NU E PJ: O Ladrão De Raios escrita por The Amazing Spider Green


Capítulo 7
De certa forma, faço uma garota sair de uma árvore


Notas iniciais do capítulo

Tá aqui o capítulo. Como eu recebi muitos reviews no capítulo anterior (e espero que continue assim), resolvi continuar com a história. Pois bem, leiam e divirtam-se.
Ah, e olhem para as notas finais. Elas são importantes.



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N
A
R
U
T
O

A notícia do incidente no banheiro se espalhou na mesma hora. Aonde quer Percy e eu fôssemos, os campistas apontavam para nós e murmuravam algo sobre água de vaso sanitário e bafo quente. Não que eu me importasse muito.

Sasuke, Sakura e Annabeth nos mostraram mais alguns lugares: a oficina de metais (onde as crianças forjavamas próprias espadas, o que, pessoalmente, acho muito irresponsável... Brincadeira! É claro que acho legal. Eu sou Uzumaki Naruto, afinal de contas), a sala de artes e ofícios (onde sátiros jateavam com areia uma estátua gigante de um homem-bode, o que me fez arquear uma sobrancelha) e a parede para escalada, que na verdade consistia em duas paredes que se sacudiam violentamente, deixavam cair rochas, espalhavam lava e colidiam uma com a outra se a gente não chegasse ao topo bem depressa.

Eu já amei o lugar.

Finalmente retornamos ao lago de canoagem, de onde a trilha levava de volta aos chalés.

— Temos treinamento — disse Annabeth secamente. — O jantar é às sete e meia. Vocês só têm de seguir o pessoal do chalé até o refeitório.

— Gente, desculpe pelos sanitários — disse Percy, realmente parecendo arrependido.

— Tudo bem. — Sakura-chan lhe deu um sorriso reconfortante.

— Não liga. — Sasuke deu de ombros.

— Não importa — disse Annabeth, carrancuda.

— Não foi minha culpa.

Nós o olhamos céticos.

— Lamento informá-lo, ó, magnífico Senhor Supremo do Banheiro, mas sim, foi sua culpa — comentei enviando um sorrisinho para ele.

Ele me olhou irritado. Mas ele sabia que havia feito a água jorrar no banheiro. Mesmo eu não entendendo como. E pelo olhar em seu rosto ele sabia tanto quanto eu.

— Vocês dois precisam falar com o Oráculo — disse Annabeth para Percy e eu.

— Quem? — perguntei. Eu já tinha ouvido esse nome antes enquanto estudava mitologia, só não me lembrava o que era.

— Não quem. O quê. O Oráculo. Vou pedir a Quíron.

Percy olhou para o lago, como se ele pudesse lhe dar a resposta. Segui seu olhar. O quê? Estava desesperado por respostas diretas, tá legal?

Eu não esperava que alguém estivesse olhando de volta para mim no fundo, portanto meu coração deu um pulo quando notei duas meninas adolescentes sentadas de pernas cruzadas na base do píer, cerca de seis metros abaixo. Vestiam jeans e camisetas verdes cintilantes, e os cabelos castanhos flutuavam soltos em volta dos ombros enquanto peixinhos passavam por entre eles. Elas sorriram e acenaram para Percy como se ele fosse um amigo há muito perdido.

Ele devolveu o aceno.

— Não as encoraje — advertiu Annabeth. — As náiades são flertadoras incontroláveis.

— Alguém está com ciúmes — comentei divertidamente. Annabeth me olhou irritada.

— Náiades — repetiu Percy, estupefato. — Já chega. Quero ir para casa agora.

— Cara, depois de toda a nossa turnê, vendo o deus do vinho — que por falar nisso, é um chatão —, um centauro com mais de três mil anos de idade e ouvindo sobre como os deuses gregos ainda estão vivos, agora você decide surtar? — eu disse arqueando a sobrancelha.

Percy me encarou irritado. Notei que as pessoas estavam fazendo muito isso hoje.

Annabeth franziu as sobrancelhas.

— Você não percebe, Percy? Você está em casa. Este é o único lugar na terra seguro para crianças como nós.

— Você quer dizer crianças mentalmente perturbadas? — rebateu ele.

— Que têm sérios problemas com nomes e outras coisas? — completei.

— Annabeth quer dizer não humanas, Naruto, Percy. Não totalmente humanas, para ser mais específico. Meio humanas — disse Sakura-chan.

— Meio humanas e meio o quê? — perguntamos.

— Acho que vocês sabem.

