Carnage Coffee escrita por Ana Bela


Capítulo 3
Segunda Impressão




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Ken saiu do outro lado do balcão e ficou de frente para Hyde. Depois de um bom tempo com muita dificuldade conseguiu o colocar nas costas, não sentiu muito incomodo afinal o cliente era muito leve. Antes de sair do café apagou as luzes e trancou a porta.

Apenas atravessou a rua e andou um pouco mais para frente chegando ao prédio onde morava, o mais simples dali, mas com aspecto aconchegante, pelo menos para ele que queria no momento estar em Tóquio.

Foi difícil pegar elevador com Hyde nas costas, mas conseguiu sentindo o forte cheiro de bebida que ele exalava, chegava até a ser enjoativo. Sentia frio nas costas afinal Hyde estava molhado e acabou molhando sua camisa nas costas. Estava tendo muito trabalho, sabia disso, mas achou até interessante estar com o cliente.

Saiu do elevador sabendo que não teria ninguém ali naquele horário, quase quatro da manhã, todos dormiam, ou pelo menos estavam dentro de seu respectivo apartamento, então ninguém o acharia estranho com um homem nas costas, ainda mais sendo cliente. Levou um bom tempo para encontrar as chaves, abriu a porta e acendeu a luz da sala logo em seguida trancando a porta

Depositou Hyde no seu sofá e pensou o que faria agora com ele. Já tinha o levado para seu apartamento, então agora teria que cuidar direito dele. Viu-o tremer devido ao frio e a bebida gelada em suas roupas. Para começar, decidiu dar um bom banho nele e colocar suas roupas para lavar mais tarde.

Foi muita dificuldade para Ken conseguir tirar suas roupas, dar banho em Hyde e o enxugar, afinal o outro ainda permanecia dormindo parecendo uma rocha e era difícil se apoiar e o apoiar ao mesmo tempo. Mas conseguiu, claro que demorou muito tempo no banho, mas conseguiu afinal das contas.

Emprestou a Hyde roupa íntima e uma camisa sua branca de botões que no menor ficou extremamente grande, Quando vestiu em Hyde até soltou uma leve risada daquilo. Por mais que ele estivesse adormecido, gostava da presença dele ali, lhe fazia muito bem, não sabia explicar o motivo, mas se sentia bem, o fazia sentir uma estranha felicidade.

Arrumou sua cama e logo em seguida deitou Hyde, foi escovar seus dentes ainda com um pouco de preocupação com o outro, depois apagou a luz e deitou ao seu lado cobrindo ambos com um grosso cobertor. Num movimento involuntário o abraçou, não com muita força, mas simplesmente o abraçou, sentindo o cheiro de seu cabelo negro misturado com o próprio perfume natural. Aquilo fez com que Ken se sentisse ainda melhor e adormecesse em poucos minutos.

Entretanto, bastaram duas horas de sono tranquilo para que o dono do café acordasse ainda abraçado ao seu cliente. Quando se deu conta do que havia feito rapidamente levantou da cama, não deveria ter o abraçado, quando Hyde acordasse poderia pensar muito mal dele.

Andou um pouco sonolento pelo quarto e pegou atrás do guarda-roupa de madeira um colchão de solteiro e jogou ao lado da cama, logo depois pegou alguns cobertores, mas antes de voltar a descansar, foi colocar as próprias roupas sujas e as de Hyde na máquina de lavar, quando terminou voltou a dormir, só que desta vez sozinho e no chão. Sabia que era melhor assim, não queria que o outro ficasse com raiva de si.

***

Abriu os olhos lentamente já vendo um ventilador de teto, viu que ali realmente não era sua casa. Sentou-se na cama sentindo uma forte dor de cabeça lhe tomar conta. Praguejou aos céus por aquilo.

