Fevereiro de 2015

Entediado, Freddie Benson olha pela janela do avião, vendo a paisagem passar. Ambiente climatizado artificialmente, pouco espaço, um tempo absurdamente grande para chegar ao seu destino... o rapaz preferia infinitamente viajar por conta própria, sentindo o deslocamento de ar no rosto, a sensação de liberdade proporcionada por seus poderes...

Entretanto, quando outros soubessem que sua identidade real estava indo para Seattle, Freddie preferia viajar de forma convencional para não levantar suspeitas de seu segredo.

Quando finalmente ele chega ao aeroporto, o rapaz apanha sua mochila e, quando adentra o saguão onde pessoas esperam por seus parentes ou amigos, percebe quase imediatamente Sam e Carly esperando por ele. De longe, ele sorri para as amigas.

Freddie sai pelo saguão e suas duas amigas vêm correndo em sua direção, ambas se jogando sobre ele, que abre um belo sorriso.

“Freddie!”

“Nerd!”

“Eu também tava com saudades das duas...”

Ele dá um beijo em cada uma delas, e os três, ele no meio e as duas segurando cada uma um braço dele (fazendo outros rapazes se indagarem se aquele cara tinha mel para estar com duas beldades ao lado) vão pelo saguão até a saída do aeroporto.

“E aí, burrão? Já era pra você ter terminado essa faculdade faz um ano! Deixou de ser nerd?”

“Pois é... a faculdade é difícil, a vida social anda agitada...”

“Hum... muitas gatinhas na vida do Freddie Benson?”, pergunta Carly, com um sorriso malicioso. Sam, por outro lado, parece ficar séria com essa afirmação.

“Hã... mais ou menos...” Freddie responde, ficando vermelho.

“Não conheço mais esse nerd.”

“Nem eu te conheço mais, delinquente. Melhor recruta da turma de policiais?”

“A Mamãe gosta de prender foras-da-lei. Fora isso, ainda consigo dar porradas em alguns manés e ainda ganho pra isso. Tem trabalho melhor?”

“E você, Carls... principal estrela do Seattle News, furo do ano...”

“Pois é, tudo graças ao Super.”

“Ah, é... o super-herói... já ouvi falar que ele salvou uma ou duas pessoas lá em Boston. O que vocês acham dele?”

“Lindo! Simpático! Maravilhoso!”

“Meio babaca. Bobão. Zé Ruela.”

“Uau... quanta diferença.”

“A Sam é a única cidadã de Seattle que não gosta dele. Ah, fora o Nevel, né?”

“Bah, ele é muito certinho pro meu gosto.”, diz a loira, torcendo o nariz.

Freddie sorri e chama o táxi, para os três rumarem ao apartamento da morena.

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Freddie e Sam estão se atualizando sentados no sofá, quando Carly chega com uma bandeja contendo alguns aperitivos, três copos e uma jarra de suco de abacaxi. Cada um dos três amigos pega um copo e começa a degustar dos aperitivos.

“Vocês sabem... podíamos aproveitar que o Freddie vai ficar alguns dias aqui em Seattle pra fazer um tipo ‘Último Episódio’ do iCarly...”

“Podes crer... a gente terminou meio de sopetão... também, perdemos um monte de espectadores por causa desse nerd idiota e caipira que nos abandonou!”

“Aceita, Freddie?”, pergunta a sua amiga morena, com um sorriso ao qual ele dificilmente conseguia resistir.

“Claro... mas, tipo, se você é uma repórter gabaritada e respeitada, não tem problema fazer um programa de palhaçadas na web?”

“Depois da minha entrevista com o Superman, meu caro... posso sair pelada pela rua sambando que vão dar um jeito de relevar... eh, eh, eh...”

“Feito. Eu participo.”

“Beleza!!! É só mandar uma mensagem no fórum do site que depois de amanhã a gente vai transmitir o último episódio do iCarly!!!”

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O lugar traz velhas lembranças a ele. Aquele elevador estranho, que desembocava direto no apartamento dos Shay, a porta com o logo do iCarly na frente, seu carrinho de aparatos... tudo isso o remete a uma época em que as coisas eram mais simples.