Eu não queria admitir, mas sabia, sim. Senti um formigamento nos membros, uma sensação que às vezes me tomava quando lia sobre o meu pai.

— Deusas — dissemos ao mesmo tempo. — Meio deusas.

Sasuke assentiu.

— Seu pai não está morto, Percy. Tampouco o seu, Naruto. Eles são dois dos doze deuses olimpianos.

— Isso é... loucura. — Percy parecia estupefato.

— Será? Qual é a coisa mais comum que os deuses faziam nas velhas histórias?

— Transavam até não poderem mais — respondi sorrindo maroto.

— Correto — concordou Annabeth. — Eles andavam por aí se apaixonando por seres humanos e e tendo filhos com eles. Vocês pensam que eles mudaram os hábitos nos últimos poucos milêniso?

— Mas isso são apenas... — Eu sabia que Percy ia dizer mitos de novo. Ele pareceu se lembrar do aviso de Quíron de daqui a dois mil anos nós poderíamos ser considerados mitos. — Mas se todos aqui são meio deuses...

— Semideuses — disse Annabeth. — Esse é o termo oficial. Ou meio-sangues.

— Então quem é seu pai?

As mãos dela se apertaram em volta da balaustrada do píer. Tive a sensação de que Percy acabara de tocar em um assunto delicado. Só por via das dúvidas, me afastei uns bons poucos metros de Annabeth. Vai que ela estava na TPM.

— Meu pai é um professor em West Point — disse ela. — Não o vejo desde que era muito pequena. Ele ensina história americana.

— Ele é humano — disse Percy.

— O quê? Está pensando que tem de ser um deus homem encontrando uma mulher humana atraente, e não o contrário? Sabe que isso é machismo.

— Puxa, mulher, calma. Percy não quis dizer isso nesse sentido — eu disse, me colocando em frente a Percy, como uma barreira. — Ele só está confuso. Acredite em mim, se tem uma coisa que Percy não é, é machista. — Ela relaxou. Aproveitei para provocar um pouco. — Puxa, você leva o lance "orgulho feminino" muito a sério, sabia?

Ela logo me olhou com um tique no olho. Estranho, as pessoas sempre fazem isso quando estão perto de mim.

— Então quem é sua mãe? — perguntou Percy, dessa vez mais cauteloso.

— Chalé 6.

— O que significa?

Annabeth endireitou o corpo. Hu-hu, diva.

— Atena. Deusa da sabedoria e da guerra.

O.k., pensei. Por que isso não me surpreende?

— E os pais ou mães de vocês? — perguntei a Sasuke e Sakura-chan. Depois do que vi com Annabeth, não queria arriscar ser chamado de machista e correr o risco de perder a cabeça.

Sakura-chan parecia quase... envergonhada?

— Afrodite, deusa do amor — respondeu ela. — Mas recebi uma bênção de Atena, por isso sou tão inteligente, como os outros dizem.

Isso também não me surpreende, pensei.

Sasuke olhou para o chão quase que... ressentido.

— Indeterminado — resmungou tão baixo que talvez eu não tivesse nem ouvido se não tivesse minha superaudição.

Lhe dei uma batida no ombro e um olhar solidário. Eu sabia como ele se sentia sobre não saber quem seu pai era, afinal, eu nem sabia quem meu pai era antes de ser enviado para cá... Na verdade, eu nem sabia ainda quem ele era de verdade. Não sabia que deus olimpiano ele era.

— E nossos pais? — perguntei, tentando descontrair o clima tenso.

— Indeterminados — disse Sakura-chan —, como nós lhe contamos antes. Ninguém sabe.

— A não ser minha mãe. Ela sabia quem meu pai é — disse Percy.

Eu fiquei triste, pois talvez minha mãe soubesse quem é meu pai. Mas ela estava morta. Não podia me responder.

— Talvez não, Percy. Os deuses nem sempre revelam sua identidade — disse Annabeth.

— Meu pai teria revelado. Ele a amava.

Annabeth deu a ele uma olhada cautelosa. Eu sabia que ela não queria acabar com as ilusões de Percy.

— Talvez você esteja certo. Talvez ele vá enviar um sinal. Talvez ambos os seus pais vão mandar um sinal. Esse é o único modo de saber com certeza: seus pais tem de mandar a vocês um sinal reclamando vocês como filhos. Às vezes isso acontece.

— Quer dizer que às vezes não acontece? — perguntamos juntos.

