Gerard e eu encarávamos a televisão, perplexos. O noticiário mostrava a fachada do prédio de Jessica enquanto o repórter falava.

 - Nesta manhã o corpo de Jessica Julie Will foi encontrado pelo porteiro do prédio onde ela morava. Ele teria estranhado o fato da moça de vinte e cinco anos não ter saído de seu apartamento como fazia todos os dias, ele diz que a garota o cumprimentava todos os dias pela manhã quando saía para uma caminhada matinal. O crime pode ter ocorrido no dia anterior, já que o porteiro e alguns morados se recordam de tê-la visto sair do prédio por volta das dez da manhã, mas não de tê-la visto voltar. A polícia está investigando o caso e adquirindo informações, serão recolhidas as imagens das câmeras de segurança dos elevadores e das entradas do prédio, na esperança de encontrarem imagens de Jessica com o suposto assassino. A família da jovem fora avisada e está chocada com o crime sem motivos visíveis, já que nada fora roubado do apartamento. Mais notícias sobre o caso há qualquer momento em sua programação... – disse o repórter, ele se encontrava na frente do prédio de Jessica.

 - Isso é horrível – disse Gerard, assustado.

 - Quem poderia ter feito isso? – perguntei, unindo as sobrancelhas.

 Gerard permaneceu em silêncio, logo depois olhou-me com uma expressão que misturava dúvida e temor.

 - Nem olhe para mim, Gerard, eu nem se quer passei perto do prédio dela! – falei, antes mesmo que ele falasse o que pretendia dizer.

 - Okay, foi um pensamento idiota – ele disse, chacoalhando a cabeça como se afastasse o pensamento. – Mas você estava com raiva dela, e...

 - Não fui eu! – disse, interrompendo-o e encerrando o assunto.

 Um choro começou no quarto dos bebês, tirando-me de meus devaneios. Fui rapidamente até lá, era Helena quem chorava.

 - Por que você chora tanto? – perguntei, pegando-a no colo. – Seu irmão é tranquilo, dorme quase que o dia inteiro, podia ser iguais nisto também, não é?

 Arthur continuava dormindo tranquilamente. Eles eram praticamente um o oposto do outro, Arthur dormia de mais, já Helena chorava de mais, eu não sabia se essas duas coisas eram normais, não conseguia deixar de ficar preocupada com esses sonos profundos e longos de Arthur, nem com o choro exagerado e irregular de Helena.

 - Ela chora muito – riu Gerard, aparecendo na porta.

 - Eu sei – falei. – Já Arthur dorme de mais.

 - Acho que eles puxaram a nós – ele sorriu. – Helena chora muito por que a mamãe é escandalosa, e Arthur dorme muito por que o papai é preguiçoso.

 - Sua lógica pode ter um ponto de razão, mas eu não sou escandalosa – corrigi.

 - Uhum... – ele disse, irônico.

 Entreguei Helena a Gerard para que eu fosse preparar o café da manhã, ele logo conseguiu acalmá-la – um dia ele teria que me falar o que fazia para conseguir isso.

 - Eu troquei a fralda da Helie – Gerard disse, orgulhoso de si mesmo, chegando à cozinha.

 - Parabéns – ri um pouco.

 - Obrigado! – ele disse, eufórico, abrindo a geladeira.

 Tomamos café e depois assistimos um pouco de televisão – um canal de música, já que os outros estavam tomados por noticiários e plantões que falavam sobre o assassinato misterioso de Jessica.

 Depois de mais ou menos meia-hora, Arthur acordou – chorando, claro. Gerard foi pegá-lo antes que acordasse Helena – que seria mais difícil de acalmar. Gerard o trouxe até a sala e sentou ao meu lado no sofá.

 - Oi, mamãe – Gerard fez voz de criança.

 - Oi – falei, rindo.

 - Tem certeza que não foi você quem matou a Jessica? – Gerard perguntou, ainda fazendo voz de criança, como se Arthur quem estivesse perguntando.

 - Okay, vou confessar para você, Arth. Foi a mamãe quem matou ela, e também vai matar o papai por estar usando você para isso – falei, irônica.

 - Papai ficou com medo agora – Gerard riu novamente.

**

 Gerard estava se arrumando para a viagem, a My Chemical Romance iria fazer dois shows em Washington, um em Seattle e um em Los Angeles, voltariam em cinco dias.

 - Qualquer coisa que acontecer você me liga, okay? – ele disse, colocando a jaqueta.

 - Okay – respondi.

 - Nem que seja uma tosse de um deles, qualquer coisa – ele enfatizou.

 - Pode deixar – sorri.

 - Eu não acredito que vou ficar esse tempo todo sem ver eles – ele choramingou.

 - Nossa, obrigada por sentir minha falta – ironizei.

 - Ah, e sem ver você também – ele riu.

 Acompanhei-o até o quarto dos bebês, Gerard esmagou um por um com um abraço apertado – na medida do possível, claro, já que eram bebês.

 - O papai volta rapidinho – ele disse, abaixando-se entre os dois berços, para ficar mais ou menos da altura em que eles se encontravam. – Vocês nem vão perceber que eu não estou aqui.

 Quando ele levantou-se e se virou para mim percebi que havia algumas lágrimas em seus olhos, Gerard secou-as com as costas da mão rapidamente, fungando.

 - Não precisa chorar – falei, envolvendo-o com meus braços.

 - Não estou chorando – ele mentiu, correspondendo ao abraço.

 Ficamos alguns instantes, apoiei minha cabeça no peito de Gerard, que afagou meu cabelo.

 - Vou ficar com saudades – choraminguei.

 Gerard não respondeu, o ouvi fungar novamente.

 - Pare de chorar, Gerard – falei, afastando minha cabeça de seu peito e olhando-o nos olhos. – São apenas cinco dias.

 - Apenas? – ele arqueou uma sobrancelha.

 Enxuguei uma lágrima que rolava lentamente por seu rosto e selei nossos lábios rápida e delicadamente.

 - Eu ligo todos os dias – ele disse, colocando uma mexa de meu cabelo atrás de minha orelha.

 - E se você não ligar, eu ligo – sorri, afagando seu rosto.

 - Bem, acho melhor eu ir de uma vez, antes que desista – ele deu uma leve risada, fungando mais uma vez.

 - Tem razão – concordei.

 Fui com Gerard até a porta, ele parou e sorriu para mim.

 - Tchau – ele disse, baixinho.

 - Deixe de ser dramático – ri, dando-o um beijo rápido. – Não esqueça de ligar quando chegarem ao hotel – lembrei.

 - Okay – ele sorriu.

 Gerard respirou fundo, como se tomasse coragem para ir. Ele deu-me mais um beijo rápido e finalmente foi até o elevador.

 Gerard abanou para mim rapidamente enquanto a porta do elevador fechava, correspondi o aceno.

 Fui até a janela que dava visão à rua e esperei até poder ver Gerard sair pela portaria do prédio e parar um táxi. Eu podia ver Gerard enxugar o rosto com a manga da jaqueta enquanto o taxista colocava suas malas no porta-malas.

 Logo depois Gerard entrou no carro, impedindo que eu pudesse continuar o vendo. Fiquei ali até o táxi virar a esquina.

 Respirei fundo e pude sentir o vazio tomando conta do apartamento, eu estava sozinha.