NU E PJ: O Ladrão De Raios escrita por The Amazing Spider Green


Capítulo 11
Nunca mais vou olhar para cobras do mesmo jeito


Notas iniciais do capítulo

E aí, pessoal. Puxa, cês devem tá pê da vida comigo, né não? Bom, foi mal, gente, mas eu andei meio distraído. A escola acabou comigo, eu saí de férias pro Nordeste, voltei pra escola, mas isso não concerta a burrada que eu fiz. Espero que sejam capazes de me perdoar, e aqui está mais um capítulo. Fiz com todo o meu esforço e dedicação, e torço pra que gostem.



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N
A
R
U
T
O

Sabe, de algum jeito, é bom saber que há deuses gregos lá fora... porque aí temos alguém para culpar quando as coisas ficam ferradas. Por exemplo, quando você está se afastando a pé de um ônibus que acaba de ser atacado por vadias monstruosas e explodido por um relâmpago, e ainda por cima está chovendo, a maioria das pessoas acha que na verdade isso é apenas uma puta falta de sorte do caralho — quando se é um meio-sangue, a gente sabe que alguma força divina só está tentando foder o nosso dia.

Então lá estávamos nós, meus amigos e eu, andando pelos bosques ao longo da margem do rio, em New Jersey, as luzes de Nova York tornando o céu amarelo atrás de nós e o fedor do rio Hudson entrando por nosso nariz. Cara, eu esperava que as pessoas desse mundo fossem mais higiências! Ao menos nisso o meu mundo é melhor.

Grover estava tremendo e balindo, e seus grandes olhos de bode, cujas pupilas haviam se transformado em fendas — como eu com o chakra da Kyuubi —, estavam cheios de terror.

— Três Benevolentes. As três de uma vez.

— É bom saber em como o meu querido papaizinho se preocupa comigo — murmurei sombriamente.

A explosão das janelas do ônibus ainda ecoava em meus ouvidos. Aquela fora uma das situações mais assustadoras da minha vida, e olha que que eu já estive em muitas situações assustadoras.

Mas Annabeth mereceu meu respeito quando percebi que, mesmo estando superassustada, ela se mantinha firme e nos fazia seguir, dizendo:

— Vamos! Quanto mais longe chegarmos, melhor.

— Todo o nosso dinheiro ficou lá atrás — lembrou Percy. — Nossa comida e nossas roupas. Tudo.

— Valeu, raio de sol — resmunguei. — Seu otimismo me contagia. Me dá até dor de barriga. Que nem o do Sasuke.

Logo fui mal-encarado pelo mesmo.

— Bem, quem sabe se você não tivesse decidido entrar na briga... — Annabeth rosnou.

Me estapeei com isso. Ótimo. Agora teríamos uma luta entre dois semideuses com hiperatividade e cabeças quentes — mais do que os normais, me corrigindo. Era tudo o que precisávamos.

— O que queria que eu fizesse? Deixasse vocês serem mortos?

— Você não precisava me proteger, Percy. Eu ia ficar bem.

— Fatiada como pão de forma — interveio Grover —, mas bem.

Ri com isso.

— Boa, Bodão! — Estendi a mão, em um gesto de high-five. — Toca aqui!

Annabeth me lançou um olhar irritado, o que me fez rapidamente abaixar a mão e assobiar inocentemente, as mãos nas costas e os olhos no alto.

— As latas... Uma sacola de latas perfeitamente boa.

— É, porque as latas eram o que mais tinha de importante naquele ônibus — murmurei para que Grover não me ouvisse.

Nós chapinhamos pelas terras lamacentas, por entre horríveis árvores retorcidas que tinham um cheiro pior que a Kyuubi quando ela não toma banho. É sério, aquela cena parecia saída de um filme de terror.

— Com medo? — perguntou Sasuke aproximando-se de mim, um sorrisinho cínico no rosto. Sakura-chan o seguia, um tanto temerosa.

— O quê? Eu? Com medo? — Fingi indignação. — Por que eu estaria com medo?

— Bom... Esse lugar parece gritar PERIGO, não acha?

Perigo? Eu rio da cara do perigo, ha-ha-ha-ha-ha-ha-ha!

— Você tirou isso de O Rei Leão, não foi? — Ele me fitava exasperado.

— Ahn... E se eu tiver tirado? — Eu queria parecer desafiador, mas infelizmente não pareceu ter funcionado.

— Tudo bem se tiver medo, Naruto. — Sakura-chan me olhou com um sorriso. — Ninguém vai te julgar por isso. Eu sei que essas piadas e jeito duro são apenas uma barreira para impedir todos de verem que você tem medo.

A tempestade havia finalmente acalmado. As luzes da cidade diminuíram atrás de nós, deixando-nos em uma escuridão que sem dúvida cegaria qualquer um. Felizmente, eu não sou qualquer um. Foquei o chakra da Kyuubi nos meus olhos e logo minha visão ficou perfeita, clara como o dia, exceto que completamente vermelha.

— O problema não é esse — eu disse, cansado. — Acontece que muito depende de mim e do Percy. Sinto como se o mundo inteiro estivesse nos meus ombros. O Acampamento Meio-Sangue, o Percy, a Annabeth, o Grover... vocês. Eu quero fugir e correr, chorar num canto até morrer de medo, mas sei que não posso, porque tenho que me manter forte, por vocês... Vocês não entendem: eu não posso sentir medo, senão o mundo acaba!

Busquei manter minhas palavras as mais baixas possíveis, e me esforcei para conter as lágrimas que queriam sair desde o dia em que vim parar nesse mundo — não queria parecer mais molenga na frente de Sasuke e dar mais chantagem para ele do que já estava dando. Tanto estava sobre os meus ombros e os do Percy, tantas pessoas contavam com a gente. Nós tínhamos uma maldita missão impossível por causa dos nossos pais idiotas e nosso tio filho da puta. Que merda, eu só queria ter uma vida normal! Eu não queria ser o carcereiro da poderosa Kyuubi no Yoko, eu não queria ser o filho de Hades, eu não queria ser o neto de Hermes! Eu só queria ser um shinobi normal com problemas normais — treinar, criar novos jutsus, esse tipo de coisa. Mas agora, graças a essa merda toda, eu tinha que salvar o mundo por causa da incompetência dos deuses.

