Running Away From Hell escrita por GabanaF


Capítulo 12
Cap. XII — Death


Notas iniciais do capítulo

Oi gente, como vocês estão? Então, eu queria me desculpar pela demora - se vocês acham que demorou o capítulo e pá... E queria dizer também que eu faço o máximo para postar todo fim de semana, e que na verdade nesse momento eu devia estar lendo um texto gigante pra segunda-feira KKK Mas não, meu compromisso com essa fic é mais importante (só quero ver no fim do semestre com as minhas notas mas por esse momento sim)
Eu queria agradecer aos reviews do capítulo anterior, muito obrigada MESMO, sinceramente, e espero que vocês gostem desse.
Aviso: como eu disse lá no primeiro capítulo, se tiver coração fraco, não leia.



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24 de Março de 2012

Quarto da Hanna, Terceiro Andar, TN

10:35 AM

— Rachel, eu sinceramente acho que eu não deveria estar aqui.

Rachel revirou os olhos. Quinn acenou afirmativamente, o pânico começando a subir em sua cabeça. Suas mãos suavam horrivelmente e ela não conseguia fazê-las parar de tremer. Estavam à porta do quarto de Hanna e a última coisa que Quinn queria fazer era entrar nele.

— Pelo amor de Deus, Quinn, ela só vai olhar como você está! — a garota retrucou irritada. — Você não vai morrer só entrando no quarto!

— Tá bom, mas se eu entrar, você terá que estrear sua pistola no quintal dos fundos hoje à tarde. — Rachel franziu o cenho, a expressão mudando radicalmente. — Isso mesmo, Rach, você vai treinar com uma arma hoje de novo.

Rachel encarou Quinn, que mantinha agora um sorriso vitorioso no rosto, o medo sendo substituído pelo tom desafiador.

— Beleza — concordou Rachel, estendendo a mão para que Quinn apertasse.

Quinn deu uma piscadela e apertou a mão estendida de Rachel. Seus olhos brilharam por uma animação desconhecida quando Rachel bateu na porta do quarto de Hanna.

A animação sumiu tão logo Hanna abriu a porta. Esquecera-se por um momento que deveria cumprir uma parte da aposta para que desse uma aula a Rachel outra vez. Hanna estava super perfeita, como sempre, vestindo uma camiseta preta com a foto de uma banda que ela nunca ouvira falar. Ela, novamente, atraiu suspiros de Quinn e Rachel.

— Vejo que convenceu sua namorada a vir aqui — disse Hanna, erguendo as sobrancelhas para a camisa flanela de Rachel rasgada nas mangas.

Rachel ficou vermelha feito um pimentão. Quinn desviou os olhos das duas e passou a observar seus tênis surrados, se perguntando se a mulher não teria falado aquilo de propósito, se ela tinha mancomunado com Santana de alguma forma para que pudessem fazê-la pedir Rachel em namoro.

— Entre, Quinn, entre! — convidou Hanna animada. Ela parecia não ter notado o clima estranho que se instaurou. Hanna pegou a mão de Quinn e logo a garota sentiu calafrios subindo por sua espinha. Ficar perto de Hanna ainda não era algo bom para ela. — Rachel, você vem?

— Não, tenho que ajudar Mercedes no almoço — disse Rachel, um tanto desanimada. A verdade era que ninguém queria ficar muito tempo perto de Mercedes nos últimos dias. Ela só falava de morte e reclamava de como os gemidos do walker do quintal do fundo dificultava seu sono. A briga que haviam ouvido outro dia não se comparava em nada com as próximas que surgiram. — Vejo você mais tarde.

Rachel se inclinou para dar um selinho em Quinn, mas olhou no último instante para uma Hanna distraída brincando com a mão dela e apenas deu-lhe um beijo na bochecha. Quinn ficou desapontada com o gesto quando Rachel saiu aos pulos no corredor. Depois, virou-se para Hanna com um sorriso envergonhado.

Ela entrou no quarto atrás de Hanna, quando finalmente a garota soltou sua mão. Observou-o atentamente, pois Hanna já tinha dado seu toque nele. As paredes, antes brancas, agora estavam rabiscadas de giz de cera de todas as cores, formando arabescos e desenhos que jamais vira na vida. A cama estava desarrumada, uma pilha enorme de roupa suja jazia jogada perto de onde os pés de Quinn estavam e um notebook aberto em arquivos estranhos estava em cima de uma escrivaninha.