Annabeth correu a palma da mão pela balaustrada. Sakura-chan ficou olhando para um Sasuke ressentido com pena, que fuzilava ainda mais o chão com os olhos.

— Os deuses são atarefados. Eles têm uma porção de filhos, e nem sempre... Bem, às vezes eles não se importam conosco, Naruto, Percy. Eles nos ignoram. — Sakura-chan continuava fitando Sasuke enquanto dizia aquilo.

Pensei em algumas das crianças que tinha visto no chalé de Hermes, adolescentes que pareciam mal-humorados e deprimidos, como se estivessem esperando por um chamado que nunca viria. Conhecera crianças assim na Academia Yancy, descartadas para internatos por pais ricos que não tinham tempo para lidar com elas. Agora, saber que os deuses eram assim...

Senti muita raiva dos deuses. Como eles podiam fazer isso com seus próprios filhos? Suas próprias carnes e sangues? Que tipo de pais eles eram?

— Ótimo. Então eles não mudaram muito nos últimos milênios — comentei, suspirando.

Um trovão ribombou no céu.

— Acho que você não deveria dizer isso. Os deuses são meio... sensíveis. — Sakura-chan fitava o céu com medo.

— Eu estou pouco me lixando pra essa merda. Eles deveriam ter mais responsabilidade, certo? São deuses. Devem mostrar o exemplo.

Mais um trovão.

— Naruto, por favor — Sakura-chan implorou com seus olhos cor-esmeralda, que quase me fizeram derreter. (sim, ainda tenho uma queda por ela. Me processe!) Mas eu me recompus e, infelizmente, acenei com a cabeça, mostrando que não diria mais nada. Mas ainda continuei olhando para o chão com mais intensidade ainda que Sasuke, cerrando os punhos e rangendo os dentes, tentando controlar meu chakra demoníaco.

— Então estamos encalhados aqui — disse Percy. — É isso? Pelo resto da nossa vida?

— Depende — disse Annabeth. — Alguns campistas só ficam no verão. Se você é filho de Afrodite ou Deméter, provavelmente não é uma força realmente poderosa — Sakura-chan deu a ela um olhar do mal, e Annabeth rapidamente acrescentou —, claro, sem ofensa, Sakura. Os montros podem ignorá-los, e então vocês podem se arranjar com alguns meses de treinamento de verão e viverem no mundo mortal pelo resto do ano. Mas, para alguns de nós, sair é perigoso demais. Temos de ficar o ano inteiro. No mundo mortal, atraímos monstros. Eles percebem nossa presença. Vêm nos desafiar. Na maioria das vezes eles nos ignoram até termos idade suficiente para causar problemas, cerca de dez ou onze anos, mas depois disso muitos dos semideuses vêm para cá ou são mortos. Alguns conseguem sobreviver no mundo exterior e se tornam famosos. Acreditem, se lhes contássemos os nomes vocês os conheceriam. Alguns nem sequer dão conta de que são semideuses. Mas poucos, muito poucos são assim.

— Então os monstros não podem entrar aqui? — perguntou Percy.

Os três sacudiram a cabeça.

— Não, a não ser que sejam intencionalmente mantidos nos bosques ou convocados por alguém de dentro — respondeu Sasuke.

— Por que alguém ia querer convocar um monstro?

— Para a prática de lutas. Para pregar peças — respondeu Annabeth.

— Pregar peças? — Dessa vez fui eu quem perguntei, e animado. Ei, eu gosto de pregar peças.

— A questão — disse Sakura-chan — é que as fronteiras são fechadas para manter os mortais e os montros de fora. Do lado de fora, os mortais olham para o vale e não veem nada de inusitado, apenas plantações de morangos.

— Então... você é uma campista de ano inteiro, Annabeth? — perguntamos Percy e eu. Eu — e pelo visto Percy — sabia que Sasuke e Sakura-chan não eram campistas de ano inteiro, pois eles estão aqui desde os dez e ainda viviam comigo em Konoha.

Annabeth assentiu. De dentro da gola da camiseta ela puxou um colar de couro com cinco contas de argila de cores diferentes. Era exatamente como o de Luke, só que o de Annabeth também tinha um grande anel de ouro enfiado, como um anel de faculdade — eu vi algumas fotos de estudantes de lá quando estava na internet, dentro da Academia Yancy.

— Estou aqui desde que tinha sete anos — disse ela. — Todo mês de agosto, no último dia da sessão de verão, a gente ganha uma conta por sobreviver mais um ano. Estou aqui há mais tempo que a maioria dos conselheiros, e eles estão todos na faculdade.