Mas estava estranhando aquele local totalmente desconhecido, olhou para um lado deu de cara com uma cômoda de madeira, um tapete cinza e pequeno estendido no chão e depois uma parede branca que tinha uma enorme janela com cortinas amarelas impedindo boa parte dos raios solares entrarem.

Quando olhou para o outro lado, levou um susto, viu o dono do café que frequentava sem camisa e dormindo num colchão ao lado da cama onde estava. Não entendia o que estava havendo ali, mas resolveu deitar novamente e esperar o outro acordar, provavelmente ele teria uma resposta correta do que aconteceu consigo.

Não demorou muito tempo para Ken acordar, mas foi tempo o suficiente para Hyde contorcer todo o corpo devido aquela dor de cabeça insuportável que latejava com força. Quando viu Ken abrindo os olhos sentou-se rapidamente na cama e ficou o observando, logo o que estava deitado no chão viu que seu cliente estava acordado.

-Como você tá? – Ken perguntou prontamente se sentando e espreguiçando demoradamente.

- Dor de cabeça... – Hyde colocou as duas mãos na cabeça com força, como se de alguma forma a dor pudesse diminuir.

-Vou pegar café para você.

No mesmo instante Ken se levantou já indo em direção a porta ainda um pouco sonolento. Hyde o seguiu com os olhos castanhos e depois ficou observando o quarto enquanto sentia aquela maldita dor.

O cômodo era muito simples e pequeno, uma cama de solteiro, em frente uma escrivaninha muito bagunçada e cheia de papeis e outras coisas. O guarda-roupa estava semi-aberto, mostrando que tinha um amontoado de coisas dentro. E em ambos os lados da cama havia criados mudos, em um deles havia um relógio antigo e mais papeis, assim como o criado mudo do outro lado. E as paredes eram todas brancas, e pelo que Hyde viu o lado de fora do quarto as paredes também eram brancas.

Ken fez um café rapidamente e voltou para o quarto, percebeu que o outro estava bem confuso com aquilo tudo. Hyde se olhava confuso com aquelas roupas que nem eram suas e eram muito grandes, se sentia estranho em roupas de outras pessoas, era a primeira vez que vestia algo que não era seu, viu logo o mais alto entrar com um xícara com desenhos abstratos coloridos em mãos.

-Por que estou com essas roupas? – Perguntou parando de se olhar encarando o outro.

-Você bebeu muito de madrugada e acabou molhando suas roupas. Eu te trouxe para cá e tomei a liberdade de te dar banho e te trocar. – Respondeu chegando próximo e oferecendo a xícara.

-Ah sim... Obrigado. – Sentiu seu rosto ficar um pouco quente, estava corado.

- O que aconteceu? – Olhava Hyde e o estado que se encontrava ali.

-Ah sim... –Parou para se lembrar, logo se lembrando de todo os últimos acontecimentos, pegou a xícara e olhou para o líquido negro tristemente. – Meu irmão morreu...

-Ah... Sinto muito mesmo. – Ken não sabia o que dizer com uma situação delicada como aquela. -... Ele estava doente?

Hyde ficou um momento em silencioso. Se de todos os males fosse acontecer uma tragédia como aquela, pelo menos que fosse realmente com doença, a dor seria a mesma, entretanto soaria menos pesado.

- Não, ele foi assassinado... Arrancaram seus olhos e alguns órgãos do corpo... – Respondeu tomando um gole de café se sentindo mal. – E eu tive que reconhecer o corpo...

Ken ficou realmente espantado. Não sabia que a dor do outro era devido aquilo. O observava colocar o café de lado e ficar com um olhar completamente distante e triste.

-Nossa... Agora sei por que estava tão transtornado.

Ken ficou com dó do cliente e simplesmente o abraçou com força Sabia muito bem como era se sentir daquela forma, a dor de perder alguém especial de uma forma tão macabra.

- Obrigado... – Hyde correspondeu o abraço do outro muito sem graça, não esperava uma atitude assim dele e tomou coragem para continuar. – Ontem enquanto eu bebia foi uma forma de eu esquecer aquelas memórias horríveis...

