Entre Pontas De Faca E Velhas Histórias escrita por Ana Barbieri


Capítulo 8
Capítulo 8




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Capítulo 8

            Muitas pessoas passaram a dizer que desde o nosso casamento, Sherlock desenvolveu um pendor para aceitar com mais facilidade a opinião de outras pessoas. Contudo, quando o que estava em jogo era um de seus casos... Digamos apenas que as pessoas não acertam na maioria das vezes. Elas não convivem com ele ou dividem a mesma cama que ele, e, diante de tais fatos, como uma especialista, posso afirmar categoricamente, que tal afirmação é um mito.

            Foi decidido que visitaríamos a senhorita Norton em sua casa. Claro que fui totalmente contra, afinal, o suspeito irmão e a pérfida cunhada estariam lá para influenciá-la. Contudo, não importava o quanto eu discutisse, o assunto estava encerrado. Me resumi, então, a falar com John.

            _ Estranhamente, seu quarto acabou se tornando o nosso quarto. – comentei, com uma risada nervosa. – Holmes não quis mover as coisas do laboratório para cá, então... – acrescentei para que soasse menos estranho.

            _ Imagino que já tenha sido difícil aceitar como as coisas mudaram. – disse Watson, descendo as escadas a minha frente.

            _ Nada mudou por aqui. – retruquei, sorrindo. – Apenas o fato de que nos trocou pela senhora Watson. – disse provocando-o.

            _ Admita que há certos momentos em que minha ausência é realmente algo oportuno. – provocou-me ele de volta, fazendo com que eu corasse. Entendia perfeitamente o que ele queria dizer.

            _ Minha querida creio que o senhor Watson já conhece bem a casa. – desdenhou Holmes, do andar de baixo.

            _ Ele só perguntou o que havíamos feito lá em cima. – disse na defensiva, indo para a sala. Holmes estava em sua poltrona.

            _ Pois então, será possível fazer a visita a senhorita Norton ainda hoje? – perguntou calmamente.

            _ E você ainda vai insistir em...

            _ Não vou mais discutir Anne. – disse reprimindo a voz, para não erguer o tom.

            E se levantou, apanhando o chapéu antes de sair. Watson e eu o seguimos, mas antes apanhei um dos casacos de Holmes.

            _ Mas o que...? – ele inquiriu, confuso.

            _ Não questione meus métodos e eu não questionarei os seus. – adverti, sorrindo maliciosamente.

            Ao virarmos a rua que daria para a casa de Godfrey, visualizamos uma carruagem da Scotland Yard parada próxima à calçada. “Lestrade” meu marido e eu murmuramos junto a Watson, resultado de várias aventuras juntos. Holmes foi o primeiro a descer, a passos largos, do cabriolé em direção à porta do nosso cliente. Tentando manter uma expressão neutra, bateu e esperou que alguém viesse abrir.

            _ Senhor Holmes. – cumprimentou Godfrey Norton com o maior sorriso que eu já o vira dar a alguém. – Entre. Senhora Holmes, Doutor Watson.

            Lestrade estava na sala com Irene Adler e Gregston, não havia, no entanto, nenhum sinal de Letícia Norton. Holmes e John chegaram em seguida, seguidos pelo anfitrião.

            _ Holmes. – cumprimentou Lestrade, visivelmente irritado. – Devo dizer que estou mortalmente satisfeito em dizer que seus serviços não são mais necessários. – completou com ar orgulhoso.

            Apressei-me em correr para perto de meu marido e segurar-lhe o braço. Gesto que foi notado por Irene, que me lançou certo olhar de nojo.

            _ O que quer dizer com isso Lestrade? – perguntei, fingindo-me de desentendida.

            _ Descobrimos quem é o culpado Anne. – respondeu Gregston. – Raincourt. – revelou ele. Sorri nervosamente.

            _ Mas como?! – exclamou Holmes, perdendo a calma. – Nós o interrogamos. Não havia como...

            _ Permita-me discordar Holmes. – interrompeu Lestrade. – Mas as evidências são inquestionáveis.

