O dia começou a clarear, e Lorrayne ainda estava no corredor, pensando no que devia fazer. Layane surgiu na porta. Disse ao passar pela irmã, em direção ao quarto da mãe:
_ Sugiro que você esqueça isso.
_ Como você quer que eu esqueça? Você cometeu um crime, sabia? O que você vai fazer agora? Dar soda cáustica para ela tomar com a pílula?
_ Vou conversar com ela. Sabe como é, né? Tenho que aproveitar que ela fica um pouco doidona, e dar algumas coordenadas básicas...
_ Então é assim que você consegue colocá-la contra mim? Só assim mesmo, não? Você tem consciência que ela gosta muito de mim. Melhor assim.
_ Ah, Lorrayne! Ache o que quiser, agora tenho que ir.
Lorrayne colocou-se à frente da irmã e perguntou:
_ E se eu não deixar?
_ Chamo ela e falo muitas coisas.
_ Ela não está “doidona”?
_ Ela ainda não tomou o remedinho. Mas se você vai mesmo ficar aí... Mãe! Ô manhê!
Lorrayne desimpediu a passagem de Layane e foi para seu quarto se arrumar para mais um dia torturante de aula. Ao se trocar, parou em frente ao espelho. Pensou um pouco, e correu para o quarto da mãe. Abriu a porta repentinamente. Sua mãe ainda estava deitada, mas já havia acordado. Layane estava ao seu lado. Parecia que ainda não havia tomado o remédio. Vendo aquele comportamento de Lorrayne, Martha perguntou:
_ Lorrayne, isso são maneiras de entrar?
_ Desculpa, mãe... A senhora já tomou seu remédio?
_ Hã? Por que quer saber?
_ Por nada... Pesquisa de opinião... – sorriu nervosa tentou disfarçar.
_ Qual o problema, Lorrayne? Está com ciúmes da Layane? Não se preocupe, venha cá, tem Martha pra todo mundo.
_ É que...
Pensando melhor, Lorrayne aceitou a proposta. Sentou-se do outro lado da cama. Imaginou que talvez pudesse impedir Layane de encher a cabeça de sua mãe. Mas logo Martha levantou-se, pegou o vidro do medicamento e foi para o banheiro.
Layane agarrou a irmã pelo braço e a levou até a porta. Sussurrando disse:
_ Sai já daqui!
_ Não, eu não vou! – replicava Lorrayne também sussurrando.
_ Vai sim!
_ Me larga!
Layane puxou a irmã até o quarto de Renan. Bateu violentamente na porta enquanto se esforçava para não deixar Lorrayne se livrar.
O garoto abriu a porta. Layane empurrou Lorrayne para dentro e mandou:
_ Renan, não deixa ela sair até eu mandar! Se você deixar, vai se ferrar! Fecha logo a droga da porta!
Ainda zonzo de sono, o garoto fechou a porta e Layane voltou ao quarto da mãe. Lorrayne ameaçou:
_ Se você não abrir essa porta, vou ter que abrir eu mesma!
_ Lorrayne, é melhor você aceitar e ficar quieta.
_ Certo, então eu abro!
Lorrayne avançou para a porta, mas Renan a impediu. Segurava suas mãos atrás do corpo, enquanto dizia:
_ Lorrayne, você vai acabar se machucando!
_ Você é que vai me machucar, me solta senão eu grito!
_ Sua mãe não vai ouvir. E se ouvir, eu e a Layane vamos fazer ela acreditar em qualquer coisa que te incrimine. Lorrayne, não é necessário isso. Ela vai descer para tomar café, então você sai numa boa.
_ Sabia que posso dar queixa de vocês na polícia?
_ E do que você vai nos acusar?
_ Eles vão examinar o remédio, e vocês estarão encrencados.
_ A tia Martha jamais deixaria você fazer isso.
_ Ela não precisa saber.
_ E quando eles vierem aqui?
_ Eles podem vir quando ela não estiver.
_ E quem vai permitir a entrada deles?
_ Eu.
_ Ainda tem eu e a Layane.
_ Vocês fazem curso de espanhol durante as tardes de segunda e quarta?
