Sob a Luz do Sol escrita por Tatiana Mareto


Capítulo 19
Capítulo 18 - Vertigem




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*tema: David Bryan’s Hear Our Prayers*

Edward não mentiu quando ele me prometeu lugares que eu jamais imaginaria existirem. Infelizmente, depois de Carbonia, tivemos que retornar para casa. Passamos uma semana na ilha italiana, aproveitando o clima mediterrâneo. Nadar foi extremamente excitante, principalmente porque eu pude ver toda a vida que habita sob a água. Além de a vida ser muito mais linda sob o sol, ela também o era sob a água! Quanto tempo de minha existência eu perdi sob a terra, em um covil miserável, trabalhando de costureira, lavadeira, passadeira, para os caçadores. E eles eram monstros, como eu já sabia. Connor não podia ser o único, e ele foi claro ao afirmar que Rudolph consumia sangue humano. Deprimente, detestável. Não era ilegal, como Edward me garantira diversas vezes… mas afinal, de que lei ele estaria falando?

Estar ali, com minha nova família, nos braços do vampiro que eu amava e escolhera para mim, aproveitando ao máximo o que a vida terrestre me proporcionava, era impagável. Eu podia compreender um novo estado de amnésia, daquela vez voluntária. Eu não queria lembrar de nada do meu passado, eu não queria lembrar que um dia fora Beatrice Caldwell. Gostaria de mudar de nome, de me tornar outra. Eu simplesmente queria tornar-me Cullen.

Caçar naquele lugar foi mais complexo, e todas as vezes precisamos pegar os carros e nos dirigirmos a outras regiões. Mas foi pedagógico, também. Conheci outro animal interessante, o porco selvagem. Ele não me pareceu tão saboroso quanto os ursos, ou quanto o Lince. Mas toda a diversão e a reação do meu organismo a tudo me fazia muito sedenta, sempre. Sem contar o controle absurdo para nunca desejar os humanos. A semana passada em Carbonia poderia ser considerada uma das melhores de toda a minha existência, até melhor do que as primeiras que vivi com Edward.

Durante a volta para casa, senti uma vertigem estranha, no avião. Eu não costumava sentir aquilo, foi novo, inesperado e um tanto assustador. Era como se o chão e o teto se invertessem, e eu estivesse flutuando no meio vazio. A sensação foi tão anormal que nem Edward conseguiu compreendê-la. Ele sabia que tinha algo errado, mas não sabia o que. A viagem era longa, eu estava cansada; o avião me estressava, e eu provavelmente estava reagindo ao sangue do porco selvagem. Era uma vertigem, e eu tinha tantas desde que saíra do covil que aquela sequer deveria me causar estranheza. Na verdade, o que me causou estranheza foi a impaciência de Alice, que parecia muito incomodada com alguma coisa. Alguma coisa que nem ela sabia, pois Edward não conseguiu captá-la. A vertigem passou, e Alice pareceu mais confortada. Imaginar que haveria alguma conexão entre meu mal estar e o humor de Alice era ridículo, mas foi como me senti.

A escola ainda demoraria alguns dias para recomeçar, então teríamos tempo para nos recuperarmos da viagem. Só eu precisava de recuperação, era verdade. Os Cullen não sofriam com as adaptações como eu. Talvez eles simplesmente não sentissem muita coisa humana, e eu sempre tinha a impressão errada. Carlisle e Esme nos receberam com bastante euforia, como se o tempo sozinho lhes tivesse sido também penoso. Eles estavam acostumados com a casa cheia, foi o que considerei. E era bom voltar para casa, apesar dos momentos fantásticos vividos na Europa. Eu me sentia tão segura e protegida na casa dos Cullen que retornar para aquele lugar familiar me fez sentir paz. Subi até meu quarto para colocar todas as minhas coisas de volta ao armário, tentando ao máximo manter as pilhas organizadas, porque eu jamais saberia combinar as roupas tão bem quanto Alice, e deixei Edward na sala, confraternizando com os pais.

