NU E PJ: O Ladrão De Raios escrita por The Amazing Spider Green


Capítulo 10
Nós destruímos um ônibus


Notas iniciais do capítulo

Desculpa o atraso da atualização. Acontece que ocorreu uma visita inesperada de um amigo meu e ele dormiu aqui, e no fim eu tive que sair hoje e voltei só agora. Espero que gostem do capítulo.



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P
E
R
C
Y

Não precisei de muito tempo para fazer as malas. Decidi deixar o chifre do Minotauro no meu chalé, então só restaram uma muda extra de roupas e uma escova de dentes para enfiar numa mochila que Grover encontrara para mim. Naruto colocou seus pertences — roupas, escova de dentes, kunais, shurikens, pergaminhos, sua katana etc. — na sua bolsa-carteiro.

A loja do acampamento emprestou para Naruto e eu cem dólares em dinheiro mortal e vinte dracmas de ouro cada um. Essas moedas eram grandes como um biscoito gigante, tinham imagens de diversos deuses gregos estampadas de um lado e o Edifício Empire State do outro. Os dracmas dos mortais antigos eram de prata, Quíron nos contou, mas os olimpianos nunca usavam nada menos que ouro puro. Naruto, ao ouvir aquilo, havia dito:

— Nossa, eles devem fazer o Bruce Wayne/Batman parecer um vagabundo pedindo esmola, né?

Sakura havia lhe dado um soco na cabeça, que o fez ficar inconsciente por cinco minutos.

Enfim, Quíron disse que as moedas poderiam vir a calhar para transações não mortais — o que quer que isso significasse. Ele deu a Annabeth, a Sakura, a Sasuke, a Naruto e a mim um cantil de néctar e um saco hermético cheio de quadradinhos de ambrosia, para usar somente em emergências, se fôssemos gravemente feridos. Aquilo era o alimento dos deuses, Quíron lembrou. Iria nos curar de qualquer ferimento, mas era letal para mortais. Em excesso, poderia deixar um meio-sangue com muita, muita febre. Uma overdose nos faria pegar fogo, literalmente.

Naruto, é claro, tinha que fazer algum comentário sobre isso.

— Eu sempre quis ser quente, mas isso já é exagero.

Sakura não precisou dar um soco nele dessa vez, porque eu me ocupei com esse trabalho. Ela me agradeceu sorrindo de um jeito cortês, e eu o devolvi. Aquilo nos rendeu uma cara de tacho por parte de Naruto.

Annabeth carregava seu boné mágico dos Yankees, que era, ela nos contou, um presente da mãe pelo seu décimo segundo aniversário. Ela levou um livro sobre a famosa arquitetura clássica, escrito em grego antigo, para ler quando estivesse entediada, e carregava uma comprida faca de bronze escondida na manga da camisa. Eu tinha certeza de que a faca ia nos causar problemas na primeira vez em que passássemos por um detector de metais.

Grover estava com seus pés falsos e calças para passar por humano. Usava uma touca verde estilo rastafári, porque, quando chovia, seu cabelo encaracolado se achatava, deixando aparecer a ponta dos chifres. Sua mochila berrante, alaranjada, estava cheia de sucata de metal e maçãs para o lanche. Em seu bolso havia um conjunto de flautas de bambu que o papai-bode esculpira para ele, muito embora ele só conhecesse duas músicas: o Concerto para Piano n. 12, de Mozart, e So Yesterday, de Hilary Duff, e ambas soassem muito mal em flautas de bambu.

Sasuke levava uma mochila simples com algumas roupas e uma escoava de dentes, assim como Naruto e eu. Ele levava uma katana em suas costas, o que me deixava confuso. E se alguém visse a katana? Isso era bem possível.

Sakura levava apenas uma mochila com algumas roupas, alguns livros e um pouco de maquiagem — Naruto tinha revirado os olhos naquilo. Ela levava uma faca de bronze igual a de Annabeth.

Acenamos em despedida para os outros campistas, demos uma última olhada para os campos de morangos, o oceano e a Casa Grande, depois subimos a Colina Meio-Sangue até o alto pinheiro que outrora fora Thalia, filha de Zeus.

Notei que Naruto olhava para o pinheiro com respeito. Eu sabia como ele se sentia. Eu sentia um enorme respeito por Thalia também, agora que sabia sua história.

Quíron nos esperava em sua cadeira de rodas. Ao lado dele estava o surfista que eu tinha visto quando me recuperava no quarto de doente. De acordo com Grover, o cara era chefe de segurança do acampamento. Supostamente, tinha os olhos espalhados pelo corpo inteiro para jamais ser pego de surpresa. Naquele dia, no entanto, usava uniforme de chofer, então só pude ver os olhos extras das mãos, do rosto e do pescoço.

— Este é Argos — disse Quíron. — Vai levar vocês de carro até a cidade, e, ahn, bem, ficar de olho em tudo.

Naruto sussurrou para mim:

— Cara, que piada ruim.

— Shhh! — Eu o encarava irritado.

Ouvi passos atrás de nós.

Luke veio correndo colina acima, carregando um par de tênis de basquete.

— Ei! — ofegou ele. — Ainda bem que alcancei vocês.

Annabeth corou, como sempre acontecia quando Luke estava por perto.

— Só queria desejar boa sorte — disse ele para mim e Naruto. — E pensei... ahn, quem sabe um de vocês poderia usar isso.

Ele me entregou os tênis, que pareciam bastante normais. Tinham até cheiro de normais.

Luke disse:

Maia!

Asas brancas de ave brotaram dos calcanhares, deixando-me tão surpreso que os deixei cair. Os tênis bateram as asas no chão até que estas se dobraram e desapareceram.

— Impressionante! — disse Grover.

