POV RAONI (ON)

Todos estavam paralisados depois da dramática saída de Naara, literalmente. Nós paramos no meio dos nossos movimentos e começamos a encarar o caminho que uma autoritária super brava acabou de passar e depois nossos olhares foram se cruzando lentamente.

Por mim continuaria a briga, mas parece que o completamente dominado por Naara do Luka, a nova amiguinha e o idiota que lambe o chão que Naara pisa, resolveram desistir e levantar a bandeira branca.

-Qual é! Vamos! Se matem! – Incentivei com raiva de mais para parar, porém todos já estavam saindo da posição de ataque.

Chutei Brian, porém ele continuou de costas pra mim. Ele parecia nem ligar para os meus insultos e Luka já estava se preparando para se transformar em humano novamente. Pus-me na frente de Brian e impedi sua passagem.

-Eu não posso dar as costas para a vontade dela, eu simplesmente não posso. – Brian me explicou sério. – Mas posso dar a você. – E continuou andando como se não notasse mais a minha presença.

-Desde quando ela virou nossa líder?! –Perguntei ruminando de ódio, não por Naara a quem eu amo mais que tudo, mas por não poder extravasar a minha raiva que eu mantenho guardada a um bom tempo.

-Desde sempre. – Perséfone respondeu, a única humana entre nós.

- E por falar nela, vocês viram pra onde ela foi? – Luka apareceu já transformado em humano. Ele parecia bastante preocupado com Naara, o que nem parecia que a gente estava se matando há cinco minutos.

-Acho que ela foi para lá. – Perséfone apontou para o lado oeste da floresta. – Mas não tenho certeza.

Luka olhou pra lá como se estivesse tentando descobrir exatamente onde ela estava, mas suspirou exasperado, com certeza, não tendo a mínima ideia de onde Naara poderia estar. Percebi que ele estava muito aflito por causa do ataque dela. Como marido dela ele já devia ter acostumado com isso...

 Eu dei as costas para eles e me transformei, indo para casa. Eu já estava cansado mentalmente e fisicamente daquela maluquice toda. Olhei no relógio e marcava quase meia noite. Eu estava louco para ir naquela floresta e ir buscar Naara a pulso, mas eu sabia o quanto ela estava fula da vida e que exaurido desse jeito eu não conseguiria nem arrasta-la por um centímetro contra sua vontade, como eu pretendia. 

Quando eu já abria minha porta, uma bola de cabelos pretos curtos se jogou em cima de mim desesperada. Eu sabia que era Izabel, mas eu não estava com cabeça nem saco pra ela hoje ou qualquer dia.

-Raoni, você tem que procurar por Naara! – Ela chorava, me abraçava e gritava ao mesmo tempo.

Sério, de todas as pessoas do mundo, a única que eu jamais pensaria nem como ultima hipótese que me pediria para sair atrás de Naara era Izabel. Mas o desespero dela era tão visível que eu até me assustei com tamanha sinceridade vindo dela. Qualquer pessoa normal que acredita em milagres ficaria pasmo diante de tal situação. Daqui a pouco só faltava acontecer um furação ou algo do tipo aqui em Dark Sky.

-Eu preciso que vá busca-la! – Ela me comunicou com uma mistura de desespero e raiva que eu até me sobressaltei. Notei que ela até tremia - Ela não pode sair da minha vista!

-Por quê? – Perguntei desconfiado.

-Eu... Dei... Meu... Poder... A...ELA! – Ela tremia tanto que parecia que estava convulsionando. Ah, ela deu o poder dela para a Naara. Isso explicava o porquê de ela estar tão estranhamente preocupada. Peraí, ela deu o quê a Naara?!

-O quê?! – Eu não percebi que havia gritado, somente quando os outros três olharam para nós com as sobrancelhas arqueadas e vindo em minha direção.

-Essa demente deu o poder dela para Naara. –Eu disse pesaroso, eu já sabia o quê daria no final e eu tinha absoluta certeza que coisa boa não era.

-Você é lerda, garota?! –Perséfone já estava ao nosso lado e olhava Izabel, provavelmente a achando uma doida, assim como eu.

-Por que... Não pode? – Perguntou infantil.

Perséfone me lançou um olhar mortal e me atropelou entrando na casa, arrastando Izabel consigo.  Eu entrei seguido com Luka e Brian, já humano. Perséfone jogou Izabel com violência no sofá.