_Ooops. – Foi o som de minha voz, ao sentir-me desequilibrada descendo as escadas. Eu pretendia juntar-me aos demais, mas a experiência foi quase frustrante. Em instantes, Edward me amparava nos braços, confuso. – Está tudo bem… foi uma vertigem.
_Igual a que sentiu no avião?
_Sim… parecida.
_Você não está bem. – Edward disse, ajudando-me a descer as escadas como se eu realmente estivesse debilitada. – Carlisle… Beatrice não está bem.
_O que houve? – O médico se aproximou. Eu me sentia melhor, a vertigem tinha acabado.
_Ela não está bem… eu sei. Ela passou mal no avião, e agora também… e Alice anda inquieta com ela por perto. – Edward falou, procurando a irmã pela sala. Mas Alice estava fora de seu alcance de visão.
_Não tenho nada. – Disse, soltando-me dos braços de Edward. – Veja, nada demais…

E foi só me soltar de Edward para meu corpo desequilibrar-se e eu quase desfalecer no assoalho límpido de Esme.

Edward me impediu, fazendo-me sentar imediatamente. Seu semblante assustado me causou agonia, e minha agonia o assustava ainda mais. Carlisle ajoelhou-se à minha frente, observando-me. Senti-me a cobaia novamente.
_O que você sente, Bea?
_Eu não sei direito… chão e teto se invertem, é isso. Eu perco o equilíbrio…
_Hmmmmm… sente algum enjôo?
_Enjôo? – Palavras novas.
_Quando comeu comida humana… sentiu algo logo após?
_Não, faz dias que só me alimento de sangue. Se bem que…
_Os muffins? – Edward se lembrou da minha incursão a uma cafeteria, na cidade de Cagliari, quando eu decidi que estava apaixonada por um bolinho com pedaços de algo estranho. Chocolate, era o nome do meu novo veneno. Baunilha e chocolate, a tentação maior que a comida humana poderia me oferecer. Eu devorei três, como se fosse um animal faminto. Logicamente, depois dos muffins eu me senti mal, como se minha barriga pesasse. Mas deveria ser uma reação normal ao meu exagero, como fora a reação ao Martini.
_Hmmmm… – Carlisle continua a me observar, confuso. – Tem algo aqui que não estou captando…
_Nem eu estou. – Edward estava aflito. – Onde está Alice, pelos céus?
_Foi até seu quarto. – Esme respondeu. – Acha que ela pode ter visto algo?
_Ela deve ter… mas está escondendo de mim!
_Façamos assim, vocês vão para seu quarto. – Carlisle ponderou. – Amanhã Bea vai até o hospital e eu realizo alguns testes, para saber o que está havendo.
Edward concordou, e me levantou intentando retornar-me para o quarto. Sempre zeloso em exagero comigo; uma preocupação que eu não merecia.
_Seja gentil, Edward. – Emmett bradou, da sala. Se eu estivesse completamente saudável, eu mesma o teria aniquilado. Edward era mesmo gentil, apenas ignorou o irmão. A sua preocupação comigo era infinitamente superior a qualquer perturbação vinda de Emmett.

Como meu vampiro era o mais exagerado da família, ele não me permitiu caminhar até o quarto. Carregou-me em seus braços, e fez-me deitar imediatamente. Ele não me deixaria tocá-lo aquela noite, eu já suspeitava. As boas vindas à nossa cama teriam que ficar para data futura, quando minha vertigem passasse. Com bastante suavidade, ele retirou meus sapatos, cobriu-me com os cobertores e deitou-se comigo, mantendo-me bem próxima. Tentei manter meus pensamentos longe de qualquer coisa que pudesse irritar ou aborrecer Edward, porque ele já parecia ansioso demais com o fato de eu estar reagindo daquela forma. O dia seguinte nos daria uma perspectiva do que estava acontecendo, era o que eu pensava.

Mas a perspectiva parecia tão borrada quanto a minha vertigem.

Eu praticamente não consegui me levantar da cama durante a manhã, e meus olhos estavam de uma cor púrpura inaceitável. Eu nunca sequer vira aquela cor na natureza, e minha paleta de cores já parecia bastante preenchida. Edward teve que ajudar-me a levantar-me, e mesmo assim foi difícil manter-me de pé. Peguei a primeira peça de roupas que estava na primeira pilha ao alcance, e iniciei meu ritual para troca de roupas.
_Edward. – Eu o chamei. Ele estava observando a paisagem, já completamente vestido, algo em suas mãos, proporcionando-me uma privacidade desnecessária. Mas eu adorava como ele podia ser tão respeitador, ao não deliberadamente se aproveitar do momento para observar-me. – Edward… você não notou nada estranho em mim durante o passeio na Europa?
_Deveria? – Ele se aproximou, olhando para mim curioso. Os pensamentos começaram a fluir, e eu não consegui segurá-los. – Seu corpo parecia modificado sim… mas deveria ser uma reação natural aos alimentos humanos.
_Mas Edward… eu senti algo.
_A vertigem? – Ele se aproximou, mesmo eu estando ainda nua.
_Não. Eu estou bem.. eu senti algo aqui. – E levei minha mão esquerda até minha região do ventre, apontando para a área que estava, definitivamente, maior do que sempre fora. Reação aos alimentos humanos, era a explicação…