- Com certeza foi horrível... Mas você tem mais parente?

-Tenho só meus pais, mas mesmo eles morando mais próximo de onde aconteceu, eles não puderam ir, então eu fui...

- Tente ficar ao lado deles, será melhor para eles e para você também. – Ken dizia lembrando se si próprio, como há seis meses queria sua família perto de si.

-Não, é melhor deixar do jeito que está. Já se passaram mais de vinte dias... E eu mesmo estou a procura de quem fez, eu já contatei tudo que precisava.

-Deve ter sido aquela quadrilha que rouba órgãos...

- Não, eu tenho certeza que não é, pois quando são eles, eles deixam a assinatura no corpo e não havia nada assim...

-Sinto muito... Posso te perguntar uma coisa?

-Claro... – Hyde estranhou um pouco enquanto se soltava dos braços do outro.

-Qual é o seu nome? – Ken perguntou algo que queria saber a muito tempo, antes nunca conseguiu espaço para fazer tal pergunta.

-Hideto Takarai... – Respondeu lembrando-se que nunca havia dito seu nome a ele.

-O meu é Ken Kitamura. –Sorriu de leve e feliz por saber o nome do outro.

-Prazer. – E pela primeira vez o outro viu Hyde abrir um sorriso sincero. – Mas me chame de Hyde, é assim que todos me chamam.

- Ok... Hyde. – Repetiu para não se esquecer, como se fosse possível e alargou mais ainda o sorriso.

-Sim... E desculpe pelo incômodo que te causei.

-Não foi incômodo, você não estava bem de madrugada.

- Obrigado... Bem vou pegar minhas roupas... – Se levantou da cama, mas foi impedido pelo outro.

-Sinto em dizer, Hyde, mas elas ainda não secaram, eu tive que as colocar para lavar.

-Ah, entendo... Nossa quanto alvoroço estou te causando. – Disse voltando a sentar na cama e muito, mais muito, envergonhado.

 -Que nada, eu teria que lavar as minhas mesmo, então lavei as suas junto.

- Realmente, muito obrigado... Mas você mora sozinho?

- Sim, eu morava com meu pai, mas ele faleceu uns seis meses atrás...

-Sinto muito... Doença? – Perguntou curioso.

Agora foi a vez de Ken balançar a cabeça negativamente com algumas lágrimas já nos olhos, teria chegado ao ponto mais doloroso deste.

-Suicídio... – Respondeu com certo peso na voz.

-Ah! Desculpe! Eu não deveria ter perguntando, desculpe mesmo...

- Tudo bem. – Respirou fundo e abriu um sorriso para não chorar novamente. – Ele achou que seria melhor assim... Mas foi um choque quando eu estava chegando em casa e vi o corpo dele pendurado na sacada...

 - Entendo... Ele tinha algum problema psicológico para ter feito isso?

-Não... Nós tínhamos muitos problemas financeiros, muitos mesmo, e meu pai tinha um seguro de vida... – Respirava fundo falando as palavras devagar para não cair em lágrimas. – Eu me lembro que no dia que tudo aconteceu... Pela manhã eu estava muito transtornado porque talvez eu teria que vender o café e o apartamento para quitar as dívidas e se realmente nós fizéssemos isso teríamos que voltar para o Japão, mas não teria como porque minha irmã não teria condições de bancar a viagem para mim e meu pai... Só sei que aquele dia ele disse que daria um jeito... Que tudo iria se resolver e nós ficaríamos bem...

-Para pagar as dívidas... Bem, eu nem sei o que dizer numa situação assim...

Hyde realmente estava impressionado com a história de Ken, jamais pensaria que ele passou por um momento tão doloroso como aquele, e sentia que ele sabia muito bem como por dentro estava se sentindo com a morte de seu irmão.

