Primavera Mentirosa escrita por fosforosmalone


Capítulo 2
Verdades E Segredos


Notas iniciais do capítulo

Capitulo que vem em marcha mais lenta. Mas é o que eu chamo de calmaria antes da tempestade.
Espero que gostem.



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APARTAMENTO DE FRANK SAGE

A agente Belli chega ao apartamento de Sage. O lugar é limpo e organizado. Dentro do local, há policiais pra lá e pra cá. Uma fita isoladora com os dizeres “Afaste-se” esta em volta da geladeira. Um policial vê a agente entrando, e avisa Ferguson sobre a sua chegada. O Chefe De Policia vem do fundo do apartamento, onde ela pode ver Sage sentado em uma poltrona.

FERGUSON

- A situação se complicou, Agente Belli. Às três horas da manhã, Sage nos ligou dizendo que havia órgãos humanos em seu freezer. Justamente os que faltavam a Tina Becker.

HELENA

- O que Sage disse?

FERGUSON

- Disse que chegou em casa, encontrou uma nota na porta do freezer, abriu, e encontrou Dois seios e um coração.  Dê uma olhada no bilhete.

Ferguson vai até a mesa, e tira de dentro de uma caixa um pequeno papel de agenda envolto em um saco plástico. O chefe de policia alcança o papel para a agente, que lê o bilhete onde diz “Um presente no freezer para você, Sr. Sage. Espero que goste de maminha e coração”. Helena se sente enojada ao terminar de ler o que esta escrito.

FERGUSON

- O maluco tem um senso de humor doentio.

HELENA

- Quero falar com Sage.

Ferguson faz sinal para ela ir em frente. Helena se dirige até Frank, e senta-se diante dele.

SAGE

- Agente Belli. Pena revê-la nestas condições.

HELENA

- Eu sei que já falou com o Chefe Ferguson, mas gostaria de lhe fazer algumas perguntas.

SAGE

- Conheço o procedimento. Terei prazer em responder a pergunta que você quiser. Mas antes me sacie uma curiosidade. Você tem um belo sobrenome. É de origem italiana?

HELENA

- Sim. Minha mãe era italiana. Agora, Ferguson disse que o senhor ligou às três da manhã. Por que tão tarde?

SAGE

- Por que foi quando cheguei em casa. Estava em um clube de jazz. Caso queira saber, sai de casa às nove e meia da noite.

HELENA

- Quando chegou aqui, encontrou logo a nota?

SAGE

- Sim. E Sim, assim que li, abri o freezer. E sim, liguei para a polícia em seguida. E não, não toquei em nada até eles chegarem.

Helena olha irritada para o homem, pois ele previu todas as suas perguntas.

- Como eu disse, conheço o procedimento. Mas essas são só perguntas de rotina. Tenho certeza que a pergunta que quer realmente fazer Agente Belli, é “por que acha que ele deixou aquilo no seu freezer?”. O que você acha?

HELENA

- Acho que foi uma ameaça, um aviso.

SAGE

- É um ponto de vista.

HELENA

- E o que o senhor acha?

SAGE

- Ainda estou pensando a respeito.

HELENA

- Enquanto o senhor pensa, vou pedir a Ferguson para mante-lo sob proteção.

Pela primeira vez, ela vê com satisfação, a calma de Sage ser abalada. Mas só por segundos.

SAGE

- Não acho que seja realmente necessário.

HELENA

- Infelizmente não é decisão sua.

Ela começa a se levantar, mas Sage a impede, colocando a mão delicadamente em seu ombro.

SAGE

- É um erro. Não sou eu que preciso de proteção, Agente Belli. São os alunos de New Sharon.

Helena olha com certa raiva para Sage, e responde firme e decidida.

HELENA

- Se Jack Calcanhar De Mola voltou, eu vou pega-lo.

Frank olha com curiosidade para moça, enquanto ela se levanta

- Eu vou lembrá-lo de novo. Não é mais do FBI. Se ficar questionando a minha investigação, eu ferro com você, e dane-se quem você foi!

Enquanto observa a moça se afastar, Frank sorri, e tira um cigarro do bolso, o acendendo.

SAGE

- Ela tem mesmo sangue italiano.

SALA DE FERGUSON

Helena esta sozinha no escritório tomando uma xícara de café, quando Ferguson entra.