— Sente-se — disse Hanna enquanto ela se virava para a mesinha e abria o kit de primeiros-socorros que Quinn tanto temia.

Quinn achou difícil arranjar um lugar para sentar-se na cama extremamente bagunçada de Hanna, mas acabou se acomodando num cantinho dela, sentindo-se muito desconfortável. Suas mãos já haviam parado de suar, contudo, a tremedeira não parava. Pôs-se a observar os arquivos em aberto do notebook furtivamente numa maneira de manter distraída do que estava por vir.

Hanna tornou-se a virar para ela. Seu medo deveria estar muito na cara por que a primeira coisa que a garota fez foi dar uma risada.

— Relaxe, é apenas uma parte básica de qualquer check-up — tranqüilizou Hanna, pondo o estetoscópio no peito de Quinn e sentindo seus batimentos cardíacos. — Garanto que você sairá viva.

Hanna abriu um sorriso lindo, e Quinn relaxou-se um pouco. Os olhos, no entanto, mantinham-se no notebook, tentando decifrar o que diabos aqueles arquivos significavam. Eram números, misturados com milhões de letras e mais alguns números. Não era a tela do Windows, e sim outro sistema, algo que Quinn nunca tinha visto antes.

Hanna, enquanto examinava a boca de Quinn, observou aonde os olhos da garota se desviavam e disse:

— Estou acessando a tela preta dele. Tive que arrumar uma coisa no driver.

— Por que continua usando o computador? — perguntou Quinn, franzindo a testa. Para ela, não havia muita razão para usar um se não tivesse nada mais para se conectar com o mundo lá fora. — Não tem mais internet.

— Avanços, Quinn, avanços. Preciso anotar as reações do walker, além de seus exames.

Quinn assentiu. Hanna terminou de verificar a boca e os olhos de Quinn para poder medir sua pressão. O toque quente de Hanna dava a ela um frio estranho na barriga; o silêncio que se instaurou a perturbou um pouco. Ela se odiava por ainda estar tão constrangida na presença de Hanna. Sim, só tinha olhos para Rachel, mas Hanna tinha uma voz, um humor e uma beleza tão contagiante que era preciso muito esforço para não prestar atenção nela.

— Parece que está tudo bem com você — finalizou Hanna, dando tapinhas no ombro da garota, liberando-a. Quinn, contudo, permaneceu sentada.

— Já descobriu alguma coisa sobre os walkers? — questionou um tanto acanhada.

— Apenas que eles gemem demais — respondeu Hanna com um sorriso amarelo. Ela sentou-se ao lado de Quinn na cama bagunçada e deu um suspiro pesado. — Iria precisar de um hospital inteiro à minha disposição para descobrir só uma pequena parte do que eu quero.

— Talvez a gente possa... — começou Quinn, porém Hanna lhe interrompeu com um gesto de mão.

— Não vou obrigar vocês irem para Nashville, não com a cidade inteira sitiada. A essa altura, todos lá estão mortos.

Quinn concordou com a cabeça, levantando-se. Sorriu para ela e se aproximou da porta. Antes de sair, contudo, ouviu a voz de Hanna carregada de ironia:

— Foi mal pela camisa. — Quinn parou no portal e acompanhou a risada fraca da garota. — Mas eu aposto que sua namorada adorou. A propósito, se quiserem matar o walker hoje à tarde no treino de vocês, sintam-se à vontade.

Quinn sentiu-se corar furiosamente. Ela saiu do quarto de Hanna sem responder ao comentário da garota.


24 de Março de 2012

Cozinha, Primeiro Andar, TN

12:34 PM

Sam sorriu ao encontrar Mercedes preparando alguns enlatados para o almoço. Ele não sabia se seria correto aproximar dela após da milésima discussão que haviam tido na noite anterior, que o fizera ir dormir no sofá outra vez, mas o que ele mais queria naquele momento era abraçar sua namorada. Tê-la em seus braços era a coisa mais importante que ele teria naquele mundo maluco.

Ele não sentia nada por Hanna, tinha que se obrigar a lembrar. A garota era apenas mais uma que achava bonita, nada mais. Mercedes era o que importava. Ela estava precisando de Sam, talvez mais do que ele estava precisando dela, e não podia recusá-la um pouco de carinho e atenção.

Sam pigarreou para anunciar sua presença na cozinha. Mercedes virou-se para ele com a sobrancelha erguida, mas logo sua expressão se transformou. Era complacente, algo que o garoto não via há tempos no rosto dela. Sorriu de novo, aliviado.

