Meu Quase Melhor Amigo escrita por JéssicaSuhett


Capítulo 2
O2 x O1




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Meu grande objetivo sempre foi o de ser a melhor, pois tudo que eu fazia, não importava o que fosse, Georgina conseguia me superar. Sempre graciosa e educada, esbelta, seus cabelos louros e acetinados estavam sempre muito bem presos e no lugar. Georgina era impecável. John ficou feliz, quando a mesma ganhou a Miss Mirim do estado de New Jersey. Éramos crianças, porém o extinto de competição já havia nascido dentro de nós.

Sempre fui uma garota espoleta, não me importava com os bons modos, e meu cabelo parecia um ninho de passarinho. Estava sempre brigando com a balança por ter uns quilinhos a mais, que meu pediatra, insistia que eu devesse perder. Gostava de brincar na lama, procurar minhocas e caçar borboletas. Eu nunca cheguei a participar de um concurso de Miss. Por outro lado, participei do concurso de soletração. John ficou muito orgulhoso, como não ficava há anos, quando levei o prêmio de primeiro lugar para casa naquele ano. Ele sequer desconfiou que eu soubesse soletrar. John guarda o troféu na estante, em um lugar especial. Eu gostei que ele tivesse o colocado lá, me mostrou que ele ainda se importa comigo. E pela primeira vez eu superei a garotinha de Meredith, desde então, me esforço para ser uma aluna letra A.

Quando fomos transferidas para o St. Marta High School, fiquei tão curiosa sobre o nome e acabei pesquisando sobre. Achei genial a escola ter sido um convento, que fechou por falta de verbas, mesmo que os pais das alunas pagassem para que as filhas tivessem uma educação. Depois de muitas reformas, St. Marta tornou-se de fato um colégio, o melhor do estado. Eu estava feliz com a possibilidade de fazer amigos finalmente, eu precisava ter com quem conversar, porém St. Marta foi apenas outra decepção em minha vida.

Eu deveria me acostumar com as decepções, afinal, era basicamente isso que havia sobre mim. Nanny me decepcionou ao dizer que ficaria, quando na verdade aceitou calada a demissão que Meredith lhe impôs, simplesmente indo embora sem lutar. John me decepcionou quando disse que éramos melhores amigos, mas afastou-se de mim estabelecendo apenas vinculo de pai e filha, quando se casou novamente. Eu não conseguia compreender o porquê ele sempre estava cansado demais para me ouvir ou simplesmente me por para dormir a noite. Ele somente me disse que eu estava velha demais para isso.

Eu cheguei a pedir que ele me mandasse para morar com a vovó, porém, ao saber que teria chance de estudar no St. Marta, apenas desisti da ideia. Eu precisava ser a melhor em algo, e provar para Meredith, que mesmo não sabendo arrumar os cabelos ou conseguir manter me limpa, não me fazia pior do que sua filha.

Foi nessa época, que aprendi que a melhor solução para quando a situação está insuportável, é ignorar. Eu passei dias ignorando as falas debochadas de Meredith. Eu agradecia aos céus, quando só precisava suporta-la e manter-me calada no horário do jantar.

Estudar e passar um tempo com os livros me ajudou bastante a conseguir o controle que necessitava. Logo minha presença quase não era notada. Meredith cansou e parou com as provocações, e isso me reconfortou. Mesmo que não tenha durado muito tempo, pois logo ela encontrou outro modo de me atormentar.

Meu sobrepeso era um assunto que gerou muitas brigas, ela passou a controlar a minha alimentação, reclamei com meu pai, porém ele não fez muita coisa. Foi então que comecei a comprar besteiras no mercado perto da escola, e a contrabandear guloseimas para meu quarto usando minha mochila. Às vezes simplesmente dizia que estava indo mais cedo para escola, quando na verdade, estava indo à confeitaria que fica duas quadras após a minha casa.

Eu conheci pessoas legais na confeitaria. Havia a senhora do balcão, com seu coque, rosto rosado e sorriso gentil. Ela sempre colocava um doce a mais para mim. Havia o senhor estranho com chapéu de marinheiro, ele não falava com ninguém, apenas sentava-se ali ao longo de toda manhã, deixando seu café puro esfriar. Havia também duas velhinhas que adoravam gargalhar alto e tomar chá, e havia o Sr. Bob e seu fiel cachorro Dickson.

St. Marta fica relativamente perto da minha casa. Eu apenas tenho que atravessar quatro quarteirões e meio, a escola fica bem no centro de Newark, cidade onde moro. É um ótimo lugar e o melhor é que fica perto de New York, Isso é muito bom para os negócios de John. Eu geralmente faço esse percurso a pé, ou quando estou muito atrasada, faço de bicicleta.