Luke sorriu.

— Ajudaram muito quando eu estava na minha missão. Presente do papai. É claro, eu não os uso muito hoje em dia... — Sua expressão tornou-se triste.

Eu não sabia o que dizer. Já era bem legal o fato de Luke ter ido se despedir. Tinha receio de que ele estivesse magoado comigo e Naruto por termos ganho tanta atenção nos últimos dias. Mas ali estava ele, com um presente mágico... Aquilo me fez corar quase tanto quanto Annabeth.

— Ei, cara, obrigado.

— É. — Naruto acenou com a cabeça, sorrindo. — Eu sempre quis um desses. Imagine quantas pegadinhas eu posso fazer com isso?

— Escutem, Percy, Naruto... — Luke pareceu sem graça. — Todos esperam muito de vocês. Então, apenas... matem alguns monstros por mim, o.k.?

Trocamos um aperto de mãos. Luke afagou a cabeça de Grover entre os chifres e depois deu um grande abraço em Annabeth, que pareceu que ia desmaiar.

— Será que ela está tendo um orgasmo? — sussurrou Naruto para mim, o que me fez lhe encarar com o rosto completamente vermelho. Eu queria dar um soco nele. Mesmo para uma criança com TDAH, Naruto não conseguia calar a boca.

Depois que Luke se foi, eu disse a Annabeth:

— Você está com a respiração acelerada.

— Não estou, não.

— Não só está com a respiração acelerada — continuou Naruto por mim —, como está com o rosto mais vermelho do que o meu quando Sakura-chan e Percy me dão um tapa daqueles.

Sakura e eu demos mais um tapa nele, fazendo-o cair no chão.

— Viu? — murmurou Naruto se levantando.

— Sem falar que você o deixou capturar a bandeira em seu lugar, não foi? — perguntei ajudando Naruto a se levantar.

— Ai... por que mesmo eu quero ir a algum lugar com você, Percy?

— Porque você tem tesão por ele e quer o corpo dele nu — respondeu Naruto sorrindo maliciosamente.

Annabeth o encarou com o maior ódio que eu já vi em toda minha vida, mas então ela desceu batendo os pés para outro lado da colina, onde um utilitário esportivo branco esperava no acostamento da estrada. Argos a seguiu, balançando as chaves do carro.

Peguei os tênis voadores e tive uma súbita sensação ruim. Olhei para Quíron.

— Eu não vou poder usar isso, não é?

Ele sacudiu a cabeça.

— A intenção de Luke foi boa, Percy. Mas subir para o ar... não seria muito inteligente de sua parte.

— Mas eu posso, não é? — Naruto arrancou os tênis de mim tão rápido que quase levou os meus dedos junto.

— Não, Naruto. — Quíron balançou a cabeça.

— Mas... Mas eu sou descendente de Hermes. — Naruto tinha uma expressão engraçada no rosto. — Quem melhor que eu para ter isso?

— Você ainda é filho de Hades — respondeu Quíron. — E Zeus nunca deixaria você voltar com vida.

— Cara — murmurou Naruto. — Ser filho de Hades é um saco.

Eu assenti, concordando com Naruto, desapontado, mas então tive uma ideia. Eu arranquei os sapatos das mãos de Naruto.

— Ei, Grover. Você quer um apetrecho mágico?

Seus olhos se iluminaram.

— Eu?

Naruto me olhou chocado.

— Ele?

Rapidamente, amarramos os tênis por cima dos seus falsos pés, e o primeiro menino-bode voador do mundo estava pronto para o lançamento.

Naruto sorria maliciosamente.

— O lançamento do bode começa em três, dois, um... ZERO!

Maia! — bradou.

Ele se ergueu do chão muito bem, mas então tombou de lado e sua mochila arrastou-se pela grama. Os tênis alados ficaram corcoveando para o alto e para baixo como minúsculos cavalos selvagens.

— Prática — gritou Quíron para ele. — Você só precisa de prática.

— Aaaaaa! — Grover saiu voando de lado colina abaixo, como um cortador de grama ensandecido, em direção à van.

Antes que Naruto e eu pudéssemos segui-lo, Quíron segurou nossos braços.

— Eu devia tê-los treinado melhor, meninos — disse ele. — Se ao menos tivesse tido mais tempo. Hércules, Jasão... todos receberam mais treinamento.

— Tudo bem. Só queria...

Eu me interrompi pois estava prestes a soar como uma criança mimada. Queria que meu pai tivesse me dado uma coisa mágica legal para ajudar na missão, algo tão bom quanto os tênis voadores de Luke ou o boné invisível de Annabeth.

— Onde estou com a cabeça? — exclamou Quíron. — Não posso deixar vocês irem embora sem isto.

Ele puxou uma caneta do bolso do casaco e me entregou. Era uma esferográfica descartável comum, tinta preta, tampa removível. Custava provavelmente trinta centavos. Em seguida ele puxou um par de luvas-sem-dedos de couro com um desenho cada uma e as entregou para Naruto.

— Uma... caneta e um par de luvas — disse Naruto, fitando os nossos novos pertences com uma cara de tacho. — Maneiro.

— Puxa — disse eu, correspondendo ao sarcasmo de Naruto. — Obrigado.

— Meninos, isto foram presentes de seus pais. Guardei durante anos, sem saber que eram vocês que eu estava esperando. Mas a profecia agora está clara para mim. Vocês são os escolhidos.

Lembrei-me da excursão ao Metropolitan Museum of Art, quando Naruto e eu reduzimos a pó a Sra. Dodds. Quíron nos jogara uma caneta e um par de luvas que se transformaram em armas. Será que...?