— Sinto muito por ontem — disse Mercedes num suspiro só antes que ele falasse. — E antes de ontem, e dois dias antes... fui uma idiota, tenho que admitir.

O garoto assentiu, surpreso com suas palavras. Mercedes não se incomodava muito em pedir desculpas quando se sentia certa — e ela se sentia certa quase sempre.

— Tudo bem? — ele perguntou, franzindo o cenho.

Mercedes riu fragilmente, limpando as mãos no pano de prato, se aproximando dele e as colocando nas bochechas do garoto. O toque frio de sua pele assustou Sam um pouco; ela costumava ser quente. Talvez fosse a água gelada, pensou esperançoso.

— Você é o máximo, Sam — Mercedes falou depois de dar-lhe dois beijos estalados na bochecha do namorado. — Obrigada por tudo.

O tom dela amedrontou Sam. Mercedes estava armando algo, ela não estava tão bondosa assim nos últimos dias. Queria acreditar que a garota tivesse simplesmente tomado juízo, mas não conseguia. Alguma coisa estava acontecendo dentro dela, alguma coisa perigosa.

— Mercedes... — chamou Sam com a voz fraca, sentando-se num dos banquinhos da cozinha quando ela voltou sua atenção à refeição. Pelo canto do olho, ele foi finalmente reparar em Rachel. — O que foi? Eu te conheço, você não pode estar dessa maneira por causa da Hanna, se quiser eu...

— Sam, chega desse assunto — cortou Mercedes firmemente. Ela parou de retirar as beterrabas da latinha e fitou-o outra vez. — Já disse que sinto muito. Eu...

Ela parou de falar e respirou fundo. Sam, por outro lado, ficou mais preocupado. O que estaria acontecendo com sua namorada?

— Eu amo você — Mercedes disse por fim, os olhos cintilando de lágrimas. — Não se esqueça disso.

Sam jamais esqueceu.


24 de Março de 2012

Quarto de Santana e Brittany, Segundo Andar, TN

01:45 PM

— Me explica, de novo, por que estamos cuidando de Beth? — Santana perguntou confusa enquanto segurava a garotinha no colo.

— Puck e Quinn estão dormindo, Rachel está com ela, e nenhum dos outros são capacitados para isso — respondeu Brittany sabiamente. — Além disso, achei que seria interessante.

Santana franziu a testa. Seu quarto e o de Brittany era o único estritamente arrumado na casa. O berço da menininha estava no quarto de Puck, mas Beth não parecia querer dormir, tampouco tomar seu leite. Estava inquieta no colo de Santana. Ela deixou-a caminhar pelo quarto, indo até a porta e fechando-a, impedindo a saída de Beth, que começou a andar em círculos pela cama das garotas.

— Por que seria interessante? — Santana retomou a conversa, os olhos postos em Beth.

Ao ouvir a pergunta, a namorada se atrapalhou toda. Ela estava na cama, deitada, porém logo se empertigou. Santana, sentada na cama, estranhou o movimento. Brittany era geralmente muito tranqüila, e não surtava por coisa boba.

— Estamos namorando, não é? — começou Brittany, torcendo as mãos, nervosa. Santana confirmou com a cabeça. Beth sentou no chão e passou a conversar com a boneca de pano que tinha. — Bem, então... Eu sei que pode parecer besteira, mas... hm... achei que seria, hm, uma boa forma de ver se a gente... ahm...

Santana a cortou com uma risada. Brittany pareceu ofendida.

— Você tá me dizendo que queria ver como nós nos sairíamos se estivéssemos casadas? — ela indagou ainda rindo. Beth acompanhou sua risada, mas ela não saberia dizer se a garotinha sabia o que estava acontecendo ao seu redor ou se estava distraída demais com a boneca de pano suja que antes pertencera a Quinn.

— Não custa sonhar, né? — disse Brittany encolhendo os ombros. — Poderemos estar mortas amanhã, eu queria saber se ter uma vida de casada era bom. Minha mãe vivia reclamando do meu pai...

Santana abraçou a namorada de lado, sorrindo bondosamente a ela. Perder a mãe havia sido dolorido para Brittany, e com o pai fora de Lima, ela nunca chegou a saber se ele morrera também ou não. Nem o gato de estimação, Lord Tubbington, lhe sobrara. Santana era a única família que ela tinha. Era mais do que justo que se sentisse assim.

— Poderíamos nos casar — sugeriu Brittany de repente, os olhos voltando a ter o brilho infantil de meses antes, que Santana de alguma forma cansara de procurar durante o apocalipse.