A reação de Edward àquele fato foi muito pior do que a minha, aos olhos verdes. Ele deixou cair das mãos o livro que segurava, e me olhou totalmente atônito. Eu vi Edward sem nenhuma reação pela primeira vez, e devo confessar que ele me apavorou. Ele me apavorou por estar sem reação e pelo que aquilo podia representar. Coloquei a mão totalmente sobre meu ventre, tentando entender o que poderia causar aquele inchaço. De todas as reações absurdas que meu corpo já sofrera, aquela era definitivamente a mais estranha. Algo se mexendo era praticamente ridículo. Tomei a mão de Edward e coloquei-a no lugar da minha, tentando fazê-lo compreender o que eu queria dizer. E ele continuava a me olhar daquela forma apavorante.
_Edward, assim eu vou ficar com medo. – Eu nem conseguia me vestir.
_Precisamos mesmo ver Carlisle. – Ele disse, finalmente. Respirei aliviada, e iniciei minha tarefa de vestir-me.
_Espero que ele tenha uma boa idéia do que seja isso, não estou gostando nada. Imagine, eu agora sinto coisas.
_Bea… – Edward voltou-se para mim, depois de recolher o livro no chão, e me segurou as duas mãos. – Bea, você não tem mesmo idéia? – Balancei a cabeça negativamente, olhando em seus olhos. – Você sabe qual era meu maior medo em relação a você? O que eu não podia prever… o que nenhum de nós podia prever? Você sabe o risco que corremos quando decidi… sucumbir a você?
_Risco? Do que você está falando, Edward?
_Eu acho que você está grávida, Beatrice.

Oh. E a reação dos olhos verdes ficaria realmente em terceiro lugar. Eu sempre conseguia me superar em esquisitices, e aquela era a esquisitice maior entre todas elas reunidas. O show estava completo, e não haveria lugar para tantas anormalidades em minha vida. Onde estaria o meu conceito de normalidade frente uma situação daquelas? Eu puxei as minhas mãos de volta, e comecei a andar em círculos. Nada daquilo era possível, nada daquilo era razoável. E tudo veio à minha cabeça de uma só vez. Híbridos não geram filhos de vampiros. Híbridos não se casam, não procriam. Híbridos não vivem sob o sol. Híbridos são monstros, e você nada mais é do que uma aberração, um erro da natureza. Híbridos não amam, eles não se apaixonam e não se submetem aos desejos humanos. Híbridos não se alimentam de comida. Híbridos não se envolvem com vampiros, de forma alguma.

Onde estava o meu conceito de normalidade, então?

Uma mulher podia gerar filhos. Um ser humano. Eu era um corpo morto ambulante. Não podia gerar vida dentro de mim. Edward era um morto, também. Nunca, de nenhuma forma aceitável, nós dois poderíamos conceber uma vida.
_O que diabos é isso? – A familiaridade com a linguagem mundana.
_Bea, venha aqui. – Edward segurou-me entre os braços, mas eu ainda sentia meu corpo se mover. Eu tremia… e o movimento dentro de mim retornou. – Acalme-se, você pode ter um colapso. Vamos ver Carlisle… eu estou só supondo.
_Edward, eu não posso ter filhos. – Olhei para ele, mais irritada do que assustada. Eu estava definitivamente irritada. – Eu sou um monstro, você sabe disso?
_Você não é. – Ele me beijou os cabelos. – Você é aquela que eu amo… tudo que fizemos até agora foi arriscado… havia a possibilidade, porque ninguém conseguiu descartá-la. Você provavelmente pode gerar filhos, e você provavelmente está grávida, agora.