— Naruto... — Sakura-chan estendeu a mão para a minha face, mas eu a impedi.

— Não preciso de pena — eu disse mais rudemente do que pretendia. — Eu preciso de uma maneira de recuperar o dildo elétrico de Zeus.

Quando ela parecia estar prestes a dizer alguma coisa, um piado estridente inundou o local, como o som de uma coruja sendo torturada. Eu quase gritei com dor. Para alguém com audição normal aquele som seria horrível, mas para alguém uma audição canina, bom... Vamos apenas dizer que não é muito agradável.

— Ei, as minhas flautas de bambu ainda funcionam! — exclamou Grover. Internamente eu gemi e chorei igual a um bebezinho. — Se ao menos eu pudesse me lembrar de uma melodia de “achar caminho”, poderíamos sair desses bosques.

Ele soprou algumas notas.

— Mas por enquanto, estamos presos com a melodia de “explodir nossas cabeças” — resmunguei.

— A semelhança da melodia com a de Hillary Duff ainda é questionável — sussurrou Percy para mim. Eu concordei silenciosamente.

Com minha visão aguçada, eu vi que Percy estava caminhando direto para uma árvore.

— Percy, cuid... — Antes que eu pudesse terminar, ele colidiu a cabeça com a árvore e ganhou um galo de tamanho enorme na cabeça — eu juro, aquilo parecia estar cacarejando.

— Por que você não me avisou?! — Ele me encarou irritado.

— Eu tentei, mas você ainda é muito apressado — eu disse, indignado.

Ele bufou, e com essa troca gentil de palavras continuamos o nosso caminho.

Depois de tropeçar, xingar pra cacete e, de modo geral, me sentir uma bosta de cão infernal tamanho jumbo por mais de um quilômetro e meio, comecei a ver luzes à frente. No início pensei que fosse a tal luz que todo mundo fala quando alguém está prestes a bater as botas — e sinceramente, eu estava prestes a aceitá-la de braços abertos — até ver que elas tinham cores multicoloridas: um letreiro de neon.

Continuei pensando na morte, dizendo para mim mesmo: Puta que pariu, o Submundo tem uma propaganda com letreiro de neon. Pelo visto é verdade o que dizem: Hades é mesmo um ricaço.

Mas então senti cheiro de comida — e comida gordurosa, não a romã que Hades deu para Perséfone comer para mantê-la no Submundo. Pela cara dos outros, eles também sentiram. E como o meu olfato é foda, aquilo me afetou ainda mais. Percebi que não havia comido desde que saímos da Colina Meio-Sangue, e ter um demônio dentro de mim era como ter um segundo estômago — tudo o que eu comia devia ser em dobro para satisfazer minha fome.

Continuamos andando até que Percy viu por entre as árvores uma estrada deserta de duas pistas. Do outro lado havia um posto de gasolina fechado, um cartaz de um filme dos anos 90 e uma loja aberta, que era a fonte da luz de neon e do cheiro gostoso.

Não era um restaurante de fast-food como eu esperava. Era uma dessas estranhas lojas de curiosidades de beira de estrada que eu nunca fui por serem um tédio total, que vendem flamingos de jardim, índios de madeira, ursos-pardos de cimento e coisas do gênero — sério, o que as pessoas desse mundo têm na cabeça para querer coisas assim? A construção principal era um armazém comprido e baixo, cercado por quilômetros de estátuas. O letreiro de neon acima do portão era para mim difícil de ler, pois, se existe coisa pior para a minha dislexia do que inglês e japonês normal, é inglês em letras cursivas, vermelhas, em neon. Mas por sorte, eu tinha o meu método de leitura.

Para mim, parecia MEOPRÓI ED NESÕA ED JIDARN AD IAT MEE.

— Que diabo quer dizer aquilo? — perguntou Percy.

— Não sei — disse Annabeth.

— Não faço a mínima ideia. — Sakura-chan encarava aquilo como se tentasse desvendar as palavras.

— Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe — disse Sasuke cruzando os braços, emburrado, como se ele não gostasse do fato de não saber algo.

Eles pareciam ser tão inteligentes — menos Percy — que me esqueci que eles também eram disléxicos.

— Empório de Anões de Jardim da Tia Eme — traduzi.

Todos me olharam surpresos.

— Como diabo você sabe? — perguntou Sasuke chocado e — me atrevo a dizer — irritado.

— O Naruto tem uma técnica de leitura especial — respondeu Percy, revirando os olhos. Ele sempre invejou a minha fabulosa técnica.

— Que seria? — Annabeth me olhou com expectativa.

— Encaro as palavras que leio como um jogo de palavras cruzadas — respondi. — Olho para elas e, quando as letras estão espalhadas, minha mente pensa em dez palavras por segundo para defini-las. Pode não parecer, mas minha mente trabalha mais rápido do que uma mente normal — talvez seja o TDAH. Quando li aquelas letras espalhadas, as palavras mais óbvias que me vieram à mente foram Empório de Anões de Jardim da Tia Eme, principalmente pelo fato de que ali só tem objetos feitos de pedra, principalmente anões. E aí, estou certo, Grover?

— Sim, está — disse Grover, olhando para o letreiro. — Está escrito mesmo Empório de Anões de Jardim da Tia Eme.

— Nossa, Naruto — disse Sakura-chan, surpresa —, não sabia que você tinha uma mente tão...

— Fodástica, incrível, demais, maravilhosa, fabulosa, espetacular? — sugeri esperançosamente.