Beth continuava falando palavras indecifráveis para a boneca de pano, e agora andava a esmo pelo quarto. Santana tossiu, sentindo-se desconfortável pelo tom animado de Brittany.

— Como? — perguntou educadamente.

— Não temos governo, ninguém mais impediria duas garotas de se casarem. Poderíamos pedir à Quinn para ser a juíza, ela sempre nos apoiou e, além disso, sabe a bíblia de cor. O resto dos meninos seriam nossos padrinhos.

Por baixo de toda incredulidade da ideia maluca de Brittany, ela não deixou de sentir-se lisonjeada. Aquela era a garota que ela amava desde que tinha doze anos de idade, lhe pedindo em casamento da forma mais displicente que existe. Sugerindo, para ser mais exata.

E Santana queria casar com Brittany. Um dia. Sempre quisera. Mas... aquilo tudo parecia uma maneira desesperada de Brittany tê-la para a vida inteira. Como as histórias de guerra que sua avó contava-lhe quando era criança, em que as pessoas se casavam dias antes dos caras irem para o front.

Santana não queria deixar Brittany, jamais. No entanto, apesar de todas as regras e leis terem sido apagadas da face da Terra, ela ainda achava errado casar-se adolescente.

Contudo, antes que pudesse responder, Beth parou na sua frente e agarrou a seu joelho, pedindo colo. Ao seu lado, os olhos de Brittany brilharam de expectativa.

— Tana! — disse Beth com a voz aguda. A menininha ergueu os braços, e Santana nada fez além de aceitar o pedido dela, pegando-a. — Mama!

Santana estreitou os olhos, na dúvida se a garotinha acabara de chamar por Puck ou se queria algo para comer.

— Ela quer alguma coisa — disse Brittany quando Beth ameaçou abrir o berreiro. — Mas o quê?

A garota deu de ombros.

— Viu? É por isso que não nos casamos ainda, nem sabemos o que o bebê quer — retrucou Santana com ar de riso. Contudo, Brittany pareceu sinceramente magoada.

— Não, Britt, não faça essa cara, por favor — pediu desesperada enquanto Beth segurava firmemente seu dedão, pedindo o que diabo fosse “mama”. — Você sabe que eu não queria dizer isso... eu quero me casar contigo...

— MAMA! — gritou Beth, apontando para Brittany.

Santana franziu o cenho, em parte por Beth estar chamando sua namorada de mamãe, e outra por que Brittany mantinha um sorrisinho irônico que ela aprendera com Quinn no rosto. Ela demorou a entender que o que Beth queria era estar ao lado de Brittany. Quando entregou a garotinha à namorada, ela se acalmou quase imediatamente. Brittany sorriu complacente e deitou ao lado de Beth, murmurando uma canção de ninar em seu ouvido.

Santana abriu um sorriso, impressionada. Anos convivendo com Brittany para descobrir apenas mais tarde a facilidade que ela possuía com crianças. Talvez fosse a mentalidade sonhadora e pura que ambos tinham, pensou. De qualquer forma, quando acabou de pensar no quão demais sua namorada era, Beth já dormia calmamente no colchão delas, as mãozinhas agarradas à boneca de pano sem nenhuma gentileza.

Brittany sentou-se outra vez na cama, olhando para Santana com superioridade e com um sorriso convencido no rosto.

— Iríamos dar um ótimo casal de velhas cuidando de sua netinha — sussurrou no ouvido de Santana. Ela deu um selinho demorado na namorada após. — Hora de terminar a cerca! — Ela vibrou e apertou o braço de Santana, se levantando.

— Vou acordar Quinn e dizer que Beth tá aqui — Santana disse, um tanto perturbada, ao saírem do quarto. Deixou a porta entreaberta.

Brittany assentiu e avançou uns passos, mas voltou para puxar Santana em seus braços sem razão aparente e lascar-lhe um beijo. Ela não soltou a mão de Brittany até que se separassem no fim do corredor.

Uma explosão de felicidade invadiu seu coração. Ela poderia não concordar com um casamento na situação terrível em que se achavam, porém, tinha certeza de que passaria o resto de seus dias com Brittany.


24 de Março de 2012

Sala de Estar, Primeiro Andar, TN

04:25 PM

Os barulhos vindos do lado de fora da mansão não incomodavam Rory mais. Os olhos dele estavam vidrados onde Rachel e Quinn praticavam tiro ao alvo perto da primeira parte da cerca. Sugar e Harmony estavam na sala de estar com ele, ocupadas demais lutando entre si no sofá para lhe dar atenção.

