tirar da minha cabeça voltou à tona novamente.

–O que ele queria?

–O que você acha? Mandar em mim! Eu disse pra ele que não me virei contra ele quando você decidiu apoiar a Mônica por causa daquele lance com a Carmem, e eu ia dizer que continuava a ser amigo dele mesmo não andando mais com ele, e que eu mudei, não sou mais aquele cara que seguia todas as ordens dele e que ele não podia fazer nada pra mudar isso. Mas ele... Ele não fez nada do que eu pensei que faria – Eu e Mônica nos interessamos. – Ele disse que entendia e que também tinha mudado, ele disse que mudou por você Mônica – Mônica ficou com os olhos esbugalhados, e eu passei a prestar ainda mais atenção. – Sabe, faz um tempo que ele anda me falando que agora quer ser seu amigo e está arrependido de tudo o que fez por isso ele quer te compensar.

–É eu sei, ele já me compensou, vai fazer uma festa junto comigo. – Quim entortou o nariz.

–Eu não acho que seja apenas uma festa que ele esteja planejando... Você convidou aquele cara novo na escola pra sua festa?

–Hm... Não, o Tony ficou encarregado dos convites, mas acho que sim, por quê?

–E você sabe por acaso quem ele é?

–Bem... Ah, é mesmo, ele disse que se chama Fernando.

–Eu não sei, tem algo nele um pouco suspeito.

–Por que você acha isso? – Ela perguntou.

–Eu sei lá, só acho que o Tony está metido nisso. Se servir de conselho, fique de olho! – Ele alertou.

–Tudo bem. – Mônica falou ainda tentando entender aquilo tudo.

Nós nos despedimos deles e seguimos nossos caminhos. Subimos algumas escadas e dei de cara com um restaurante, ventiladores que soltavam ar umidificado e várias pessoas naquelas mesas sentadas comendo comida chique, o cheiro era tão bom que fez meu estomago roncar. Mônica e eu nos sentamos em uma mesa próxima ao balcão, onde havia vários garçons preparando algo maravilhoso por ali, sente na cadeira em frente a de Mônica enquanto um garçom bem humorado se aproximava para nos atender.

–O que desejam? – ele perguntou estendendo os cardápios sobre a mesa.

–Cebola o que vai querer? – Me perguntou Mônica. Passei os olhos pelo cardápio.

– O que você me sugere? – Resolvi perguntar á ela. Ela deu uma risadinha e apontou o pedido pra mim no cardápio. – Certo então, vou querer esse.

–Eu quero o mesmo. – Disse ela ao garçom.

–Tudo bem então. Já trago os pedidos. – Quando o garçom saiu, Mônica se preparou pra dizer.

–Então, o que está achando?

–Pra ser sincero, eu achei que você iria me levar para um lugar chique onde me impressionaria com o tanto de dinheiro que tem na carteira. – Ri junto com ela assim que ela revirou os olhos e olhou pra mim, esperando que eu continuasse. –Mas devo dizer que fiquei contente quando me trouxe a um lugar comum, mas ao mesmo tempo divertido e prazeroso. Aqui é tipo uma lanchonete, não é?

–É sim, fico feliz que esteja gostando.

–Tá, mas vem cá, você não avisou seus pais que viria pra cá, só eu avisei minha mãe. Eles não ficam preocupados com você?

–Ficam – Ela respondeu rápido de mais, rápido de mais pra ser verdade. – Eles... Eles ficam muito preocupados comigo, é que hoje meu pai vai trabalhar até tarde, mas minha mãe, quando voltar do mercado vai ligar pra ver se eu estou bem. – Ela disse, e logo desviou o olhar do meu. Fiquei em silêncio tentando adivinhar o que ela queria dizer com aquilo e me perguntando se eu deveria perguntar algo sobre o assunto, mas cheguei a conclusão de que não seria o melhor a se fazer naquele momento.

–Seus pedidos! – Falou o garçom se aproximando e colocando os pedidos na mesa. Logo que ele saiu Mônica falou:

–Lanches. Super original! – Exclamou ironicamente, rindo junto comigo. Eu devorei o meu X-salada rapidinho enquanto Mônica demorava um século pra engolir de uma vez aquele X-Burger. Por que as mulheres tem essa mania de comer com calma?

–Hahahaha... – Mônica começou a rir quando terminei de comer meu lanche.

–O que foi? – Perguntei.

–Sua boca está suja. Clássico! Ha ha. – Tudo bem, agora sim eu entendi por que as mulheres tem a mania de comer com calma.