— ...única — terminou com um sorriso atrevido, me desinflando. Única? Era isso o que eu recebia por ter tal mente brilhante? Que mundo ingrato era esse em que eu vivia, meus deuses?

Nas laterais da entrada, como o anúncio dizia, havia dois anões de jardim de cimento, bem feios e barbados como normalmente são descritos, sorrindo e acenando como se estivessem posando para uma fotografia. Aquilo me incomodou um pouquinho.

Percy atravessou a rua, seguindo o cheiro dos hamburgúeres.

— Ei... — avisou Grover.

— As luzes estão acesas lá dentro — disse Annabeth. — Talvez esteja aberto.

— Lanchonete — falei, ansioso.

— Lanchonete — concordou ela. Awmmm, que megafofo, eles já estavam pensando a mesma coisa! Ahhhhh, modo fanboy on!

— Concordo — disseram Sasuke e Sakura-chan indo até eles, comigo atrás.

— Vocês estão loucos? — disse Grover. — Este lugar é esquisito.

Você é esquisito! — revidei. Foi rude, eu sei, mas eu sou rude quando fico com fome.

O terreno da frente era uma floresta de estátuas: animais de cimento, crianças de cimento, até um sátiro de cimento tocando as flautas. Nem preciso dizer que Grover quase se cagou de medo com aquilo.

Béééé! — baliu. — Parece meu tio Ferdinando.

Paramos diante da porta do armazém.

— Não batam — implorou Grover. — Sinto cheiro de monstros.

— Seu nariz está congestionado com as Fúrias — disse-lhe Annabeth. — O único cheiro que estou sentindo é de hambúrgueres. Você não está com fome?

— Carne! — disse ele, desdenhoso. — Sou vegetariano.

— Você come enchiladas de queijo e latas de alumínio — disse Percy, fazendo-me rir. Era verdade, né?

— São vegetais. Venham, vamos embora. Essas estátuas estão... olhando para mim.

Aquilo me estranhou. Eu sentia uma pontada na cabeça, como se alguma coisa quisesse me dizer algo, mas houvesse algo que a impedisse de se manifestar. Decidi ignorar aquilo e pensar apenas com o estômago, como todo o bom garoto em fase de crescimento.

Então a porta se abriu rangendo, e diante de nós estava uma mulher alta, do Oriente Médio. Ela vestia um longo vestido preto que escondia tudo menos as mãos, e sua cabeça estava coberta por um véu. Seus olhos brilhavam embaixo de uma cortina de gaze preta, mas isso foi tudo o que pude distinguir — e aquele brilho meio que me apavorava. As mãos cor de café pareciam velhas, mas bem cuidadas e elegantes, portanto ela poderia ser uma avó que já fora uma bonita dama.

E eu ouvia um barulho semelhante a um... chiado? O que estava acontecendo aqui?

O sotaque da mulher também parecia ser do Oriente Médio. Ela disse:

— Crianças, já é muito tarde para estarem sozinhas na rua. Onde estão seus pais?

Eu franzi a testa. Eu não tinha pais. Ou pelo menos uma mãe.

— Eles estão... ahn... — Annabeth começou a dizer.

— Nós somos órfãos — falou Percy, fazendo a carranca no meu rosto se aprofundar. Ele sabia que eu não gostava daquela palavra.

— Órfãos? — disse a mulher. A palavra soou estranha em sua boca, e aquilo só intensificou o meu ódio por aquela palavra. — Mas meus queridos! Certamente não!

— Nós nos perdemos da caravana — continuou Percy. — A caravana do nosso circo. O mestre de cerimônias nos disse para encontrá-lo no posto de gasolina se nos perdêssemos, mas ele pode ter se esquecido, ou talvez se referisse a outro posto de gasolina. De qualquer modo, estamos perdidos. Esse cheiro é de comida?

Eu espalmei a testa. Aquela mulher nunca acreditaria em uma coisa tão absurda. Percy, pelo amor de cada deus que existe — e os que não existem —, não pense com o estômago quando for inventar uma história!

— Ah, meus queridos — disse a mulher, para a minha surpresa. — Vocês precisam entrar, pobres crianças. Eu sou a tia Eme. Vão direto para os fundos do armazém, por favor. Ali há um lugar para as refeições.

Nós agradecemos e entramos.

Annabeth murmurou para o meu amigo filho de Poseidon:

— Caravana do circo?

— Sempre há uma estratégia, certo?

— Sua cabeça está cheia de algas.

Eu dei uma risada discreta com aquilo. Sasuke e Sakura me deram olhares estranhos, mas eu apenas os ignorei.

O armazém era abarrotado de estátuas, estátuas e mais estátuas — pessoas, todas em poses diferentes, usando roupas diferentes e com expressões diferentes no rosto.

Eu senti aquela pontada na minha cabeça de novo, como uma voz, mas eu ignorei tudo o que acontecia a minha volta com o cheiro da comida. Pode me chamar de idiota com um estômago de demônio, mas eu não comia há muito tempo e o cheiro da comida da tia Eme era — no eufemismo da palavra — demais. Eu nem reparei nos soluços nervosos de Grover, nem no modo como os olhos pareciam me seguir ou no fato de que a tia Eme trancara a porta atrás de nós. Tudo o que importava era a comida e o som satisfeito do meu suspiro quando eu a comesse.

Mas ainda assim, eu não podia deixar de me preocupar um pouco.

Nós finalmente chegamos no lugar das refeições, no fundo do armazém, um balcão de sanduíches com uma grelha, uma máquina de refrigerantes, uma estufa de pretzels e uma máquina de queijo nacho. Tudo o que poderíamos querer e desejar e sonhar, mais algumas mesas de piquenique de aço na frente.

— Por favor, sentem-se — disse a tia Eme.

— Fantástico — comentou Percy.