Rory não entendia. Todo mundo de repente tinha virado lésbica? Por que isso não era nada legal. Havia garotas o bastante para ele, mas todas elas queriam apenas a elas mesmas. Rory não era homofóbico, ele não achava que havia lugar naquele mundo para uma hipocrisia dessas. Ele sentia apenas solitário. Não queria terminar morto por walkers no dia seguinte ainda virgem.

— Rory! — exclamou Sugar no ouvido dele, assustando-o. Ele pulou para o lado, tirando seus olhos de Quinn e os pondo na garota. — O que tá fazendo?

— Nada — mentiu ele, se traindo ao dar outra olhada para fora.

O garoto sentiu as orelhas esquentarem. Sugar lançou a Rory um olhar desconfiado, retornando aos braços de Harmony. Os dois ficaram se encarando, desafiadores, até Harmony falar primeiro:

— Ele gosta da Quinn.

— Não! — reagiu Rory, indignado, afastando da janela e sentando na poltrona. — Que mentira.

Sugar e Harmony se entreolharam e riram.

— Você não é nenhum James Bond escondendo seus sentimentos, garoto irlandês — retrucou Sugar, se aconchegando mais em Harmony.

Rory suspirou invejoso.

— Além disso, anda ignorando Rachel como um grande ciumento — acrescentou Harmony, séria.

Ele deu de ombros, indiferente. Não se arrependia disso. Rachel era legal demais, bondosa demais, com todos na casa. Até com Hanna (com quem Rory tentara conversar, mas se descobrira muito burro para ela), que todos ignoravam ou brigavam o quanto podiam; Mercedes, que ultimamente andava um porre; e incluindo ele próprio, que jamais se dirigia a Rachel, mesmo quando ela tentava abrir uma conversa com ele. Rachel conseguia suportá-los com classe.

Ele sabia que Quinn tinha todas as razões do mundo para gostar de Rachel, e era a coisa que ele menos gostava nela.

— Tem que parar com isso, cara — avisou Sugar, tirando Rory de seus pensamentos. — Rachel está ficando francamente magoada. E isso não vai mudar o fato de que Quinn vai continuar a amá-la.

Rory torceu o nariz. Ele tinha que aceitar, sua mente dizia. Tinha que ver o quanto Quinn amava Rachel e vice-versa. Porém, seu coração não permitia. Estava ficando doentio, tinha que admitir. Ele não queria virar em outra Mercedes, tão presa a uma pessoa que seu humor não se transformava, ficava e ficava ruim o tempo todo.

— Eu fico de boa com a Rachel — o garoto murmurou emburrado. Sugar lhe fez um sinal positivo.

Os três ficaram em silêncio. Rory balançava na poltrona, ouvindo as risadas de Quinn e Rachel perto da janela e as marteladas de Puck e Sam numa das vigas, Santana gritando-lhes instruções maldosamente. No segundo andar, podia escutar claramente Beth rindo de uma forma escandalosa, Rory imaginou que Hanna estivesse cuidando dela.

Bufou, sentindo-se mais sozinho do que nunca ao observar Sugar brincar com os cachos de Harmony, deitada em seu colo. Se pelo menos não pudesse ter uma delas, desejava que as duas se assumissem logo. Nenhuma pessoa que quisesse somente amizade olharia para a outra daquela forma.

— Oi, gente — disse Mercedes subitamente atrás da poltrona de Rory, fazendo o garoto sobressaltar. Seu tom de funeral a acompanhava outra vez. Agora, contudo, não estava com raiva, parecia simplesmente triste. — Onde está o Sam?

— Lá fora, arrumando a cerca — respondeu Harmony, distraída com os olhos apaixonados de Sugar.

— O walker de Hanna continua lá? — Mercedes indagou. O garoto achou estranha a pergunta, ela sempre reclamava do quão ruim era ter aquele monstro no quintal.

Sugar, também sem dar a devida atenção à Mercedes, assentiu. Rory mordeu o lábio. Algo estava muito errado com a namorada do Sam, mas não sabia dizer o quê.

— Obrigada, gente — Mercedes agradeceu, e Rory achou que suas simples palavras significavam muito mais do que aparentavam.

Seu coração apertou quando viu a garota arrastar os pés pra fora da sala de estar. Harmony e Sugar continuavam em seu jogo bobo, mas Rory se levantara. Ele queria seguir Mercedes, impedi-la de sair da casa, porém seus pés pareciam fincados no chão.