Tirei a tampa, e a caneta ficou mais comprida e pesada em minha mão. Em meio segundo eu estava segurando uma reluzente espada de bronze com lâmina de fio duplo, cabo envolvido em couro e uma guarda chata rebitada com pinos de ouro. Era a primeira arma que realmente parecia equilibrada em minha mão.

— A espada tem uma história longe e trágica, sobre a qual não precisamos falar — contou-me Quíron. — Seu nome é Anaklusmos.

— Contracorrente — traduzi, surpreso que o grego antigo me tenha vindo tão fácil.

— Uau! — Naruto assobiou, impressionado. — Agora sou eu.

Ele pôs as luvas e as abotoou, mas não aconteceu nada.

— Ei, e as minhas armas? — disse Naruto fazendo beicinho. — Eu quero armas fodas também.

Ri com o tom amuado e mimado que ele usava.

— Naruto, você deve deixar o... ahn... poder dentro de você correr para suas mãos para que as armas apareçam — explicou Quíron.

— Quer dizer o chakra da Kyuubi? — perguntou Naruto.

— Exato — respondeu Quíron.

Naruto fechou os olhos por um segundo e em seguida notei que suas unhas viraram garras, e em suas mãos vazias apareceram uma espada e uma foice. Assobiei impressionado, exatamente como Naruto fizera comigo.

Na sua mão direita estava uma espada com uma empunhadura negra. Na ponta da empunhadura tinha nove caudas de bronze que pareciam se balançar. Ela tinha uma lâmina vermelho-alaranjada, mas ao invés de ter uma ponta, ela tinha o formato da cabeça de uma raposa com as presas arreganhadas. A foice em sua mão esquerda tinha a empunhadura cinza, e a ponta parecia dez caudas se contorcendo, e uma lâmina negra-cinzenta, parecida com um machado. A ponta dela era igual a da primeira, mas ao invés da cabeça de uma raposa, tinha a cabeça de algum animal com um olho só.

— O... o Kraken? — perguntou Naruto, surpreso.

— O quê? — perguntou Quíron, confuso. — Não, não. Você deve ter se confundido. A criatura que representa sua foice não é o Kraken. É uma criatura do seu mundo, Naruto. É o... Juubi, eu acho que esse seja o nome.

Juubi? — perguntou Naruto, confuso. — Quem é esse?

— Foi um monstro criado originalmente por seu pai, Naruto — respondeu Quíron. — Foi o primeiro bijuu do mundo.

— Então existe mais além dos nove bijuus? — perguntou Naruto. Me lembrei das aulas que ele teve com a Kyuubi. Na maioria das vezes ele também me levava, porque não queria ser o único a enfrentar a "chatice enorme" da Kyuubi. Lembrei-me sobre a história que ele contou — sobre o fato de haverem mais monstros como ele. Mas eu não me lembro de ele ter mencionado essa parte.

— Os nove bijuus foram criados a partir de cada parte do chakra do Juubi, Naruto. — Arregalamos os olhos. — Já ouviu falar no Rikuddou Sennin?

Naruto balançou a cabeça, confuso.

— Ele foi, basicamente, o primeiro ser humano a dominar o chakra. — Naruto e eu estávamos de bocas abertas. — O Juubi quase destruiu as Nações Elementais, mas Rikuddou Sennin, que era o filho de Caos, o selou em si mesmo. Mas Rikuddou sabia que o monstro sairia de seu corpo assim que ele morresse, então ele separou o poder dos bijuus em nove partes e selou o resto do Juubi na Lua.

— Uau! — disse Naruto, surpreso. — Maneiro.

— Mas Hades conseguiu arranjar uma pequena, mas poderosa parte do Juubi, e a pôs na foice que reside em suas mãos. O mesmo ele fez com a Kyuubi, pondo uma pequena parte dela em sua espada. Você é o único que pode empunhá-las, Naruto. Elas reagem ao chakra demoníaco que reside em você. Apenas um jinchuuriki pode empunhá-las.

Naruto fitava suas armas com um novo respeito que eu também tinha pelos instrumentos mortais.

— Só as usem para emergências — disse Quíron —, e apenas contra monstros. Nenhum herói deve ferir mortais, só se for absolutamente necessário, é claro, mas estas armas não os feririam em nenhum caso.

Olhei para a lâmina cruelmente afiada. Naruto fez o mesmo com suas lâminas.

— Como assim, não feririam mortais? Como elas podem não ferir?

— É — concordou Naruto. — Elas parecem afiadas o bastante para cortar aço.

— Suas espadas são de bronze celestial. Anaklusmos foi forjada pelos Ciclopes, temperada no coração do monte Etna, resfriada no rio Lete. A espada e a foice de Naruto foram forjadas pelo próprio Hefesto nas fornalhas do próprio Hades. Seus núcleos são do chakra mais demoníaco e poderoso de todos, por isso as cores vermelha e cinza. São mortíferas para monstros, para qualquer criatura do Submundo, desde que não matem você primeiro. Mas a lâmina passará através de mortais como uma ilusão. Eles não são bastante importantes para serem mortos pela lâmina. E devo avisá-los: como semideuses, vocês podem ser mortos tanto por armas celestiais quanto por armas normais. Vocês são duas vezes mais vulnerável.

— Bom saber — dissemos.

— Agora, Percy, recoloque a tampa na caneta. Naruto, tire o chakra da Kyuubi das suas mãos.

Encostei a tampa da caneta na ponta da espada e instantaneamente Contracorrente encolheu e se transformou de novo em uma esferográfica. As garras de Naruto voltaram a ser unhas e as espadas desapareceram, como se fossem hologramas. Enfiei minha caneta no bolso um pouco nervoso, porque na escola tinha a fama de perder canetas.

— Não há risco — disse Quíron.

— De quê?