Ela tirou o guardanapo do suporte de prata que estava sobre a mesa e começou a limpar lentamente o canto esquerdo da minha boa. Enquanto ela estava próxima de mim, ela olhava profundamente em meus olhos sem conseguir desvia-los. Eu sabia que a sujeira já tinha saído, mas não queria que aquilo acabasse. Vendo a situação, ela se afastou rapidamente de mim e voltou a se sentar em seu lugar como se nada tivesse acontecido, embora suas bochechas vermelhas a denunciassem. Observei ela terminar de comer, cortando e mastigando lentamente o seu lanche, é só pra ter noção do quanto aquilo demorou. Quando ela terminou eu chamei o garçom e ele trouxe a conta, antes que eu pudesse fazer quase nada ela foi tirando a carteira do bolso da calça jeans.

–Ei, nem pensar! Eu pago. – Protestei.

–O que? Não precisa.

–Olhe, eu sei que no seu mundo de garota riquinha você tem condição de pagar tudo e é normal pra você comprar e pagar tudo o que tem vontade, mas no MEU mundo, o mundo de gente que tem que suar pra conseguir o que quer, os caras gostam de pagar pras garotas quando saem com elas. – Eu disse pagando o garçom, ele agradeceu e se retirou.

–Obrigada, mas não precisava ter feito isso. – Ela falou pra mim.

–Eu sei, mas eu quis. – Conclui olhando nos olhos dela, com um sorriso de canto.

Andamos para a saída do mercado e desta vez não fomos vistos por Magali que ainda estava comendo (novidade). Quando saímos do local, eu pude sentir o cheiro do ar puro outra vez e o vento estava forte, bem fresco.

–O que vamos fazer agora? – Perguntei.

–Eu não sei. Podemos só andar e conversar por enquanto.

–Legal. – Disse começando a andar junto com ela. – E sobre o que quer conversar?

–Sei lá, que tal me contar sobre a sua antiga vida no Rio de Janeiro? – Perguntou sorrindo e interessada.

–Não tem muita coisa pra contar.

–Ah, qual é, dizem que Rio de Janeiro é lindo, como não tem muita coisa pra contar? – Eu me estressei, não queria contar da vida antiga onde tudo deu errado pra mim, mas sabia que ela não me deixaria em paz se não contasse para ela, então eu resolvi falar tudo de uma vez, bem rápido, rápido mesmo, então eu disparei:

–Eu era um nerd, não tinha amigos, sonhava com uma garota que nem me notava, e tinha uma garota que ficava no meu pé o tempo inteiro, eu odiava a escola por que eu era um rejeitado e meu pai morreu! – Fui bem rápido e direto, falei tagarelando tudo. Andei rápido á frente deixando Mônica pra trás.

–Cebola! – A ouvi dizer lá de traz, ela caminhou até mim e disse. – Eu não sabia. Me desculpe.

–Tudo bem. Eu é que tenho que pedir desculpas, é que não gosto de falar sobre minha vida no Rio de Janeiro, era um pesadelo. Será que podemos falar de outra coisa?

–Claro. – Ela sorriu tentando me convencer de que não estava incomodada, e sua expressão era realmente sincera, apesar de sem querer, esboçar curiosidade.

Andamos e conversamos sobre várias coisas, era legal saber que podia conversar livremente com ela, além de linda também era uma ótima companhia, eu não diria isso dela antes, mas agora eu vejo que ela realmente é uma pessoa diferente. Meu telefone tocou, era minha mãe dizendo se eu ia demorar pra voltar pra casa, eu simplesmente a ignorei e fui direto, disse que ia demorar um pouco e que podia voltar só de noite, depois desliguei. Mônica ficou me olhando e resolvi dizer:

–Calma, sua mãe também deve estar preocupada, logo ela vai ligar. – Ela sorriu, acho que tinha adivinhado o que ela estava pensando, mas parecia ainda ter mais alguma coisa por trás disso. Conversamos ainda mais sobre os assuntos da TV, da internet, escola e amigos, também falamos um pouco sobre Cascão, Mônica disse que estava com saudades dele e que ele era um ótimo amigo, “amigo” essa palavra que ficou martelando na minha cabeça e que me tranquilizou, todas as vezes que eu suspeitei que Cascão pudesse ter alguma coisa com a Mônica, desta vez eu tirei todas as minhas dúvidas, não havia nada. Quando já eram quatro horas da tarde, nós paramos de andar e fomos para uma lanchonete, nos sentamos e pedimos sucos pra bebermos, nem sei como aguentei tanto tempo andando pela cidade, eu e ela estávamos sem fôlego de tanto caminhar. Quando os sucos chegaram bebemos rapidamente e paramos pra rir de nós mesmos.