— Hum — disse Grover com relutância —, não temos nenhum dinheiro, senhora.

Eu queria dar um soco na nuca dele, mas a tia Eme disse:

— Não, não, crianças. Nada de dinheiro. Esse é um caso especial, certo? Para órfãos tão simpáticos, é por minha conta.

— Obrigada, senhora — disse Annabeth.

Domo arigatô. — Sakura-chan curvou-se respeitosamente.

Tia Eme enrijeceu, como se Annabeth e Sakura-chan tivessem dito algo de errado, mas depois, com a mesma rapidez, relaxou. Aquilo me fez aumentar um pouco a guarda — só um pouco.

— Não tem de quê, meninas. Nossa, Annabeth, você tem uns olhos cinzentos tão bonitos. — Eu imaginei como ela sabia o nome de Annabeth, quando não tínhamos nem nos apresentado. A menos que ela fosse médium e cartomante no tempo livre, eu não acho que ela saberia os nossos nomes.

Tia Eme desapareceu atrás do balcão e começou a cozinhar.

A pontada na minha cabeça crescia, como um tumor crescendo no meu cérebro. Agarrei minha nuca, tentando relaxar, ou pelo menos o máximo de relaxamento que alguém com a cabeça explodindo pode ter.

E, antes que me desse conta, a tia Eme tinha nos trazido bandejas de plástico com cheeseburgers duplos, mil-shakes de baunilha e porções gigantes de batatas fritas.

Sasuke e eu não comemos nada. De repente minha fome parecia ter sumido.

— Não vão comer, Naruto, Sasuke? — perguntou a tia Eme, e com minha mente mais clara, novamente me perguntei como ela sabia nossos nomes.

— Não estou com fome, arigatô — eu disse.

— Idem — concordou Sasuke.

— O que é esse chiado? — perguntou Grover de repente. Eu franzi a testa. Então era mesmo um chiado o que tinha ouvido antes.

— Chiado? — perguntou tia Eme. — Talvez você esteja ouvindo o óleo de fritura. Você tem bons ouvidos, Grover.

Novamente a questão dos nomes se levantou na minha cabeça.

— Eu tomo vitaminas. Para os ouvidos. — Grover parecia mais desconfortável ainda.

— Admirável — disse tia Eme. — Mas, por favor, relaxe.

Tia Eme não comeu nada. Ela não descobrira a cabeça nem para cozinhar, e agora estava sentada com os dedos entrelaçados, observando enquanto os outros comiam.

— Tem algo errado aqui — sussurrou Sasuke.

— Eu sei, mas não faço ideia do que seja — eu disse. — Tem alguma coisa na minha cabeça parecendo querer me avisar o que é, mas é como se algo me impedisse de saber o quê.

— Não, você não entende — disse Sasuke. — Eu usei o meu sharingan para olhar o lugar. Naruto, as estátuas têm pontos de chakra.

Arregalei os olhos.

— Então, você vende anões — falou Percy de repente, parecendo querer puxar conversa e impedindo a minha atual com o Sasuke.

— Ah, sim — disse tia Eme. — E animais. E pessoas. Tudo para o jardim. Sob encomenda. As estátuas são muito populares, sabe.

— Muito movimento nesta estrada?

— Não, nem tanto. Desde que a autoestrada foi construída... a maioria dos carros já não passa por esse caminho. Preciso cuidar bem de cada cliente que recebo.

Eu de repente senti um par de olhos me observando intensamente. Me virei, mas era apenas a estátua de uma garotinha segurando uma cesta de Páscoa. Os detalhes eram incríveis, muito melhores que os vistos na maioria das estátuas de jardim. Mas havia algo de errado no rosto. Ela parecia assustada, até apavorada.

As estátuas têm pontos de chakra, dissera Sasuke. Mas o que aquilo significava?

Franzi a testa, desconfiado. Meus sentidos começavam a se apurar novamente, superando o cheiro da comida da tia Eme.

— Ah! — disse a dita cuja com tristeza. — Você pode notar que algumas das minhas criações não dão muito certo. Elas são defeituosas. Não vendem. O rosto é a parte mais difícil de sair perfeito. Sempre o rosto.

— Você mesma faz estas estátuas? — perguntou Percy.

— Ah, sim. Já tive duas irmãs para me ajudar no negócio, mas elas faleceram, e a tia Eme ficou sozinha. Só tenho as minhas estátuas. É por isso que as faço, sabe? São minha compania. — A tristeza na voz dela parecia tão profunda e tão real que até eu não pude deixar de sentir pena.

Annabeth e Sakura-chan tinham parado de comer. A rosada se inclinou e disse:

— Duas irmãs?

— É uma história terrível — disse tia Eme. — Não é para crianças, na verdade. Veja, Sakura, uma mulher má estava com inveja de mim, muito tempo atrás, quando eu era jovem. Eu tinha um... um namorado, sabe, e essa mulher má estava determinada a nos separar. Ela provocou um acidente terrível. Minhas irmãs ficaram do meu lado. Compartilharam a minha má sorte enquanto foi possível, mas por fim morreram. Elas se esvaíram. Só eu sobrevivi, mas a um preço. Que preço.

Eu franzi a testa. Todos aqueles fatores se mexiam em volta do meu cérebro. Eu sabia que aquela história devia me lembrar de algo, mas o quê?

— Percy? — Annabeth sacudiu Percy para chamar sua atenção. — Acho que devemos ir. Quer dizer, o mestre de cerimônias do circo deve estar esperando.

A voz dela parecia tensa. Grover estava comendo o papel encerado da bandeja, mas se tia Eme estranhou aquilo, não disse nada.

— Que olhos cinzentos bonitos — disse ela, outra vez, para Annabeth. — Ah, mas faz muito tempo que não vejo olhos cinzentos como esses.

Ela estendeu o braço somo se fosse acariciar o rosto de Annabeth, mas Annabeth se levantou abruptamente.