— De perder a caneta — disse ele. — É encantada. Sempre vai reaparecer no seu bolso. Experimente.

Eu estava desconfiado, mas atirei a caneta o mais longe que pude colina abaixo e a vi desaparecer na grama.

— Pode levar alguns instantes — disse Quíron. — Agora verifique o bolso.

Sem dúvida, a caneta estava lá.

Ao me ver tirando a caneta do bolso, Naruto arregalou os olhos.

— Maldito! — ele gritou. — Eu queria uma coisa tão legal assim!

— Você usa luvas — eu disse com cara de tacho.

— E... — Naruto gesticulava com as mãos.

— Como posso explicar de uma forma que você entenda? — disse eu, fingindo pensar. — Ah, já sei... ahn... ELAS NÃO SAEM DAS SUAS MÃOS PORQUE JÁ ESTÃO ABOTOADAS!

— Ahhhh... — Naruto parecia ter entendido. — Não entendi.

— AHHHHH! — rugi, não aguentando mais. Eu puxei seu pescoço e comecei a enforcá-lo enquanto o balançava. — Como você consegue ser tão burro?!

— Não... consigo... respirar... — dizia Naruto asfixiado, tentando arrancar minhas mãos do pescoço dele.

— Essa é a intenção!

Quíron nos separou, e eu respirei profundamente, tentando me acalmar.

— Ei, eu acabei de perceber uma coisa — disse eu, ignorando o Naruto caído de joelhos no chão, com a mão na garganta, respirando como se não houvesse amanhã. — E se um mortal me vir puxando uma espada?

Quíron sorriu.

— A Névoa é algo poderoso, Percy.

— A Névoa? — perguntou Naruto, voltando a ficar de pé, o rosto menos vermelho.

— Sim. Leiam a Ilíada. Está cheia de referências a isso. Sempre que elementos divinos ou monstruosos se misturam com o mundo mortal, eles geram a Névoa, que tolda a visão dos seres humanos. Vocês verão as coisas exatamente como são, sendo meio-sangues, mas os seres humanos interpretarão tudo de modo muito diferente. É realmente incrível até que ponto os seres humanos podem ir para adaptar as situações à sua concepção de realidade.

Pus Contracorrente de volta no bolso.

Pela primeira vez, senti a missão como algo real. Eu estava de fato deixando a Colina Meio-Sangue. Estava indo para oeste sem nenhuma supervisão de adulto, sem um plano B, nem mesmo um telefone celular. (Quíron disse que os telefones podiam ser rastreados por monstros; se usasse um, seria pior do que lançar um foguete de sinalização.) Eu não tinha nenhuma arma mais poderosa do que uma espada para combater monstros e chegar à Terra dos Mortos.

— Quíron... — falei. — Quando você diz que os deuses são imortais... quer dizer, havia um tempo antes deles, certo?

— Quatro eras antes deles, na verdade. O Tempo dos Titãs foi a Quarta Era, às vezes chamada de Era do Ouro, o que sem dúvida é um nome impróprio. Esta época, a época da civilização ocidental e reinado de Zeus, é a Quinta Era.

— Então como era... antes dos deuses?

Naruto pareceu curioso, pois fitou Quíron com olhos que pediam uma resposta.

Quíron contraiu os lábios.

— Nem mesmo eu sou bastante velho para me lembrar disso, crianças, mas sei que era um tempo de trevas e selvageria para os mortais. Cronos, o Senhor dos Titãs, chamou seu reinado de Era de Ouro porque os homens viviam em inocência e lives de todo o conhecimento. Mas isso era mera propaganda. O rei Titã não se importava nada com sua espécie a não ser para servir de aperitivo, ou como fonte de entretenimento. Foi só no início do reinado do Senhor Zeus, quando Prometeu, o bom Titã, trouxe o fogo para a humanidade, que sua espécie começou a evoluir, e mesmo então Prometeu foi estigmatizado como pensador radical. Zeus o castigou severamente, como vocês devem lembrar. É claro, por fim os deuses se interessaram pelos seres humanos, e nasceu a civilização ocidental.

— Mas agora os deuses não podem morrer, certo? Quero dizer, enquanto a civilização ocidental estiver viva, eles estarão vivos. Assim... mesmo se nós fracassarmos, nada pode acontecer de tão ruim a ponto de estragar tudo, certo?

Quíron nos deu um sorriso melancólico.

— Já não vou gostar da resposta — disse Naruto baixinho.

— Ninguém sabe quanto tempo a Era do Ocidente irá durar, Percy. Os deuses são imortais, sim. Mas os Titãs também eram imortais. Eles ainda existem, trancados em suas várias prisões, forçados a suportar dores e castigos infinitos, com o poder reduzido, mas ainda muito vivos. Que as Parcas não permitam que os deuses sofram tal maldição, ou que retornemos às trevas e ao caos do passado. Tudo o que podemos fazer, crianças, é seguir nosso destino.

— Nosso destino... presumindo que saibamos qual é.

— Não — discordou Naruto. Quíron e eu o olhamos, confusos. — Nós forjamos nosso próprio destino. Nada está escrito em pedra, Quíron. Sempre temos escolha. É por isso que existem pessoas boas e as más. Elas escolheram ser o que são, não o destino. Nunca duvide disso, está bem, Percy?

Eu o olhava confuso. Nunca tinha visto Naruto tão sério. Eu já o tinha visto quando ele estava com um humor sombrio, mas nunca o vi sério assim. Pelo visto a palavra destino era um tabu perto dele.

— Relaxem — disse-nos Quíron, sorrindo para Naruto orgulhoso. — Mantenham as ideias no lugar. E lembrem-se, vocês podem estar a ponto de evitar a maior guerra da história humana.

— Relaxar — disse eu. — Estou muito relaxado.

