Um raio de sol despontava no céu, adentrando a janela aberta da biblioteca de Seiyo Middle School, e pousando sobre os rostos de dois jovens adormecidos. Nagihiko ainda estava escorado contra a parede, o rosto virado para o lado em um ângulo estranho, seu braço direito envolvendo alguma coisa apoiada em seu colo e as pernas dormentes por causa do peso sobre elas. Durante a noite Stéffanie tinha escorregado depois de cair no sono, e agora estava com a cabeça e parte do corpo apoiados nas pernas dele, dormindo em seu colo com uma expressão raramente serena em seu rosto.
Expressão que não durou muito tempo.

Assim que o sol em seu rosto começou a incomodar, Nagihiko despertou, protegendo os olhos com a mão da claridade do sol da manhã. Soltou um longo bocejo, se espreguiçando e, assim que percebeu que não conseguiria se levantar por causa de um peso que causava a dormência em suas pernas, olhou para baixo, e seus olhos sonolentos arregalaram-se quando viram a garota adormecida no colo dele. Deixando escapar um sorriso, ele moveu a mão que ainda abraçava firmemente o corpo dela, até seu rosto, afastando os cabelos azulados que pendiam para todo lado de sua face. Sentiu-a estremecer quando tocou sua bochecha com os dedos finos, e a ouviu murmurar durante o sono:

- Pare... faz cócegas...
- Você fica tão bonitinha quando está dormindo... por que você não é sempre assim, hein Blanca-san? - ele deixou escapar
- O que? - ela acabou despertando com aquele comentário, os olhos semi-cerrados focalizando o lugar com dificuldade. Olhou em volta confusa, até onde sua vista limitada com aquela posição deitada lhe permitia, e quando se lembrou de onde estava e com quem estava, levantou-se bruscamente, por pouco não dando uma cabeçada no queixo de Nagihiko, e soltou um berro - P-P-PERO QUE DEMONIOS PIENSA QUE ESTÁ HACIENDO HOMBRE????!!
- Bom dia pra você também - Nagihiko ironizou - E não grite tão alto, eu acabei de acordar...
- Ohh sí, acaba de despertar pero já está haciendo tonterías, no és?? - ela gritou, o rosto vermelho de raiva e vergonha misturadas
- O que?! Não diga besteira, foi você quem escorregou e dormiu no meu colo! - Nagihiko exclamou de volta, com certa dificuldade para traduzir o espanhol rápido dela àquela hora da manhã - Céus, como você tem energia já de manhã cedo, hein... devia usar toda essa energia na prova de hoje
- Prova? - ela repetiu, parando de gritar de repente - Oh sí, és verdad... hoy teremos prova...
- Sim, e não é só uma prova, vamos passar a manhã inteira fazendo provas de várias matérias - Nagi acrescentou, vendo que finalmente encontrara um assunto que não a fazia gritar como uma escandalosa - Mas ainda deve ser muito cedo... temos que esperar até alguém abrir a biblioteca para podermos sair, então, já que estamos aqui, por que não damos uma última revisada na matéria?
- Sí... creo que és una buena idéia... - Stéffanie respondeu, mal prestando atenção no que ele dizia. Ela havia estudado, era verdade, mas não sabia nada sobre a matéria da prova, e a questão dos kanjis ainda a preocupava. Seria ridículo se ela tirasse zero porque não conseguiu nem ler as perguntas da prova, mas, bem lá no fundo a garota temia que isso acontecesse. Puxou sua mochila que ainda estava largada em cima da mesa para perto com uma das mãos, e puxou uma cadeira com a outra, mas assim que se curvou para sentar, gemeu de dor, levando uma das mãos ao ombro, tentando tocar a parte de suas costas que doía, sem conseguir alcançá-la
- O que foi? - Nagihiko perguntou
- Me duele la espalda... acho que dormi de mau jeito - ela respondeu, ainda insistindo na ação, embora fosse óbvio que ela não conseguia alcançar o ponto que doía
- Você nunca vai alcançar desse jeito... venha, sente-se aqui - o Valete falou, puxando uma cadeira atrás dela
- Por que?
- Não importa, apenas sente-se - Nagi insistiu, e ela se sentou. Sem nenhum aviso prévio, ele afastou os cabelos dela para a frente, o que foi relativamente fácil, considerando que ainda estavam presos nas duas tranças que ele havia feito ontem, e apoiou as duas mãos nos ombros da garota, começando a massageá-los
- P-P-Pero que piensa que está haciendo chico???!! - Stéffanie gritou com voz aguda de novo, quase pulando da cadeira onde estava sentada, mas Nagihiko a empurrou de volta, forçando-a a permanecer sentada
- Fique quieta. Você disse que está doendo, não é? Então é só massagear um pouco, você vai ver como vai melhorar rapidinho
- P-Pero eso no es razón para para usted... t-tocarme así sem nem pedir permissão primeiro! -  ela gaguejou nervosa, o rosto voltando a se colorir de vermelho
- Não fale como se eu estivesse fazendo alguma coisa imoral! - o Valete exclamou - É apenas massagem. E eu já estou acostumado a fazer isso para o Hotori-kun... você sabe, por causa das minhas obrigações como Valete
- Oh sí, isso... - a Rainha estrangeira murmurou, lembrando-se das estranhas tarefas que Tadase tinha dado ao garoto - Bién... se és como aquilo que usted hace para o Tadase, entonces.... c-creo que no hay problema - ela murmurou, conformando-se em ficar quieta e deixar o garoto continuar. Ainda não gostava daquilo, a sensação de ter um garoto tocando seu corpo daquele jeito era terrivelmente embaraçosa, e lhe causava várias sensações além da costumeira irritação, talvez não por ser um garoto qualquer, mas sim por se tratar daquele garoto. Mas tinha que admitir que Nagihiko era realmente muito bom no que fazia
- Isso mesmo, não tem problema - ele concordou, encorajando-a a ficar quieta sem reclamar - Apesar de que não é nada mal fazer isso para uma garota de vez em quando, só pra variar... - ele murmurou para si mesmo
- O que disse??
- Ah, nada, nada não - ele apressou-se a dizer, apertando em um ponto particularmente dolorido, fazendo a garota soltar um ruído estranho e involuntário. Ela levou as mãos a boca, censurando a si mesma por emitir aquele som, corando furiosamente. Agradeceu intimamente por Nagihiko não ter feito nenhum comentário sobre aquilo, embora ele certamente tivesse ouvido, e limitou-se a ficar calada até que ele terminasse.

Nagihiko paralizou por um momento, surpreso com o ruído que a garota produzira, mas por fim achou melhor igniorar e continuar com o que estava fazendo. Ele depositou as mãos sobre a pele alva da garota, e apertou os ombros suaves, aumentando a velocidade e a intensidade do seu toque aos poucos. A Rainha estrangeira arquejou, com o toque firme da mão do valete. Nagihiko acariciou os ombros macios, fazendo com que ela se contorcese e mordesse os lábios, com o rosto corado, tentando controlar os seus impulsos. A espanhola sentiu seu corpo tremer ao sentir as mãos firmes de Nagihiko pressionando sua pele, e antes que percebesse, deixou um fraco gemido escapar, enquanto fechava os olhos para apreciar melhor aquela sensação. Pequenos tremores se espalhavam por todo o seu corpo, cada vez que Nagihiko intensificava o toque. As mãos hábeis rodearam o pescoço delgado, e voltando para os ombros, aumentando cada vez mais a intensidade e a rapidez do toque. E antes que a estrangeira percebesse, ele falou:

- Prontinho, acabei - Nagihiko anunciou depois de algum tempo, e a garota saltou da cadeira assim que ele disse isso - Viu, não foi tão ruim assim, foi?
- Não, não foi - ela admitiu á contragosto. Parecia uma criança que tinha acabado de saltar da cadeira do dentista depois de perceber que a consulta realmente não tinha sido tão assustadora quanto ela imaginava - Usted... e-es realmente bueno en esto - ela sussurrou tão baixo que por um momento Nagihiko duvidou se tinha ouvido corretamente
- Ahn... a-arigatou - ele respondeu, só percebendo depois que não era ele quem devia estar agradecendo, mas como sabia que a garota jamais demonstraria alguma gratidão, achou melhor se conformar com isso - Então... acho melhor começarmos a estudar, não é? - ele sugeriu, tentando focar sua mente em outra coisa - Ahh, mas preciso dar um jeito nisso primeiro, meu cabelo está um horror assim! - ele exclamou ao ver o próprio cabelo bagunçado no reflexo da janela
- Usted parece mismo una niña de vez en cuando - a Rainha estrangeira comentou, observando o garoto com o canto dos olhos. Ela tirou uma escova de cabelos da própria mochila e a estendeu para o garoto - Tome, pegue. Yo te empresto
- Ah... obrigado - ele pegou a escova que a garota lhe oferecia, estranhando aquela repentina generosidade - Etto... você não quer usar primeiro?
- Não, tudo bem. M-Mío cabelo está trançado, entonces... n-não bagunçou tanto... - ela murmurou sem graça, virando o rosto para o lado. Notou que o garoto ainda a encarava fixamente, e voltou a se irritar com aquele olhar insistente - Ora, vamos luego chico, usted quer a escova ou não?!
- Ah, hai! - ele recuou um passo, surpreso em como ela mudava de humor tão facilmente. Notou então que esse devia ser o jeito de ela agradecer pela massagem, e achou melhor não dizer mais nada para provocá-la. Pelo menos não enquanto seu cabelo não estivesse de volta ao normal.

Depois de longos minutos escovando o cabelo, Nagihiko devolveu a escova para ela. Quando o fez, seus dedos se encostaram. Mesmo aquele simples toque serviu para deixar Stéffanie nervosa, eela tentou puxar a mão de volta com rispidez, mas Nagihiko não queria soltá-la. A garota inflou, pronta pra gritar com ele de novo, quando de repente a porta se abriu em um rompante. Por ela, entraram Tadase e Anna, parecendo aliviadíssimos em vê-los, seguidos pela bibliotecária, que não sabia se ficava aliviada por vê-los bem, se sentia-se culpada por ter trancado os dois ali, ou se dava dava uma bronca neles por passarem a noite na escola. Stéffanie se aproveitou do momento de choque do valete por ver que a porta tinha enfim sido aberta para puxar sua mão de volta e enfiar sua escova de cabelos na mochila às pressas.