— Ah, isso deve te dar tanto orgulho. — Limpei uma lágrima do meu olho enquanto envolvia um braço nos ombros de Annabeth. Ela me deu tapa.

— Por que veio tão jovem? — perguntou Percy.

Ela girou o anel no colar.

— Não é da sua conta.

Ui. Dureza.

— Ah. — Ficamos ali por um minuto em um silênico constrangedor.

— Então... Nós poderíamos simplesmente sair andando daqui agora mesmo, se quiséssemos? — perguntei, tentando quebrar o silêncio.

— Seria suicídio, mas vocês poderiam, com a permissão do Sr. D ou de Quíron. Mas eles não dariam permissão até o final da sessão de verão, a não ser...

— A não ser? — repetiu Percy.

— Que lhes seja concedida uma missão. Mas isso dificilmente acontece. Na última vez...

A voz dela foi sumindo. Pude perceber pelo seu tom de voz que a última vez não tinha ido muito bem.

— Antes, quando estava doente no quarto — disse Percy —, quando você me dava de comer aquela coisa...

— Ambrosia.

— É. Você me perguntou algo sobre o solstício de verão.

Arqueei uma sobrancelha, acompanhado por Sasuke e Sakura-chan. Os ombros de Annabeth se contraíram.

— Então você sabe alguma coisa?

— Bem... não. Na nossa antiga escola, Naruto e eu ouvimos por acaso Grover e Quíron conversando sobre isso. Grover mencionou o solstício de verão. Ele disse algo como não termos muito tempo, por causa do prazo final. O que isso queria dizer?

Ela apertou os punhos.

— Eu gostaria de saber. Quíron e os sátiros, eles sabem, mas não contam para mim. Algo está errado no Olimpo, algo muito importante. Na última vez em que estive lá, parecia tudo tão normal.

— Você esteve no Olimpo? — perguntei incrédulo.

— Alguns de nós, campistas de ano inteiro... Luke, Clarisse, eu e poucos outros... fizemos uma excursão durante o solstício de inverno. É quando os deuses fazem sua grande assembleia anual.

— Mas... como chegou lá? — perguntou Percy.

— Pela Ferrovia de Long Island, é claro. Você desce na Estação Penn. Empire State, seiscentésimo andar. — Ela olhou Percy como quem tinha certeza de que ele já sabia disso. — Você é nova-iorquino, certo?

— Ah, com certeza. — Fiquei confuso, pois Percy me dissera que o Empire State tinha apenas cento e dois andares. Resolvi não comentar isso.

— Logo depois da visita — continuou Annabeth —, o tempo ficou esquisito, como se os deuses tivessem começado a brigar. Uma ou duas vezes desde então, ouvi sátiros conversando.

— Annabeth acha que algo importante foi roubado — continuou Sasuke, sério. — E também acha que, se não for devolvido até o solstício de verão, vai haver problemas.

— Quando vocês vieram, eu estava esperando... quer dizer... Atena pode se entender com quase qualquer um, a não ser Ares. E, é claro, ela tem uma rivalidade com Poseidon. Mas, quer dizer, fora isso, pensei que poderíamos trabalhar juntos. Pensei que vocês pudessem saber alguma coisa.

Sacudimos a cabeça. Eu com certeza gostaria de poder ajudá-la, parecia ser uma boa pessoa — apesar do orgulho e arrogância —, mas estava com fome, cansado e mentalmente sobrecarregado demais para fazer mais perguntas.

— Preciso conseguir uma missão — murmurou Annabeth. — Eu não sou jovem demais. Se eles ao menos me contassem qual é o problema...

— Na verdade, você é jovem demais sim — eu disse, e ela me lançou um olhar do mal. — Ei, você tem a minha idade, e eu admito ser jovem. E por causa disso, eu tento saber das coisas à força. — Estralei os dedos.

O cheiro de churrasco infestou minhas narinas, e comecei a babar. Claro, churrasco não era tão bom quanto ramén, mas servia. O estômago de Percy roncou de repente.

— Vão em frente, nós alcançaremos vocês depois — disse Annabeth para nós.

— Eu vou com eles — disse Sasuke.

Nós três deixamos Sakura-chan e Annabeth no píer, correndo os dedos pela balaustrada como se estivessem desenhando um plano de batalha.