            _ Quais evidências? – perguntou Watson.

            _ Fomos até a casa de Lord Raincourt e descobrimos certas cartas dele para um assassino de aluguel. A assinatura não poderia ter sido falsificada, pelo que verificamos e foi confirmado pelo senhor Norton. – explicou Lestrade.

            _ É realmente uma lástima saber, mas, como disse anteriormente senhor Holmes, nunca gostei muito dele. – comentou Norton, abalado.

            _ Ele será preso imediatamente, presumo. – disse Adler.

            _ É claro senhora Norton. – garantiu Lestrade. – Então, como pode ver senhor Holmes, está tudo resolvido.

            Dei um passo a frente de meu marido, que tocou meus ombros.

            _ Assim como estava tudo resolvido das outras vezes, caro Lestrade. – desdenhei. – Senhor Norton, onde está sua irmã? – perguntei.

            _ Está lá em cima senhora Holmes. – respondeu confuso. – Mas, qual é seu interesse em Letícia?

            _ Apenas me lembrei de que não pegamos nenhuma declaração dela e, visto que é sua irmã, acredito que também deva ter tido contato com Longborn. – expliquei calmamente.

            _ E gostaria de fazer alguma pergunta a ela? – quis saber Godfrey.

            _ Do que adiantará?! – exasperou-se Irene Adler. – O caso está encerrado.

            Norton e eu nos fitamos por longos minutos.

            _ Chame minha irmã querida. – pediu gentilmente a esposa.

            A contragosto, Irene foi buscar sua cunhada. Minutos depois, Letícia estava na sala. Parecia visivelmente abatida. Os olhos fundos, como se chorasse todos os dias. Seu rosto não transmitia nenhuma emoção certa.

            _ Em que posso ajudá-la, senhora Holmes?

            _ Gostaria de saber... sua opinião sobre Richard Longborn.

            Ela não respondeu de imediato, o que me deixou com dúvidas com relação ao que ouviria em seguida.

            _ Eu não tenho nenhuma. – respondeu por fim. – Mal nos víamos. Meu irmão era seu advogado e grande amigo, mas, eram raras as vezes que chegávamos a nos ver...

            _ Certo, então, isso é tudo. Acho melhor vocês irem. – disse Norton, vendo que a irmã não falaria mais.

            Por mais que seja indiferente ou fria, uma mulher sempre sabe quando outra está mentindo. É algo que não varia muito de uma para outra. Quando mentimos, sempre parecemos mais nervosas do que o habitual. E Letícia Norton, pelo que pude notar, estava fazendo um grande esforço para não chorar. Então, fiz algo que exigiu muito do que aprendi com Holmes ao longo dos anos, discretamente, peguei um pedaço de papel e escrevi um nome, “London Bridge” e um horário e ao me despedir dela, entreguei o papel de forma bastante imperceptível e troquei um olhar significativo. Acho que ela entendeu.

            _ Lestrade está muito enganado se acha que vou desistir simplesmente porque ele soube como bancar o estúpido mais uma vez. – discutia Holmes, dentro do cabriolé.

            Eu pensava em Letícia Norton. Os olhos dela. Realmente parecia chorar bastante, e eu tenho minha teoria do porque, mas resolveria a hipótese na possível conversa que teríamos dali duas hora. Só esperava que ela tivesse entendido a mensagem.

            _ O que aconteceu Anne? – perguntou John, preocupado.

            _ Estou pensando. – murmurei.

            _ E não vai dividir seus pensamentos conosco? – inquiriu Holmes, zangado.

            _ Posso até dividi-los com Watson mais tarde, mas não com você. E sim, ainda estou zangada por não ter me ouvido. – disse, bufando sendo seguida de meu marido.

‡‡‡

            Estava sentada em minha poltrona, lendo, mas sem me concentrar nas palavras. Ansiosa, mirava o relógio a todo instante. Tentei vários para me acalmar, incluindo arrumar alguma parte da casa, mas tudo em vão. No fim, acabei desistindo e voltando para a posição atual. De repente, ouvi um som vindo do andar de cima. Um violino tocando um noturno de Chopin. Subi a escada e abri a porta do nosso quarto, Holmes estava sentado na cama, tocando. Uma bela expressão introspectiva no rosto.