- Ahh vocês estavam mesmo aqui!! - Tadase exclamou, surpreso e aliviado em ver os amigos
- Oh thank God you're okay! I was so worried! - Anna choramingou, adentrando a biblioteca e abraçando a amiga
- Devagar, Anna, yo no compreendo seu inglês... - Stéffanie respondeu, traduzindo com dificuldade as falas apressadas da Às estrangeira - E espere um pouco, usted está coberta de chocolate e de farinha! O que ustedes estaban haciendo?! - ela exclamou, desvencilhando-se da garota para não acabar com o uniforme sujo também
- Nós ficamos presos na cozinha, e acabamos preparando alguns biscoitos... quero dizer, a Lewis-san preparou, e...
- Ah, tudo bem, já entendemos - Nagihiko interrompeu o loiro, rindo só de imaginar a cena - Mas então quer dizer que vocês também ficaram trancados?
- Yes, we spent the night in the kitchen, foi terrível, Long hair Boy! Achei que fosse ficar lá pra sempre... - Anna exclamou, tremendo só de lembrar
- Pero usted passou la noche con teu "Prince Charming"... esto no fue tão ruim assim, cierto? - Stéffanie alfinetou, cutucando a outra garota com o cotovelo
- Oh, yeah... t-this... certamente não foi so bad. N-Na verdade foi really fun... e-eu fiquei very happy por ser ele a estar with me - a Às estrangeira murmurou em resposta, sorrindo sem jeito, o que fez a Rainha rir ainda mais da expressão dela
- Você está realmente passando muito tempo com a Yaya-chan, Blanca-san... está ficando que nem ela - Nagihiko comentou, e enfim a garota percebeu o que estava fazendo, voltando a assumir a expressão mal-humorada de sempre
- Cállate hombre! Se me comparar com Yaya de nuevo, juro que hacerei usted se arrepender de ter nascido! - ela exclamou, irritando-se facilmente
- Certo, certo, já chega, crianças. Vocês deve estar cansados depois de passar a noite aqui, então por que não descansam um pouco antes das aulas começarem? - a bibliotecária interveio, interrompendo a discussão
- Adoraríamos fazer isso, mas não podemos, vamos ter prova hoje - Tadase lembrou
- Descansaremos bastante quando chegarmos em casa, mas agora não podemos mesmo fazer isso - Nagihiko concordou
- Pero antes de esto, venga conmigo - Stéffanie falou de repente e, sem esperar por resposta, puxou Anna pelo braço
- Ehh?! W-Where are we going? - a mais nova indagou, meio desnorteada
- Aonde mais? Ao banheiro, é claro! Usted está coberta de chocolate e está toda suja, no puede hacer la prueba así! - a Rainha estrangeira exclamou, arrastando-a para fora da biblioteca em direção ao banheiro.

As duas foram até o vestiário feminino, que era bem equipado com chuveiros em cada uma das pequenas cabines de um lado da parede e pias com espelhos do outro. Agora, Anna tomava um banho rápido para tirar toda aquela farinha do cabelo, enquanto Stéffanie a esperava do lado de fora, encarando-se em um dos espelhos sobre a pia. Seu cabelo tinha ficado meio bagunçado durante a noite, já que ela tinha dormido de mau jeito, mas estava com pena de desmanchar aquelas tranças irritantemente bem feitas, e odiava-se por isso.

- Err.. Spanish Girl? Are you still there? - Anna chamou depois de alguns minutos em silêncio
- Sí, estoy. Qué sucede? - a outra respondeu
- Well... m-meu uniforme também está a little dirty... very dirty indeed so... e-eu não sei o que vestir...
- Vista o uniforme de Educação Física - Stéffanie falou antes mesmo que ela terminasse a frase. Ela foi até um dos armários, pegou o uniforme da garota e passou para ela por cima da porta do chuveiro
- T-Thanks - Anna murmurou, surpresa em como a amiga tinha conseguido resolver isso rápido
- No es nada - Stéfanie respondeu, decidindo por fim deixar o cabelo assim mesmo, e se recostando na parede oposta - Entonces... usted passou la noche com o Tadase, no es? - ela perguntou, mudando repentinamente de assunto. Ouviu o som de alguma coisa batendo contra a parede, seguido de uma exclamação de dor, e teve certeza de que Anna tinha ganhado um novo hematoma roxo para sua coleção
- Y-Yeah... - ela respondeu depois de algum tempo - We got stuck, so não havia muito o que se fazer além de wait alguém vir nos salvar
- Compreendo... y... durante él tiempo en que estiveram presos, ustedes... ustedes no hicieron nada? - ela tentou escolher as palavras com mais cuidado, não querendo que a Às se machucasse desnecessariamente outra vez
- Well... we are talking about como era minha vida in London, antes de vir pra cá... eu contei para ele um pouco sobre my family - Anna contou, puxando pela memória as coisas que tinha feito na noite anterior, aparentemente sem entender do que a outra falava - And then we made cookies! Ah, but... e-eu fiz a maior parte, so... não saiu... s-so good quanto eu esperava - ela murmurou tão baixo que Stéffanie precisou se aproximar mais da porta para ouvir - Mas ainda assim o Prince Charming comeu todos eles!  I was so surprised when I woke up this morning e vi que eles tinham sumido! - ela contou, a felicidade óbvia transbordando em sua voz - I was very happy, too...  is the first time que alguém comeu a minha comida
- Mismo? Entonces creo que usted agradeceu devidamente à ele, certo? - Stéffanie perguntou, rindo em ver como a garota se empolgava facilmente
- Ah... - Anna abriu a porta e saiu de lá já vestida, trajando o shorte vermelho e a blusa branca folgada do uniforme de Educação Física agora, com uma toalha ao redor do pescoço, os cabelos lavados pingando o chão - I forgot... fiquei tão emocionada na hora que esqueci completamente de agradecer
- Díos mío, yo no creo - a Rainha deu um tapa na própria testa - Ande, usted já acabou, entonces vamos luego - ela tornou a puxar a garota pelo braço
- A-Aonde nós vamos agora?
- Yo no voy a lugar nenhum, és usted quem vai agradecer ao Tadase agora mesmo! - ela arrastou Anna para fora do vestiário, aparentemente muito acostumada a sair arrastando as pessoas por aí.

