Colorblind escrita por HeyWonderland


Capítulo 18
Heaven Must Be Missing an Angel




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– Bom, eu sempre fui aplicada no que eu queria fazer, e sempre quis ajudar as pessoas. - Anny continuou a dizer. - Quando comecei a estagiar como enfermeira, tinha mais ou menos a sua idade. Muitos sonhos, e toda euforia de estar seguindo à carreira que eu sempre desejei seguir. - Anny suspirou e sorriu para o chão. - Me lembro de como foi a sensação de vestir um uniforme branco, com aquele crachá pela primeira vez... Eu nunca estive tão feliz. - Ela piscou e voltou a me olhar. - Eu estagiava em um dos hospitais mais caros de Londres. Cada um que trabalhava naquele lugar me fazia sentir como se estivesse gravando Grey's Anatomy.

Nós rimos baixinho.

– Eram todos muito apessoados. Certa vez, estava fazendo o meu trabalho e percebi que um rosto novo havia passado por ali. Um rosto novo e... Um rosto muito, muito bonito. - Ela deu um sorriso triste. - Acabamos nos tornando amigos... E mais tarde, amantes. Ele era doutor, no início da carreira, tinha tudo para decolar e ser um grande médico...

Anny soltou minha mão por um momento e olhou para cima, respirando fundo. Quando voltou a me olhar, seus olhos marejavam e ela tentou sorrir, equilibrando as lágrimas nos olhos. Seus dedos se entrelaçaram com os meus.

– E foi exatamente o quê aconteceu. - Ela suspirou. - Ele se tornou um grande médico. Sempre requisitado em cirurgias importantes, sempre recebendo congratulações e cumprimentos por onde passava. Até que um dia, eu já não era nada além de mais uma que o admirava.

Olhei fundo nos olhos de Anny. Às vezes, as pessoas guardam mágoas e sentimentos por tempo demais, e isso não faz nada bem à alma.

Naquele momento pude ver como uma pessoa que sorri o tempo todo e que faz com que todos em sua volta se sintam bem por compartilhar de sua presença pode carregar dentro de si as dores mais fortes, as histórias mais profundas, enterradas em um baú da memória, reprimido por ações de gratidão e esperança... E distribuindo um amor gratuito que ninguém lhe retribui. Senti meus olhos começarem a marejar apenas por ver que atrás de todo sorriso constante, existe uma história que faz lembrar como é preferível sorrir.

– E o quê aconteceu? - Eu pedi quase num sussurro.

– Ele acabou se apaixonando por uma paciente, acabou se casando com ela... Mas ela estava fazendo tratamento, e só poderia engravidar depois de alguns anos... E o quê estava acontecendo, Ally... - Ela apertou minha mão de um jeito um tanto quanto desesperado. – Era que eu já estava de alguns meses. Eram gêmeos. - E finalmente a lágrima presa se soltou.

Foi um choque. Nunca achei que Anny escondesse uma história dessas. Apenas fiquei a observando enquanto ela tentava conter as lágrimas e continuar a falar.

– E então, quando dei a luz... Poucos meses depois... Ele os tirou de mim. Ele ficou com a minha menina e mandou meu menino para um orfanato. Eu não podia fazer nada além de ficar com a boca calada, ou perderia meu emprego e minha carreira que estava começando a se estabilizar em um hospital renomado. - Ela já não conseguia conter-se e começou a chorar. A única coisa que eu pude fazer foi chorar junto dela. Eu estava fraca, estava debilitada, mas encontrei forças para me sentar ainda mais acima e aconchegá-la nos meus braços. Ela secou as lágrimas e sorriu, mas ainda tinha uma expressão tristonha.

– E como você veio parar aqui? - Pedi.

– Esse é o desfecho da história. Acabei perdendo meu emprego por ter ficado calada. Descobriram tudo, mas para não escandalizar o hospital, claro que resolveram me tirar. Me mandaram para a única clínica filiada fora de Londres que havia, então eu vim para Cambridge... E hoje não sei... - A esse ponto, ela tentava falar, chorar, e soluçar ao mesmo tempo. - Hoje não sei se... Deus... Ouviu minhas... Preces e me abençoou... Ou se... Estou sendo castigada por... Ter deixado-os... Ir! - A abracei forte e lágrimas escorriam pela minha face. Me cortava o coração ver como Anny era por dentro. Achei que anjos não tinham dores.

– Anny, fique calma! -Eu alisava seus cabelos. - Me explique! Me explique porque acha que está sendo castigada!

Ela se soltou de mim e voltou a segurar apenas minhas mãos. Seus olhos inchados fitaram os meus por um período de tempo.

– Meu garotinho morreu... E minha menina está doente. - Ela começou a chorar novamente, mas sem tirar os olhos dos meus. Eu já não sabia mais o quê dizer. Achei em primeiro momento que eu estava tão desesperada por respostas na minha vida que saí encaixando tudo em mim. Mas não era o caso.

Nos abraçamos e começamos a chorar muito. O silêncio do quarto era rompido pelos soluços confusos e pelo soar da máquina que marcava meus batimentos cardíacos inconstantes.

– Eu achei... Que nunca mais... Fosse ver você! - Ela disse em meio aos soluços, sem me soltar.

– Eu não acredito nisso. Eu... É impossível!

Nos soltamos e Anny secou as lágrimas.

– Eu me culpo todos os dias da minha vida por ter deixado levarem vocês de mim! Mas de alguma forma, nós voltamos a ficar juntos. De algum jeito, eu pude fazer por vocês tudo o quê eu nunca havia feito. Vi você dar seu primeiro passo. Seu primeiro beijo, sua primeira arte... Sua primeira vez.

Eu sorri em meio às lágrimas que molhavam todo o meu rosto.

– Isso é divino. - Ela completou, com um sorriso no rosto. - Você só está aqui porque seu pai te tirou de mim. Porque você é filha de um dos médicos mais respeitados daquele hospital. E eu só estou aqui porque deixei você ir. O Kyle só estava aqui porque o orfanato onde ele vivia era conveniado com esta clínica.

– Já ouviu dizer que o quê é nosso nunca se vai para sempre? - Eu respirei fundo com dificuldade. Eu não acreditava que Kyle era mesmo meu irmão. Que Anny era minha mãe. Eu sempre tive uma família, e eu não sabia disso. Achei por tantas vezes que havia sido abandonada, deixada de lado. Mas alguém lá em cima nunca me abandonou. E tudo o quê aconteceu me colocou ao lado da minha verdadeira família.

As coisas estavam bem mais claras agora. Era por isso que minha mãe sempre cuidou melhor da minha irmã e me deixou aqui com tanta facilidade. Era por isso que eu e Kyle éramos como éramos. Porque Anny sempre foi o mais perto do céu que eu conhecia.

– Você está com raiva de mim? Por não ter te contado? - Anny secou minhas lágrimas e eu beijei sua mão.

– Não. Nunca. Eu não tenho muito tempo para ficar vivendo com ressentimentos agora. - Ela me abraçou tão forte que quase perdi meu ar.

– Não fala isso!

– Você... Está me... Esmagando!

Ela riu e me soltou.

– Desculpe! - Nós rimos. - Eu amo você. -Ela levantou enquanto segurava minhas mãos.

– Eu também te amo. - Eu sorri.

– E agora eu preciso cuidar do seu quadro médico, mocinha. Mais tarde teremos muito o quê conversar. - Ela beijou minha testa e se dirigiu até a porta. Antes que pudesse sair, não consegui me conter.

– Você acha que ele volta? Acha que ele me ama de verdade?

– Nós ainda temos muito o quê conversar. - E saiu.


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