* * *

De volta ao chalé 11, todo mundo estava falando e se divertindo, esperando o jantar. Pela primeira vez, notei que muitos campistas tinham feições parecidas: narizes pontudos, sobrancelhas arqueadas, sorrisos maliciosos. Eram o tipo de crianças que os professores classificariam como encrenqueiros. Felizmente, ninguém prestou atenção em nós quando fomos até nossos lugares no chão e nos deixamos cair com os chifres de minotauro. Sasuke disse que tinha que ir, portanto, Percy e eu estávamos sozinhos em um lugar cheio de ladrões profissionais. Nada para nos preocuparmos.

O conselheiro, Luke, se aproximou. Ele também tinha a aparência familiar de Hermes. Estava desfigurada pela cicatriz na face direita, mas o sorriso estava intacto.

— Arranjei sacos de dormir para vocês, Naruto, Percy — disse ele. — E, aqui, furtei para vocês alguns artigos de toalete da loja do acampamento.

Automaticamente já gostei do cara. Qualquer um que furtasse, para mim, era muito bom.

Percy e eu dissemos:

— Obrigado.

— Sem problemas. — Luke sentou-se entre nós dois, descansando as costas contra a parede. — Primeiro dia difícil?

— Meu lugar não é aqui — disse Percy. — Nem mesmo acredito em deuses.

Balancei a cabeça, de acordo.

— É — disse ele. — Foi assim que todos nós começamos. E depois que você começa a acreditar neles? Não fica nem um pouco mais fácil.

A amargura em sua voz me fez arquear uma sobrancelha, porque Luke parecia ser o tipo de cara despreocupado. Parecia capaz de lidar com qualquer coisa. Se parecia... comigo.

— Então seu pai é Hermes? — perguntou Percy.

Ele puxou um canivete de mola do bolso de trás e, por um momento de superproteção, pensei que fosse destripar Percy, mas ele apenas raspou o barro da sola da sandália.

— É, Hermes.

— O mensageiro com asas nos pés — eu disse, divertido.

Luke sorriu para mim.

— É ele. Mensageiros. Medicina. Viajantes, mercadores, ladrões. — Os ladrões são demais, baby! — Qualquer um que use as estradas. É por isso que vocês estão aqui, desfrutando a hospitalidade do chalé 11. Hermes não é exigente com relação a quem apadrinha.

Me senti um pouco insultado, pois Luke basicamente acabara de me chamar de joão-ninguém. Mas depois descartei minha raiva, pois ele provavelmente só tinha muita coisa na cabeça.

— Você já encontrou seu pai? — perguntamos Percy e eu.

— Uma vez.

Esperamos. Se ele quisesse nos contar, contaria. Aparentemente não. Imaginei se a história tinha alguma coisa a ver com como ele conseguira aquela cicatriz.

Luke ergueu os olhos e conseguiu sorrir.

— Não se preocupem com isso, gente. A maioria dos campistas aqui é boa gente. Afinal, somos uma grande família, certo? Cuidamos uns dos outros.

De repente me senti feliz. Família. Uma palavra que eu nunca havia ouvido ou dito sobre mim. Eu sempre fui solitário, então ouvir aquilo me animou um pouco. E Luke foi uma das únicas pessoas que tratou Percy e eu bem de verdade. Nos dera as boas-vindas ao chalé. Até mesmo furtara alguns artigos de toalete, o que era a coisa mais simpática que alguém fizera por nós o dia inteiro.

Percy perguntou de repente:

— Clarisse, de Ares, debochou sobre eu ser um dos "Três Grandes". Depois, Annabeth... ela falou duas vezes que Naruto ou eu poderíamos ser "o cara". Disse que Naruto e eu devemos falar com o Oráculo. O que quer dizer tudo isso?

Três Grandes? Os Três Grandes? Não, não podia ser. Eu sabia quem eles eram, mas... Percy ser um dos Três Grandes?

Luke fechou o canivete.

— Odeio profecias.

— O que quer dizer? — perguntei.

Seu rosto deu uma estremecida em volta da cicatriz.

— Digamos apenas que eu compliquei as coisas para todos os outros. Nos últimos dois anos, desde quando me dei mal em minha viagem ao Jardim das Hespérides, Quíron não autorizou mais nenhuma missão. Annabeth está morrendo de vontade de sair para o mundo. Ela importunou tanto Quíron que ele finalmente disse que já conhecia seu destino. Recebera uma profecia do Oráculo. Não quis contar tudo a ela, mas disse que Annabeth ainda não estava destinada a sair numa missão. Tinha de esperar até... alguém especial vir para o acampamento.

— Alguém especial? — perguntamos eu e Percy.