Mercedes estava prestes a fazer algo terrível, e Rory sabia que não conseguiria evitar a tempo.


24 de Março de 2012

Quintal dos Fundos, TN

04:12 PM

— Rachel! Preste atenção no que está fazendo!

Os gritos de Quinn encheram os ouvidos de Rachel, fazendo-a se sobressaltar. Soltou um suspiro, irritada; só por que estava vendo Sam e Puck prendendo as vigas no chão a poucos metros dela e de Quinn, não significava que não via ou ouvia as preleções e reclamações dela.

— Suba um pouco a guarda — disse Quinn se aproximando dela e erguendo os braços de Rachel alguns centímetros.

Rachel queixou-se com um muxoxo. A arma que tinha arranjado há quase uma semana com Quinn no arsenal era pesada, cabia na mão dela perfeitamente, mas não deixava de ser difícil de carregar por aí. Ela não queria mais nenhuma arma em seu poder por um bom tempo.

Contudo, sabia que era necessário que pudesse saber atirar. Em uma situação de perigo, ela não saberia o que fazer se não sair gritando por todos os lados. Precisava disso, precisava aprender a se defender sozinha, por que sabia que Quinn não estaria ao lado dela sempre.

Pensando nisso, deixou os braços onde Quinn desejara que eles estivessem e atirou uma vez para o alvo que as duas haviam montado mais cedo, o sacolejo que a arma deu não a assustando tanto assim. O barulho, no entanto, continuava ensurdecedor.

— Pode abrir os olhos — recomendou Quinn rindo. Rachel nem se tocara que havia fechado os olhos. Ela abriu-os, hesitante, tentando discernir o alvo pintado de vermelho e colocado a uns dez metros delas. Não parecia haver marca de nenhum tiro nele. — Você não acertou. De novo.

Rachel ouviu a risada seca de Santana atrás dela. Olhou para ela e encontrou-a encostada a Brittany observando suas tentativas falhas de acertar o alvo quando, na verdade, deveriam estar ajudando Puck e Sam a trabalharem nas cercas quase prontas.

— Vá caçar o que fazer Santana — enxotou Quinn maldosamente, cumprimentando a amiga com seu costumeiro gesto obsceno. Rachel e Brittany fizeram caretas de reprovação.

— Eu ensinei as meninas a usarem armas, sabia Rachel? — disse Brittany, revirando os olhos para a namorada.

Rachel ergueu as sobrancelhas, impressionada. Ela ainda não se acostumara com essa Brittany inteligente, que sempre chegava com uma surpresa nova. Quinn assentiu seriamente à frase da garota, se esquecendo de Santana por um instante.

— Bizarro, eu sei — murmurou ela no ouvido de Rachel. — Mas é verdade. Santana! — Quinn gritou, assustando a garota. — Vá ajudar o coitado do Sam, anda!

— Beleza, mamãe — zombou Santana, pegando a mão de Brittany e saindo do caminho de Quinn e Rachel.

Quinn assentiu convencidamente, o que fez Rachel rir. Porém, o momento de diversão acabara, tinha que voltar a tentar acertar o alvo a dez metros dela. Ao contrário do walker que havia enfrentado antes, o alvo não se movia, não chegava perto e nem ameaçava, o que deixava a garota bem menos preocupada.

Um gemido atrás dela fez os pêlos da sua nuca eriçar. É claro que o errante de Hanna continuava ali para pesquisa, mas Rachel não iria se acostumar com ele nunca. O walker estava preso, não podia andar nem um metro, porém, Rachel se aterrorizava toda hora que ele gemia perto dela.

— Vai, Rachel! — exclamou Quinn.

Rachel balançou a cabeça, esquecendo do morto-vivo atrás dela e puxou o ferrolho da sua pistola. Estreitou os olhos e tentou mirar outra vez no alvo. Atirou uma, duas vezes. Ouviu Quinn gritar ao seu lado, e animou-se, pois isso significava que ela havia acertado pelo menos uma das balas.

— Ok, não foi no centro do alvo, mas foi um começo depois desse tanto de tentativas — admitiu Quinn depois dar uma checada na placa de madeira que elas estavam usando.

— Por favor, não me lembre o número de tentativas — pediu ela, desviando os olhos de uma Quinn feliz, que vinha ao seu encontro com um sorriso maroto.