-É... Ele deixou uma carta explicando tudo e me disse para eu voltar logo para o Japão... Londres foi só ilusão para nossas vidas...

-Eu entendo... E então depois disso o que você decidiu?

-O que eu mais quero agora é voltar para lá, aqui estou sozinho... Só que também o dinheiro que recebi não deu para pagar todas as dívidas, pelo contrário ainda têm várias, e eu somente recebi o dinheiro porque mostrei a carta para o pessoal da seguradora e eles sentiram pena de mim, porque quando a própria pessoa tira a vida a família não tem direito de receber...

- Eu entendi a sua situação e esse é o correto a se fazer... Agora que você disse isso eu me lembro que alguns meses atrás o café estava fechado e ficou por um tempinho.

Hyde se lembrou no dia em que foi ao café desesperado de madrugada e lá estava fechado. No dia seguinte durante o almoço idem, e quando finalmente voltou o dono do café parecia incomodado com algo, agora entendia o motivo. Sentia-se culpado de ter praguejado tanto aquela vez por isso, xingava sem saber o real motivo.

-Sim... –Soltou um longo suspiro. - Eu não tinha forças para seguir em frente, pensei até em fazer o mesmo que ele fez, mas vi que vale a pena jogar a vida fora desta maneira. Eu sei que quando eu for para o Japão minha vida vai mudar completamente, mas para que isso eu preciso pagar todas as dívidas e vender o café.

-Ah sim, é muito difícil né... Bem complicado e mesmo assim você está sempre sorrindo, nunca lhe vi sem um sorriso no rosto.

-Chorar jamais vai fazer com que eu tenha dinheiro para voltar para o Japão ou conseguir um comprador para o café. Pelo menos um sorriso ameniza um pouco a dor. – Disse sorrindo e encarando outro que ouvia sua história prestando muita atenção.

-É... – Hyde parou um momento para refletir. – Se pensar deste modo você tem razão.

-Eu tenho que pensar deste modo para conseguir  sair deste inferno que Londres se tornou para mim...

-Deve ser realmente difícil viver aqui com acontecimentos assim...

-E é...

Hyde se sentia estranho numa situação assim, nunca havia passado por tanta dificuldade quanto o outro ao seu lado, jamais imaginou que uma pessoa poderia ter problemas assim. Sempre viveu muito bem e nunca houve que passar dor de cabeça Tentava entender ao máximo outro, pois o modo de como ele vivia em Londres era injusto.

Por um longo tempo ficou um silêncio naquele quarto, cada qual no seu pensamento, quando Ken resolveu cortar aquele aspecto estranho que se formou entre os dois. Juntou coragem para continuar contando, sabia que o outro ali nem deveria entender o seu ponto de vista, já que deveria ter uma boa vida.

-... Se aqui fosse menos violento, eu com certeza já teria voltado... Já perdi as contas de quantas vezes assaltaram o café...

- isso é verdade... Mas confiança que logo você volta para lá. – Não sabia por que havia dito aquilo, foi algo que saiu naturalmente de sua boca.

- Eu tenho fé nisso. – Abriu um sorriso percebendo a sinceridade do outro.

- Eu estou bem aqui, e não pretendo sair enquanto não encontrar o desgraçado que fez aquilo com meu irmão.

-Sim, você tem razões, muitas razões, para continuar aqui.

- Eu nem sei do que sou capaz de fazer quando eu encontrar o maldito. – Abriu um sorriso triste, lembrando-se do viu no necrotério.

- Deve ser muito revoltante isso né... Mas não suje suas mãos com tão pouco.

- É muito difícil tentar não fazer nada... – Frisou a palavra “muito”. – Meu irmão sempre foi uma pessoa decente, e do nada morre...

- Não deve ser fácil...

- E não é mesmo... E sem motivos, nem assaltado foi... Bem agora um tio meu vai morar com meus pais já que eles estão bem transtornados.

- Todos vocês devem se sentir ameaçados.