— Não se preocupem com isso, garotos — disse Luke. — Annabeth quer pensar que todo campista novo que chega aqui é o presságio que ela está esperando. Agora vamos, é hora do jantar.

No momento em que ele disse isso, uma trombeta soou a distância. Não sabia do que era.

Luke gritou:

— Onze, reunir!

O chalé inteiro, cerca de vinte de nós, formou fila no pátio. Enfileiramo-nos por ordem de antiguidade, portanto é claro que Percy e eu éramos os últimos. Vieram campistas também dos outros chalés, com exceção dos três vazios no fim e do chalé 8, que parecia normal durante o dia mas agora começava a ter um brilho prateado à medida que o sol se punha.

Marchamos colina acima até o pavilhão do refeitório. Sátiros vieram da campina e juntaram-se a nós. Náiades emergiram do lago de canoagem. Algumas outras meninas brotaram dos boques — e quando digo brotar, quero dizer brotar mesmo. Vi uma menina de nove ou dez anos formar-se a partir da lateral de um bordo e vir saltitando colina acima. Ninfas do bosque, talvez.

Ao todo, havia talvez uma centena de campistas, algumas dúzias de sátiros e uma dúzia de ninfas e náiades variadas. Puxa, se os campistas eram uma família, eu estava muito feliz por ter uma tão grande.

No pavilhão, tochas ardiam em volta das colunas de mármore. Um fogo central queimava em um braseiro de bronze do tamanho de uma banheira. Cada chalé tinha sua própria mesa, coberta com uma toalha branca com detalhes em roxo — eu preferia laranja. Quatro mesas estavam vazias, mas a do chalé 11 era superlotada. Tive que pegar um banco e me sentar ao lado de Percy, que estava espremido na ponta de um banco, com metade do traseiro para fora.

— Maldito — ele murmurou. — Por que não pensei nisso antes?

— Ahn, deixa eu pensar — eu disse, esfregando o queixo. — Porque eu sou incrível enquanto você é um idiota.

— Se eu pudesse, arrancaria suas bolas — respondeu Percy.

— Eu também, meu amigo — eu disse colocando um braço em volta de seu pescoço, dando batidinhas em seu ombro. — Eu também.

Já dá pra ver como Percy e eu somos amigões, né?

Vi Grover sentado à mesa 12, e um par de meninos loiros gorduchos bem parecidos com o Sr. D. Quíron ficou em pé ao lado, pois a mesa de piquenique era um pouquinho pequena para a bunda de cavalo dele.

Annabeth sentou-se à mesa 6 com um bando de crianças atléticas de aparência séria, todas com olhos cinzentos e cabelo loiro da cor do mel.

Sakura estava sentada à mesa 10 com um bando de garotas e garotos de boa aparência, com características variadas, a maioria com um ar esnobe, exceto uma, que tinha cabelos negros e grandes olhos castanhos. Nenhuma delas parecia ser o meu tipo.

Sasuke estava do outro lado da mesa 11 rindo e parecendo muito, mas muito feliz, diferente da expressão ressentida que ele mostrou quando nos contou que era indeterminado ou quando estávamos em Konoha. Realmente esse acampamento o mudou muito.

Clarisse sentou-se atrás de mim à mesa de Ares. Parecia recuperada do banho, pois estava rindo e arrotando ao lado das amigas. Ela é um tipo... diferente de garota.

Finalmente, Quíron bateu o casco contra o piso de mármore do pavilhão e todos se calaram. Ele ergueu um copo.

— Aos deuses!

Todos ergueram os copos.

— Aos deuses!

Ninfas do bosque avançaram com bandejas de comida: uvas, maçãs, morangos, queijo, pão fresco e, sim, churrasco.

— Eu queria ramén — eu disse tristemente. Depois apareceu uma ninfa dos bosques com a minha idade que colocou uma enorme panela cheia de... RAMÉN! E AINDA COM RODELAS DE PORCO! Eu me virei para a ninfa e a abracei, gritando: — EU TE AMO! VOCÊ QUER CASAR COMIGO?

Todos olharam para mim estranhamente enquanto a ninfa corava e se afastava. Percy me deu um olhar estranho e depois balançou a cabeça, dando um tapa na testa. Estranho, por que será que ele fez isso?

Nossos copos estavam vazios, mas Luke disse:

— Falem com eles. Qualquer coisa que queiram. Não alcoólica, é claro.

Fiz um beicinho. Eu queria saber como era o gosto de sake. POR QUE, MUNDO CRUEL?