-Você não sabe as consequências do que você acabou de fazer, sua... Irresponsável?! – Perguntou a ruminando com o olhar. – E se Deus me livre, acontece algo com Naara?

-Eu não pensei nisso... – Admitiu de cabeça baixa, constrangida - Ela precisava dele, então eu dei...Vocês estavam se matando!

-Agora quem tá morrendo é você, sua burra! – Luka sentenciou e vi Izabel empalidecer ainda mais.

-C-Como assim? – Perguntou já apavorada.

Eu estava apenas no canto com os braços cruzados pensando se algo acontecer com ela, será bem feito. Eu já estava cansado das besteiras dela, como ela pôde fazer uma idiotice dessas?

-Oh,  santa inteligência! – Perséfone exasperou olhando para cima impaciente. – Você jamais pensou que você nasceu apenas para proteger seu elemento dentro de si e sem ele você não tem nada a mais o que fazer aqui? – Perguntou, eu acho que ela já estava prestes a arrancar a cabeça de Izabel com as unhas.

-E a pergunta de um milhão de dólares é: - Comecei a falar, para alivio de Izabel. –Pra que porra você deu seu poder a ela? – Perguntei ríspido o suficiente para fazê-la se encolher no sofá.

-R-Raoni, eu já disse! – Começou a chorar compulsivamente – Achei que isso ajudaria!

Todos nós rimos sarcásticos, inclusive Brian. Se eu pudesse, eu tiraria aquele sorriso imbecil da cara dele num estalar de dedos. Porém foi a vez de Luka prosseguir falando:

-Você nunca pensou que Naara é mais poderosa que nós quatro, multiplicado por mil? –Perguntou retórico.  – Se ela quisesse, ela poderia parar o tempo somente para fazer a gente parar de brigar, sua burra!

-Nossa, eu não sabia! – Ela falou honesta.

 Depois, nós sequer lembramos que Izabel estava ali, mas não nos esquecendo do problema dela, claro. Estávamos fazendo uma estratégia para achar Naara, antes que fosse tarde demais para a cabeça de vento.

Há, gostei desse apelido!

Perséfone estava com o celular no ouvido, porém quando Izabel se lembrou de que Naara havia quebrado o dela, veio até nós também preocupada com ela. Tanto eu como ela, sabíamos que pelos antecedentes de Naara, ela não voltaria tão cedo.

-Daqui a pouco ela está aqui e eu posso pegar meu elemento e volta. –Izabel tentava se convencer, ela estava beirando a psicose.

-Luka, você não pode fazer algo para descobrir onde ela está? – Percebi o olhar duro que ela lhe lançava e notei que era a primeira vez que ela falava com ele tão diretamente desde que ele chegou.

-Se eu pudesse já teria feito, Perséfone. – Suspirou derrotado. – Eu só consegui descobrir para que sentido ela seguiu, mais nada.  

Brian que estava no canto da sala perto da Izabel histérica,  andou hesitante até nós. Ele sabia que não estando transformado, levaria uma surra nem que se seja minha. Porém Luka já devia ter esquecido o beijo que o vira-lata deu em sua esposa, pois fez um aceno para ele chegar mais perto.

-A minha ideia é, vocês não tem animais elementares tatuados em seus corpos? – Nós três assentimos, Izabel gritou um “não” desesperado. –Junto a mim, eles podem nos ajudar a procurar Naara pela floresta. Vai ser muito mais fácil e rápido.

Luka já estava na porta quando Brian terminou. Perséfone teve que arrastar Izabel que parecia petrificada no sofá. Enquanto eu e o cachorro sarnento tentávamos mapear rapidamente toda a floresta.

Depois de alguns minutos, Luka achou onde Naara entrou na floresta. Perséfone, ele e eu sentamos no chão em posição de lótus, tentando nos concentrar no nosso elemento. Cada um murmurando um pedido para seu animal interior.

O primeiro a aparecer foi o leão da montanha, o meu animal, é claro. Com um rugido ele se embrenhou na floresta com a promessa de só sair depois de encontra-la. Depois Luka materializou o seu animal que – assim como o de Naara - era uma bela fênix que logo saiu voando graciosamente em direção a floresta. E em ultimo lugar, o animal de Perséfone que era um boto cor de cosa seguiu os outros dois animais em direção à floresta, só que em vez de ir por terra ou ar, pulou no lago emitindo um brilho intenso e que quase nos deixou um pouco sem visão por alguns segundos.

