A Árvore Dos Pássaros Mortos escrita por Kacire
Para Claus, cortar-se era como transcender a morte e a vida. Claus fechou os olhos para esperar mais uma vez. A sensação de estar sozinho, longe do mundo, nunca fora tão ruim. Claus já não queria o silêncio. Queria ouvir o que o silêncio tinha para dizer e agora sabia que o silêncio é gritante.
- Aparece, por favor, aparece.
E então o quarto entrou num vácuo.
- Não posso vir todas as vezes, Claus – Morte estava sentado na cama, ao lado dele.
- Eu queria te ver. – Disse Claus, sorrindo ao toque de Morte.
- Pra quê?
- Não é todo dia que se fala com a Morte. Quero entender tudo.
- Não era pra você lembrar da nossa primeira conversa. Vem. Vamos andar.
- Por aí? - perguntou Claus.
- É.
***
Claus e Morte caminhavam por uma ruela completamente destruída e livre de cores.
- Isso é a morte? – Perguntou Claus, reconhecendo a ruela por onde sempre passava e que sempre ficava repleta de crianças alegres.
- Antes fosse. – Respondeu Morte – A morte é apenas a interrupção da vida, Claus. Pelo menos para a grande maioria.
- Mesmo assim, acho que seria melhor. Onde estamos então?
- Essa é a linha que separa a vida da morte; Acho que é a única coisa que eu agradeço por existir, depois que eu morri.
No fim da rua, o único ponto de cor passou e acenou para Morte, que retribuiu o cumprimento.
- O que foi aquilo? – Perguntou Claus.
- Não sou o único Claus. Aquela é Desejo.
- Isso ta ficando cada vez mais confuso – Disse Claus, tentando desembaralhar os nós na cabeça.
- E nunca deixa de ficar.
- Isso... Que você é... E aquela garota também... É algum tipo de maldição?
- Essa seria a melhor definição, mas ninguém sabe de fato o que é.
- Como aconteceu com você? – Claus estava curioso para entender tudo. Tão curioso que não sentia o medo natural que deveria sentir diante de uma situação tão bizarra.
- Eu era exatamente como você, Claus. Num determinado ponto da minha vida eu quis me matar e fiz isso no banheiro da minha casa. Alguns dias depois eu ‘despertei’. E sabia que, a partir daquele momento, eu era a Morte.
- E ninguém apareceu para dar explicação?
- Não. Quando descobri que podia alternar entre a vida e esse lugar ‘paralelo’, esperei que aqui viesse Deus ou o Diabo para explicar o que acontecera. Mas não apareceu merda nenhuma.
- E os outros que estão por aqui?
- Sabem tanto quanto eu. Mas eles aceitam melhor suas condições. Acho que não existe nada pior do que ser a Morte.
- Já que não te agrada, porque continua matando? – Perguntou Claus, achando a solução simples.
- Porque tenho fome. Não interromper o ciclo natural da vida é minha forma de sobrevivência. Quando alguém está para morrer, está na hora de almoçar. Se eu não comer, eu morro.
- E o que acontece se a morte morrer? – Perguntou Claus, tentando processar todas as informações confusas.
- Eu não sei. Só sei que não é coisa boa.
Claus e Morte ficaram em silêncio por um bom tempo, caminhando pelas mesmas ruas da cidade onde Claus estava acostumado a andar, mas todo lugar tinha aquele tom apocalíptico. Os únicos pontos coloridos passavam as vezes, acenando sempre para Morte.
- Pra onde estamos indo? – Perguntou Claus, finalmente.
- Para a casa de Ilusão. – Respondeu Morte, com a voz mais grave que nunca.
- Pra quê? – Perguntou Claus.
- Algo aconteceu da primeira vez que impediu você de esquecer o nosso papo. Não acredito que seja algo bom um humano conhecer esse outro lado. Principalmente um suicida em potencial...
- Não quero esquecer.
- Você deve! Como disse antes, não posso te salvar todas as vezes que você tentar se matar. Aliás, não devia ter ajudado nem uma vez! Não compete a mim decidir quem morre e quem não morre. Eu apenas busco! Vocês tem o livre arbítrio;
- Não estou pedindo pra que você me salve. Eu decidi que é isso que eu realmente quero...
- Claus, se você soubesse o quanto você pode se arrepend...
- Morte. Eu não sei por que você se matou... E não me interessa saber. Mas deve pelo menos entender os motivos que me levam a querer o mesmo. Você sabe o que é estar decidido.
- Está bem... Mas ainda sim tenho que fazer você esquecer isso tudo. Vem, vamos para a casa de Ilusão.
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