FERGUSON

- Pela manhã, devemos saber se o DNA dos órgãos conferem com o de Tina Becker. Embora eu não tenha duvida. Tem alguma idéia do por que aquilo foi parar no freezer de Frank Sage?

HELENA

- Sage estava na universidade ontem. Ele deve ter chamado a atenção do assassino. Botar os órgãos de Becker na casa dele pode ter sido a maneira que ele encontrou de intimidá-lo.

FERGUSON

- Esta dizendo que o assassino estava lá? Que pode ter passado na nossa frente?

HELENA

- Exato. Mas não ajuda muito. Centenas de pessoas viram Sage lá hoje. Mas seja quem for, é alguém que conhece Sage ao menos de vista.

FERGUSON

- Alguém que esteve em New Sharon em 2001? Alguém Como Jack Calcanhar De Mola?

HELENA

- Ou alguém obcecado por ele. Sage estava à frente do caso, e exposto na imprensa.

FERGUSON

- Considerou a possibilidade de Sage ter feito isso?

Helena olha para Ferguson, como se ele tivesse dito uma grande blasfêmia.

HELENA

- Por que ele faria isso?

FERGUSON

- Ele foi uma lenda, e agora está aposentado. Quem sabe o velho não queria atenção, matou a garota e colocou os órgãos no próprio freezer?

HELENA

- Isso é ridículo! Sage pode ser um cara estranho, mas não é assassino!

FERGUSON

- Tudo bem! Mas tem que admitir que foi estranho Sage aparecer na universidade ontem. E ele parecia bem tranquilo lá no apartamento.

HELENA

- Frank Sage passou metade da vida caçando assassinos, e tentando salvar vidas. Acho que só seguiu o próprio instinto.

FERGUSON

- Pode ser. Só vamos torcer pra que o assassino não pense assim, e não resolva dar mais do que “presentes” ao Sage.

QUARTO DE BRUCE E NICK

O sol esta nascendo. Nick acorda aos poucos, e vê Bruce sentado diante da mesa, mexendo em seu Notebook. O rapaz tem um pacote de bolachas e um copo de refrigerante ao seu lado.

NICK

- Não conseguiu dormir?

BRUCE

- Consegui sim. Só acordei cedo.  E foi bem interessante. Descobri que você fala dormindo.

NICK

- Sério? O que eu falo? (Pergunta curioso)

BRUCE

- Você fica repetindo o nome da Kelly. Fiquei emocionado. (Diz zombeteiro)

Nick fecha a cara com a resposta do colega. Bruce sorri, voltando a atenção para o Notebook.

NIICK

- Não sei mais o que fazer pra ter aquela garota de volta, cara. Já pedi desculpas e nada.

Bruce desvia os olhos do computador, e olha para o amigo.

BRUCE

- Tá querendo a minha opinião, ou é só um desabafo?

NICK

- Acho que vou me arrepender, mas vou querer uma opinião.

BRUCE

- Tú gosta mesmo dela?

NICK

- Claro que sim! Não vem com aquele papo de “Quem Ama não trai”. Eu tava na cidade, e a gostosa da Megan começou a me dar mole. Eu até tentei agüentar, mas eu sou homem, né?

BRUCE

- E a Kelly é mulher, e tá irada contigo.

NICK

- Então o que eu faço, porra?

BRUCE

- Se tú já pediu desculpas pra ela, e mostrou que tá arrependido, o jeito é dar um tempo pra ela, e ver se ela te perdoa ou não. Mas não fica cercando a garota que nem você fez ontem.

NICK

- Mas e se ela não me quiser mais de volta? O que eu vou fazer?

BRUCE

- As mesmas coisas que você fazia antes de começar a namorar com ela.

NICK

- Pra você que não tem namorada é fácil falar.

BRUCE

- Não tenho namorada por que não to a fim de ninguém.

NICK

- Sei. E a Isadora?

BRUCE

A Isa é minha amiga. Só isso.

NICK

- Qual é, Bruce. Eu vejo o jeito que vocês dois ficam se provocando. Eu percebo o jeito que vocês se olham. Você tá a fim dela sim, e acho que ela tambem tá a fim de você.

BRUCE

- Ela não tá não (diz perdendo a segurança que mantinha até então).