Nós três suspiramos, meio que ao mesmo tempo, muito nervosos. Com muita facilidade eu conseguia ver no rosto dos dois o medo e a apreensão. Não só pela Naara estar desaparecida, mas também pelo que estava acontecendo à Izabel.

 Todo mundo já deve ter percebido que ela não é uma garota pra lá das mais adoráveis, mas se ela tentasse ser um pouco menos irritante poderia até ser que a nossa convivência com ela melhorasse e muito. E, mesmo que ela não mude logo, quem sou eu para desejar que algo de ruim aconteça com ela?

Aquele silencio entre nós deveria incomodar, porém não foi o que aconteceu. Olhávamo-nos entre si, e era como se estivéssemos pensando a mesma coisa meio que ao mesmo tempo. Foi Luka quem interrompeu o momento de silêncio assim que o primeiro animal retornou , já que havia sido a fênix que sussurrou algo no ouvido dele e voltou para sua forma original de tatuagem. Quase que ao mesmo tempo o boto de Perséfone  e o meu leão apareceram e nos trouxeram o recado que só fez com que nos deixasse mais apreensivos.

-Londres?! – Luka saiu de lá pisando firme. Ele estava tão aturdido quanto eu e Perséfone estávamos, então pude compreender sua reação. – O que a Naara iria fazer lá?

-Será que não é obvio? – Perséfone retrucou, nos obrigando a raciocinar um pouco mais. – É claro que ela não foi por conta própria. Ou vocês acham que ela iria se esconder em uma floresta logo após uma briga e poof, fugir para Londres? Não tá na cara que ela não foi seqüestrada? Ou vocês acham mesmo que ela teria algo para fazer por lá? Bem, ela poderia fazer compras, mas eu sei que ela me levaria junto, até porque ela precisaria muito de uma opinião para as roupas dela que são nada legais.

-Nisso eu tenho que concordar com você. – eu digo. A essa altura já havíamos chegado rapidamente em minha casa e eu estava abrindo a porta. – Na parte sobre o seqüestro, não sobre as roupas. – acrescentei de ultima hora.

-O que aconteceu? – Brian perguntou assim que nos viu, pois ele teve que ficar com Izabel que se recusava a andar. – Acharam-na?

Nenhum de nós quis responder e creio que nossa expressão ajudava em nada. Ele suplicou novamente, querendo saber de vez a resposta.

-Sim. – Perséfone disse, se aproximando de Izabel que não estava nada bem. - E essa é a parte ruim. Levaram Naara para Londres e precisamos ir para lá imediatamente.

-Ah, você acha? – Izabel questionou, o que em parte nos surpreendeu já que ela mesmo estando quase à beira da morte não conseguia deixar de ser tão irônica e sarcástica. – Ou prefere esperar por mais alguns dias o que seria suficiente para a avó dela notar alguma coisa ou até mesmo o dia da minha morte?

-A avó dela! – Brian exclamou. Eu olhei para Luka e vi que ele estava comprando as passagens usando o telefone da minha casa. Só espero que ele não resolva usar o meu cartão como forma de pagamento. – Temos de avisá-la!

-Eu faço isso. – Perséfone disse, indo em direção à porta. – Vou avisá-la. Luka está comprando nossas passagens para Londres e dá tempo suficiente de eu enrolar ela. Eu só não gosto da idéia de ter que levar a Izabel junto.

-Não, você não pode enrolar ela! – Izabel disse, nervosa. – Conte a verdade.

-Não é uma boa idéia, Izabel. – Perséfone retrucou. – Ela já é velha e uma noticia dessas só pioraria a nossa situação... Eu não quero que uma senhora tendo ataque cardíaco entre na nossa lista de problemas. Confie em mim, pelo menos dessa vez. Eu sei o que faço.

-E quem a levou? – Brian perguntou, assim que Perséfone foi embora.

-Também quero saber. – respondi. – Só sei que seja lá quem for terá de pagar caro por isso!