— Cherry Coke — falou Percy.

O copo se encheu de líquido espumante cor de caramelo.

— Suco de laranja — falei, dando de ombros. Suco de laranja é a melhor coisa que eu já tomei — PORQUE É LARANJA, BABY! —, portanto não podia reclamar.

O copo se encheu de líquido laranja — ah, o lindo laranja até me dá vontade de chorar.

— Cherry Coke azul — falou Percy sorrindo matreiro.

O fitei tristemente. Claro que ele iria escolher tomar algo azul.

O refrigerante assumiu um tom berrante de cobalto.

Aquilo me fez mais triste ainda. Quero dizer, a Sra. Jackson, mesmo que em poucas horas, se tornou quase uma mãe para mim. Ela é uma das pessoas mais bondosas que já conheci na vida — se bem que eu nunca encontrei pessoas bondosas antes, tirando o Jiji-Sandaime e o Iruka-sensei —, e simplesmente imaginando-a nos braços do maldito Touro Doidão com Testosterona fazia meu coração doer. Muito.

— Vão, Naruto, Percy — disse Luke, nos passando uma travessa de peito defumado.

Enchi minha tigela com ramén e ainda coloquei um pouco de tudo no ramén — vá em frente, me chame de estranho por fazer isso, tô nem aí! — e estava prestes a comer o meu precioso ramén quando notei que todos se levantavam, levando os pratos para o fogo no centro do pavilhão. Imaginei se estavam indo buscar a sobremesa ou coisa assim.

— Venham — disse-nos Luke.

Quando chegamos mais perto, vi que todos estavam pegando algo do prato e jogando no fogo, o morango mais maduro, a fatia mais suculenta de carne, o pão mais quente e mais amanteigado.

Luke murmurou ao meu ouvido:

— Oferendas queimadas para os deuses. Eles gostam do cheiro.

— Fala sério! — disse Percy.

Cerrei os punhos. Os deuses apenas ficavam ali, sem se preocupar com os filhos, e ainda exigiam oferendas queimadas a eles? E AINDA QUERIAM AS PARTES MAIS SABOROSAS DAS COMIDAS? Isso era... Isso era... Isso era tão cruel e desumano.

O olhar de Luke nos advertiu a não fazer nenhum comentário daquilo, mas não pude deixar de me perguntar por que um ser imortal, todo-poderoso, gostaria do cheiro de comida queimada.

Luke aproximou-se do fogo, inclinou a cabeça e atirou um cacho de uvas gordas e vermelhas.

— Hermes.

Percy era o próximo.

Percy parecia incerto, mas depois uma expressão desesperada, quase implorativa, tomou seu rosto e ele jogou uma grande fatia de peito para as chamas.

Eu era o próximo.

Eu queria saber o nome de qual deus eu devia dizer.

Acabei tendo apenas um pedido. Por favor, seja você quem for, conte-me! Eu imploro.

Empurrei uma grande parte do meu ramén.

Quando inalei um pouco da fumaça, não engasguei. Na verdade, o cheiro da fumaça era realmente bom. Tinha cheiro... de muitas coisas boas, tipo, coisas que não deviam combinar nem um pouquinho, mas combinavam. Até acreditei que os deuses podiam viver daquela fumaça.

Estava prester a me afastar, até me lembrar de algo. Se eu não me engano, havia uma deusa da lareira na mitologia grega. Seu nome era... Héstia, eu acho. E me lembrei que ela era basicamente a deusa da família. Eu sei, eu sei, Hera é a deusa da família. Mas eu não a considero a deusa da família... Quero dizer, ela matou o próprio enteado, Hércules, sem ele ter culpa alguma de ser filho de Zeus, e ainda matou as mortais com quem Zeus fez sexo. As pobrezinhas não tinham culpa de nada. Zeus era o culpado. Foi ele quem deu o primeiro passo, não foi? E não nos esqueçamos de que ela JOGOU O PRÓPRIO FILHO, HEFESTO, DA PORRA DO MONTE OLIMPO, APENAS POR SER FEIO! E AINDA O ALEIJOU POR CAUSA DISSO! Sim, tem lendas que dizem que foi Zeus quem fez isso, mas isso me parecia mais uma coisa que Hera faria. Por isso, FODA-SE, HERA, SUA VACA — literalmente: o animal sagrado dela é a vaca. Muita coincidência, não acha? —, VOCÊ NUNCA SERÁ A DEUSA DA FAMÍLIA! Enfim, Héstia é basicamente a deusa da família, a coisa que eu mais queria no mundo, e agora eu tinha a chance de ter uma. Acho que ela merecia um pouco de crédito.