_ Mesmo que isso fosse possível, como você provaria que foi Layane quem fez isso? A tia Martha seria a primeira a inocentá-la. E a primeira pessoa que ela acusaria, seria o Eduardo.
_ Então, por favor, parem com isso! Vocês não têm medo de matá-la?
_ Tomamos muito cuidado.
_ Renan, por que você ajuda a Layane? O que você ganha com isso?
Calaram-se ao ouvir passos no corredor. Era Martha. Bateu na porta:
_ Renan, levanta, está na hora.
_ Hum-hum, já vou, tia.
Ouviram-na se afastar e descer. Renan soltou Lorrayne. Abriu a porta. Confusa, Lorrayne correu para seu quarto e bateu a porta. Eduardo vendo a cena, perguntou a Renan:
_ E agora? Qual foi sua nova estupidez?
_ Sabe como é... Ela é muito sensível.
_ Se tem uma coisa que ela não é, é sensível. O que você fez dessa vez?
_ Pergunte pra ela.
Renan fechou a porta de seu quarto. Eduardo bateu na porta de Lorrayne, que mal-humorada perguntou quem era. E só disse que a porta estava aberta quando a resposta foi “sou eu”.
Eduardo encontrou Lorrayne sentada em sua cama, com olhos fechados, massageando as têmporas. Sentou-se aos pés da cama e disse:
_ Você tem que começar a se acostumar com esses dois.
_ Uma vez eu disse para uma colega que não me conformo com os problemas, que eu luto. E essa foi a maior verdade que eu já disse na vida.
Lorrayne levantou-se. Pegou sua mochila e começou a arrumar seu material, que não havia sido arrumado na noite passada. Contrariado, Eduardo perguntou:
_ Certo. O que eles fizeram dessa vez?
A garota certificou-se que a porta estava realmente fechada e disse:
_ Eles estão colocando minha mãe contra nós, com uma ajuda.
_ ...?
_ Droga, Eduardo. Eles estão drogando minha mãe.
_ Como eles fazem isso?
_ Trocam os remédios dela.
_ E por que você não conta pra ela?
_ Ela jamais acreditaria, já que está contra mim. Seria minha palavra contra a da Layane e do Renan. Ela inocentaria Layane, e acusaria você.
_ E por que eu?
_ Porque é quem mais convém.
_ Então por que você não troca os remédios de volta sem que eles percebam?
_ Eles jogam o remédio original fora.
_ Como você sabe?
_ Eu vi os dois durante a noite. Eles jogam o remédio na descarga. Agora, melhor irmos. Estamos atrasados. Quando voltarmos, pensamos em alguma coisa.
Saíram do quarto e desceram. Todos já haviam terminado o café e esperavam por Lorrayne. Ao vê-la, Martha perguntou:
_ O que faziam?
_ Nada, mãe. Estávamos conversando.
Martha aproximou-se de Lorrayne. Disse:
_ Lorrayne, melhor se afastar de Eduardo. Acho que ele está lhe influenciando bastante.
_ Mãe, a senhora vai me desculpar, mas as más influências por aqui são outras pessoas.
_ Lorrayne! Você está falando isso de sua irmã?
_ Não disse quem, mãe. Não estamos atrasados?
_ Estamos, mocinha, e quando eu chegar, teremos uma conversa muito séria, entendeu?
Lorrayne manteve-se inexpressiva e seguiu sua mãe para o carro.
Ao serem deixados na escola por Martha, cada um seguiu seu caminho. Ao entrar na sala, Lorrayne ainda cumprimentou Yshara e Marco Aurélio:
_ Bom dia Yshara, bom dia Marco.
Surpresos, os jovens não tiveram a chance de responder, a professora Carmem entrava na sala. Lorrayne não conseguia se concentrar nas aulas. Era muita coisa para sua cabeça. E diferente de todas as outras aulas, o professor Paulo de matemática nem fez alusão a Lorrayne durante toda a aula. Lorrayne achou que talvez ela estivesse perdendo a graça. Quando o sinal do intervalo tocou, Lorrayne enrolou o máximo possível. Não estava com a mínima vontade de encontrar sua irmã ou Renan. E só saiu da sala quando o professor mandou:
_ Anda logo, menina, não tenho tempo!