Ela guiou Anna até a sala de aula que ela dividia com Tadase, e quando viu o Rei à porta, soltou o braço dela e deu-lhe um empurrão nas costas, empurrando-a na direção do loiro. Antes que Anna pudesse falar alguma coisa, ela saiu correndo para longe, sumindo de vista e deixando os dois sozinhos.

- Ahn... t-tudo bem Lewis-san? - Tadase indagou, também meio atônito com aquela cena
- Yes... err... - ela começou a torcer a própria camisa, sentindo seu rosto queimar só por estar diante da presença de Tadase - P-Prince Charming, tem algo que I forgot de lhe dizer yesterday
- O que foi? Pode me dizer qualquer coisa, Lewis-san, você sabe - ele se apressou a dizer, entre curioso e preocupado
- W-well, it's not really important, I mean... - a Às estrangeira gaguejou em um inglês apressado, que Tadase se esforçou para entender - You... Y-You eat my cookies yesterday... m-mesmo estando com aquela aparência horrível... e o gosto devia estar even worse... b-but ainda assim, você comeu... t-todos eles, so... err... is the first time que alguém prova my food, so... I-I'm really happy... que você tenha comido tudo. Thank you so much Prince Charming - ela terminou seu gaguejar por fim, o rosto quente como se estivesse em brasas. Sentia tanta vergonha que poderia se enfiar em algum buraco e não sair de lá nunca mais, porém, ao invés disso, esforçou-se para erguer um pouco o rosto corado e encarar Tadase nos olhos. Surpreendeu-se em ver que ele também tinha corado, o rosto vermelho até as orelhas
- Não precisa me agradecer, Lewis-san... apesar do que aconteceu, o sabor original ainda prevalecia, então estava muito bom, de verdade - antes que percebesse o que estava fazendo, Tadase segurou as mãos da garota entre as dele, acariciando-as com as pontas dos dedos. Anna ofegou e corou ainda mais com o toque repentino, mas não recuou - Na verdade eu é que deveria estar te agradecendo. Obrigado por me deixar provar a sua comida, Lewis-san... é uma honra ter sido o primeiro a fazer isso
- Kyaaaa que fofoooooooo!!!! - um grito histérico em coro despertou os dois para a realidade. Um bando de alunas, até então invisíveis para eles, os rodeavam, observando a cena aparentemente há bastante tempo, todas eufóricas com a cena que os dois tinham acabado de protagonizar.

E isso não era tudo: Em um canto que levava para as escadas do primeiro andar, Stéffanie ainda observava a cena, muito mal escondida atrás de uma parede, e por algum motivo acompanhada de Miguel, que parecia prestes a entrar no Chara Change a qualquer momento de tanta empolgação. Na verdade o mesmo valia para a espanhola. Aparentemente tinham sido eles que tinham soltado aquele gritinho histérico que despertara os dois para a realidade. Tadase soltou as mãos de Anna assim que percebeu o tipo de situação em que se encontrava, seu rosto queimando tanto que poderia muito bem fritar um ovo na testa dele.