Antes que eu pudesse livrar-me de seus braços para protestar mais uma vez, o quarto foi invadido por Alice. Secretamente, agradeci por ter conseguido forças para vestir-me.
_Eu estou chocada. – Alice disse, voz visivelmente perturbada. – Edward, diga-me que você não chegou à mesma conclusão que eu?
_Sim, eu cheguei. – Ele me mantinha presa a ele. – Parece meio lógica… desde quando?
_Eu vi ontem à noite. Mas eu me recusei a acreditar… porém agora a visão veio mais precisa.
_Desde quando?
_Não sei… mas a gestação não será longa.
_Isso é mesmo verdade? – Eu me desprendi dos braços de Edward e voltei-me para Alice, que não sabia se sorria ou gritava de medo. Eu estava apavorada, imaginava como se sentiam os vampiros. – Eu estou mesmo gerando um filho?
_Sim. – Alice confirmou, balbuciando.
_Eu preciso sair. – Caminhei para a porta. – Edward, eu preciso sair… sozinha. – Eu já o sentia próximo a mim, mas eu precisava de um tempo. – Nada vai me acontecer, não vou me afastar muito. Por favor, deixe-me.

Eu vi quando Alice entrou na frente do irmão, assentindo com a cabeça. Edward resignou-se, e me deixou sair pela porta dos fundos, rumo à trilha na floresta. Alice devia saber que nada me aconteceria, ela só precisava que Edward aceitasse aquilo. Eu tinha que ficar sozinha, mesmo que a vertigem me acometesse novamente. Eu precisava raciocinar sobre tudo aquilo. Um fato tão simples se tornou tão enormemente grande que eu não sabia como lidar com ele. Antes, uma vertigem. Depois, uma gestação. Pus-me a caminhar por entre as árvores, mãos na cabeça, sem muita noção de para onde ir. Eu não podia afastar-me, prometera a Edward. Mas como me controlar?

Eu carregava ali, dentro de mim, uma vida. Aquilo não fazia sentido algum. Eu estava morta. Era como eu considerava, era o que eu sabia. Eu fora transformada em um ser imortal quando tinha 20 anos, e desde então a minha vida se resumiu à clausura total. Eu estava morta. Edward também. Mas ambos geramos um filho. Não, nada fazia sentido. Dois organismos mortos não podiam dar vida a outro, podiam? O quanto aquilo desafiava as leis da ciência? O quanto aquela concepção poderia desafiar o lógico, o racional, o óbvio?

E então eu me dei conta de que tudo na minha existência era contrário às leis da ciência.

Mortos não andam, comem ou falam. Seres míticos são lendas que os humanos contam aos seus filhos, para amedrontá-los. Eu era uma fábula, um conto de terror. Se eu mesma não devia existir, que diferença faria a existência de meu filho? Se eu era uma aberração, conceber uma criança não poderia ser nada tão mais errado… era só outro item anormal na minha existência surreal. Além de me alimentar de sangue e ser imortal. O quanto um filho poderia causar de estranheza? Eu mesma era contra as leis da ciência. Eu era contra qualquer tipo de lei existente. E assim o era Edward. Até que ponto nós dois concebermos uma criança poderia ser considerado mais estranho do que toda a nossa existência já era?

E foi quando meu ventre mexeu-se mais uma vez que eu raciocinei a única coisa que realmente importava. Se eu estava grávida – e daquilo eu não poderia duvidar uma vez que a confirmação viera de Alice, eu carregava em meu ventre um pedaço de Edward. Seus genes. Eu tinha dentro de mim um pedaço do vampiro que eu amava; o vampiro que me havia dado sentido à ‘vida’. Ali, dentro de mim. Edward. Era só isso que importava.