Eu havia completado 16 anos, e estava para tirar minha carta de motorista, porém eu não havia ganhado nenhum carro ainda. Eu também não tive uma festa de sixteen, achava besteira afinal, eu não tinha amigos. Eu espero pacientemente o dia que ganharei meu carro, eu quero um pequeno, talvez um New Beatle.

Eu não sou do tipo de garota material, tudo para mim está bom, gosto de coisas simples. Eu tenho preferencia a ganhar livro do que qualquer outro tipo de presente. Ultimamente meu quarto está pequeno, a estante de livros está simplesmente abarrotada. Não cabe mais nenhum em meu quarto. Meredith obviamente reclama por ter mais livros do que cabe em meu quarto. Besteira, pelo menos ela não conseguiu convencer John de doa-los, ela chegou a sugerir, mas então ficou resolvido que o escritório, sem serventia, se tornaria uma biblioteca. Se havia uma coisa que John amava era os livros, ela deveria saber.

Eu deveria estar prestando atenção na aula, porém a única coisa que me passava pela cabeça era um grande pote de sorvete de pistache. Com as provas semestrais aproximando-se, minha fome duplica. Pela primeira vez agradeci a Deus por uma aula ter acabado, e mesmo não me sentindo segura fora da sala de aula, suspirei satisfeita. Coisas estranhas aconteciam pelos corredores, coisas do tipo: alunos misteriosamente aparecerem com braços quebrados ou pequenas fraturas, além de olho roxo. Mas tratava-se do horário de almoço, e qualquer sacrifício era válido. Eu poderia ter minhas duas pernas quebradas, sem me importar, contanto que chegasse ao refeitório.

Não existe coisa melhor no mundo do que comer. Dormir é a segunda melhor coisa.

Guardei meu caderno dentro da mochila, levei os livros na mão, pois antes iria guardá-los no armário. Enquanto caminhava, os auto falantes espalhados pela extensão do colégio chiaram, antes de entrar em sintonia. A mesma voz rouca da manhã voltou a falar, porém dessa vez, algo na voz dava a sensação de animada. Todos os alunos pareceram congelar ante a informação.

“Parece que o nosso não tão garoto de ouro está de volta ao St. Marta High School.

Fontes seguras afirmam terem o visto essa manhã, aguardando na recepção juntamente à sua mãe. Ora, você já deve saber de quem se trata, mas para os desatualizados, vale a pena repetir. Carl James que foi expulso no final do semestre passado, por posse de drogas, pode nesse momento estar acertando sua volta ao colégio.

O que foi uma lástima para o time dos Snakes, desfalcados pela saída repentina do capitão, acabaram perdendo no último jogo contra os king drones. Agora resta saber, caso Carl James realmente volte, sua vaga no time está reservada?”

Quando as caixas voltaram a chiar, causando uma incomoda dor nos ouvidos, alunos que ouviam atenciosamente, começaram a falar, logo vários alunos formavam grupos e debatiam sobre o assunto. Alguns estavam felizes, outros estavam simplesmente inconformados por St. Marta aceitar um aluno com comportamento inadequado de volta. Porém um grito logo fez com que todos ficarem quietos.

Cherry estava tendo um piti em meio ao corredor da escola. Ela esbravejava em um francês rápido e incompreendido. Para lamentar logo depois com suas amigas em inglês.

— Non posso acrerditarrr que elé estan de volta. — Ela gritava, fazendo vários alunos tamparem os ouvidos com as mãos. — Aquelé estuuupide estrrrargou minha vide. Papa non confiar em mim, e mamam está desaponteda. — Seu inglês era pouco compreendido, pois seu sotaque estava mais forte.

Quase a sensação pena por Cherry me dominou, porém ao lembrar-me das maldades que ela infringia as outras garotas, achei por merecido os boatos que foram espalhados. Todos sabiam que Cherry não era santa, que já havia dormido — Quando digo dormir, não é literalmente a palavra — com quase todos os garotos do time de football, porém seu pai não conseguia enxergar o tipo que sua filha era.

Depois do pequeno show desnecessário, aos poucos os alunos voltaram a seus afazeres, muitos se encaminhavam ao refeitório. Apressei meus passos, não queria ter que ficar muito tempo naquele espaço, escutando as não tão novas novidades. Com certeza pais conservadores iriam ligar para a direção naquela tarde, deixando a diretora Hopkins louca.