Nick balança a cabeça, pensando como o amigo pode ser tão esperto para algumas coisas, e tão burro pra outras.

RESTAURANTE DO HOTEL

Helena come uma salada de frutas, enquanto observa através da janela, as pessoas passarem na rua. Ela havia conseguido dormir mais duas horas após retornar da Delegacia central, mas não se sentia descansada. O enigma do assassinato de Tina Becker, e o destino que o assassino dera ao coração e aos seios arrancados da pobre garota havia deixado Helena incomodada.

Com alguma sorte, alguma das câmeras de segurança do prédio de Sage pode ter captado o invasor, mas Ferguson já a alertara que as câmeras eram poucas, e de fácil detecção, e que não seria tão difícil para o invasor entrar sem ser visto.

Helena é surpreendida quando um homem de aproximadamente 30 anos, de cabelos pretos, para diante da mesa dela. Ele usa calças pretas, e uma camisa social azul.

TONY

- Bom dia. Desculpe incomodar, mas você é Helena Belli, Agente Do FBI que esta investigando o assassinato de Tina Becker, correto?

HELENA

- Quem é você e o que quer? (diz em tom pouco amistoso).

TONY

- Vejo que é uma mulher direta. Então vou direto ao ponto. Meu nome é Tony Stevenson, trabalho para a Gazeta de New London.

HELENA

- Vá embora, ou arranjo uma desculpa, e jogo você na cadeia mais próxima!

TONY

- Ei, calma ai moça! Eu não quero uma declaração. Não por enquanto. Prometo que tudo que falarmos nesta mesa ficara em off. Na verdade, gostaria de ajudá-la na sua investigação.

A agente olha desconfiada para o repórter.

HELENA

- Senta ai. (Enquanto ele se senta, ela continua a falar) Como acha que pode me ajudar?

TONY

- Não sei se sabe Agente Belli, mas escrevi um livro sobre Jack Calcanhar De Mola. Chama-se “Os Crimes Da Primavera Vermelha”. Por acaso já leu?

Helena o olha surpreendida. Ela leu o livro de Stevenson, que trazia entrevistas com alunos e funcionários de New Sharon, alguns envolvidos na investigação dos assassinatos de Jack Calcanhar De Mola, alem de psiquiatras forenses, mas só agora se lembra do nome do autor.

HELENA

- Eu li o seu livro. Um trabalho bem interessante, Stevenson. Mas ainda não vejo como...

TONY

- Reuni muito material enquanto preparava o livro. Tive que colocá-lo de forma mais interessante no livro, mas ainda tenho os dados que eu recolhi em um dossiê, tudo exposto de forma bem objetiva. Estou colocando isso a sua disposição.

HELENA

- E o que você iria querer em troca?

TONY

- Nada. Eu ficaria feliz com uma exclusiva quando o caso acabar, mas não é uma condição.

HELENA

- Em primeiro lugar, o FBI tem seu próprio dossiê a respeito do caso Jack Calcanhar De Mola. Em segundo lugar, se não é pela exclusiva, por que esta aqui?

TONY

- Sei que o FBI deve ter um dossiê sobre o caso, mas informação nunca é demais. Quanto a sua pergunta, estou fazendo isto por uma exclusiva, mas não só por isso. Eu estudava em New Sharon quando o maluco fez o que fez. Não sabe o medo que o desgraçado espalhou naquele lugar. E quando escrevi o livro, vi o sofrimento que ele causou as famílias. Não quero que alguém faça isso de novo, e saia impune. Pra mim Jornalismo não é só informar.

HELENA

- legal da sua parte, mas não há evidencias que um serial killer tenha matado Tina Becker.

TONY

- Não? Mas ela foi morta com um modus operandi muito semelhante ao usado pelo Calcanhar De Mola. E na primeira Primavera Vermelha que ocorre nesta região desde os assassinatos de dez anos atrás. É coincidência demais pra mim, Tenente. E acho que não sou o único que pensa assim. Quando fui a New Sharon cobrir a morte de Tina Becker ontem, vi Frank Sage lá. Acho que ele pensa como eu. E pelo seu olhar, a senhorita tambem, Agente Belli. Você sabe que a pessoa que matou Tina Becker pretende matar de novo.

HELENA

- Trouxe esse dossiê?