- Tudo resolvido. – Luka disse, colocando o aparelho de telefone de volta no gancho. – Sairemos em vinte minutos. Isso foi o mais rápido que consegui. – ele olhou enojado para Izabel que não estava nada bem. – Tem certeza que está bem?

- Estou sim. – respondeu aos sussurros. – Mas já estive melhor.

-Qualquer coisa nós manifestamos os elementos e damos um jeito em você. Não será muito poderoso, mas é melhor do que perdemos a nossa avatar que é literalmente cabeça de vento.

Ele disse aquilo de uma forma não muito gentil, mas Izabel não pode deixar de dar um sorriso discreto. Ajudei a por ela de pé e nós três fomos em direção a porta, onde Perséfone já estava junto do carro que nos levaria para o aeroporto. Quase todo mundo já estava no carro, menos eu. Virei-me para Brian, dando-lhe um ultimo recado:

-Fique aqui e mantenha a atenção para qualquer coisa que venha a acontecer. É só ligar.

E com esse comentário entrei no carro e Luka dirigiu com toda velocidade possível até ao aeroporto de Dark Sky.

-Se eu estivesse com o meu poder, era só nos levar voando. – Izabel nos disse baixinho, quando já estava sentada em sua poltrona do avião.

-É,só que você não está. – eu digo com rispidez, me sentando ao lado dela, que se encolheu ainda mais. – Desculpe nossa falta de gentileza, é que a urgência do momento não nos deixa ser legais, mas isso não significa que deixamos de ser assim.

Pela segunda vez da noite, ela sorriu meio sem jeito.

-Humpft. – Perséfone bufou. – Aproveita que isso é só porque você não está bem. Deixa só a Naara aparecer e seu dom estiver de volta, você voltará a ser a pirralha irritante e mimada do grupo.

-Será que dá para se concentrar no meu plano? – Luka disse, sentado  ao lado de Perséfone nas poltronas que ficavam logo a nossa direita.  – É a vida da Naara que está em jogo. Já descobrimos onde ela está, só precisamos dar um jeito de chegar lá e trazê-la de volta.

-É claro que dá. – bufei, bocejando. – Vamos parar de respirar e escutar o plano do poderoso chefão...Vá,conte de uma vez.

Antes de começar a falar, ele me olhou fazendo cara feia, mas eu ignorei. Apenas escutei seu plano e tivemos de manter cautela para os outros passageiros não ouvirem sobre o que nós estávamos debatendo. Provavelmente diriam que nós somos loucos ou algo do tipo. Até que o plano dele era bom. Perséfone e eu argumentamos em algumas situações, enquanto Izabel parecia estar entediada. Em minutos, nosso plano já estava completamente arquitetado. Só faltava a parte fundamental: por ele em prática.

Parece que o ar sentiu nossa urgência e nos fez chegar a Londres pouco antes do previsto. Era no fim de tarde e deveria ser umas duas horas mais cedo em nossa cidade. Já estávamos em frente ao prédio aonde Naara deveria estar. Luka se escondeu perto de uma arvore pronto para materializar a sua fênix e foi quando eu o adverti.

-Não será necessário. Ela está de fato aqui.

Ambos olhamos para Izabel que parecia assustada e nervosa. Percebi tarde demais que ela tentava nos advertir de algum perigo.

-Vocês devem estar procurando pela senhorita Naara Lee. – disse uma voz masculina, que veio de trás de nós. – Sim, ela de fato está aqui. Vocês devem ser os outros avatares. Nós andávamos esperando tanto por vocês.

E antes que algum de nós pudéssemos nos virar para ver de quem seria aquela voz, ele usou um pano com sonífero para adormecer Izabel e em seguida com Perséfone que pareceu desmaiar antes mesmo do pano tocar o seu rosto.

Luka pareceu não se mover com a ameaça de ser desmaiado, mas sim enfrentou o rapaz e com uma voz autoritária, ele comunicou ao homem de ternos pretos que parecia uma muralha:

-Eu sou Luka Shuwartz, xamã completo da 4ª ordem europeia e exijo que me deixe passar. –O homem pareceu surpreso e deu passagem.  – E esse é meu convidado.

O homem muralha me olhou com desprezo dos pés a cabeça e falou algo consigo mesmo, antes de me dar passagem também.

-Viu? – Debochei –Sou C-O-N-V-I-D-A-D-O!