Voltei para a casa para encontrar Edward no jardim, ansioso, visivelmente nervoso. Eu nunca o vira daquela forma.
_Beatrice. – Ele me abraçou, de uma forma também desconhecida. Não havia desejo, apenas preocupação. Ele me abraçou exatamente como se aquela fosse a última vez que ele fosse me abraçar, como se toda a certeza que residia dentro dele se tivesse esvaído. – Você demorou…
_Não tanto assim, Edward. – Meus braços envolveram sua cintura bem devagar. – Eu precisava de espaço para pensar.
_Carlisle quer te examinar. – Ele disse. – Ligamos para ele; ele considera que precisa fazer vários testes em você. Ele quer ter certeza… quer garantir que está tudo bem. Se você quiser, nós podemos…
_Você não pode nem pensar no que eu acho que você está pensando. – Falei, respirando fundo. Eu tinha certeza que sabia exatamente o que se passava na cabeça de Edward, porque a mesma coisa já tinha se passado na minha, durante a caminhada na floresta. Todas as coisas, possíveis e impossíveis, passaram por minha cabeça, era fato. Eu pensei em todas as possibilidades, existentes ou não, para o que estava acontecendo comigo. Uma forma de eliminar aquilo, uma forma de me livrar, uma forma de fazer dar certo…
_Agora você é quem lê as mentes? – Ele riu, tentando me distrair.
_Edward, eu não estou brincando. – Falei seriamente, e ele me olhou. Tentativa frustrada, então. Pobre Edward, lidando com uma híbrida alucinada. – Não pense em nada que não seja alegre e feliz. Eu estou me sentindo em um mundo mágico e irreal, e só estou esperando para acordar. Nada faz menos sentido do que eu carregando uma criança no ventre, mas eis que isso aconteceu. Eu não podia estar me sentindo mais completa e assustada do que estou agora.
_Você… você está bem quanto a isso? Quanto a… ter um filho meu?
_Claro que sim! – E eu estava aborrecida novamente. – Edward Cullen, eu te amo! Como poderia não estar bem em relação a isso? Sim, eu estou aterrorizada. Eu estou apavorada, e uma fragilidade que eu desconhecia se abateu sobre mim. Mas ao mesmo tempo é como se eu fosse o ser mais abençoado que existe na Terra.

Edward manteve-me pressionada contra seu corpo por algum tempo, mais do que eu poderia suportar sem respirar. Mas ele não pretendia me prejudicar, ele só estava tentando restabelecer a certeza. Ele estava tentando restabelecer o sentimento correto dentro de si, e não o pavor inicial da descoberta. Com um cuidado exagerado, ele me levou até o hospital de Carlisle, dirigindo o seu Volvo em uma velocidade inimaginável. Tão devagar que carros humanos passaram por ele. Mas eu não reclamaria, nem tinha do que reclamar. Ele estava simplesmente sendo cuidadoso comigo, e eu não sabia nada sobre aquela condição em que me encontrava.

No hospital, Carlisle parecia tão perdido quanto todos. Ele não sabia por onde começar os testes, e nem que tipo de testes meu organismo poderia permitir. Ele sabia que eu rejeitava agulhas, e que a simples entrada de um objeto externo potencialmente nocivo faria com que meu corpo o expelisse, sem sobreavisos. O primeiro exame, então, foi físico. Carlisle pediu que eu me deitasse em sua mesa e que elevasse minha blusa, a fim de que ele pudesse observar o meu ventre. Eu tinha certeza que aquela manifestação – o inchaço em minha barriga – não estava ali dois ou três dias atrás. O médico, delicadamente, pressionou os dedos contra minha pele, fazendo o inchaço aumentar e diminuir. Senti algo mexer novamente, e aquilo me incomodou.

_Ora vejam. – Carlisle sorriu, aquele sorriso que não identificava se ele estava triste ou feliz. – Realmente, tem algo aqui.
_Eu… – Edward aproximou-se, sempre ansioso demais. Eu tentava de todas as formas agir como Jasper, acalmando a situação, mas nunca conseguia. Por mais tranquila que eu tentasse aparentar, mais ansioso ele se mostrava. – Posso?

Carlisle deu espaço para que Edward se aproximasse mais, e passou os dedos suavemente por sobre meu ventre.
_Ele se mexe bastante. – O médico então riu, e eu senti um alívio redundante. Carlisle segurou uma das mãos de Edward e a colocou exatamente por sobre o local que estava se mexendo há segundos atrás. O toque frio de Edward demonstrava apreensão, mas aos poucos ele relaxou e deixou seus dedos acariciarem minha pele, enquanto sua outra mão livre segurava a minha. Novamente, eu senti algo mexer dentro de mim. Daquela vez, um desconforto aparente que logo passou.
_Oh. – Edward puxou a mão, instintivamente. Seus olhos não me faziam compreender suas emoções, e novamente eu estava apreensiva. – Isso é… uma confirmação, certo?
_Sim, não preciso de muitos exames para constatar uma gravidez quando o bebê se mexe.