Ele abre a maleta que carrega, e entrega uma pasta de arquivo para a agente.

TONY

- Tenho certeza que fará bom uso.

HELENA

- Obrigado, Tony. Talvez possa ser útil.

TONY

- Sobre aquela exclusiva...

HELENA

- Só se merecer, Stevenson. Já terminei meu café. Se me dá licença, tenho coisas a fazer.

Helena se levanta, e sai da mesa, deixando Tony sozinho. Com um sorriso, o jornalista pensa consigo mesmo que aquela jovem agente parece ser uma mulher admirável.

BIBLIOTECA DA UNIVERSIDADE NEW SHARON

Bruce e Nick entram no pátio da biblioteca da universidade. As paredes em volta deles são envidraçadas, expondo as salas que guardam as diferentes sessões da biblioteca. Os dois amigos entram na sessão de comunicação. Bruce se dirige para a bibliotecária, que esta sentada atrás de um balcão em frente à entrada da enorme sala.

BRUCE

- Estou procurando “Os Crimes Da Primavera Vermelha. Pode me ajudar?

 A mulher abre os arquivos do computador, e após alguns segundos, indica ao rapaz onde ele pode encontrar o livro. Bruce agradece, e segue para a ala indicada, seguido por Nick.

NICK

- Ainda não entendi por que tu tá tão interessado nesse Jack Calcanhar De Mola.

BRUCE

- Não estou “tão interessado”, só curioso. A morte desta garota, que deus a tenha, reavivou o meu interesse no Jack. Querendo ou não, ele faz parte da historia desta universidade.

NICK

- E qual a finalidade pratica de saber mais sobre um serial killer?

BRUCE

- No meu caso, estou escrevendo um roteiro, e esta situação esta me dando algumas idéias.

NICK

- Tú é maluco, cara!

BRUCE

- Não sou não. Garanto que tem muita gente com a mesma curiosidade que eu.

Nick para de andar de repente. Isadora, Kelly, e Judy estão em um dos corredores da biblioteca. Isadora acaba de retirar um livro da prateleira. Kelly por sua vez, parece incomodada em ver Nick. Todos se cumprimentam, mesmo Nick e Kelly, embora façam isso de forma fria. Bruce se aproxima de Isa, olhando para o livro que a garota tem em mãos.

BRUCE

- Então, tá lendo o que?

A garota alcança para ele um livro intitulado “A Enciclopédia Do Serial Killer” de Michael Newton. Bruce admira a capa do livro, que estampa um rosto vermelho e assustador.

JUDY

- Só essa louca pra ficar lendo esse tipo de coisa depois do que aconteceu ontem.

ISADORA

- E qual é o problema? Eu já ia pegar o livro antes de acontecer. Não vou deixar de ler o que eu quero por que alguém estripou uma garota que eu não conhecia.

BRUCE

- Sua sensibilidade é comovente, Isa.

ISADORA

- Falou o Sr. Emoção (diz em tom sarcástico).

Nick quebra o silencio que mantem desde que ele e Bruce se encontraram com as garotas.

NICK

- Kelly, posso falar em particular com você? (diz timidamente)

KELLY

- Não tenho nada pra falar em particular com você.

NICK

- Por favor, Kelly.

Kelly olha em duvida para ele. A garota olha para Isa e Judy buscando alguma orientação, mas o rosto das amigas mostra isenção. Bruce puxa um livro da prateleira, e fala.

BRUCE

- Achei meu livro. Vamos lá retirar, Isa?

ISADORA

-Claro (Diz percebendo a intenção do amigo). Vamos lá Judy?

Os três se afastam, deixando Nick e Kelly a sós. Nick e Kelly se dirigem até uma mesa da biblioteca, onde se sentam.

KELLY

- Então, o que ainda quer falar comigo?

NICK

- Eu to com saudade (diz em voz baixa).

KELLY

- Você me trai, me faz de palhaça pra universidade toda, e agora diz que sente saudade?

NICK

- Eu já te disse que eu to arrependido! Só queria que tú me perdoasse.

KELLY

- É, mas não vai rolar.

Kelly se levanta, o que deixa Nick consternado.

NICK

- Espera ai. Você disse que a gente podia conversar!

