Decline escrita por Yumi Saito


Capítulo 34
XXIX — Ignorância.


Notas iniciais do capítulo

Capítulo editado. [02/07/2014]



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P.O.V JANE SLANDER.

Era uma manhã de sábado.

Eu estava toda encasacada. Embora fizesse um sol de rachar, o frio ainda predominava. Na verdade era o vento que deixava frio, mas o céu estava limpo, sem nuvens e totalmente azul. Um bom cenário para Castiel sair do hospital.

Parece aquelas coisas de filme. Só falta ele dizer: "Oh! A vida sorriu pra mim" Aí ele vai sorrir ainda mais com o tapa na cara que eu vou dar nele. Castiel é rabugento, acho que nunca diria isso. É apenas a minha animação para visitá-lo logo. Depois de tantos meses... extremamente estranhos.

Cheguei um pouco atrasada, mas nada de tão preocupante. Atravessei o corredor e entrei no quarto. Como eu já previa, Lysandre estava lá, junto de Íris. Estavam sussurrando alguma coisa, mas logo pararam quando me viram.

Ajeitei meus cabelos e suspirei fundo. Entrei no quarto e fechei a porta.

— Hey — falei. — O médico já passou pra dar alta?

— Ainda não — Íris respondeu. — Eu acho que ainda é cedo e a gente se precipitou. Não é nem dez horas da manhã... E você sabe, alguns médicos sempre demoram.

Assenti positivamente.

— Ah, eu e Íris estávamos falando — Lysandre disse. Faz tempo que eu não escuto a voz dele. Chega a ser estranho. — Iremos deixar a festa pra amanhã. Não dá pra sair de um hospital e já ir pra a farra.

— Certamente — concordei.

— E... — Lysandre continuou. — Castiel terá que usar muletas. Ele feriu demais a perna, e ela não está 100% como era antes. Quando ele acordar e ficar sabendo disso, vai ficar puto.

Eu abri a boca, surpresa.

— Puto é apelido — disse. — Castiel vai querer queimar o médico.

Íris e Lysandre assentiram positivamente juntos.

A partir daí, ficamos em silêncio. Acho que nossos pensamentos estavam interligados em como Castiel iria reagir ao saber que não poderia andar normalmente por um tempo. Pelo menos não foi definitivamente, o que é uma notícia boa e ele tem que agradecer o cirurgião.

Lysandre se sentou na poltrona. Íris sentou-se na cama de Castiel — que ele não estava — e eu me escorei na parede. O quarto estava escuro, e o que nos restava era fechar os olhos e esperar.

Esperar dez minutos.

Vinte minutos.

Meia hora.

A porta se abriu. Um clarão de fora iluminou metade do quarto. Revelou um médico e um cara sentado em uma cadeira de rodas. Aquele cara era Castiel. Estava com a aparência cansada e visivelmente irritado.

Meu coração acelerou.

Desencostei-me da parede e o encarei, até que olhasse para mim e...

Sorrisse.

* * *

O salão inteiro estava escuro. As decorações estavam perfeitamente arrumadas. E tudo o que pode se ter em uma festa também. Todos estavam sentados em suas cadeiras, fazendo o mínimo de barulho possível.

Eu estava em uma mesa onde sentava Armin, Alexy, Íris e Lysandre. Alexy tinha bicho na bunda, porque reclamava da demora de Castiel toda hora. Armin comia os salgadinhos da mesa porque não podia iluminar o salão com a tela do seu PSP. Lysandre estava quieto e Íris também, mas ansiosa.

Então ele chegou.

As luzes foram ligadas, e um monte de papeis coloridos picotados caíram do teto.

— Surpresa! — todo mundo gritou, formando uma única voz.

Ele abriu a boca, surpreso. Eu conseguia ver que seus lábios tentavam formar alguma palavra, mas apenas tremiam. Era engraçado, mas ao mesmo tempo bonito. Castiel nunca foi aquele cara que recebeu atenção dos pais... Então, eu imagino que isso pode lhe cair muito bem.

Ele olhou para os braços, que se apoiavam na muleta.

Suspirou pesadamente, eu percebi. Caminhou até Leigh, que alcançou-lhe um microfone. Mas vendo o estado do ruivo, colocou o microfone em um apoio, para que ele não precisasse pegar na mão.

— Oi... — falou, e todos lhe responderam a mesma coisa. — Realmente, não parece que se passaram três meses, mas... sei lá, dois dias. Eu... — ele parou e riu, olhando pra baixo. — Fico muito agradecido por isso. É bom você sair de um hospital e ser recebido com isso, quando pensa que é um aleijado inútil.

Ele fungou, voltando a olhar pra cima.

— Valeu mesmo, pessoal.

Dito isso, saiu de perto do microfone e caminhou até a nossa mesa.

Primeira reação humana: reclusão.

Apenas nos lançou um sorriso — falso — e se sentou na mesa. Deixou as muletas ao lado da cadeira e olhou para todo mundo, menos pra a gente.

Segunda reação humana: vergonha e medo de não ser aceito por não conseguir andar direito.

Uma música começou a tocar. Todo mundo se levantou e começou a dançar. Eu fiquei na mesa junto de Armin e Castiel. O ruivo continuava em silêncio, parecia estar com os pensamentos distantes e... Eu acho que me enganei, ele não estava gostando da festa.

Íris ficaria decepcionada ao saber disso. Mas não vou falar nada, quero que ela pense que foi o máximo. Não quero simplesmente esfregar na cara dela que o esforço foi uma perda de tempo.

— Castiel...? — o chamei.

Ele crispou os olhos e ergueu as sobrancelhas. Lentamente, girou sua cabeça até mim, esperando que eu falasse alguma coisa.