Quinn abriu a boca para falar, porém Rachel reagiu e tapou-lhe com a mão, rindo. A respiração de Quinn era fraca, contudo, a troca de olhares era intensa. Rachel demorou uns bons minutos para lembrar-se do por que estavam impedindo a garota de falar, os olhos amendoados dela a hipnotizam de uma maneira assustadora.

— Mais uma vez — disse Quinn por baixo de sua mão ao saírem do transe. Rachel se afastou dela, emburrada. Gastar quase um pente inteiro da arma não era o bastante por um dia, não? — Vamos Rachel, é só essa vez, para acabar com as balas logo.

— Essas balas não vão durar pra sempre, sabia? — ela retrucou, piscando para Quinn e puxando novamente o ferrolho da arma. — Eu deveria economizá-las.

— Só cale a boca e tente acertar o alvo — obrigou Quinn num tom sério que quase fez Rachel cair na risada.

Mas Rachel ficou quieta e se concentrou outra vez. Lembrou-se de quando estivera ali da primeira vez, com Quinn ao seu lado, o walker se aproximando rapidamente, o que Quinn dissera. Carregar, mirar, atirar. Era fácil, como fora da primeira vez. Menos desesperador, porém ainda assim fácil. Engoliu em seco, pôs sua péssima mira em foco e, quando ia apertar o gatilho, o grito de Quinn a fez perder toda a atenção no alvo.


24 de Março de 2012

04:10 PM

Mercedes não estava certa do que iria fazer. Não tinha certeza de nada por esses dias. Era o que mais odiava. Ela sempre fora tão concentrada e determinada nos planos para o seu futuro que o apocalipse todo tinha levado ela a surtar completamente.

Ela não queria viver mais. Não queria acordar todos os dias com a mesma expectativa de vida, que era praticamente nada. Ela não queria mais isso. O mundo apocalíptico era para gente como Quinn e Santana, viciadas numa aventura. Sobreviver não era para ela.

Desde Lima pensava nisso. Dia após dia, minuto sobre minuto, o que vivia na sua cabeça o medo de morrer. E durante uma das manhãs na mansão, sua mente determinou que não ia ter mais medo. Que iria aceitar a morte como uma grande amiga, algo esperado. Que não podia sentir pena de Sam ou de qualquer um dos garotos da casa, por que ela sabia que eles teriam força suficiente para seguir em frente.

Hanna veio. Mercedes podia sentir que estava perdendo Sam para a garota. Podia ver os olhos dele brilhando sempre que fitavam os belos olhos verdes dela. Um dia, há tempos atrás, o olhar do garoto cintilava daquela mesma maneira na direção dela. Aqueles não eram mais seus dias. Seu tempo passara, e não podia fazer nada. Tinha que aceitar que estava perdendo Sam.

Talvez nem fosse para eles ficarem juntos. Talvez Sam nem fosse sua alma gêmea. Apegara-se a ele por que era necessário; Mercedes e Sam precisavam de calor humano numa hora daquelas. Os dois não se necessitavam mais. Qualquer tipo de relacionamento entre os dois que acontecera não era mais real, Mercedes tinha que admitir isso para si.

Mercedes se olhou no espelho do banheiro. Usava a melhor roupa que havia encontrado na mala. Tinha que estar bonita, não é? Sentia-se bem, sua decisão já estava tomada. Olhou para a cama dela e de Sam e assentiu como se estivesse se despedindo. Uma pena não ter achado a arma do namorado. Teria que fazer do modo mais difícil.

Respirou fundo. Desceu as escadas lentamente, querendo adiar o que estava prestes a fazer. Ela estava decidida, mas nem por isso não ia deixar de se sentir um pouco assustada. Ela encontrou Rory, Harmony e Sugar na sala de estar, brincando e conversando entre si. Ele parecia deslocado, e ela não poderia não sentir pena de Rory. Perto da química maravilhosa entre Harmony e Sugar, poucos se sentiam à vontade, não se sentiam um intruso.

Pediu informações de onde Sam estava. Mais uma vez, o garoto se colocava no front para protegê-los. Trabalhava do lado de fora na cerca com Puck, Santana e Brittany. Ela também podia ouvir Rachel e Quinn atirando, brincando, às vezes gritando com Santana. Mercedes sorriu de forma agradecida e encaminhou pela porta da cozinha.

A mínima troca de olhares entre ela e Rory deu ao garoto grandes informações para o que iria fazer. Ele podia ser muito sensitivo quando queria. Ouviu os passos do garoto acompanhando-a para fora da casa. Ele queria impedi-la. Mercedes abaixou os olhos e sorriu, contida, mas continuou seu caminho.