- Sim, meus pais nem querem mais sair de casa... E tem sido difícil trabalhar com isso.

Hyde não fazia a mínima ideia do motivo pelo qual dizia tantas coisas Ken, mas com ele se sentia seguro para desabafar como se sentia ao decorrer dos dias após a morte de seu irmão. Era a primeira pessoa que dizia todos os seus pensamentos sobre o ocorrido de como se sentia diante daquilo.

Nem aos pais havia contado, estava sempre quieto os ouvindo, mas e quanto a si? Foi acumulando tudo em seu coração e sentia que precisava desabafar, e já que pelo acaso o outro lhe ajudou, saber um pouco de sua vida não seria tão ruim assim.

- Por que não tira umas férias e fica junto com eles? Eles devem estar muito preocupados com você agora. – Sugeriu sentindo-se um pouco intrometido, mas já naquela altura do campeonato não era tanto.

- Eu não posso, aqui tenho todas as notícias da investigação.

- Sim, de certa forma, você trabalha num jornal.

- Não vou deixar nada passar, nem um mínimo detalhe, estou todos os dias procurando saber de tudo.

- Tomara que você consiga achar quem fez isso.

- Tomara não, eu vou encontrar, tenho certeza. – Seu tom de voz soou tão confiante que nem parecia o mesmo.

-- Que bom que está confiante assim.

- Eu não morro enquanto não encontrar quem fez isso... Outro dia fui até ao café me encontrar com a mulher que está liderando as investigações, está tudo a todo vapor. – Mentiu, sabia que estava tudo aos poucos tomando pó, mas queria acreditar que logo encontraria o assassino.

- Ah... Eu vi... – Deixou soltar um sorriso bobo, sentindo um alivio dentro de si. – Pensei que fosse sua namorada.

- Não não. – Hyde depois de tanto tempo acabou soltando uma risada gostosa. - Não tenho tempo para coisas assim, muito mais agora.

 -Perdoe-me a indiscrição. – Sorriu, sentindo uma estranha felicidade por dentro.

- Sem problemas, é comum pensar isso.

- Enfim... Você deve estar faminto, vamos tomar café. – Disse já praticamente saindo do cômodo.

Hyde o seguiu para fora do quarto e começou a notar a casa. Do quarto seguia para um estreito corredor com duas portas e mais a frente à sala, em que o maior pediu para o outro esperar ali, já que a cozinha mal cabia os móveis e uma pessoa. Hyde se sentou no sofá branco e passou a observar o local ainda sentindo aquela dor de cabeça incômoda.

A sala era um verdadeiro cubículo, Hyde até se sentiu um pouco desconfortável ali, era muito diferente do seu apartamento que era muito amplo. E também o apartamento de Ken era muito simples, sem nada exagerado, com poucos móveis. Seu olho acabou correndo para sacada que estava com a porta balcão fechada e a cortina cobrindo boa parte e sentiu um estranho vazio por dentro, havia realmente sentido dó.

Passaram-se alguns minutos e Hyde passou a olhar para as próprias mãos, ainda se sentindo muito desconfortável ali e muito mais por usar roupas que nem eram suas. Não gostava daquilo, mas pelo próprio erro de encher a cara que foi parar ali. Mas até que não era tão torturante como pensava, ao menos Ken não era uma pessoa tão chata assim, só aparentava por querer saber da sua vida, mas depois de conhecê-lo mais a fundo percebeu que ele não era uma pessoa ruim, tanto que o ajudou. Devia muito a ele.

Hyde inspirou fundo sentindo o cheiro de cigarro que a camisa que usava exalava. Sentia-se entediado no momento, mas preferia assim queria pensar em nada para não chegar a lembranças ruins. Depois viu Ken saindo daquele pequeno cômodo trazendo uma bandeja grande em mãos. Sorriu para si mesmo, sentia seu estômago roncar.