            _ Daquela vez você não atendeu ao meu chamado. – observei, fechando a porta atrás de mim. – Por que acha que eu atenderia ao seu?

            Ele parou de tocar e me olhou com doçura, fazendo com que eu me apiedasse. Holmes não era homem de lançar tais olhares a toa.

            _ Intuição. – brincou, colocando o instrumento de lado. – Sente. – pediu, fazendo sinal para a cama.

            _ Não, muito arriscado sentar-me na cama com você nas condições atuais. Sabe como a maioria das nossas discussões termina. – ponderei, mantendo-me apoiada à porta.

            Ele sorriu.

            _ John se foi? – perguntei, mudando de assunto.

            _ Foi. Disse para ligar caso algo novo surgisse. – respondeu desanimado.

            _ Você não vai se render ao Lestrade vai?!

            _ É claro que não. Só estou esperando alguma coisa me ocorrer. – disse, apoiando as mãos no queixo. – No entanto, devo admitir que achei aquela história das cartas bastante suspeita.

            _ Continue pensando. A resposta sempre vem para você. – estimulei de forma carinhosa.

            Sherlock me fitou durante um tempo. Queria adivinhar no que eu estava pensando.

            _ Você esteve bastante inquieta durante essa tarde. O que está planejando Anne?

            _ É melhor você não saber. – respondi simplesmente.

            _ Nunca foi bom haver segredos nessa casa. – advertiu ele. – Ainda estamos no meio de um caso.

            Engoli em seco. Ele estava certo.

            _ Vou me encontrar com Letícia no London Brigde. – contei. – Acho que tem mais por trás dessa história que ela sabe e vou descobrir.

            _ E se ela não for? – indagou ele, taciturno.

            _ É para isso que sempre ando com duas pistolas carregadas e uma faca. – respondi com descaso.

            _ Anne... se alguma coisa... vou com você. – decidiu-se ele, pondo-se de pé.

            _ Não. – disse categoricamente. – Será uma conversa de mulher para mulher Sherlock. – conclui pondo um fim a discussão. Ele tentou falar, mas tornou a ficar quieto.

            _ Quando você se decide é pior do que eu. – observou.

            _ Temos isso em comum. – brinquei, indo em direção a ele. – Confia em mim? – murmurei, colocando meus braços em volta de seu pescoço.

            _ Não mais do que a razão permite minha cara Bergerac. – e me beijou vorazmente.

            Cedi quase que instantaneamente aos braços dele, soltando um gemido rouco quando ele desceu em uma linha de beijos pelo meu pescoço, sussurrando “Boa Sorte Anne” no meu ouvido antes de me dar um último beijo de despedida e me soltar. Confesso que queria ficar e terminar o que já havíamos começado, contudo, e isso aprendi com meu pai, às vezes é necessário resistir a certas tentações impostas pelo coração e continuar a seguir sua mente... por mais embriaga que ela também possa estar.

            Vesti o casaco de Holmes sobre minhas “vestimentas masculinizadas” e deixei Baker Street.

            O London Brigde era um dos bares mais visitados da cidade. Estava sempre cheio, e por isso, seria o local ideal para encontrar a senhorita Norton. Os homens sempre faziam barulho, o piano era tocado alto e as prostitutas riam como se as piadas dos rapazes fossem as mais engraçadas do mundo. Quando cheguei até lá, um dos homens parados a porta me reconheceu e me deixou entrar, antes o avisei sobre Letícia.

            Primeiro julguei que ela não viria, até que vi uma pessoa miudinha se esgueirar entre as mesas até onde eu estava. Ela parecia bastante assustada.

            _ Senhora Holmes. – cumprimentou.

            _ Ninguém sabe que está aqui? – perguntei ansiosa.

            _ Creio que não, embora duvide muito que meu irmão tenha acreditado na minha história...