— Falando em pressão — falou Naruto sorrindo.

Quando chegamos ao pé da colina, olhei para trás. Sob o pinheiro que outrora era Thalia, filha de Zeus, Quíron estava em plena forma de homem-cavalo, segurando no alto seu arco em saudação. Uma típica despedida do acampamento de verão pelo seu típico centauro.

* * *

Argos nos levou para fora da zona rural em direção ao oeste de Long Island. Era esquisito estar novamente em uma autoestrada, com Naruto, Annabeth, Grover, Sasuke e Sakura ao meu lado como se fôssemos caronas normais. Depois de duas semanas na Colina Meio-Sangue, o mundo real parecia uma fantasia. Surpreendi-me olhando para cada McDonald's, cada criança no banco traseiro do carro dos pais, cada cartaz e cada shopping center.

— Até agora, tudo bem — disse a Annabeth. Eu diria aquilo a Naruto, mas ele estava tendo uma conversa com Sakura e Sasuke. — Quinze quilômetros e nem um único monstro.

Vi Naruto estapear a testa enquanto balançava a cabeça.

Annabeth me lançou um olhar irritado.

— Falar desse jeito traz má sorte, Cabeça de Alga.

— Ajude-me a lembrar: por que você me odeia tanto?

— Hum, deixe eu ver: porque você é chato, irritante, cabeça-dura, teimoso — dizia Naruto contando nos dedos. — Ah, e não vamos nos esquecer de que você é um idiota.

— O sujo falando do mal-lavado — comentou Sasuke distraidamente, sorrindo de canto.

Naruto encarou Sasuke irritado.

— Vá te catar, Sasuke-teme!

Sasuke apenas bufou e o ignorou.

— Eu não odeio você — disse-me Annabeth quando parou de assistir estranhamente a discussão entre Naruto e Sasuke.

— Posso estar enganado.

Ela dobrou o boné de invisibilidade.

— Olhe... é só que não deveríamos nos dar bem, o.k.? Nossos pais são rivais.

— Por quê?

Ela suspirou.

— Quantas razões você quer? Uma vez minha mãe pegou Poseidon com a namorada dele no templo de Atena, o que é superdesrespeitoso.

— A-ha! — disse Naruto, envolvendo meus ombros com o seu braço e batendo no meu ombro com a outra mão. — Eu sempre soube que você tinha um lado garanhão. Esse é o meu garoto!

Eu soquei a barriga dele, fazendo-o se curvar e tossir incontrolavelmente.

— Outra vez — continuou Annabeth, como se nada tivesse acontecido —, Atena e Poseidon competiram para ser o deus patrono da cidade de Atenas. Seu pai criou uma estúpida fonte de água salgada como presente. Minha mãe criou a oliveira. As pessoas viram que o presente dela era melhor, portanto deram à cidade o nome dela.

— Nossa, o ego de Poseidon deve ter ficado bem desinflado — comentou Naruto balançando a cabeça, como se ele entendesse o que Poseidon tinha passado.

— Elas realmente devem gostar de azeitonas.

Naruto deu uma risadinha.

— Ah, deixa pra lá.

— Agora, se ela tivesse inventado a pizza... isso eu poderia entender.

— Eu disse: deixa pra lá.

Naruto agora gargalhava como se não houvesse amanhã, se mantendo sentado agarrado a mim, enquanto ele tirava lágrimas dos olhos.

No assento dianteiro, Argos sorriu. Ele não disse nada, mas um olho azul na sua nuca piscou para mim.

O trânsito ficou lento no Queens. Quando nós chegamos a Manhattan já era pôr do sol e começava a chover.

Argos nos largou na Estação Greyhound no Upper East Side, não longe do apartamento de minha mãe e Gabe.

— Percy — chamou Naruto apontando para algo.

Ele apontava para uma caixa de correio. Mas o que me atraiu mesmo foi o folheto preso com fita adesiva, encharcado, com meu retrato: VOCÊ VIU ESTE MENINO?

Eu o arranquei antes que os outros pudessem vê-lo.

Argos descarregou nossas malas, certificou-se de que havíamos conseguido as passagens de ônibus e então foi embora, o olho nas costas de sua mão se abrindo para nos observar enquanto tirava o carro do estacionamento.

Pensei em como estava perto do meu velho apartamento. Em um dia normal, minha mãe estaria chegando em casa da doceria mais ou menos naquela hora. Gabe Cheiroso provavelmente estava lá, jogando pôquer, sem nem sentir a falta dela.

Naruto viu aonde eu estava olhando e pôs uma mão no meu ombro, o esfregando. Eu olhei para ele, e vi um olhar apologético na sua expressão.

Grover pôs sua mochila nos ombros. Olhou rua abaixo, na direção em que Naruto e eu estávamos olhando.

— Quer saber por que ela se casou com ele, Percy?

Olhei para ele.

— Você está lendo a minha mente ou coisa assim?

— Só as suas emoções. — Ele encolheu os ombros. — Acho que me esqueci de contar que os sátiros podem fazer isso. Você estava pensando na sua mãe e no seu padrasto, certo?

Eu assenti, me perguntando o que mais Grover teria esquecido de contar.

— Sua mãe se casou com Gabe por você — Grover me contou. — Você o chama de "Cheiroso", mas não tem ideia. O cara tem essa aura... Eca, eu posso sentir o cheiro dele daqui. Posso sentir vestígios do cheiro dele em você, e já faz uma semana que você esteve perto dele.

— Com certeza — concordou Naruto. Grover e eu o olhamos confusos. — A Kyuubi apura meus sentidos.

— Obrigado, gente — falei. — Onde fica o chuveiro mais próximo?