- Pronto... – Ken chegou perto de Hyde colocando em uma mesinha próxima ao sofá depois se sentando ao lado do menor.

Hyde observou bem a bandeja. Havia um prato com algumas coisas que pareciam ser panquecas, não estavam perfeitas, mas ao menos parecia ser comestível. Ao lado havia um pequeno pote com mel e uma colher mergulhada dentro.  E dois pratos de louça brancos e sobre eles dois copos de vidro medianos. E para finalizar havia um jarro de vidro com leite. O cheiro da comida era bom, mesmo que Hyde estivesse com um pouco de nojo.

- Parece bom... – Sorriu um pouco sem graça.

- Meu pai amava... – Sorriu deixando os copos e de lado e colocando algumas panquecas em um dos pratos.

-Entendo... – Sorriu também ainda olhando para bandeja.

- Come. – Ken sorriu colocando um pouco de mel em um dos pratos e oferecendo para o outro.

- Claro... – Hyde pegou o prato e após dar uma mordida em uma, largou o nojo de lado gostando muito do gosto. – É bom mesmo...

- Que bom que gostou. – Disse repetindo o mesmo que fez para o outro e logo após comendo.

Assim o silêncio novamente reinou entre os dois, cada um com seu próprio pensamento apreciando o café da manhã. Hyde se alimentava com vontade, estava antes com muita fome, parecia que aquele café da manhã havia o salvado. Ken comia normalmente, mas por dentro estava se sentindo muito feliz de ter a companhia do outro ali, nunca imaginou que um dia ele estaria ali ao seu lado, com suas roupas e tomando o café da manhã que preparou.

- Ahn... Como me trouxe para cá de madrugada? – Hyde cortou o silêncio realmente curioso.

- Oras como? Eu te carreguei. – Ken respondeu indiferente.

- Ah sim... – O baixinho corou novamente, sentia-se desconfortável com situações assim mesmo com os anos de vida na cara.

- Não fica assim...

- Eu estou te incomodando tanto...

- Que nada Hyde... Eu sou sozinho, está sendo legal ter você aqui.

-Sério? – Perguntou um pouco incrédulo, sabia que sua presença era chata.

- Sim sim... Na verdade sempre quis conversar com você... Ser seu amigo, mas você parece ser sempre tão... Nervoso. – Admitiu um pouco sem graça, esperava não ter ofendido.

- É o meu jeito... Não sou bom de me relacionar com as pessoas. – Sabia que era por própria culpa por se distancias das pessoas quando elas se aproximavam.

- Eu não acho isso... Agora conversando direito com você vi que não é tão nervoso quanto parece ser.

- É... Eu achei que você não tivesse problemas, está sempre tão alegre... As aparências enganam.

- Oras Hyde, todo mundo tem problemas. – Sorriu e depois rindo do último comentário feito pelo outro.

- É... Você é o único que estou conversando assim abertamente.

- Me sinto feliz por isso, eu também não tenho como conversar abertamente com ninguém, meus clientes agora são minha família e na maioria das vezes são eles que falam mais da vida deles.

- Eu entendo... Esse é o ruim de morar sozinho. – Hyde disse só se dando conta depois do que havia dito, tinha contado um segredo que sempre guardava consigo, se sentia muito solitário.

- Se eu ainda tivesse parente aqui seria bem melhor... – Soltou um longo suspiro. – Meu pai tirou vida à toa...

- Pois é... Eu queria morar de novo com meus pais, mas é aqui que me estabilizei... Entretanto onde eu trabalho não consigo conversar com as pessoas que tem lá.

- Por quê? Seus colegas de trabalho são chatos?

- Na verdade... Eu sou um pouco frio, sabe? É uma defesa própria minha que adquiri com os anos, quando percebo já falei...

- Ah entendi.

- E no fim as pessoas pensam muito mal de mim fico com a aparência de pessoa nervosa. – Sorriu sem graça se lembrando dos dias de trabalho.