KELLY

- Achei que podia ter algo novo, mas não, é a mesma ladainha de sempre! Você não se arrepende de ter me traído. Só se arrepende de eu ter descoberto!

NICK

- Não é bem assim.

KELLY

- É exatamente assim! Aceite a verdade, Nick. Acabou!

Kelly percebe que gritou alto demais. Do outro lado da sala, a bibliotecária fita o casal com censura. Mas não é por isso que os olhos da bela loira estão marejados. Kelly sai em um passo apressado da biblioteca, contendo as lagrimas, e deixando Nick arrasado e sozinho na mesa.

PATIO DA BIBLIOTECA

Bruce, Isadora, e Judy estão sentados em um banco no pátio da biblioteca

JUDY

- Será que eles estão se acertando?

BRUCE

- Pouco provável.

Judy sai da biblioteca, secando as lagrimas, e sem nem olhar para os três, entra no banheiro.

JUDY

- Eu vou converso com ela.

Bruce e Isadora observam Judy ir até o banheiro conversar a Kelly.

BRUCE

- Você não vai tambem?

ISADORA

- Ela não precisa de um monte de gente em volta dela. E Judy é melhor nisso do que eu.

Através das paredes envidraçadas, Isa vê Nick triste, sentado na mesa da biblioteca,

ISADORA

- E você, não vai lá dar apoio ao Nick?

BRUCE

- Acho que ele precisa ficar um tempo sozinho pra pensar.

Os dois ficam em silencio por um tempo. Para Bruce, aquele silencio é ensurdecedor.

BRUCE

- Você tá mesmo feliz na psicologia, não é?

ISADORA

- To sim.

BRUCE

- Olha, Isa, eu sei que às vezes eu posso te encher o saco com algumas coisas, mas quero que saiba que se você esta feliz lá, eu tambem to feliz. Eu só te incomodo às vezes por que, sei lá, acho que sinto falta de estudar contigo.

Isadora olha para Bruce através dos óculos. A garota parece pega de surpresa.

ISADORA

- Eu tambem sinto a sua falta... Quero dizer, sinto falta do tempo que a gente passava junto.

Isadora parece recuperada da surpresa inicial.

ISADORA

- Mas por que disse isso agora?

BRUCE

- Sei lá, acho que fiquei sentimental de repente. Vai me analisar agora, Dra. Thompson? (Pergunta em tom zombeteiro)

Ela ri, dando um pequeno soco no ombro do rapaz.

ISADORA

- Não perde uma piadinha, né?

ESTAÇÃO DE TREM

Frank Sage esta na estação central de New London, onde o sol se põe. Frank tem uma garrafa de refrigerante na mão, e um cachorro quente na outra. Os dois policiais destacados para protegê-lo, o seguem a uma pequena distancia. O homem grisalho olha para o seu relógio de pulso, e após jogar o copo e o papel do cachorro quente no lixo, Frank vai falar com seus acompanhantes.

SAGE

- Podem confessar, este serviço de proteção policial é um saco, não é?

POLICIAL

- Não cabe a nós dizer, senhor.

SAGE

- Claro que não. Pessoas como nós devem ter disciplina. Estou aposentado, e posso aproveitar os pequenos prazeres da vida, como vir ver o movimento na estação. Mas acho que se não tivesse passado anos vivendo pela disciplina, isto não seria tão prazeroso hoje.

POLICIAL

- Se esta dizendo, senhor.

Frank sorri, e se afasta dos vigias. Neste momento, um som ensurdecedor toma conta da plataforma. Uma multidão entra no local. Trens chegam de ambos os lados da plataforma, que fica cada vez mais cheia. Os vigias passam a ter dificuldade em encontrar Sage.  De dentro de um dos trens, varias pessoas desembarcam na plataforma. Os vigias já não vêem mais Sage no meio da multidão. Eles procuram desesperadamente pelo velho agente.

POLICIAL

- Tá vendo ele?

POLICIAL 2

- A droga do velho sumiu!

QUARTO DE HELENA

Helena esta sentada na mesa de seu quarto, com vários papéis espalhados em sua mesa. A agente lê a pasta enviada por George, que contem os registros do FBI a respeito do caso Calcanhar De Mola. Ela é distraída quando seu celular começa a tocar.