— Você devia ser grato, Percy. Seu padrasto tem um cheiro tão repulsivamente humano que pode mascarar a presença de qualquer semideus. Assim que inalei o ar dentro do seu Camaro, eu soube: Gabe esteve encobrindo seu cheiro por anos. Se você não tivesse morado com ele durante todos os verões, provavelmente teria sido encontrado por monstros muito tempo atrás.

— Então o idiota fez uma coisa útil em toda a sua vida patética? — perguntou Naruto, legitimamente surpreso. — Por essa eu não esperava.

— Sua mãe ficou com ele para proteger você, Percy — continuou Grover. — Era uma senhora esperta. Devia amar muito você para aturar aquele cara... se é que isso o faz se sentir melhor.

Não fazia, mas me forcei para não demonstrar. Eu a verei de novo, pensei. Ela não se foi.

Fiquei imaginando se Grover ainda podia ler as minhas emoções, confusas como estavam. Estava grato por ele, Naruto e todos os outros estarem comigo, mas me sentia culpado porque não fora sincero com eles. Não lhes contara a verdadeira razão de ter dito sim para aquela missão maluca.

A verdade era que eu não me importava em recuperar o relâmpago de Zeus, em salvar o mundo ou mesmo em ajudar meu pai a sair da encrenca. Quanto mais pensava nisso, mais me ressentia de Poseidon por nunca ter me visitado, nunca ter ajudado minha mãe, nunca ter sequer mandado uma droga de cheque de pensão alimentícia. Ele só me reconhecera porque tinha um serviço a ser feito.

Eu só me preocupava com minha mãe. Hades a levara injustamente, e Hades iria devolvê-la.

Você será traído por aquele que o chama de amigo, sussurrou o Oráculo em minha mente. E, no fim, irá fracassar em salvar aquilo que mais importa.

Cale a boca, respondi.

* * *

A chuva continuava caindo.

Ficamos impacientes esperando o ônibus e decidimos brincar de footbag com uma das maçãs de Grover. Annabeth foi incrível. Ela era capaz de arremeter a maçã com o joelho, com o cotovelo, com o ombro, ou o que fosse. Sasuke, entediado, apenas ficou chutando a maçã, como se não fosse nada. Sakura era boa em fazer cabeçadas com a maçã. Naruto, como sempre, era um exibido. Ele fez tudo o que Annabeth, Sasuke e Sakura fizeram e ainda girou a maçã no nariz, como uma foca. Eu mesmo não era de todo ruim.

O jogo terminou quando arremessei a maçã para Grover e ela chegou perto demais da sua boca. Em uma megamordida de bode, nossa footbag desapareceu — miolo, pedúnculo e tudo.

Grover enrubesceu. Ele tentou se desculpar, mas nós estávamos muito ocupados dando risada.

Finalmente o ônibus chegou. Enquanto estávamos na fila para embarcar, Grover começou a olhar em volta, farejando o ar do jeito como farejava seu lanche favorito na cantina da escola — enchiladas.

— O que foi? — perguntei.

— Não sei — disse ele, tenso. — Talvez não seja nada.

Mas eu podia perceber que era alguma coisa. Também comecei a olhar para trás por cima do ombro. Notei Naruto começando a farejar o ar como Grover, mas de um jeito mais forte.

Isso só aumentou minha preocupação.

Fiquei aliviado quando afinal embarcamos e encontramos lugar juntos na parte de trás do ônibus. Guardamos nossas mochilas. Annabeth batia nervosamente seu boné dos Yankees na coxa.

Quando os últimos passageiros subiram, Annabeth apertou com força o meu joelho. "Percy."

Uma senhora acabava de embarcar no ônibus. Usava vestido de veludo amarrotado, luvas de renda e chapéu laranja, tricotado e disforme, que encobria seu rosto, e carregava uma grande bolsa de lã estampada. Quando ergueu a cabeças seus olhos pretos faiscaram, e meu coração deu um pulo.

Cutuquei Naruto ainda encarando a senhora, horrorizado.

— Percy, pare de me cutucar. Estou tentando encontrar uma ameaça. — Naruto me ignorou.

Cutuquei mais forte.

— Percy, pare!

Cutuquei ainda mais forte.

— Percy!

Por fim, eu agarrei sua cabeça e a virei na direção da senhora. Os olhos de Naruto ficaram do tamanho de pratos, e sua expressão — temo eu — se espelhava à minha.

— Aquela é... — Ele não conseguia dizer mais nada.

Era a Sra. Dodds. Mais velha, mais enrugada, mas se dúvida a mesma cara maligna.

Nos encolhemos no assento.

Atrás dela subiram mais duas senhoras: uma de chapéu verde, outra de chapéu roxo. A não ser por isso, eram parecidíssimas com a Sra. Dodds — as mesmas mãos encarquilhadas, as mesmas bolsas de lã, os mesmos vestidos de veludo enrugados. Um trio de avós demoníacas.

— Não! — sussurrou Naruto alto. — Três Sras. Dodds! O meu pior pesadelo está virando realidade!

Elas se sentaram na fileira da frente, logo atrás do motorista. As duas no corredor cruzaram as pernas bem na passagem, formando um X. Aquilo era bastante normal, mas enviava uma mensagem clara: ninguém sai.

O ônibus partiu da estação e seguimos pelas ruas escorregadias de Manhattan.

— Ela não ficou morta muito tempo — disse eu, tentando impedir minha voz de tremer. — Achei que você tivesse dito que eles podem ser afastados por toda uma vida.

— Eu disse, se você tiver sorte — disse Annabeth. — Você obviamente não tem.

— Todas as três — choramingou Grover. — Di immortales!