— Precisamos mesmo ir.

— Sim! — Grover engoliu o papel encerado e pôs-se de pé. — O mestre de cerimônias está esperando! Isso!

— Com certeza — dattebayo! — concordei, deixando deslizar o meu tique verbal, coisa que não faço há algum tempo.

— Por favor, queridos — implorou a tia Eme. — É tão raro eu estar com crianças... Antes de ir, não gostariam pelo menos de posar para uma foto?

— Uma foto? — perguntou Annabeth com cautela.

— Sim, uma fotografia. Vou usá-la como modelo para um novo conjunto de estátuas. Crianças são muito populares, sabem? Todo o mundo ama crianças.

Annabeth se balançou de um pé para o outro.

— Acho que não podemos, senhora. Vamos, Percy...

— Claro que podemos — interrompeu Percy irritado. — É só uma foto, Annabeth. Qual é o problema?

— Sim, Annabeth — a mulher murmurou. — Não há problema nenhum.

Annabeth não tinha gostado, mas deixou que tia Eme nos levasse para fora pela porta da frente, para o jardim de estátuas.

Tia Eme nos conduziu até um banco de jardim perto do sátiro de pedra.

— Agora — disse ela — vou posicionar vocês corretamente. As mocinhas no meio, acho, e dois dos três jovens cavalheiros em cada lado, enquanto os outros dois ficam atrás.

Sakura-chan e Annabeth ficaram no meio, com Percy e Grover em cada lado, enquanto Sasuke e eu ficávamos atrás.

— Não há muita luz para uma foto — observou Percy.

— Ah, é o suficiente — disse tia Eme. — Suficiente para enxergarmos um ao outro, não é?

— Onde está sua câmera? — perguntou Grover.

Tia Eme deu um passo atrás, como que para admirar a foto.

— Agora, o rosto é o mais difícil. Vocês podem sorrir para mim, por favor, todo mundo? Um grande sorriso?

Grover deu uma olhada para o sátiro de cimento a seu lado e murmurou:

— Parece mesmo com o tio Ferdinando.

— Grover! — ralhou tia Eme. — Olhe para este lado, querido.

Ela ainda não tinha nenhuma câmera nas mãos.

— Percy... — disse Annabeth.

Eu de repente ouvi o chiado de novo, mais forte, e percebi que o chiado pertencia a... cobras. Um monte delas.

Naruto, é uma armadilha!, ouvi a voz da Kyuubi na minha mente. A pontada era ela tentando me avisar!

— Não vai demorar nem um segundo — disse tia Eme. — Sabe, não consigo vê-los muito bem por causa deste maldito véu...

— Percy, alguma coisa está errada — insistiu Annabeth.

Naruto sentia que podia desmaiar com a sensação de perigo.

— Errada? — disse tia Eme, erguendo as mãos para remover o véu em volta da cabeça. — De modo algum, querida. Estou em tão nobre companhia esta noite. O que poderia estar errado?

Chiados de cobras, pensei, cauteloso. Estátuas de pedra com expressões de pânico e pontos de chakra... Tia Eme... Tia “M”... Fúria de Titãs... AH, PORRA!

— Aquele é o tio Ferdinando! — disse Grover, arfando.

— Não olhem para ela! — gritou Annabeth. Num piscar de olhos ela colocou seu boné dos Yankees na cabeça e desapareceu. Suas mãos invisíveis empurraram Percy e Grover para fora do banco.

Sasuke, Sakura-chan e eu pulamos do banco e corremos o mais rápido que pudemos, nos colocando na parede.

Percy estava bem na frente da tia M, os olhos na direção dos pés com sandálias. Ela retirou completamente o véu, revelando centenas de cobras no lugar dos cabelos, chiando e pulando. Agh, que nojo. Toda a sua pele enrugou e ficou cheia de verrugas, e afiadas garras de bronze substituíram suas unhas.

Percy quase olhou para o alto, mas Annabeth, que estava atrás dele gritou:

— Não! Não olhe!

— Como pude ser tão estúpido?! — berrei, furioso. — Um dos montros mais famosos da mitologia grega bem na minha cara, com todos os fatores bem debaixo do meu nariz, e eu não percebi?! — Me virei para os meus amigos grudados na parede como eu. — Pensa, gente: como foi que a Medusa morreu no mito?! Eu não consigo me lembrar!

— Medusa foi morta pelo chará de Percy — Perseu! — disse Sakura-chan. — Ele olhou para ela através do reflexo de seu escudo de bronze para não ser transformado em pedra. Após decaptá-la, entregou a cabeça à deusa Atena, que a fixou ao seu escudo.

— Corra! — baliu Grover.

Ele correu pelos pedregulhos, gritando “Maia!” para dar partida em seus tênis voadores. Percy não se mexeu, apenas olhando para as garras encarquilhadas de tia Eme. Meus olhos se estreitaram.

— Que pena ter de destruir um jovem rosto tão bonito — disse em tom confortador. — Fique comigo, Percy. Tudo o que tem a fazer é olhar para cima.

Percy olhou para uma das esferas espelhadas que as pessoas põem nos jardins. Aparentemente, ele viu o reflexo do monstro, pois sua expressão ficou horrorizada.

— A dos Olhos Cinzentos fez isso comigo, Percy — disse a Medusa, mas ela não soava como um monstro. Aquele tom parecia o mesmo que o Hokage-Jiji usava para me confortar quando era pequeno, me dizendo que as coisas iriam melhorar, que eu não precisava ter medo. — A mãe de Annabeth, a patrona de Sakura, a maldita Atena, transformou a bela mulher que eu era nisto aqui.

— Não dê ouvidos a ela! — gritou Annabeth entre as estátuas. — Corra, Percy!