–Mas e aí... Por que se importa tanto com a atenção da sua mãe? – Eu perguntei.

–Não é isso. Ela sempre está trabalhando, nunca tem tempo pra mim.

–Eu já sei. Mas, agora ela parece estar te dando mais atenção, não é?

–É ela estava, mas ultimamente ela anda saindo de casa misteriosamente sem dizer aonde vai, quer dizer, ela diz, mas não acho que seja verdade, ela não está mais sendo tão atenciosa quanto eu achei que estava sendo.

–Relaxe, logo ela volta a te dar atenção.

–Talvez, mas foi assim minha vida toda, eles sempre trabalham, sempre viajam, sempre chegam tarde em casa e sempre não me dão atenção. Ás vezes eu me sinto que nem você falou pra mim outro dia. Como se eu fosse só mais um problema que ninguém tem tempo de resolver. – Ela desabafou.

–Ei, não é nada disso. Por que alguém te consideraria um problema? Você é a pessoa mais legal que eu já conheci. – Falei.

–Sério? – Ela perguntou olhando em meus olhos.

–Sério. – Confirmei. – Talvez você devesse falar com eles.

–Eu já tentei.

–E... – Fiz um gesto pra que ela prosseguisse.

–Bem... Minha mãe e meu pai acharam que eu estava agindo feito uma mimada, só minha mãe me escutou depois disso, mas acho que foi só porque viu que eu estava carente. Acho que eles ainda pensam que eu sou aquela garota mimada e irresponsável que eu era antes.

–E você não é mais? – Ousei perguntar.

–Não. – Sorri ao ouvir a resposta.

–E quando foi que isso mudou? – indaguei.

–Olha, eu posso te garantir que foi depois que você chegou. – Nós dois rimos e papeamos o resto da tarde. Quando eu olhei no relógio preso no meu pulso eu vi que já eram sete da noite.

–Já está tarde. – Falei. Mônica abaixou a cabeça. – Tudo bem. Sua mãe se preocupa com você do mesmo jeito, vai ver ela teve um problema e se atrasou.

–Valeu Cebola, mas acho que não foi nada disso.

–Por que você não liga pra ela?

–Hm... Não, eu ainda tenho que te mostrar um último lugar antes da gente ir embora.

–Que lugar? – Perguntei.

–Vem, eu vou te mostrar.

Andamos algumas quadras até chegarmos ao meu carro outra vez, dirigi conforme ela ia me dizendo aonde ir. Paramos em frente a um lugar chique, um restaurante, nas portas de vidro estava escrito “Café Girondino” entramos e quando eu vi, estava lotado de gente, havia mesas por todo o local e uma escada bem em frente à porta de entrada. Mônica foi até o balcão de madeira marrom onde o atendente estava e sussurrou algo pra ele, ele confirmou e ela acenou com a cabeça indicando pra mim a segui-la. Subimos as escadas, paramos no segundo andar onde tinha apenas três casais, Mônica se direcionou para o moço que estava ao balcão daquele andar, e falou á ele:

–Mesa 24!

–Sim, no terceiro andar. – Ele respondeu.

–Obrigada. – Agradeceu ela.

Subimos mais um andar e nos sentamos em uma mesa com uma toalha branca de seda, a claridade estava baixa, um tanto escuro no local, as únicas coisas que iluminavam ali era a pouca quantidade de luz na energia e o lustre bem no centro da sala.

–Por que me trouxe aqui? – Perguntei.

–São sete horas, vamos jantar. E desta vez eu pago. Sem protestos, por favor. – Falou ela vendo o cardápio. Não insisti e apenas vi o cardápio.

–Eu vou querer camarão. – disse ela.

–Hm... Então eu também. – Respondi. – Garçom! – Chamei.

–Sim? – Disse ele assim que chegou.

–Queremos dois pratos de camarão, com arroz e salada. – Respondeu Mônica.

–E pra beber? – Assim que ele perguntou a nós, eu me senti sem resposta, estava com vontade de beber bebida alcóolica, mas não ia interferir no pedido de Mônica.

–Hm... Vinho? – Ela me perguntou.

–Claro!

–Tudo bem, eu já trago. – E o garçom se despediu. O silencio tomou conta, o que me incomodou um pouco.

–Sabe... Quando você me perguntou sobre minha vida no Rio De Janeiro?

–O que tem? – Indagou.

–Eu não queria dizer por que é um pouco triste, mas não significa que eu não queira conversar.

–Tudo bem, eu entendo. Mas se quiser me contar...