— Está tudo bem — disse Annabeth, obviamente se empenhando em pensar. — As Fúrias. Os três piores monstros do Submundo. Sem problemas. Sem problemas. Vamos simplesmente saltar pelas janelas.

— Não abrem — gemeu Grover.

— Uma saída nos fundos? — sugeriu ela.

Não havia nenhuma. E, mesmo que houvesse, não teria ajudado. Àquela altura, estávamos na Nona Avenida, em direção ao Túnel Lincoln.

— Elas não vão nos atacar com testemunhas em volta — disse eu. — Ou vão?

— Os mortais não têm bons olhos — lembrou-me Sasuke seriamente. — Seus cérebros só podem processar o que eles veem através da Névoa.

— Eu acho que estou começando a odiar a Névoa neste momento — disse Naruto, irritado, estapeando a própria testa e balançando a cabeça.

— Eles vão ver três velhas nos matando, não vão? — perguntei, ignorando Naruto.

Ele pensou a respeito.

— Difícil dizer. Mas não podemos contar com a ajuda de mortais. Talvez uma saída de emergência no teto...?

Chegamos ao Túnel Lincoln, e o ônibus ficou às escuras a não ser pelas luzes do corredor. Estava assustadoramente silencioso sem o ruído da chuva.

A Sra. Dodds se levantou. Com uma voz inexpressiva, como se tivesse ensaiado aquilo, ela anunciou para o ônibus inteiro:

— Preciso usar o toalete.

— Eu também — disse a segunda irmã.

— Eu também — disse a terceira irmã.

Todas elas começaram a se aproximar pelo corredor.

— Já sei — disse Annabeth. — Percy, pegue meu chapéu.

— O quê?

— É você que elas querem. Fique invisível e siga pelo corredor. Deixe que elas passem por você. Talvez você possa chegar até a frente e escapar.

— Mas vocês...

— Há uma pequena possibilidade de que elas não reparem em nós — disse Annabeth. — Você é filho de um dos Três Grandes. Seu cheiro deve encobrir o nosso.

— Mas Naruto também é filho de um dos Três Grandes.

— Mas eu aprendi a diminuir meu chakra — disse Naruto, sério. — Elas não devem me notar.

— Não posso abandonar vocês.

— Isso é muito lindo, Percy, fico lisonjeado que você se preocupe tanto assim conosco, mas agora não é a hora! — disse Naruto me encarando nos olhos. — Agora ponha a droga do boné e !

— Não se preocupe conosco — disse Sakura docemente para mim. — Vá!

Minhas mãos tremiam. Eu me senti um covarde, mas peguei o boné dos Yankees e pus na cabeça.

Quando olhei para baixo, meu corpo não estava mais ali.

Comecei a me esgueirar pelo corredor. Consegui passar dez fileiras, depois me esquivei para um assento vazio bem quando as Fúrias passaram.

A Sra. Dodds parou, farejando, e olhou diretamente para mim. Meu coração estava disparado.

Parecia não ter visto nada. Elas e as irmãs continuaram andando.

Eu estava livre. Cheguei até a frente do ônibus. Já estávamos quase saindo do Túnel Lincoln. Estava a ponto de apertar o botão de parada de emergência quando ouvi lamentos abomináveis vindos da fileira do fundo.

As velhas não era mais velhas. Os rostos ainda eram os mesmos — acho que seria impossível ficarem mais feios —, mas os corpos haviam murchado e tinham o aspecto de um couro marrom sobre formas de bruxas, com asas de morcego e mãos e pés como garras de gárgula. As bolsas viraram chicotes chamejantes.

As Fúrias cercaram meus amigos estalando os chicotes e sibilando:

— Onde está? Onde?

As outras pessoas no ônibus estavam gritando, escondendo-se em seus bancos. Certo, elas viram alguma coisa.

— Ele não está aqui! — gritou Annabeth. — Saiu!

— Mas o que é isso, minhas senhoras? — disse Naruto, as mãos na sua frente, como uma forma de apaziguá-las. — Será que não podemos nos dar bem? Afinal, vocês trabalham para o meu papaizinho, não é?

As Fúrias ergueram os chicotes.

— É, eu acho que não — respondeu Naruto à própria pergunta, afastando-se delas e voltando para os outros.

Annabeth e Sakura sacaram suas facas de bronze. Sasuke agarrou sua katana. Grover agarrou uma lata da sua sacola de lanches e se preparou para jogá-la. As armas de Naruto se materializaram em suas mãos com garras e ele rosnou ameaçadoramente para as Fúrias.

O que eu fiz a seguir foi tão impulsivo e perigoso que eu merecia ser o rei do transtorno do déficit de atenção do ano.

O motorista do ônibus estava distraído, tentando enxergar o que estava acontecendo pelo espelho retrovisor.

Ainda invisível, agarrei o volante e dei um tranco para a esquerda. Todos gritaram ao serem jogados para a direita, e ouvi o que esperava ser o som das três Fúrias esmagadas contra as janelas.

— Ei! — gritou o motorista. — Ei! Oaaa!

Ele lutou para segurar o volante. O ônibus chocou-se com a lateral do túnel, o metal arrastado pela parede lançando fagulhas um quilômetro atrás de nós.

Saímos de lado do túnel, de volta à tempestade, com pessoas e monstros arremessados de um canto a outro do ônibus e carros jogados de lado como se fossem pinos de boliche.

De algum modo o motorista achou uma saída. Arremessamo-nos para fora da autoestrada, passamos meia dúzia de semáforos e acabamos disparando por uma daquelas estradas rurais de New Jersey, nas quais não dá para acreditar que existia tanto nada do outro lado do rio quando se deixa Nova York. Havia bosques à nossa esquerda e o rio Hudson à direita, e o motorista parecia se desviar na direção do rio.

Outra grande ideia: aperto o freio de emergência.