Me voltei novamente para a lareira e acabei fazendo um agradecimento. Aqui, Héstia. Sei que você provavelmente não fez eu vir para esse acampamento, mas agora eu tenho a chance de ter uma família. Por isso, agradeço muito. Domo arigato.

A fumaça dessa vez tinha os mesmos cheiros de antes, só que muito mais forte e cheiroso. E então me lembrei que na mitologia original Héstia recebia parte das oferendas aos deuses, e que por ser a deusa da lareira, o cheiro da fumaça seria muito mais intenso e forte. O fogo se intensificou, como se agradecesse. Sorri para o fogo, como se dissesse De nada.

Depois que todos voltaram aos lugares e terminaram de comer, Quíron bateu novamente o casco para chamar nossa atenção.

O Sr. D levantou-se com um enorme suspiro.

— Sim, suponho que deva dizer olá a todos vocês, moleques. Bem, olá. Nosso diretor de atividades, Quíron, diz que a próxima captura da bandeira será na sexta-feira. Atualmente, o chalé 5 detém os lauréis.

Um monte de aplausos disformes se ergueu da mesa de Ares. Revirei os olhos. Convencidos. Eles iriam esperar até ver como um profissional de verdade agia.

— Pessoalmente — disse o Sr. D —, não me importo nem um pouco, mas congratulações. — O cara era muito dedicado ao trabalho, não acha? — Também devo lhes dizer que temos dois novos campistas hoje. Peter Johnson e Naoto Uzagi.

— É NARUTO UZUMAKI, PORRA! — gritei. — VOCÊ, ALÉM DE PÉSSIMO DIRETOR DE ACAMPAMENTO, É SURDO PRA OUVIR NOMES TAMBÉM — TEBBAYO?

Todos me olharam assustados. Provavelmente achavam que eu era muito corajoso, ou muito doido — mas eu prefiro o primeiro —, para enfrentar um deus assim.

Quíron murmurou alguma coisa.

— Ahn, Percy Jackson — corrigiu o Sr. D. — Está certo. Viva, e tudo o mais. Agora vão correndo para a sua fogueira boba. Andem.

Todos aplaudiram. Dirigimo-nos para o anfiteatro, onde o chalé de Apolo liderou a cantoria. Cantamos canções de acampamento sobre os deuses, comemos besteiras e nos divertimos, e o engraçado foi que não senti mais ninguém mais olhando para mim. Era como estar em casa. Diferente de Konoha.

Mais à noite, quando as fagulhas da fogueira se enroscavam em um céu estrelado, a trombeta de caramujo soou de novo, e todos nós formamos filas para voltar aos nossos chalés. Não me dei conta de como estava exausto até desmoronar em meu saco de dormir emprestado.

Mas o estranho era que eu não conseguia dormir. Eu sentia alguma coisa me chamando, me atraindo. Dei de ombros e saí do chalé, seguindo a sensação. Eu em alguns minutos me vi na Colina Meio-Sangue, em frente à árvore estranha que eu vi tanto enquanto estava no acampamento.

Eu olhei mais profundamente e toquei a árvore, e de repente uma dor insuportável me atingiu, como se algo dentro de mim fosse sugado para dentro da árvore. Eu gemi um pouco, mas tão rápida quanto chegou, a dor passou.

Mantive a mão na árvore, até que ouvi uma voz feminina perguntar:

— Quem é você?

Me virei na direção da voz e vi uma menina com cabelo preto curto e sardas no nariz. Pela forma do corpo, diria que treinou muito, e usava umas roupas bem estranhas que me pareciam ser algo entre punk e gótico — camiseta preta, jeans pretos esfarrapados e uma jaqueta de couro com buttons de uma porção de bandas de que eu nunca ouvi falar, já que não sou desse mundo. O mais estranho nela: ela parecia um holograma, como se sua forma fosse... tremeluzida.

— Naruto Uzumaki. Você?

— Sou Thalia, filha de Zeus.

Arqueei uma sobrancelha.


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Notas finais do capítulo

Gente, eu estou tentando atualizar todas as minhas fics porque eu vou viajar no dia dezoito, mas tem algumas fics que eu perdi a inspiração, por isso não fiquem muito esperançosos. Sinto muito.
Mas até lá, EU QUERO REVIEWS!!! POR FAVOR!!!