Fiquei em silêncio, sem saber o que dizer, e antes que eu pudesse abrir a boca pra falar, ela diz:

–O que eu não entendo, é por que não valoriza a mãe que tem.

–O que? – Perguntei confuso com o que ela havia dito.

–Sei lá. Você pode ter perdido o pai, o que eu entendo que deve ser bem difícil, mas não é por isso que não tem que dar valor ou atenção pra sua mãe.

–Eu não ignoro minha mãe! – Falei.

–Sim, ignora sim. Quando eu fui à sua casa, mal me apresentou pra ela, mal disse oi ou bom dia. Você atende super mal as ligações que ela faz á você, eu vi, você age como se tivesse obrigação de atura-la.

–Não é verdade! – Me estressei.

–Talvez seja. Já parou pra pensar?

–Eu não quero falar sobre isso. – A cortei.

–Tudo bem, mas foi você quem começou a falar... Eu só acho que sinto tanto a falta dos meus pais, mas minha mãe é a que mais me ignora, e por um tempo achei que era por que ela queria mesmo, só agora que fui descobrir que ela fazia o máximo pra ficar comigo, mas não tinha tempo e isso me fez ficar com raiva dela, por que eu queria que ela dedicasse mais o seu tempo pra mim e não ao trabalho. E se eu pudesse ter minha mãe na hora que eu quisesse, tiver ela falando como foi o meu dia, como eu estou, assim como sua mãe faz com você, eu daria valor a isso. Mas você não Da. Quando me falou que acha que sua mãe te trata como se fosse um problema, eu pensei que era assim como meus pais me tratam, mas não é nada disso, ela se importa com você Cebola. Ela se importa, e talvez ela passou a se importar mais depois da morte de seu pai e...

–Chega! – Eu a interrompi com firmeza na voz. – Eu não quero falar sobre isso!

–Mas talvez devesse pensar sobre isso! – Ela disse.

–Mas eu não quero tudo bem? Tudo estava bem antes do meu pai morrer... Eu estava contente coma minha vida chata de sempre, faltava só mais um ano de ensino médio pra eu ir pra faculdade até que tudo ficou bem pior... Meu pai, o meu melhor amigo morreu, minha mãe não teve dinheiro suficiente pra bancar cuidar de dois filhos sozinha, então nós viemos pra cá a procura de emprego melhor, felizmente ela conseguiu, mas eu ainda não vejo motivo pra tudo isso ter acontecido. Dizem que Deus sempre tem um motivo pra fazer com que as coisas aconteçam, mas eu não vejo motivo pra tudo ter acontecido do jeito que aconteceu. Eu não vejo motivo pra ele ter morrido. – Apertei os lábios e fechei os olhos tentando fazer as lágrimas não saírem.

–Tá tudo bem. – Disse Mônica com a voz de calma e paciência.

–Eu sinto tanta a falta dele. – sussurrei. Ela ficou me olhando em consolo, quando em fim diz:

–Outro dia você disse que eu não sei como é perder alguém que ama... E você pode até ter razão Cebola, eu realmente não sei como é perder alguém que amo... – Ela olhou pra mim hesitante – Mas eu sei como é sentir falta... E eu também sei como é lidar com alguém que sente falta de um parente querido que já partiu. – Levantei a cabeça e olhei nos olhos dela.

–O que quer dizer? – Perguntei.

–Cebola... Lembra quando me perguntou por que eu deixei o Tony fazer a festa junto comigo?

–O que tem? – Quis saber.

–E lembra quando disse que senti pena, mas ainda assim sinceridade?

–Sim.

–Eu senti pena, por que... Quando eu e Tony começamos a namorar – Belo jeito de começar uma frase, pensei. – eu lembrei que na época ele não era tão metido e impaciente quanto é hoje, pois... Quando nós saímos pela primeira vez, ele me disse... Ele me disse que a mãe o deixou quando tinha apenas cinco anos de idade Cebola. – Eu olhei pra ela, com um olhar atencioso no qual escondia sua surpresa. – Por isso, ele era como eu já fui um dia, uma pessoa que estava sofrendo e que escondeu as mágoas através da crueldade. A maioria das pessoas da nossa idade acontece isso, sofrem por algo e não querem que ninguém tenha pena da situação, por isso tentam parecer superiores para que as pessoas se afastem. Você é uma dessas pessoas que estão sofrendo, exceto que você sempre foi você mesmo, e era essa pessoa que eu precisava em minha vida neste momento, uma pessoa que apesar de tudo não muda sua personalidade por nada, mas Cebola... Não quer dizer que tenha que sofrer em silêncio – concluiu pegando em minha mão esquerda em frente à dela e a acariciando.