Agora, Spencer e Carly não mais moravam juntos, já que ela tinha preferido se mudar para uma cobertura e morar sozinha; pelo que Freddie havia entendido, Spencer ficou um pouco depressivo nas primeiras semanas, mas pouco a pouco começou a apreciar a liberdade de morar sozinho. O antigo estúdio estava sendo usado por Spencer para criar suas esculturas, mas ele gentilmente havia cedido temporariamente o espaço para que os jovens fizessem uma última transmissão. E fez mais: havia até limpado o local e refeito a decoração antiga. Spencer era uma ótima pessoa, faria tudo pela irmã e pelos amigos.

Carly, Sam e Freddie haviam feito um roteiro às pressas para o programa, que basicamente consistiria em revisitar os sketches mais famosos deles; reinterpretariam alguns personagens, trariam convidados... seria um iCarly feito às pressas, mas decente.

Ele ouve o elevador subindo e as duas amigas conversando. Era hora de fazer o programa.

Freddie empunha sua câmera e se sente novamente com 12 anos. A visão de suas duas amigas conversando e rindo lhe traz imensa alegria, fazendo-o involuntariamente sorrir.

“Pronto, Clarkson? Pronto pra fazer aquela contagem regressiva ridícula onde você nunca fala o número 1?”

“Sempre, Sammy. Em 5, 4, 3, 2...”

“Olá!!!”, as duas moças dizem juntas.

“Depois de um tempão, o iCarly original está de volta pra um último episódio!”

“É, galera... até o Frednerd está de volta! Diz oi pra galera, Freddie!”

Ele vira a câmera para seu rosto, sorri e diz ‘Oi’, de forma tímida.

Para variar, Sam pega a câmera e a vira em direção a ela e à amiga.

“Câmera nas verdadeiras estrelas, Nerd.”, ela diz jocosa, mas logo depois olha diretamente em seus olhos e lhe dá um doce sorriso.

As duas amigas apresentam o programa com o mesmo bom humor de outrora; nesta edição, eles haviam resolvido fazer uma revisita aos momentos marcantes do programa, trazendo alguns convidados especiais, como o entregador oriental sem noção (que ainda era entregador de comida chinesa), o garoto da língua gigante, a mulher que toca trompete em cima de um pula-pula, entre diversos outros. O trio também presenteou os espectadores com as velhas encenações do inglês que era horrível com seus filhos, a fazendeira burra, e até mesmo o sketch do vampiro.

Ao cabo de três horas de programa, que parecem ter voado, as duas apresentadoras falam à câmera:

“Bem, infelizmente chegamos ao fim do iCarly. Mas antes, temos uma surpresa!”

“Adivinha quem está aqui? É alguém muito próximo (pelo visto) da minha amiga Carly, o super-herói mais famoso de Seattle, bem... o único, na verdade... o Superman!!!”

Freddie arregalou os olhos. Ele não sabia dessa ideia, e um temor lhe tomou a mente ao imaginar se suas amigas haviam descoberto seu segredo e resolvido revelá-lo em público para milhões de espectadores.

Mas, para seu alívio, adentra pululando pelo estúdio o rotundo Gibby, trajado com um uniforme parecido com o seu, mas mais simples e com uma cueca vermelha por cima das calças azuis. Freddie já havia visto aquele uniforme sendo vendido em lojas de crianças e de fantasias, só não lhe agradava a cueca por cima das calças. De alguma forma, as pessoas achavam aquele visual mais ‘super-heroístico’.

“Nada tema, Seattle! Aqui está o Superman ao resgate!”

“Oh! Superman, salve-me desse monstro!!!”, grita Sam, enquanto um Spencer fantasiado de um lagarto gigante a agarra pela cintura.

“Não se preocupe, linda dama, com meu supersoco eu abato esta vil criatura!”

Gibby finge dar um soco em Spencer, que cai fingindo estar desmaiado. Sam abraça o Super-Gibby e lhe dá um beijo na bochecha.

“Oh, meu herói!!!”

“Desculpa, Super, isso não foi ideia minha, foi dessa minha amiga louca...”, desculpa-se Carly, olhando sem jeito para Sam.

“É, foi mal... mas vê se vira policial de verdade, super-mané!”