A agente atende, e ouve a voz do Chefe Ferguson do outro lado da linha. O homem parece escolher as palavras com cuidado, mas Helena o pressiona para ser direto. Ele conta que Frank Sage desapareceu na estação ferroviária central de New London, e muito provavelmente, fugiu da proteção policial por vontade própria. Helena não consegue acreditar no que lhe é contado. Ferguson conta o que seus homens lhe relataram sobre o ocorrido na estação, enquanto Helena se veste, e pega a sua arma.

HELENA

- Os homens que você pôs para vigiar Sage são duas bestas, Ferguson! O filho da mãe planejou isso! Devia conhecer o horário dos trens.

Ela desliga a luz do quarto, e se dirige para a porta de saída, ainda ao telefone.

- Estou indo pra ai. Temos que encontrar Sage o mais rápido...

Helena abre a porta, e espantada, vê Sage parado em frente a sua porta. A agente fica emudecida, enquanto Frank a observa, parecendo se divertir com a reação da moça.

SAGE

- Ola Agente Belli.

HELENA

- Ferguson, eu estou com Sage.

FERGUSON

- O que?! Como assim?

HELENA

- Eu o levo pra prestar explicações daqui a pouco. Até

Helena desliga o celular, e conseguindo disfarçar o espanto, encara o caçador de assassinos.

HELENA

- Entre.

SAGE

- Obrigado.

Sage entra no apartamento, enquanto Helena fecha a porta, e vira-se furiosa para ele.

HELENA

- Você perdeu a cabeça?! O que deu em você pra fugir da sua escolta?

SAGE

- Queria falar com você.

HELENA

- Não podia simplesmente ter me procurado?

SAGE

- Não sabia se me daria a devida atenção se fizesse isso. Podia não me levar a sério (diz puxando seu maço de cigarros do bolso).

HELENA

- E fugindo da sua escolta eu vou levar você a serio (diz sarcástica). Ei, não pode fumar aqui.

Sage guarda o cigarro no maço, e o coloca de volta no bolso, desculpando-se. Ele vê os registros do FBI sobre Jack Calcanhar De Mola em cima da mesa.

SAGE

- Nossa, há dez anos eu não via esses papéis. Já se convenceu de que há um serial Killer a solta em New Sharon?

HELENA

- Estou analisando as possibilidades. Disse que queria falar comigo, Sr. Sage. Estou ouvindo.

SAGE

- Muito bem, Helena. Posso chamá-la de Helena?

HELENA

- Faça como quiser.

SAGE

- Tive acesso a sua ficha, Helena.

HELENA

- Como teve...

SAGE

- Ainda tenho alguns amigos. Você tem um histórico brilhante, sabe?  Todos os seus instrutores só teceram elogios a seu respeito. Foi uma das primeiras cadetes de sua classe, onde teve especial destaque em Estudo Comportamental, onde escreveu uma tese, segundo dizem, muito interessante sobre o fenômeno social dos serial killers

HELENA

- Conhece meu histórico, e daí?

SAGE

- Sempre fui bom em ler as pessoas, Helena. Como bem sabe, é parte do nosso trabalho. Quando conversamos em minha casa, percebi sua determinação quando falou em pegar Jack Calcanhar De Mola, caso ele tivesse realmente voltado. Era só senso de dever?

HELENA

- E o que mais seria? (Diz Helena parecendo incomodada).

SAGE

- O nome Adelie Parkins lhe diz alguma coisa?

Helena demora um pouco a responder, mas enfim o faz, com a voz séria e contida.

HELENA

- A terceira vitima de Jack Calcanhar De Mola em 2001.

SAGE

- Mas ela é mais pra você, não é Helena? Quando sua mãe veio para os Estados Unidos em 85, ela não esperava ser engravidada e abandonada por um nativo. A coitada estava desempregada e grávida, foi o que a tal terra da oportunidade lhe deu.

HELENA

- Cala a boca (diz em voz baixa).

SAGE

- Ela foi trabalhar como doméstica na casa da família Parkins, e escondeu a gravidez até onde pôde, certo? Mas quando descobriram, os Parkins não a expulsaram, pelo contrario, a acolheram. Eles eram gente de bom coração, raríssimo de se encontrar hoje em dia, não é?