–Os seus pedidos! – Falou o garçom se aproximando e colocando as comidas em nossa frente. Tentamos disfarçar o clima e comemos sem dizer uma palavra. Enquanto eu comia fiquei pensando em tudo o que ela me disse, e como tudo fazia sentido, além de tudo ela tinha me falado que eu a ajudei a superar as crises em sua vida, isso me deixou contente. Quando terminamos, Mônica pagou a conta e fomos em direção a porta, abri e assim que saímos ficamos nos olhando sem saber o que dizer, talvez não tivesse nada pra dizer, então... Fui me aproximando dela, segurei o seu queixo com minha mão direita fazendo ela me encarar, com a outra mão livre eu a puxei pra mais perto pela cintura e aproximei meus lábios dos dela, quando senti gotas e mais gotas pingando em mim e nela, uma chuvarada forte apareceu do nada, eu a larguei pegando em seu braço e a puxando pra que saíssemos daquela chuva enquanto nós dois dávamos risadinhas. Parei junto com ela embaixo de uma porta de loja onde podíamos nos proteger da chuva, começamos a rir, até que eu calei nossos risos quando eu me aproximei dela, a prensando contra a parede, afundando meu rosto em seus cabelos e beijando seu pescoço, e finalmente chegando a seus lábios, macios e levemente úmidos, eu a beijei fortemente e urgente como se a cada segundo fosse tarde de mais. Minha língua pediu passagem e ela concedeu, pude sentir o calor percorrer o meu corpo inteiro quando ela passou as mãos pelo meu peito até o meu pescoço, sabia que se não parasse agora, não pararia nunca, por isso me afastei observando ela com os olhos ainda fechados querendo sentir meus lábios novamente.

–Me desculpe. – Ela falou. Não entendi o motivo no pedido.

–Desculpe? Não tem por que se desculpar, foi sincera em tudo o que disse e, além disso, fui eu que a beijei. – Sorri ainda agarrado com ela. Ela tirou uma das mãos de meu pescoço e colocou-a em meu queixo fazendo meu rosto se aproximar, tocando meus lábios com os dela, desta vez o beijo foi mais rápido e mais selvagem, como se quisesse, assim como eu, ficar ali pra sempre. Ela afastou seus lábios dos meus e sussurrou:

–Não foi por isso que pedi desculpas.

–Foi pelo que então? – Perguntei.

–Por ter me afastado de você... Quando na verdade, pensei que morreria se ficasse longe. – Meu coração acelerou assim que ela terminou a frase. Ela sentia o mesmo que eu.

–Acho melhor agente ir. – Resolvi dizer ainda sussurrando.

–Concordo. – Seguimos em direção ao carro onde eu dirigi até chegarmos em frente da casa dela.

–Boa noite. – Ela falou.

–Boa noite.

–Agente se vê amanhã! – Disse.

–Tudo bem. – Concordei. Me aproximei novamente, me levantando do banco do motorista pra lhe dar outro beijo, onde desta vez me impulsionei tanto que a deitei no banco ao lado, ela abriu a porta pra sair, ainda com nossos sorrisos e salivas se misturando, quando tive que a deixar ir. Observei ela entrar em casa, deixei o carro na garagem da minha casa e abri a porta, a Maria provavelmente já foi dormir e minha mãe estava na cozinha preparando o jantar. Quando ela me viu abriu um sorriso contente por me ver, mas sabendo que era inútil por que eu não iria lhe dar a menor atenção.

–Oi filho. Tudo bem? Chegou tarde. – Neste momento ela não teve tempo pra dizer mais nada, pois eu corri em sua direção tão rapidamente que até a assustou. Dei lhe um abraço mais forte que podia a fazendo me abraçar também, mas ela ainda não estava entendendo o motivo.

–Querido. O que houve?

–Nada. Eu já disse que te amo? – Ela sorriu. – Eu te amo, eu te amo, eu te amo. Me desculpe por ter sido um idiota e estupido com você desde que chegamos aqui.

–O que? Não!

–Fui sim mãe, me desculpe por tudo, eu sei como foi difícil pra você encarar a mudança e eu não facilitei nada. Por favor, me perdoa. – Continuei abraçando ela.

–Tudo bem.

Neste momento eu soube, e realmente entendi o que Mônica queria dizer. Eu não devia lamentar pelo que eu perdi, e sim agradecer pelo que eu ainda tinha!


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Notas finais do capítulo

espero que tenham gostado, ficou um pouco grande, mas acho que ficou bom! Beijos. Comentem!