- M-M-Mas o que vocês pensam que estão fazendo, Gonçalves-kun, Blanca-san?! - Tadase exclamou no que ele pretendia ser uma repreensão, falhando miseravelmente nisso
- Ohh rayos, él nos descobriu - Stéffanie reclamou, sem deixar de exibir um sorriso no rosto - Hehehehe... é que ustedes dos estabam tão fofos juntos, não tinha como não espiar!
- Não acredito nisso... as outras alunas ainda vai, mas até vocês?! Vocês são Guardiões! - o loiro exclamou, ainda vermelho até as orelhas
- E daí? Isso não muda o fato de que vocês ficam incrivelmente fofos juntos! - Miguel exclamou, com a voz aguda demais para alguém que ainda não tinha feito o Chara Change - Ahh então quer dizer que você provou a comida da Anna, né, seu sortudo... ahh isso é como uma cena de um mangá shoujo se concretizando!
- I-Is nothing like that, Micchan.. I... I-I can explain - Anna gaguejou nervosa, tão embaraçada que tinha vontade de se trancar em algum lugar sozinha e não sair de lá por um bom tempo
- Pois yo creo que es exactamente lo que estamos pensando... admita logo Anna Lewis! - Stéffanie exclamou, também deixando-se levar pela empolgação, e implicando demais com a amiga para alguém que se negava a admitir as coisas óbvias que andava acontecendo com ela mesma
- S-Será que podemos discutir sobre isso depois? - Tadase pediu, seriamente incomodado com as demais alunas que ainda os rodeavam, algumas certamente filmando a cena com seus celulares - Nós vamos ter prova agora, se lembram??
- Ah sim... a prova - o sorriso descarado desapareceu do rosto de Miguel tão rápido quanto um piscar de olhos - Que droga... tenho certeza de que vou bombar nessa prova
- Não conseguiu estudar Micchan? - Anna indagou
- Eu acho que estudei, mas... não me lembro de nada do que estudei ontem... na verdade não me lembro de ter estudado também - ele confessou, forçando sua memória inutilmente. Ainda não se lembrava de como tinha ido parar na casa de Shunsuke, nem de ter estudado com ele, ainda que o amigo insistisse que eles tinham passado a tarde inteira estudando
- Ahh então era aqui que você estava! - uma voz escandalosa interrompeu os pensamentos do garoto de repente. Kukai vinha avançando pelo corredor, acompanhado de Yaya. Rima vinha mais atrás, lutando para acompanhar os passos apressados dos dois
- Mas aonde... foi que você... se enfiou, hein Anna Lewis?! - Rima exclamou com dificuldade quando se aproximou o suficiente para ser ouvida, ainda ofegante por causa da corrida e visivelmente irritada - Você sumiu depois da aula, nem sequer voltou pra casa ontem!
- Ah... good morning, Miss Mashiro - Anna cumprimentou, surpresa em ver a loira - I'm sorry, but... e-eu fiquei presa na escola ontem...
- É verdade, eu acabei ficando preso aqui com ela. E também o Fujisaki-kun e a Blanca-san - Tadase confirmou, não querendo que a garota levasse uma bronca no meio do corredor
- Ora, isso é ótimo! Perfeito! E eu perdendo meu tempo me preocupando com ela enquanto essa tonta estava aqui namorando! - Rima esbravejou
- "N-Namorando"...? What..? - Anna repetiu, duvidando se tinha traduzido corretamente aquela palavra
- Annaaaaa!! I was so worried about you!! - Peach veio voando na direção da garota, interrompendo os pensamentos da dona
- Peach! I'm sorry, não queria te preocupar - ela sorriu para a Chara, acariciando o topo de sua cabeça
- Não acredito que você sumiu também Stéffanie! Não me diga que passou la noche en la escuela tambiém?! - Setsuna exclamou, voando ao redor da cabeça da dona
- Sí, acabei ficando presa aqui - a espanhola confirmou
- Ahh pobrezinha.. usted debe ter ficado com tanta hambre, e frío... y ahora ainda tiene que hacer una prueba!! - Setsuna exclamou, agarrando-se ao braço da dona no que ela pretendia ser um abraço
- Estoy bién Setsuna, não se preocupe - a garota respondeu, querendo ao mesmo tempo tranquilizar a Chara e fazê-la parar de fazer tanto escâncalo em público
- Yaya também estava tão preocupada com você Onee-chaaaan!!! - a ruiva pulou em cima da garota, sufocando-a em um abraço e quase derrubando a garota no chão. Parecia estar fingindo um choro melodramático, atraindo a atenção de ainda mais pessoas no corredor
- N-No necessita fazer tanto drama, Yaya! Estoy bién, não está vendo?! - ela exclamou, desvencilhando-se da Às com dificuldade
- Vamos, já chega de fazer tanto escâncalo, Yuiki-san, estamos todos bem - Tadase tentou acalmar a amiga, também incomodado com toda aquela gente olhando para eles - É melhor entrarmos agora, nós vamos ter prova daqui a pouco afinal
- Aff você é mesmo um estraga-prazeres, hein Tadase... mas depois a Yaya quer saber tudinho o que aconteceu, viu?! E com detalhes! - a ruiva exclamou, enfim soltando a amiga
- Bom, acho que nós também precisamos ir... então até mais tarde, e boa sorte pra vocês - Kukai despediu-se, seguindo pelo corredor junto com Miguel, Stéffanie e Yaya, enquanto Tadase, Anna e Rima adentravam a sala de aula mais próxima.