Bebê. Meu cérebro não absorveria aquela palavra muito facilmente. Bebê. Senti uma onda de calor me invadir, calor que eu não sentia, calor que era humano demais, e imediatamente minha consciência pretendeu deixar-me. Tudo ficou escuro, a imagem de Edward desapareceu e meus dedos afrouxaram os seus. O mundo girava freneticamente, e eu não imaginava como fazê-lo parar. A vertigem. Retomei os sentidos alguns instantes depois, e me peguei nos braços de Edward, os dois vampiros me olhando com total apreensão.
_Você vai fazer muito isso? – Edward respirava lentamente. – Avise-me, Bea… para que eu me prepare.
_Acalme-se Edward… mulheres grávidas, nesse estágio, geralmente sofrem desmaios e enjôos freqüentes.
_Que estágio? – Eu perguntei, ainda tentando absorver tudo.
_Bem, o que Alice falou sobre a gravidez? – A pergunta era para Edward.
_Que a gestação não seria longa.
_Então… eu considero que não será mesmo longa. Beatrice está grávida demais… e como não observamos essas mudanças em seu corpo antes, é provável que ela tenha acumulado vários meses de gravidez em apenas semanas. Se eu estiver correto, ela está demonstrando uma gravidez de umas 16 semanas…
_Tudo isso?
_Pode ser uma semana por mês, da gestação humana. É uma possibilidade, mas não existem muitos casos como o seu para podermos pesquisar, Bea. Eu teria que fazer diversos testes, infelizmente alguns que seu organismo não permite.

Carlisle era mesmo muito sábio. Desde que Edward o avisara sobre a gravidez, durante o meu afastamento repentino pela manhã, ele havia feito pesquisas. Ele precisava saber tudo sobre meu caso, mas aparentemente os humanos – e os vampiros – não tinham muitas situações semelhantes para retratar. E não era por menos, os híbridos foram banidos do território humano por séculos. E ainda o eram. Como poderia haver relatos de híbridos engravidando, seja de vampiros ou humanos? Sequer os vampiros eram autorizados a vagar sob o sol, então realmente, os relatos não seriam muitos.

_Carlisle… – Edward ajudou-me a levantar, e se aproximou do pai. – Como poderemos contabilizar os riscos?
_Eu também não sei. – O médico considerou, franzindo as sobrancelhas. – Como não sei nada sobre essa gravidez, não posso considerar os riscos. Existem diversos relatos demoníacos que tratam da morte, da geração de monstros. Até mesmo do anticristo. Mas todos esses relatos dão conta de humanos… e Bea é muito mais forte do que qualquer humano. A sua capacidade extraordinária de regeneração também torna a coisa muito mais intrigante.
_Eu não me preocupo com isso. – Falei, segurando firme a mão de Edward. – Creio que o único risco que corremos agora é o fato de aumentarmos a família Cullen em um indivíduo.
Minha brincadeira, sarcástica o suficiente para o momento, fez com que Carlisle desse uma gargalhada. Edward não sorriu, apenas olhou para mim daquela forma que só ele sabia.

E meu vampiro não falou mais comigo, nem depois que chegamos em casa. Nem depois que a vertigem me acometeu mais uma vez, e eu precisei sentar no sofá branco enorme da sala. Ele ficou apenas ao meu lado, como se me velasse.
_Isso não pode ser verdade! – A voz de Rosalie foi ouvida pela porta.
_Calma, Rose… digamos que Alice viu, Carlisle confirmou, e agora eu estou doido para checar. – Emmett vinha logo atrás.
_Cale a boca, Em! – Rosalie parecia irritada. – Eu não acredito que essa híbrida está… grávida!!!
Sempre que Rosalie desejava despejar sua animosidade sobre mim, ela recordava a minha origem. Híbrida era uma palavra de baixo calão, para ela. Eu não sabia os motivos da irritação de Rosalie, mas ela simplesmente passou por mim bastante insatisfeita, e me olhou com ferocidade. Edward cerrou os punhos e encarou a irmã de volta, em uma daquelas conversas silenciosas que eu só o via ter com Alice. Emmett deu de ombros, como que pedindo desculpas pelo comportamento exagerado da companheira. Em poucos segundos, Alice e Jasper chegaram, com um humor completamente diferente.