Quando falei que adolescentes são cruéis, não disse da boca para fora, entenda o caso de Carl James, ele já foi o garoto popular que todo garoto quis estar no lugar, e toda a população feminina do St. Marta sonhou em beijar. Porém desde que assumiu que as drogas encontradas no vestiário masculino pertenciam a ele. Praticamente todos os que o abraçavam, lhe viraram as costas.

E como diz um velho ditado popular: com amigos assim, não precisa nem de inimigos.

Depois de pegar um hambúrguer, um pacote de rufles e uma lata de coca cola. Por hora deveria me contentar com aquilo, pois na escola, infelizmente não vendiam sorvete. Arrumei a bandeja nos braços, tentando manter-me em equilíbrio, pois não seria um bom lugar para cair. Noventa por cento dos alunos encontravam-se naquele lugar, cair na frente deles era somente adiantar uma morte social. Não que eu tenha uma.

Em passos lentos, consegui chegar a biblioteca, e como sempre ela estava vazia. E dona Amélia ─ Bibliotecaria ─ deveria estar tirando um cochilo no almoxarifado. Finalmente estava no meu lugar. Escolhi uma mesa ao fundo, depositei a bandeja sob a mesa e suspirei revigorada. Só o cheiro daquele lugar me fazia bem. Meu estomago roncou, ela hora de comer.

O hambúrguer em mãos, pronto para levar uma mordida, passei a língua entre os lábios, meu ritual diário, era estranho o fato de encarar a comida antes de levar a boca, estava concentrada. E então um barulho me sobressaltou. Meus olhos vaguearam do lanche que segurava firme, até toda a extensão que pude observar. Ninguém visível, entretanto antes de sequer pensar, perguntei o mais alto que minha voz tremuda permitia:

— Quem está ai? — Ninguém respondeu. Ratos. Foi o pensamento de que se tratava apenas de ratos que me tranquilizou naquele momento. Alunos normais do St. Marta não frequenta a biblioteca. Caso não fossem os ratos, provavelmente seria apenas algum casal tarado, isso era realmente comum.

Comer na biblioteca tornou-se um habito, era confortável não ter pessoas te olhando enquanto estou mastigando. Estava terminando, quando senti a sensação de estar sendo observada. Virei-me tentando ver quem poderia estar ali, incomodando a minha refeição. Porém não consegui ver ninguém, a grande sala continuava silenciosa. Então voltei a perguntar:

— Quem está ai? — Provavelmente estava imaginando coisas, uma vez escutei de alguém, que as pessoas podem enlouquecer por ser sozinho. — Seja quem for, poderia parar de me observar em quanto almoço? Grata! — Mesmo sendo apenas uma sensação, não custava pedir para que me deixasse almoçar em paz.

O pedido pareceu surtir efeito, pois em segundos, aquela sensação opressora não estava mais sob mim, e então pude terminar de comer. Olhei o relógio, e tomei um susto ao ver que uns minutos a mais na biblioteca acabariam me fazendo perde horário da próxima aula.

Estava voltando para o refeitório afim de entregar a bandeja, antes que o sinal voltasse a bater, quando fui parada no meio do corredor por um aluno.

— Oi! — Ele sorriu, enquanto eu mantinha minha expressão séria. Ele coçou a nuca e então continuou. — Fazemos aula de Física juntos. Bem, hoje terá um teste...

— Eu já sei, você precisa de cola. — O interrompi. — Tudo bem, sente-se atrás de mim e eu lhe darei, mas não comente com mais ninguém sobre isso. — Devo ganhar um lugar especial no céu, por ser tão boazinha.

— Obrigado, você acabou de me salvar. — Ele me agradeceu desajeitado.

— Estude da próxima vez. — Eu nunca ajudava a mesma pessoa duas vezes, essa era a minha regra. Eu não seria apenas uma nerd idiota que todos os alunos iriam usar. Eu gostava da sensação de dependência que eles mostravam ter por mim, porém isso não era o suficiente para ajuda-los várias vezes. Se eu podia estudar, eles também poderiam.

Como havia perdido alguns minutos naquela pequena conversa desnecessária, comecei a correr para chegar ao refeitório a tempo. Essa era a única coisa ruim de fazer todo o caminho até a biblioteca, ter que voltar ao refeitório para entregar a bandeja vazia. Acabei esbarrando em alguém, a pessoa levou alguns minutos para equilibrar-se novamente e me encarou. Meu rosto simplesmente pegou fogo, eu deveria estar muito vermelha, pois um comichão espalhava-se por minhas bochechas.

— Diretora Hopkins. — Consegui dizer, depois de recuperar a respiração.