— Mercedes... — ela o escutou chamar, num fiapo de voz.

— É uma escolha, Rory — disse Mercedes por cima do ombro. — Você deveria respeitá-la.

Continuou seu caminho sem olhar para trás.

Chegando ao quintal dos fundos, Mercedes observou o cuidado com que Quinn ajudava Rachel a atirar; a dificuldade com que Santana erguia as vigas no ar e as punha no chão, deixando para que Brittany as fincasse na terra. Mercedes não viu Sam e Puck, no entanto, e logo presumiu que eles estivessem terminando as cercas na parte da frente da mansão.

Caminhou alguns passos e achou o que procurava: o walker que Hanna prendera numa viga que eles não iriam utilizar. Ouvira Quinn no quarto de Hanna durante a manhã e sabia que Rachel provavelmente ia matá-lo no seu treinamento com armas dali a pouco.

— Olá — ela disse de mansinho, se aproximando do morto-vivo. A criatura fixou os olhos vazios nela e tentou avançar, mas a corda presa o parou. — Provavelmente você não vai gostar daqui, sabe? Os garotos são boas pessoas, no princípio são ótimos... mas eles são idiotamente críticos. Um deslize... e te condenam, sério.

O errante gemeu e tentou se libertar das cordas que o prendiam, pois Mercedes chegava cada vez mais perto dele, somente alguns passos na direção errada e seria atacada.

— Eu não pertenço a esse mundo. Não mais. Tá tudo muito louco para processar. Essa calmaria vai passar. E... eu posso ver nos olhos deles... também sabem que não sou daqui. Perderam todo o respeito por mim. Todos eles. Até meu namorado.

“Ele tenta ser legal, mas posso sentir. Sam Evans só está sendo condescendente comigo. Olha só... não faz nem uma semana aqui e ele já se apaixonou outra vez. Ele também acha que estou louca.”

Ela lançou um olhar para Quinn e Rachel, as mais próximas dela. Estavam distraídas demais entre si para notar a aproximação dela com o walker. Mercedes sorriu complacente, dando um passo na direção do morto-vivo. Perto o bastante, mas ainda distante.

— Fui contra a trazerem você aqui — Mercedes disse, notando as roupas esfarrapadas do errante, os braços magros levantados à procura da carne que ela tinha. A pele translúcida no sol da tarde não assustava ela nem um pouco. Havia sido uma mulher, de uns vinte e cinco anos, talvez, antes de ter sido transformada. Talvez fosse uma das donas ricas de uma das mansões ali perto. Talvez fosse uma simples empregada que não tinha lugar mais para ir e acabara se escondendo no porão durante a fuga dos patrões. Não sabia sua história, não queria saber. — Agora, vejo que você foi a única que me sobrou para conversar. Eu me chamo Mercedes.

Mercedes deu dois passos fatais na direção da walker. O errante finalmente ergueu seus braços para atacá-la, pegando pelo pescoço. Ela deixou-se levar, sentindo a mordida dele em sua garganta. O sangue se esvaiu, os olhos de Mercedes foram fechando lentamente.

Escutou gritos, e reconheceu como sendo Quinn. O errante ainda a devorava com uma fome arrepiante, engolindo cada pedaço de carne seu como se não houvesse outro mais no planeta. Um tiro ensurdeceu o que restava de seus ouvidos. Caiu no chão como uma boneca de pano, o sangue pululando da jugular.

— Mercedes, não!

Seus olhos reviraram nas órbitas. A respiração falhava, o oxigênio não parecia mais chegar aos seus pulmões. A pouca sensibilidade que lhe restava avisou a ela que mãos a sacudiam pelos ombros.

— Só me... — ela arquejou fracamente — só me deixe morrer...

Mercedes pensou em dar um sorriso fraco. Não se lembrava de ter conseguiu ou não. Ela não via mais à sua frente Quinn ou o errante, mas, sim, sua família, morta ao que pareciam anos-luz antes, ainda em Lima, sorrindo de forma convidativa a ela.

Seu pai estendeu-lhe a mão.

Ela aceitou de bom grado.


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Notas finais do capítulo

A passagem da morte da Mercedes realmente aconteceu na série em quadrinhos The Walking Dead e eu achei interessante se a colocasse aqui. Espero que não tenha sido "forte" demais para vocês, e vocês têm todo o direito de me xingar e esmurrar via tela do computador se não tiverem gostado.
Espero o review de vocês, galera, e muito obrigada por terem lido!



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