Lorrayne jogou a mochila nas costas e saiu. Assustou-se quando Yshara a cumprimentou na porta:
_ Bom dia para você também!
_ O que você está fazendo aqui?
_ Vim responder seu cumprimento!
_ Faça-me o favor!
_ Venha, melhor sairmos de perto. – disse a garota apontando para o professor.
Lorrayne seguia Yshara pelos arredores da escola. Perguntou:
_ Você e sua irmã continuam brigadas?
_ Quem me dera se fossem apenas brigas...
Sentaram-se em um banco. Yshara perguntou:
_ E agora? O que ela anda fazendo de tão grave?
_ Coisas.
_ Tá. Que coisas?
Nesse instante, Caroline se aproximou com Ariane. Sorria alegremente, quase simpática. Voltou-se para Lorrayne:
_ Lorrayne! Fiquei sabendo que mudou de vida! E aí? Está gostando?
_ Pois é... Parece que agora sou mais rica que você, né?
_ Será?
_ Será não, é! E é realmente uma pena que você não é bem-vinda na minha família, portanto, não me importune.
Caroline gargalhou graciosamente. Contou:
_ Nem tanto minha querida! Layane é muito minha amiga. Ainda mais agora que...
_ Que o quê? Que ela me detesta?
_ Não! Como você tem coragem de falar isso da sua irmã? Ela não me disse isso. Ela só disse que há constantes desentendimentos entre vocês... Verdade?
_ Não é problema seu.
_ Então ela me pediu uma ajuda, sabe, só te ajudar a entender que ela só quer seu bem... Ou seria o bem dela? – Caroline riu, seguida de Ariane.
Concentrando-se para não avançar na garota, Lorrayne perguntou:
_ Então quer dizer que Layane tem tanto medo, que até na escola precisa de aliados contra mim? Está me saindo pior que a encomenda. Bom eu devia imaginar. E também, só gentinha como você entraria nesse tipo de acordo com ela, não?
_ Lorrayne, se enxerga querida. Pau que nasce torto, morre torto, você sempre será pobre.
Dessa vez a gargalhada foi de Lorrayne.
_ Olha só Carol. Presta mais atenção ao que você diz. Seu pai foi empregado da minha mãe...
_ Pelo menos minha mãe não me entregou a ninguém...
_ Ela tem compaixão pelo próximo.
_ Você é tão baixa...
_ E você é tão ridícula...
_ Epa, epa, o que está acontecendo aqui nesse meio? – perguntou Marco que acabava de chegar.
Caroline deu sua versão:
_ Como você pode ver, Lorrayne estava me ofendendo.
E Yshara deu a versão de Lorrayne:
_ Só porque você a ofendeu primeiro.
Lorrayne levantou-se e disse:
_ Quer saber Caroline, estou pouco me lixando se agora você vai me perseguir a mando de minha irmã. Só que eu acho que você podia fazer coisa melhor.
E saiu pelo pátio do colégio. Caroline tentou se explicar para Marco, mas o garoto já deixava o local juntamente com Yshara. Encontraram Lorrayne sentada no jardim da escola. Sentaram-se em frente à garota. Marco perguntou:
_ Então quer dizer que agora a tirana da sua irmã se juntou com Carol e sua turma?
_ O que você sabe sobre minha irmã? – Lorrayne perguntou indignada.
Yshara se explicou:
_ Lorrayne, me desculpa, mas fui eu que contei. Mas não se preocupe, pode confiar na gente.
_ Como posso confiar em você, se você contou pra ele?
_ Mas eu contei pra ele porque ele é a única pessoa com quem eu converso...
_ Então quer dizer que se você conversasse com metade da escola, teria contado para metade da escola?
_ Não! Se eu não confiar nele, em quem eu vou confiar? Você fez o mesmo! Contou pra mim porque sou a única pessoa que você sabia que podia confiar aqui na escola.
Lorrayne permaneceu calada. Constatando a reação da colega, Yshara perguntou:
_ Ficou com raiva?
Continua