_Beaaaa! – Alice jogou-se para o meu lado, abraçando-me com força. Edward novamente cerrou os punhos, mas Alice só mostrou-lhe a língua. – Como você está se sentindo? E o bebê? O que Carlisle disse? Vamos, eu não leio mentes…
_Eu estou bem. – Disse, desvencilhando-me do abraço. – E o… bebê…
_Difícil aceitar, hem? – Ela compreendeu. Jasper deu uma risadinha, e Edward manteve-se impassível. – Não se preocupe… vai ficar tudo bem, eu sei.
Alice era um grande alívio. Quando ela afirmava que tudo ia ficar bem eu me sentia como se ela fosse a profeta do apocalipse, sem prever o apocalipse, claro.
_Jasper, podemos nos falar? – Edward finalmente disse alguma coisa, e saiu com o irmão para a cozinha. A principal função da cozinha podia ser aquela. O refúgio de Edward para falar algo privado, escondido de mim. Alice percebeu que eu me senti aborrecida com algo, e sentou-se ao meu lado tão logo os rapazes deixaram a sala.
_Não se incomode, Bea. Ele… vai superar. Assim como você.
_Alice… Rosalie também não parece satisfeita com o que aconteceu. – Sim, eu estava aborrecida.
_Rosalie… era de se esperar.
_Por quê?
_Porque Rosalie sempre sonhou em ter filhos, quando humana. Agora ela é vampira, e não pode mais. Vampiros não geram filhos… pelo menos, não as fêmeas. Agora, você… você não é um vampiro. Por mais que você seja parecida com um, você tem uma grande parte humana. Se corpo é muito humano. Você nem reluz ao sol. Então, você pode abrigar um bebê durante uma gestação.
_E ela então me culpa porque eu estou grávida.
_Ela também vai superar, Bea. Todos vão… o que está acontecendo aqui é chocante. É algo totalmente inesperado… mas é bom.
_Você acha que… eu corro algum risco? – Eu tinha que perguntar, até mesmo para forçar Alice a pensar naquilo e Edward acalmar-se.
_Se corresse, eu teria visto.
_E… você já sabe como isso vai acabar?
_Sim!
_Sabe se meu bebê será…
_Menino ou menina? – As palavras que me faltavam sempre sobravam em Alice. Ela era vivaz demais, ela era fenomenal. Se eu não soubesse que ela era uma vampira, eu juraria que Alice era uma humana. – Sim, eu sei! – Ela se levantou, e riu. – Mas nem pense que eu vou te contar, Beatrice Caldwell! Nem você nem Edward ficarão sabendo… será uma surpresa!!

Alice saiu cantarolando pela casa, a fim de resgatar Jasper das garras cruéis de Edward. Eu me recostei no sofá, respirando lentamente. Meu ventre estava agitado, eu sentia o… bebê se mexer constantemente. Talvez o meu estado de espírito o afetasse. Era um talvez, porque eu nada entendia de proles. Mas eu estava tão agitada e tudo estava acontecendo tão caoticamente que era de se esperar que o… bebê… estivesse sentindo o ambiente. Edward deixou a cozinha, subiu as escadas, demorou-se por alguns minutos e depois retornou para o meu lado. Eu estava definitivamente aborrecida, mas tentando me manter calma. Minha mão direita repousava sobre meu ventre, como que embalando o que estivesse ali dentro. Ele me observou, por alguns instantes, e se ajoelhou à minha frente.
_Bea… – ele deitou a cabeça em minhas pernas, visivelmente chateado. – Desculpe-me por deixar-te assim. – Suas mãos enlaçaram minha cintura, e eu senti novamente o alívio bom que ele me causava. Não era o mesmo alívio de Alice, o alívio ‘tudo-vai-ficar-bem’. Era o alívio ‘mesmo-que-nada-fique-bem-estarei-com-você’. Eu nem sabia qual deles preferia. – Eu só… desculpe-me, eu só precisava do meu tempo para colocar algumas coisas no lugar.
_Tudo bem. – Eu acariciei seus cabelos de fogo. – Muita coisa de uma só vez, certo?
_Sim, muita coisa. – Ele elevou seu olhar, e concentrou-se em meus olhos púrpura por um instante. – Eu nem tive tempo de dizer… bem, eu acho que não tive tempo de processar o quanto tudo isso é… importante para mim. Eu te amo e pretendo amar por toda a minha existência. Agora, você está me proporcionando algo que eu nunca imaginei ser possível… eu não tive tempo de processar como eu sou feliz.

Os lábios de Edward alcançaram os meus no mesmo instante em que eu me curvei para ele. Aquela era a sensação que eu desejava sentir por toda a eternidade, os lábios de Edward nos meus.


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