- É verdade... Eu sem conversar com você pensei isso. – Abriu um sorriso enquanto tomava o último gole de leite que tinha em seu copo.

- Pois é... E bem me desculpe por aquela vez que disse sobre fumar com os clientes junto... Bem, eu também fumo. – Sentia-se com grandes orelhas de burro houvessem brotado de sua cabeça no instante.

 - E você ainda disse também que não era da minha conta se você fumava ou não. – Completou.

- Sim... – Abriu um grande sorriso envergonhado olhando para o prato em mãos. – Aquele dia eu estava estourado por causa do trabalho e pela minha insônia.

Ken não respondeu nada, apensas se abriu um sorriso, levantou do sofá e seguiu para cozinha, deixando um Hyde confuso e silencioso. Pensou que havia dito coisa errada, já estava se culpando quando o outro voltou do cômodo com um pote de vidro médio em mãos com algum tipo de erva rosada dentro.

- Tome isso, é valeriana, meu pai sofria muito disso e sempre quando tomava um chá desta erva sempre dormia. – Explicou entregando ao menor. – Já eu, graças a Deus, não tenho esse problema.

- Nossa, muito obrigado. – Pegou o pote olhando para o mesmo e se sentindo sem graça numa situação assim, se sentia um incômodo ali.

- Espero que resolva.

- Eu também. Desde morte do irmão não tenho dormido, e quando cochilo tenho pesadelos... Só consegui dormir mesmo ontem depois de ter bebido muito.

- Tome isso antes de uma hora que geralmente você costuma ir dormir, quando estiver perto de chegar a hora, você já estará cochilando.

- Entendi, espero que realmente funcione. – Tirou os olhos do que tinha em mãos e encarou o outro.

- Vai funcionar. – Ken se sentou no sofá, logo em seguida tateou uma das mãos até um dos bolsos da calça, logo em seguida tirando um maço de cigarros um pouco amassado. – Aceita?

- Claro. – Abriu um sorriso, fazia tempo que não fumava.

- Pode pegar. – Estendeu o maço próximo dele esperando que o outro pegasse um.

- Valeu. Tem isqueiro, fósforo, algo assim? – Após colocar o cigarro na boca procurava os olhos meio daquela sala bagunçada algo do gênero.

Ken tirou do mesmo bolso na parte de trás da calça um isqueiro e o acendeu logo colocando perto do cigarro do outro o acendendo, deixando Hyde um pouco sem graça.

-Obrigado... Então... Hoje eu estou um pouco aéreo, que dia da semana é hoje?

- Hoje é domingo. – Falou enquanto acendia o próprio cigarro.

- Ah é... Lembro até que ontem tive que trabalhar..

- Nossa não sabia que no jornal se fazia hora extra de sábado.

- É, eu fiz em casa na verdade, mas mesmo assim deu tudo errado. – Soltou um longo suspiro. – Não estava dando atenção para aqueles papeis, aquelas informações. E quando alguém me ligava para falar do que eu estava fazendo em relação ao trabalho me dava mais dor de cabeça... No final do dia já estava quebrado e o trabalho totalmente errado, só pensava na morte de meu irmão.

- Tem dias que é bom nem termos acordado né...

- Preferível... E ainda mais em pleno sábado... – Mudou de assunto por uma curiosidade que lhe veio em mente. – Você não abre o café hoje?

- Não. – Abriu um grande sorriso, estava mentindo, deveria já ter até aberto o café, mas não abriu por Hyde, queria ficar com ele ali.

- Ah, entendo... – Sentiu um alívio, não queria ser um incômodo dele ali. – E o jornal quer me mandar para Suécia...

- Suécia? – O maior repetiu, espantado com a declaração do outro, não queria que ele saísse de Londres, não sabia o motivo, mas não queria.


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Notas finais do capítulo

Ok, agora vão comer minha alma por reviews.
E agora?



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