— Silêncio! — rosnou a Medusa. Depois sua voz voltou ao Modo Jiji. — Você está vendo por que preciso destruir as meninas, Percy. Uma é filha de minha inimiga, e a outra é a escolhida dela. Vou esmagar suas estátuas até virarem pó. Mas você, querido, você não precisa sofrer.

— Não — murmurou Percy, parecendo querer se levantar.

Bati na minha testa. De todos os momentos em que ele escolhe ser submisso.

— Você quer mesmo ajudar os deuses? — perguntou a Medusa. Senti um frio na espinha com aquelas palavras. — Entende o que o espera nessa missão boba, Percy? O que acontecerá se chegar ao Mundo Inferior? Não seja um peão dos olimpianos, meu querido. Você estará melhor como estátua. Menos dor. Menos dor.

— Percy!

Grover voou até eles com um galho de árvore do tamanho de um taco de beisebol. Ele estava com os olhos fechados. Ele se guiava pelos ouvidos e nariz.

— Abaixe-se!

Eu sorri. Finalmente Grover estava mostrando algumas bolas por baixo daquela baitolice toda.

— Abaixe-se! — gritou ele de novo. — Vou pegá-la!

Ele a acertou, para surpresa de Naruto. Logo, a Medusa deu um rugido irritado.

— Seu sátiro miserável! — rosnou. — Vou acrescentá-lo à minha coleção!

— Essa foi pelo tio Ferdinado! — gritou Grover de volta.

Percy saiu correndo aos tropeções e se escondeu entre as estátuas enquanto Grover mergulhava para mais um ataque.

Pimba!

— Aaargh! — berrou a Medusa, as serpentes do cabelo sibilando e cuspindo, e me deixe te dizer, não é uma visão bonita.

— Vamos! — disse a Sasuke e Sakura-chan, que assentiram e me seguiram quando pulei na direção em que Percy foi.

— Percy! — chamei, ficando ao seu lado.

Ele olhava para o nada com uma expressão aterrorizada, como se tivesse sofrido um trauma. Suspirei. Pressão durante a batalha. Se há um inimigo maior que o próprio inimigo para um guerreiro é isso.

— Percy! — gritei.

— Não está funcionando — disse Sakura-chan preocupada.

Dei um tapa forte em seu rosto. Nada aconteceu. Outro. O mesmo resultado.

— Ah, pelo amor dos deuses — resmungou Sasuke irritado. — Deixa comigo.

Ele cerrou os dedos e deu um soco forte na mandíbula de Percy, até fazendo ele cair.

— Ai! — O moreno esfregou o local atingido pelo Uchiha, encarando o dito cujo com olhos verdes brilhando com fúria. — Por que você fez isso?!

— Você não acordava. — Sasuke deu de ombros.

— E eu achando que Naruto fosse a pessoa mais irritante que já conheci — sussurou ele, o que eu ouvi graças a minha audição apurada. Parte de mim ficou com raiva e a outra estava divertida.

Ao lado de Percy, a voz de Annabeth disse:

— Percy!

Percy pulou tão alto que seus pés quase derrubaram um anão de jardim.

— Ai! Não faça isso!

Annabeth tirou o boné dos Yankees e se tornou visível.

— Percy, você tem de cortar a cabeça dela.

— O quê? Está louca? Vamos dar o fora daqui.

— A Medusa é uma ameaça. Ela é má. Eu mesma a mataria com a ajuda de Sakura e Sasuke, mas... — Annabeth engoliu em seco, como se estivesse prestes a admitir algo difícil. — Mas você tem a melhor arma. Além disso, nunca vou conseguir chegar perto dela. Ela me faria em pedacinhos por causa de minha mãe, e ela faria o mesmo com Sakura por minha mãe ser sua patrona. Você... você tem uma chance.

— O quê? — Percy a encarou com os olhos arregalados. — Eu não posso...

— Olhe, você quer que ela transforme mais gente inocente em estátua?

Ela apontou para as estátuas de um casal apaixonado, um homem e uma mulher abraçados, transformados em pedra pelo monstro. Putz, isso foi sacanagem da Annabeth, apelar para a lealdade e senso de dever e honra de Percy.

A loura em questão agarrou uma esfera espelhada verde de um pedestal próximo.

— Um escudo espelhado seria melhor. — Ela estudou a esfera com um ar crítico. — A convexidade causará uma certa distorção. O tamanho do reflexo estará distorcido por um fator de...

Percy e eu encaramos com os olhos vidrados. De que porra ela estava falando?!

— Quer falar numa língua que eu entenda? — perguntou meu melhor amigo confuso e frustrado.

— Pelo amor dos deuses do Olimpo, você é ainda mais complicada que a Sakura-chan! — exclamei atordoado.

Sakura me encarou de um jeito que me fez desejar arrancar a porcaria da minha língua fora.

Estou falando! — Ela lhe jogou a bola de vidro. — Só olhe para a Medusa pelo espelho. Nunca olhe diretamente para ela.

— Ei, gente! — gritou Grover em algum lugar acima deles. — Acho que ela está inconsciente.

— Seu idiota! — gritei, exasperado. — Você acabou de nos azarar!

Grrraaaurrr!

— Você está certo — concordou ele comigo. E mergulhou para mais um ataque.

— Depressa — disse Annabeth para Percy. — Grover tem um excelente nariz, mas vai acabar caindo.

Percy pegou sua caneta e tirou a tampa. A lâmina de bronze de Contracorrente se alongou em sua mão.

— Boa-sorte, Percy. — Lhe dei uma batida leve no ombro. — Você consegue acabar com aquela coisa. Você tem a força.

— Você não vai comigo? — perguntou ele de olhos arregalados.

— Ficou maluco?! — gritei. — Aquela coisa vai me destroçar! Quem em sã consciência faria isso?! — Percy me deu o mau-olhado. — Tá bom, tá bom, foi mal. Mas é sério, cara, Annabeth estava certa quando falou que nós seríamos destruídos. Só você pode fazer isso. Você é filho de Poseidon, ex-namorado da Medusa. Acho que ela ainda tem sentimentos por ele.