“Sam!”, grita Carly reprovando a fala da amiga, logo em seguida se virando para a câmera novamente, “Bem, pessoal, eu queria agradecer de coração todo esse carinho dispensado por vocês nesses quase dez anos desde que começamos a fazer o iCarly, uma coisa que começou como uma brincadeira, mas que se tornou parte importante das nossas vidas. A bem da verdade, sempre foi uma brincadeira, né?”

“É isso aí, pessoal! E lembrem-se, se aprontarem alguma, eu prendo vocês, hein!”, diz Sam, apontando seu indicador em direção à câmera.

As amigas incentivam e Freddie passa a câmera para Gibby, e se junta às duas apresentadoras.

“Pessoal, pra mim é uma honra muito grande ter feito junto com essas duas garotas maravilhosas esse programa, e é com uma pontada no coração que eu me despeço dele.”

Os três amigos se abraçam.

“Tchau, pessoal! Obrigada!”

“Falou povo!”

“Tchau, gente!”

Gibby desliga a câmera.

“E corta! Pela última vez.”, diz Freddie.

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Depois de uma festa bem animada com a participação de todos os seus antigos amigos, Carly, Sam e Freddie estão sentados cada um em um pufe, as duas garotas cansadas do dia agitado.

“Ufa... trabalhão, mas valeu a pena, hein...”

“Argh... tem razão, mais trabalho do que a Mamãe gostaria de fazer.”

“Aquela cena com o Superman foi surpresa pra mim...”, fala Freddie, curioso em saber por que o herói havia sido colocado daquela forma.

“Ah, a gente decidiu de última hora!”

“Se bem que o Gibby não chega aos pés do Super original...”, diz melosamente Carly.

“Ah, para de falar nele, Carls...”

“Ei, fala a verdade, você também já viu aquele gato de perto.”, Carly fala isso com uma cara maliciosa.

“Bem, isso não dá pra negar... ele é muito gostoso mesmo.”, rende-se Sam.

“Ai, os bíceps... a barriga tanquinho... e aquele pacote dele, menina?”

“Eu vi! Só faltou ver como é a bundinha dele... com aquela maldita capa não dá pra ver nada...”

Freddie sente suas bochechas arderem e resolve interromper a conversa.

“Ei!!! Não sei se vocês perceberam, mas eu estou aqui e não vejo nada demais nesse Superman!”

“Ahahaha, tá bom! A gente para de falar nisso, Fredonho! Pelo menos parece que você não é gay.”

Aliviado, Freddie tenta fugir do assunto.

“Bem, amanhã eu tenho o dia livre, vocês querem sair comigo?”

A morena e a loira olham para o lado e mordem seus lábios.

“É... bem... é que é o dia de São Valentim... e você sabe... eu e o meu namorado Peter temos planos... bem...”, tenta se justificar a morena.

“E você, Sam?”

“Uhh... bom... cê sabe... eu também tô namorando... e... o Carlos me chamou pra ir no apê dele... e...”

Somente agora se dando conta da situação difícil na qual colocou suas amigas, Freddie procura contornar o assunto.

“Ei, deixa pra lá! Esqueci que amanhã é o Dia dos Namorados!”

“Foi mal, Freddie...”

Por uns momentos, um clima ruim se instala no estúdio, mas logo eles voltam a conversar animadamente.

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Carly, com um elegante vestido negro, está sentada à mesa de sua sala de estar enquanto degusta um delicioso jantar e um caro vinho importado, tudo arranjado por seu namorado. Já estão nesse encontro há um par de horas, e a morena parece estar se divertindo.

Do lado de fora, a dezenas de metros de altura, Superman os observa com sua visão de raios-x combinada com a telescópica. Ele se sente mal por bisbilhotar a amiga dessa forma, mas não pôde evitá-lo, por algum motivo. Ele se vira alguns graus à esquerda, e vê sua outra amiga, Sam, que está no apartamento de seu namorado Carlos. Ao contrário do clima romântico e chique envolvido na celebração da morena, o outro casal está jogando video-game, tomando cerveja e comendo hambúrgueres.

Uma pontada no peito dele aparece a cada beijo trocado pelas duas amigas com seus respectivos namorados.

Farto de bisbilhotar, Freddie voa rumo ao prédio mais alto da cidade e se senta no topo dele.