— Tudo bem com você?

Ele assentiu positivamente. Eu sentia falta de um sorriso no rosto dele, por mais que não fosse verdadeiro. Por mais que fosse forçado. Ele poderia ao menos disfarçar. Orgulhoso!

Ele voltou sua atenção para a festa. Parecia aqueles menininhos com sonhos distantes. Era forte ver Castiel naquela situação. Realmente levaria um tempo para que ele aceitasse aquela responsabilidade temporária com as pernas que recebera.

— Eu estou com tédio — Armin disse, espreguiçando-se. — Jane, vamos dançar? Eu acho que podemos fazer isso. Alexy escondeu meu jogo, não sei onde ele colocou.

Mordi o lábio inferior.

Armin era tão inocente que não percebeu o que acabara de dizer.

Eu só consegui ver a cabeça de Castiel virando-se novamente para me encarar. Ele piscou lentamente e então decidiu falar comigo:

— Você vai dançar com ele? — perguntou. — Ah... aproveita, porque eu não posso. Eu sou um retardado que não consegue andar mais.

Revirei meus olhos.

— Não fala isso. Poderia ter ficado paraplégico, mas não ficou.

Ele riu ironicamente, evitando me olhar. Eu odeio quando ele faz isso!

— Vai dançar, Jane. Vai.

— Quer saber? — falei, grossa. Puxei a mão de Armin: — Eu vou mesmo. Se você mesmo não consegue se aceitar, não vai ser eu que vai te ajudar. Com licença, Castiel Tissot.

Saímos.

Marchei furiosamente para o meio da pista e travei. Não sabia dançar, muito menos Armin. Então, decidimos dar risada da nossa situação. Até... Até Armin começar a dançar feito um robô. Acompanhei-o.

A música terminou, substituindo-se para uma mais calma. Miss you love do Silverchair.

Armin sorriu divertido.

Estendeu sua mão. Antes, olhei para Castiel, que havia sumido. Dei de ombros e aceitei o convite. Ele juntou seu corpo ao meu. Acabei afundando meu rosto um pouco abaixo do pescoço dele, enquanto Armin encaixava seu queixo na minha cabeça.

Balançamos nossos pés lentamente. A música, em certas vezes, aumentava o ritmo. Não nos importávamos, continuávamos naquela lentidão infernal. Me deu sono, mas não liguei.

Subitamente, Armin tropeçou, quase caindo em cima de mim.

Assustada, me afastei dele. Armin indagou-se o que havia acontecido, até olharmos para o lado e virmos que Castiel estava rindo da nossa cara. Havia usado a muleta para atrapalhar Armin. Não sabia se estava brincando ou se estava sendo sério... Continuava a criança de sempre.

— Deixa eu dançar com a minha namorada, Armin — falou, assumindo uma pose séria. — Anda, circula logo.

— Calma, Castiel — ele ergueu os braços em rendição. — E pelo que eu saiba, ela não é mais a sua namorada.

Castiel o encarou, sarcástico:

— Quem é você para dizer isso? Vai achar um joguinho de barbie, vai.

— Porra! — gritei. — Eu não quero confusão agora. Castiel, poderia ser mais gentil? Armin é o meu melhor amigo, respeite isso! E, se você não se lembra, há três meses atrás você estava desistindo de mim pra ficar com a Debrah. refrescou a memória?

Ninguém a nossa volta ligava para a discussão.

A música trocou: Say something.

Agora a lentidão era total.

— Para de palhaçada, Jane — ele se aproximou. — Com licença, Armin.

— Palhaçada? — ri nervosa. — Que raios...!

— Nenhum raio, Jane. Agora engata aqui, logo.

— Para de ser um imbecil! — gritei, sem me importar com os outros. — Todo mundo ralou o mês inteiro pra te dar essa festa e é assim que você agradece? Ignorante, grosso! Você tem noção de quantos dias eu fiquei chorando pensando que iria morrer? Você tem noção de quantos dias Armin saiu de madrugada da casa dele para ficar comigo?

— Ah, o viadinho ficou contigo? — zombou ele, sem rodeios. — Pelo visto já fiquei corno.

— Castiel, não fala merda — Armin disse, controlando a raiva. — Se você não sabe diferenciar amizade e namoro, não podemos fazer nada.

— Tu é o cara da friendzone, né? — e Castiel não conteu a língua novamente. — Sinto muito, hein.

Em um piscar de olhos, Armin avançou para cima de Castiel. Ele recuou para o lado, agilmente. Riu debochadamente e gritou para que Armin o atacasse se ele fosse homem.

E ele o fez.

Para se defender, Castiel levantou as duas muletas, acertando no estômago de Armin.

Sabe quando tudo parece acontecer em câmera lenta para você?

Então... Armin caiu no chão, batendo as costas fortemente. Nessa hora, as pessoas vieram preocupadas, algumas gritando, para ver o que estava acontecendo. Ele estava ao chão, tossindo, com a mão em cima da barriga. Castiel se aproximou e colocou a muleta em cima da barriga dele, pressionando.

— Não se mete mais, tá?

Ele cuspiu no chão.

Eu senti uma repulsa, um nojo grande de Castiel.

Eu não tinha estômago para aguentar aquilo, nunca me vi tão fraca na minha vida inteira. Lembro de ter corrido até Armin e o ajudado, mas, ao mesmo tempo, olhava para onde Castiel ia. Ele saiu pela porta da frente, estragando a festa inteira.

As lágrimas saíram com urgência.

E a noite terminou em um hospital.


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Notas finais do capítulo

Hm... esse Castiel meio ingrato. Sei de nada.