— Ótimo — resmungou Percy. — Sou atraente para uma velha com mais de três mil anos de idade que, provavelmente, vai me molestar. Isso é errado em vários níveis e é um novo nível alcançado de pedofilia.

Ri e dei tapinhas em seu ombro.

— Só tenha confiança em você mesmo. E mesmo se não a tiver, saiba que eu tenho.

Ele sorriu para mim.

— Valeu, Naruto. É em momentos como esse que fazem eu me lembrar do porquê eu ainda sequer me preocupo em sair com você.

Percy foi até o campo de batalha, seguindo os sons de silvos e cuspidas do cabelo da Medusa.

— Você sabe que poderia derrotar a Medusa, né? — perguntou Sakura-chan confusa.

— Sei. — Assenti com a cabeça. — Mas Percy é novo na batalha. Ele precisa se acostumar a enfrentar essas coisas. Eu nem sempre vou estar lá para cuidar dele.

— Você é um amigo muito leal, Naruto — disse Sasuke balançando a cabeça.

— Obrigado. — Sorri.

— Não foi um elogio. — Meu sorriso se apagou.

Vi Percy encarando o espelho, assistindo o reflexo de Grover descendo para mais um assalto com o bastão, mas dessa vez um pouco baixo demais. A Medusa agarrou o bastão e o desviou de curso. Ele deu uma cambalhota no ar e tombou nos braçosde um urso-pardo de pedra com um dolorido “Uummmpff!”.

A Medusa estava prestes a pular em cima do pobre sátiro quando Percy gritou:

— Ei!

Eu roía minhas unhas, os olhos enormes e assustados. Sei que disse que nem sempre estaria lá para cuidar dele, mas porra, era difícil ver seu melhor amigo caminhando para uma possível morte eminente, transformado em pedra para sempre. Vai me dizer que também não ficaria um pouco preocupado.

Ele avançou na direção dela, tropeçando no caminho, por causa da espada e da bola de vidro em seus braços. Se a Medusa o atacasse, com certeza seria difícil ele se defender.

Quando notei que minhas unhas já estavam todas ruídas, olhei para as mãos de Sasuke e, dando de ombros, peguei uma e comecei a roer suas unhas também. Sasuke me encarou indignado, mas resolvi ignorá-lo.

O monstro deixou que Percy se aproximasse — seis metros, três metros.

A cada passo que ele ficava mais perto dela, mais preocupado eu ficava. E o pior é que nem havia mais unhas para roer. As meninas com certeza não deixariam que eu roesse suas unhas, e se há algo que eu tenho mais medo do que um exército de monstros, esse algo é duas mulheres irritadas — principalmente se estiverem irritadas comigo.

Percy hesitou, parecendo paralisado. Ele encarava o espelho, aparentemente hipnotizado pela aparência da Medusa. Seus olhos estavam cravados no espelho, e seus braços fraquejaram. É, com gosto não se discute. Acho que ele puxou o gosto por mulheres monstruosas do pai.

De cima do urso-pardo de cimento, Grover gemeu:

— Percy, não lhe dê ouvidos!

A Medusa gargalhou.

— Tarde demais.

Ela se lançou até mim com suas garras.

Um grito feminino e assustado foi ouvido. Era ensurdecedor e fino, como o de um violino desafinado. De primeira achei que fosse Sakura-chan ou Annabeth, mas então vi Sasuke me encarando estranhamente.

— Cara, você tá gritando como uma menina — afirmou com cara de tacho.

Rapidamente parei de gritar e limpei a garganta, tentando recuperar minha postura.

— Foi mal. Perdi a cabeça.

— E a dignidade.

— Ah, cale a boca!

Percy deu um golpe com a espada, o pescoço fazendo um plof! nauseante, e então o corpo da Medusa transformou-se em areia e desintegrou-se.

A cabeça, porém, permaneceu, caindo no chão ao lado do pé de Percy. Uma gosma nojenta e podre escorria do pescoço dela, molhando os sapatos de Percy e as pequenas serpentes agonizando na cabeça da Medusa puxavam seus cadarços.

— Ah, eca! — disse Grover. Seus olhos ainda estavam bem fechados, mas parecia ouvir a cabeça gorgolejando e fumegando. — Megaeca.

Annabeth se aproximou de Percy, os olhos fixos no céu. Estava segurando o véu preto da Medusa. Eu e meus parceiros de time fomos logo atrás.

— Não se mova — disse ela.

Com muito, muito cuidado, sem olhar para baixo, a loura ajoelhou-se e embrulhou a cabeça do monstro no pano preto, depois a ergueu. Ainda estava pingando um suco verde.

— Tubo bem com você? — perguntou para Percy com a voz trêmula.

— Sim — respondeu ele, embora parecesse um pouco verde.

Corri até ele e inspecionei seu corpo, atrás de quaisquer ferimentos ou picadas.

— Você está bem? Aquela coisa não te picou? Você sente alguma ferida?

— Deuses, Naruto, não! — Percy afastou-se de mim, irritado. — Puxa, você é mais mamãe-coruja do que a minha própria mãe.

O encarei furioso e logo em seguida lhe dei um tapa bem dado no topo da cabeça.

— AI!

— Peraí, por que a cabeça não evaporou? — perguntei, me dando conta do fato, sequer me importando com os gemidos de Percy agarrando a cabeça.

— Depois que você a decepa, ela se torna um troféu de guerra — explicou Annabeth. — Como os chifres do Minotauro. Mas não a desembrulhe. Ainda pode petrificá-lo.

Grover gemeu enquanto descia da estátua do urso-pardo. Estava com um grande vergão na testa. O boné rastafári verde estava pendurado em um dos pequenos chifres de bode e os pés falsos haviam sido arrancados dos cascos. Os tênis mágicos voavam sem rumo em volta de sua cabeça. Admito que rolou uma risadinha.