O ônibus gemeu, traçou um círculo completo sobre o asfalto molhado e se chocou contra as árvores. As luzes de emergência se acenderam. A porta se abriu. O motorista foi o primeiro a sair, com os passageiros gritando enquanto fugiam em pânico atrás dele. Subi no assento do motorista e deixei-os passar.

As Fúrias retomaram o equilíbrio. Estalaram os chicotes para Annabeth e Sakura enquanto elas brandiam as facas e gritavam em grego antigo que recuassem. Grover atirava latas. Sasuke as encarava com atenção, como se procurasse uma brecha. Me assustei quando vi que seus olhos estavam vermelhos com duas vírgulas envolvendo cada pupila. Naruto rugia de um jeito animalesco enquanto movia suas armas ameaçadoramente na direção delas.

Olhei para a porta aberta. Eu estava livre para partir, mas não podia abandonar meus amigos. Tirei o boné invisível.

— Ei!

As Fúrias se viraram, mostrando as presas amareladas para mim. Naruto me encarou com a expressão animalesca que tinha quando usava o chakra da Kyuubi e rugiu:

— Percy, seu idiota! Fuja!

A saída de repente me pareceu uma excelente ideia. A Sra. Dodds avançou de modo arrogante pelo corredor, como costumava fazer em classe, pronta para entregar meu F na prova de matemática. Cada vez que ela estalava o chicote, chamas vermelhas dançavam pelo couro farpado.

Suas duas irmãs horrorosas pularam para cima dos assentos de ambos os lados e se arrastaram na minha direção como dois lagartos enormes e asquerosos.

— Perseu Jackson — disse a Sra. Dodds com um sotaque que vinha de algum lugar mais distante do que o sul da Geórgia. — Você ofendeu os deuses. Você deve morrer.

— Eu gostava mais de você como professora de matemática.

— Ih, nessa parte eu não concordo — discordou Naruto. — Pelo menos desse jeito eu posso apunhalar ela sem pegar detenção.

Ela rosnou.

Annabeth, Grover, Sakura e Sasuke se aproximavam com cautela por trás das Fúrias, procurando uma passagem. Naruto escalava o teto do ônibus e ia na direção da Sra. Dodds.

Tirei a esferográfica do bolso e a destampei. Contracorrente se alongou e virou uma reluzente espada de fio duplo.

As Fúrias hesitaram.

A Sra. Dodds já havia sentido a lâmina de Contracorrente antes. Obviamente não gostou de vê-la de novo.

— Renda-se agora — sibilou. — E não sofrerá o tormento eterno.

— Boa tentativa — disse a ela.

— Percy, cuidado! — gritou Annabeth.

A Sra. Dodds lançou seu chicote em volta da mão com a qual eu segurava a espada, enquanto as Fúrias em cada lado pularam em cima de mim.

Era como se minha mão estivesse envolta em chumbo derretido, mas consegui não soltar Contracorrente. Atingi a Fúria da esquerda com o cabo e a mandei cambaleando de costas para a poltrona. Sasuke e Sakura investiram contra ela e cortaram seu corpo com suas armas. Ela estourou como um saco cheio de bolinhas de isopor. Virei e fiz um corte na Fúria da direita. Como a Fúria da esquerda, assim que a lâmina entrou em contato com o pescoço dela, ela gritou e explodiu em pó. Annabeth agarrou a Sra. Dodds em um golpe de luta e a atirou para trás, enquanto Grover arrancava o chicote de suas mãos.

— Ai! — gritou ele. — Ai! Quente! Quente!

— O que você esperava, gênio? — perguntou Naruto revirando os olhos. — Esse chicote está pegando fogo.

A Sra. Dodds estava tentando tirar Annabeth das costas. Ela esperneou, arranhou, sibilou e mordeu, mas Annabeth se agarrou firme enquanto Grover amarrava suas pernas com seu próprio chicote. Depois Naruto deu um corte fino nas costas dela e a empurrou de costas para o corredor.

— Isso é pelo F que você me deu! — gritou ele triunfante.

A Sra. Dodds tentou se erguer, mas não havia espaço para ela bater as asas de morcego, portanto continuou caindo.

— Zeus o destruíra! — prometeu ela. — Hades terá a sua alma!

Braccas meas vescimini! — gritei.

Eu não sabia muito bem de onde viera o latim. Acho que queria dizer: "Coma as minhas calças!"

Naruto pareceu me compreender, pois começou a gargalhar como se não houvesse amanhã.

Um trovão sacudiu o ônibus. Os cabelos se eriçaram na minha nuca.

— Fora! — gritou Annabeth para mim. — Agora!

Não era necessário.

Corremos para fora e encontramos os outros passageiros andando de um lado para o outro, atordoados, discutindo com o motorista ou correndo em círculos e gritando: "Nós vamos morrer!" Um turista de camisa com estampa havaiana e uma câmera bateu uma foto minha antes que eu pudesse pôr a tampa na minha espada.

— Nossas malas! — Sakura se deu conta. — Nós deixamos nossas...

BUUUUUUUM!

As janelas do ônibus explodiram enquanto os passageiros corriam para se abrigar. Um relâmpago rasgara uma enorme cratera no teto, mas um lamento furioso lá dentro me disse que a Sra. Dodds ainda não estava morta.

— Corram! — disse Sasuke. — Ela está chamando reforços! Temos de sair daqui!

Mergulhamos para dentro dos bosques enquanto a chuva despencava torrencialmente, com o ônibus em chamas atrás de nós e nada à frente a não ser trevas.


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Notas finais do capítulo

E aí? Ficou bom? Ficou uma merda? Eu mereço aplausos? Vaias? Frutas e verduras podres? Podem falar, eu aguento.