Na sala do oitavo ano, o professor distribuía as provas para os estudantes, que estavam na sua maioria nervosos e apreensivos, mas nenhum estava tão preocupado quanto Miguel. Por mais que Shunsuke tivesse lhe dito que eles tinham passado a tarde anterior estudando para a prova, ainda lhe incomodava não lembrar de nada disso, nem como ele mesmo tinha ido parar na casa do amigo. Era como se houvesse um vazio em suas memórias, como um quebra-cabeça que está faltando a peça mais importante para completar uma cena. Olhou rapidamente para o lado com o canto dos olhos, e viu Kukai coçando a própria cabeça nervosamente, tentando encontrar a resposta para a primeira pergunta da prova. O ruivo tinha confirmado a história de que ele tinha ido direto da escola para a casa de Shunsuke, ou pelo menos assim tinha lhe dito Miguel, mas ainda assim o português não conseguia se acalmar. Respirou fundo, tentando espantar essas preocupações infundadas, pensando que, pelo menos por enquanto, era melhor ele se concentrar na prova diante dele, e não em suas suspeitas sem sentido. E essa prova em particular exigiria muita concentração da parte dele, já que certamente devia estar cheia de kanjis que ele não entendia.

No entanto, Miguel surpreendeu-se ao olhar para a prova diante dele. Ele conseguia entender perfeitamente todas as palavras escritas naquele papel, isso porque a prova estava toda escrita em português. Continham as mesmas perguntas que as provas dos outros alunos, é claro, como "Quem foi o primeiro Imperador do século XVI?", ou "Qual era o nome do homem que pôs fim à Era Tokugawa?", mas todas escritas em seu idioma. E o mesmo valia para as provas das outras meninas estrangeiras, estavam todas escritas nos idiomas delas. Miguel deu graças aos céus, tremendamente aliviado de que ao menos uma coisa tivesse dado certo e, com ânimo renovado, pegou o lápis e começou a responder as perguntas da prova, no entanto ainda com uma vozinha no fundo de sua mente lhe incomodando, e lhe dando a certeza de que ele estava se esquecendo de alguma coisa muito importante. Só não sabia o quê.