— Nosso grande aviador — disse Percy. — Bom trabalho, cara.

Ele conseguiu dar um sorriso envergonhado.

— Se bem que, na verdade, não foi nada divertido. Bem, a parte de acertá-la com o pau, isso foi bom. Mas me arrebentar contra um urso de concreto? Nada divertido.

Envolvi um braço em seu ombro e dei tapinhas em sua cabeça.

— Não liga, acontece com todo mundo. Acredite em mim, eu sei.

Ele agarrou os tênis no ar. Percy pôs a tampa em sua espada. Juntos, nós seis voltamos cambaleando para o armazém.

Nós encontramos alguns sacos plásticos velhos atrás do balcão de lanches e embrulhamos duas vezes a cabeça da Medusa. Com um plop, largamos a coisa em cima da mesa onde havíamos jantado antes de quase sermos mortos e nos sentamos em volta exaustos demais para falar.

Por fim Percy disse:

— Então temos de agradecer a Atena por esse monstro?

Annabeth lhe lançou um olhar irritado. Tremi. Essa não, mais uma luta Poseidon/Atena!

— A seu pai, na verdade. Medusa era namorada de Poseidon. Eles combinaram um encontro no templo de minha mãe. Foi por isso que Atena a transformou em um monstro. A Medusa e suas duas irmãs, que a ajudaram a entrar no templo, se transformaram nas três Górgonas.

— Mas Atena não podia simplesmente tê-las matado? Precisava criar três porras de monstros superpoderosos? — comentei distraído olhando para o alto.

Annabeth me lançou o mesmo olhar que lançou para Percy, porém eu podia ver em seus olhos que ela concordava.

— É por isso que ela queria me picar em pedacinhos, mas ia conservar você, Percy, como uma bela estátua. Ainda gosta de seu pai. Você deve tê-la feito se lembrar dele.

O rosto de Percy ficou vermelho.

— Ah, então a culpa de termos encontrado a Medusa é minha?

Annabeth endireitou o corpo. Em uma péssima imitação da voz de Percy, disse:

— “É só uma foto, Annabeth. Qual é o problema?”

— Deixa para lá — falou Percy. — Você é impossível.

— Você é insuportável.

— Você é...

Ah, briga de casal, sempre divertida e sangrenta, pensei sorrindo.

— Ei! — Interrompeu Grover. — Vocês dois estão me dando enxaqueca. E sátiros nem têm enxaqueca. — Admito: rolou mais uma risadinha. — O que vamos fazer com a cabeça?

Percy olhou para aquela coisa. Uma pequena serpente estava pendurada para fora de um buraco no plástico. As palavras impressas no saco diziam: AGRADECEMOS SUA VISITA!

Revirei os olhos.

— Que belo modo de agradecer: transformar os clientes em estátuas! Que porra de mundo em que os gregos vivem é esse — tebbayo?!

Percy encarava o saco com uma fúria nova nos olhos, um tipo de fúria que eu conhecia muito bem: rancor. Nem precisava pensar muito para saber que ele guardava rancor dos deuses — principalmente de seu pai — por terem nos enviado para essa porra de missão, nos desviado de nosso caminho e ainda terem nos dado duas batalhas fodidas logo no primeiro dia fora do acampamento. Eu também estava com raiva dos deuses — principalmente Hades.

Percy se levantou.

— Volto já.

— Percy — chamou Annabeth. — O que você...

Percy vasculhou os fundos do armazém até encontrar o escritório da Medusa comigo atrás dele. Seu livro-caixa mostrava as seis vendas mais recentes, todas remessas para o Submundo para decorar o jardim de Hades e Perséfone — é claro, meu amoroso pai e minha amada madrasta teriam esse tipo de humor torcido. De acordo com uma nota de embarque, o endereço de cobrança do Submundo era Estúdios de Gravação M.A.C. — Morto ao Chegar —, West Hollywood, Califórnia. Percy dobrou a nota e a enfiou no bolso.

Na caixa registradora nós encontramos vinte dólares, uns dracmas de ouro e algumas guias de remessa do Expresso Noturno de Hermes, cada qual com uma pequena bolsa de couro anexa, para moedas. Ele vasculhou o restante do escritório até encontrar uma caixa do tamanho certo. Eu nem precisava perguntar para saber seu plano.

Nós voltamos para a mesa de piquenique, o meu melhor amigo encaixotou a cabeça da Medusa e preencheu uma guia de remessa.

Aos Deuses
Monte Olimpo
600º andar,
Edifício Empire State
Nova York, NY
Com os melhores votos,
PERCY JACKSON

— Eles não vão gostar disso — advertiu Grover. — Vão achá-lo impertinente.

— Ele é impertinente — disse eu. — E querem saber, eu também sou. Bota o meu nome aí embaixo.

Percy o fez, um sorrisinho malicioso no rosto.

Ele colocou alguns dracmas de ouro na bolsa anexa. Assim que a fechou, veio um som como o de uma caixa registradora. O pacote flutuou para fora da mesa e desapareceu com um pop!.

Percy olhou para Annabeth, desafiando-a a criticá-lo.

Ela não criticou. Parecia resignada com o fato de Percy ter um talento especial para chatear os deuses.

— Vamos — murmurou ela. — Precisamos de um novo plano.


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Notas finais do capítulo

O.k., eu já vou avisar que o próximo capítulo também pode demorar. Mas antes que me chutem e destrocem, eu juro que vou me esforçar ao máximo pra postar o capítulo. E, eu acrescento, que mesmo que demore um ano inteiro pra eu postar, nunca percam a esperança de que eu vou postar mais um capítulo, porque eu prometi ir com isso até o fim, e promessa pra mim é dívida!
Do seu Amigão da Vizinhança, o Spider Green.



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