            _ Então sejamos rápidas senhorita... quem matou Richard Longborn? - tornei a perguntar.

            _ Acho que a senhora sabe... – disse ela, as lágrimas começando a se formar em seus olhos. – Fui eu. Eu matei o Richard.

            Mirei-a estupefata. Jurara que seria ou Norton ou Adler, sempre julguei que ela fosse uma vítima.

            _ Mas... senhorita...

            _ O matei, mas eu juro... não queria fazê-lo. Godfrey me obrigou. Entenda... eu amava o Richard e eu sei que ele também gostava de mim... Mas, ele devia dinheiro ao meu irmão por seus últimos serviços prestados... não o pagou e disse que não iria pagar, chamou Godfrey de canalha e jurou que me tiraria de suas garras. Então, meu irmão começou a me jogar contra o Richard, tentava me convencer de que ele só me desejava porque era bonita, nada mais...

            _ Acalme-se senhorita Norton e prossiga.

            _ Mas um dia, ele me chamou para conversar e disse que perdoaria Richard, que se arrependera de tentar manter a briga. Eu fiquei desconfiada, mas, feliz. Uma festa seria dada na sede do Parlamento e nós iríamos para discutir tudo com Richard. Quando chegamos, fui direto para ele e não vi mais o meu irmão. Dançamos, bebemos, rimos, foi maravilhoso, daí Richard quis sair da festa e me levar, eu concordei. No meio do caminho, o coche parou e só então descobrimos que quem conduzia era Godfrey. Estávamos de frente para aquele lugar vazio em que o corpo dele foi achado na Oxford Street.

            “Meu irmão nos mandou ir para dentro. Obedecemos. Lá, ele disse que se Richard não entregasse o dinheiro, ele me mataria. Fiquei parada perplexa ao lado dele. Começamos a discutir, e no fim, Godfrey passou a pistola para mim e me mandou atirar. Eu me recusei, mas, no fim... Richard... Richard me mandou atirar. Sem ver, puxei o gatilho. Morto.”

            _ E o que aconteceu depois?

            _ Voltamos imediatamente para casa e nos livramos da arma. Disse que iria direto para a polícia. Ele me ameaçou. Por isso não tenho sido vista, sou prisioneira naquela casa. Ele chamou Irene logo em seguida, ela estava em Bristol... não entendi o porquê, mas acho que foi quando mencionei seu marido...

            É claro! Irene Adler foi apenas uma distração. Eu estaria ocupada com ciúmes e Norton deveria julgar que Sherlock sentia alguma atração por ela...

            _ Então você tem sido ameaçada por seu irmão e sua cunhada, pobrezinha...

            _ Ele sussurrou que me amava antes de eu atirar... Oh, senhora Holmes... eu que deveria morrer.

            _ Não diga isso, a justiça será feita. – garanti, pondo-me de pé. – Agora preciso ir, tenho que contar ao senhor Holmes e não devemos ter certeza se a senhorita foi seguida ou não... deve sair primeiro, depois eu irei.

            Letícia limpou as lágrimas e me abraçou.

            _ Obrigada pela ajuda. – agradeci.

            _ Sei que fará o que é certo. – e saiu.

            Esperei por um tempo e saí a passos largos em direção a Baker Street. Holmes ficaria encantado ao descobrir a verdade. Poderíamos dar um fim aquele caso e seguir em frente. Norton seria preso e com certeza Adler tentaria fugir... ela sempre conseguia escapar de uma forma ou de outra. Alcancei o 221B e abri a porta, contudo, a visão que tive quase me fez desmaiar.

            _ Boa tarde senhora Holmes. – cumprimentou Godfrey Norton que tinha em uma das mãos uma arma apontada para a cabeça de Holmes.


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Notas finais do capítulo

MIL DESCULPAS PELA DEMORAAAAAA! Estava estudando para o Vestibular, que ainda não passou, mas simplesmente não podia deixá-las mais esperando. Então, resolvi caprichar, espero que gostem! Reviews sempre são bem vindas, vocês sabem como me deixar feliz!