HELENA

- seu filho da mãe! Você me investigou! (diz com raiva)

SAGE

- Não é pessoal. Eu investigo todo mundo. Mas voltando aos Parkins, apesar de ser filha da empregada, como se diz, foi criada praticamente como da família, não foi? Judith Parkins se tornou sua segunda mãe, o que de certa forma torna Adelie Parkins...

HELENA

- Minha irmã (completa ela com os olhos raivosos e marejados).

SAGE

- Eu provavelmente não teria descoberto sua ligação com Adelie se você não tivesse sido a única testemunha do suicídio da mãe dela.

Helena seca os olhos marejados com a mão, enquanto se recompões. Nenhuma lagrima cai.

HELENA

- Eu tinha quinze anos quando Judith se matou. Ela não suportou o que aquele psicopata fez com Adelie. Eu a vi pegando a arma, mas eu não... Eu não consegui impedir.

Ela olha séria para Sage.

HELENA

- Isso que veio fazer aqui, Sage? Jogar meu passado na minha cara? Vai fazer o que agora, contar para os meus superiores? Sabe que vou ser retirada deste caso se souberem da minha ligação com Adelie.

SAGE

- Esta nisto por vingança?

HELENA

- Só quero fazer o meu trabalho (diz com firmeza). Não sou nenhuma adolescente brincando de vingadora. Ao que me consta, o Jack Calcanhar De Mola original pode estar morto e enterrado, mas alguém matou Tina Becker em New Sharon. Alguém destruiu mais uma família. Não quero que aconteça de novo.

Sage sorri com a resposta.

SAGE

- Foi o que eu pensei. Não se preocupe, não vou contar nada. Sei reconhecer um bom agente quando vejo um, e não via ninguém como você há bastante tempo. Sua perda do passado pode lhe dar força, se quiser. Desculpe te abordar assim, mas achei que precisávamos pôr todas as cartas na mesa.

HELENA

E quais são as suas cartas, Frank? (Diz esquecendo as formalidades).

Sentando-se, Sage continua.

SAGE

- Esta manhã, você me perguntou por que eu achava que o assassino havia posto os órgãos de Tina Becker no meu freezer. Vou te responder agora. Aquilo não foi uma ameaça ou um aviso. Esta mais para um convite. Um desafio se preferir.

HELENA

- Explique (diz sentando-se em frente a ele)

SAGE

- Quem fez isso, quer fazer algo maior do que aquilo que foi feito dez anos atrás. Naquela época estávamos no escuro, agora fomos avisados. Não acredito naquela baboseira que diz que esses malucos querem ser pegos, não. O que eles querem é escapar de alguém com a capacidade de pega-los. Querem provar que são superiores. Por alguma razão, ele me escolheu. Ele acha que eu posso pega-lo. Mas eu não acho que posso fazer isto sem você, Helena.

A agente olha séria para o veterano.

HELENA

- Já disse mil vezes que não é mais do FBI.

SAGE

- Tem razão. Mas tambem disse que eu precisava de proteção. Acho que você é mais apta que aqueles dois patetas. (diz sorrindo)

Helena ainda parece hesitante.

HELENA

- Não sei se é uma boa idéia.

Sage se levanta, e abre a cortina, revelando o céu da noite. Pode-se notar que uma fraca neblina começa a se formar.

SAGE

- Os metereologistas dizem que a Primavera Vermelha vai durar o mês todo. Sabemos quando ele mata.  É provável que haja névoa durante a noite pelos próximos quatro dias. Se não agirmos logo, uma garota vai morrer naquela universidade, e a coitada não vai nem saber o porquê.

Helena olha para aquele homem de sobretudo preto, e cabelos grisalhos. Desta vez não há ironia no olhar. Não há zombaria na voz. Tudo que ela vê é determinação. Pela primeira vez desde a manhã em que o conheceu após ver o cadáver de Tina Becker, ela entende por que Frank Sage é chamado de Caçador De Assassinos. Se havia alguém que podia ajudá-la a impedir que outras tivessem o mesmo destino de Adelie, era ele.

HELENA

- Muito bem, Sr. Sage. Vamos trabalhar juntos.


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Notas finais do capítulo

Capitulo sem mortes ou ação, mais dedicado ao desenvolvimento de alguns personagens. Mas as coisas já devem esquentar no proximo capitulo. Espero que tenham gostado!
Em breve,o Capitulo três.