Sopra um vento relativamente forte, que move sua franja. Ele abaixa o olhar, pensativo. Não há nenhum amigo com o qual possa contar nesta noite, e isso faz o kryptoniano se lembrar que possivelmente não há ninguém mais no universo como ele, o que o faz se sentir ainda mais solitário.

Um alienígena superpoderoso entre humanos.

Uma lágrima percorre seu rosto. Ao menos isso ele tinha em comum com os seres humanos.

De repente, uma imagem unusual lhe chama a atenção. Uma garota, talvez um pouco mais velha do que ele, dava um passo para fora de sua janela, ficando perigosamente na beirada do prédio. Ele se prepara para voar em supervelocidade, mas se detém ao ver que ela parece em dúvida sobre o que fazer.

Freddie então decide se aproximar lentamente.

Ele a observa sem que saiba de sua presença. É uma garota negra, um pouco acima do peso, muito bonita. Seu semblante exala tristeza, e o herói de sensibiliza com a cena. Ela chora.

“Hã... boa noite.”

A jovem se assusta e instintivamente dá um passo para trás.

“Superman?!?”

Ele sorri.

“Bem, dada a data de hoje, e o lugar incomum em que você está... acredito que você não esteja apenas admirando a paisagem, não?”

“Não adianta você me salvar! Eu vou pular em uma hora que você não estiver por perto!”

Ele flutua suavemente até o lado dela e se senta na beirada do prédio, olhando para a paisagem.

“Seu nome?”

“M-Micaela.”

“Belo nome. Meu nome verdadeiro é Kal.”

Ele continua observando a paisagem. A garota, sem entender o que está acontecendo, fica apenas calada.

“Você sabe que eu sou de outro mundo, né, Micaela?”, ele pergunta, olhando para ela, que assente para o herói, “Meu planeta natal, Krypton, foi destruído por uma supernova. Acho que sou o último ser vivo daquele planeta.”

Ela o fita curiosa. Diferente do que ela via nos noticiários, este era um Superman que tinha um lado frágil, inseguro.

“E sabe... às vezes, como hoje, eu me sinto extremamente solitário. Porque eu sei, que no fundo, não sou humano, não sou um de vocês. Se bem que... os amigos compensam isso. Só que minhas duas melhores amigas não estão à disposição hoje.”

“Você... tem amigas?”

“Sim. E uma delas... me interessou muito há um tempo atrás.”

“E o que elas estão fazendo?”

Superman apura a audição.

“Hum... coisas... proibidas pra menores. Bem, o que importa é que provavelmente é o meu destino. Quem ficasse comigo correria muito perigo.”

“Mesmo?”

“Mas eu não vou desistir, muita gente que gosta de mim precisa que eu continue por aqui, Micaela. Do mesmo jeito que eu tenho certeza de que muitas pessoas queridas querem que você continue por aqui.”

“Mas... minha vida não existe sem o Pietro...”

“Existe, sim. O que você estava pensando em fazer é irreversível, Micaela. Pense bem, muita gente gosta de você, e elas sofreriam sem a sua presença. Você está 100% certa quando diz que eu não vou estar aqui sempre pra te salvar, mas... eu peço, não faça isso.”, Freddie diz, enquanto olha para a jovem.

Micaela olha para baixo, para a rua, reflete por um momento, e olha de volta para o herói, sorrindo.

“Você tem toda a razão. Eu me matar por causa daquele idiota?”

Freddie sorri de volta, se levanta e começa a flutuar em frente à garota, que logo depois volta para seu apartamento.

“Assim que se fala! Agora, se você me der licença, Micaela, preciso continuar minha ronda noturna.”

“Obrigada, Kal.”, ela diz, sorrindo para o super-herói.

“Vê se te cuida, Micaela. Foi um prazer. Boa noite!”, ele fala e sai voando para longe.

Ele sobe além das nuvens, onde o céu está mais estrelado ainda, um visão que o kryptoniano nunca irá se cansar. Freddie cruza seus braços, aguça sua audição e começa a varrer a cidade em busca de pessoas que precisem de ajuda.

Ele sorri.

O rapaz pode estar destinado a ficar com ninguém, mas a sensação de dever cumprido supre essa carência, ou ao menos é o que ele pensa.