— Senhorita Collins. — Ela respondeu cordialmente. — Estava precisando mesmo falar com você, por hora apenas quero um favor, e depois vá até a minha sala. Não se preocupe, direi ao professor da sua próxima aula o motivo da falta. — Meu rosto estava roxo de vergonha, minha voz estava presa, temendo que caso eu gaguejasse ao tentar falar, apenas acenei com a cabeça. — Vá até o campo de treinamento e chame o Treinador Jones.

— Tudo bem. — Respondi, quando me senti segura para falar.

Ela me encarou por alguns segundos e eu percebi que era hoje de ir andando, primeiro entreguei a bandeja no refeitório e depois segui até o campo, peguei alguns atalhos, pois do pátio principal até lá era uns quinze minutos de caminhada, consegui fazer em oito. Ao longe pude observar as lideres em uma grande ponte humana, e os garotos do futebol correndo em volta do gramado. O treinador apenas os observava, e vez ou outra gritava com algum que não fazia o circuito direito.

Lentamente me aproximei, e quando cheguei perto o suficiente, toquei em suas costas, tentando chamar a atenção. Quando ele virou-se e colocou os olhos em mim, prendi a respiração, seu rosto fechado em carranca me assustava. Ele estava sério e tinha cara de poucos amigos. Busquei o ar, antes de abrir a boca para falar.

— Sim mocinha? — Ele perguntou irritadiço.

— A diretora lhe solicita em sua sala. — Ele vincou as sobrancelhas, seus olhos brilharam em ira e ele somente saiu resmungando. Cada louco com sua mania.

Resolvi ficar mais alguns minutos encarando as najas, quando uma bola voou em minha direção.

— Hey! Gordinha… Joga a bola para cá! — O snake forte gritou, apenas “gordinha” chegou aos meus ouvidos, de repente minhas vistas estavam em vermelho. Ele veria a gordinha!

Peguei a bola e a chutei para o outro lado do campo, e me surpreendi quando percebi que a bola atravessara a cerca de segurança. Completamente enraivecida, me virei em direção aos jogadores que me encaravam boquiabertos, gritando de volta:

— Se quiser vai pegar, retardado! — Sai de lá batendo o pé, odiava quando me chamavam com nomes pejorativos. Era humilhante e desnecessário.

Novamente aquela sensação de que alguém me observava estava sob mim me deixando muito mais nervosa. Caminhei apressadamente de volta à escola, enquanto xingava o garoto do campo de todos os nomes possíveis, quanto a sensação de alguém me observar, eu torcia para a pessoa parasse com isso, pois já estava me tirando a paciência.

E quando estou sem paciência, tome cuidado, pois eu viro a Lolazilla!

Estava frustrada, com raiva e ainda haveria um maldito teste de física quântica, o que mais poderia me acontecer? Talvez um raio caísse sobre minha cabeça, ou até mesmo descobrisse que minha nota de artes foi trocada por algum outro aluno. Eu realmente precisava de um grande pote de sorvete, ou poderia perder a sanidade há qualquer momento.

Minha sorte estava por um fim, e como não bastasse à diretora queria minha presença em sua sala. Felicitar-me pelo troféu nas nacionais de xadrez não seria, pois essas ocorreram há muitas semanas. Antes que meu estômago começasse a doer, resolvi tomar uma água para me acalmar.

Os corredores estavam silenciosos, diferente do horário de almoço, não haveria perigo, então andei despreocupadamente, até o bebedouro mais próximo. Talvez eu estivesse errada, ao julgar o corredor vazio, pois alguém tocou em meu ombro, arregalei meus olhos e comecei a gritar, chamando a atenção de vários alunos e professores. Que como curiosos colocaram suas cabeças para o lado de fora das salas de aula.

Antes que a pessoa fizesse qualquer movimento, fechei as mãos em punho e virei-me de frente levando meu braço a toda força a seu rosto. Aproveitei que a pessoa estava sem reação e comecei a bater com toda a força que consegui reunir, quando minhas mãos ficavam doloridas e vermelhas, simplesmente usava os cotovelos. Não era do tipo violenta, na verdade não sabia bater, mas meu corpo estava descarregando uma corrente elétrica, mal conseguia me controlar. A outra pessoa, que por incrível que pareça até aquele momento eu não consegui identificar, segurou meus braços, fazendo-me finalmente parar com a agressão. Segui as mãos que seguravam os meus braços até o rosto, e quando finalmente compreendi de quem se tratava, o encarei assustada e meus lábios entreabriram-se em descrença.


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