Cien Fleur escrita por Bolt


Capítulo 3
A frustração mor do escritor




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Fleur III
A frustração mor do escritor

Era Cien Fleur. E nela era Luke, que enquanto via as sombras ao seu redor se dissiparem à medida que adentrava o novo território, sentia-se descobrindo um lugar totalmente diferente, como uma criança que acaba de abandonar o confortável e perfeito ventre de sua mãe para encarar a vida. Ou talvez não desta forma, afinal, é elementar que já houvera visto inúmeras praças antes desta. Enfim, confiando ou não em minha descrição da magnitude desta nova aventura, Luke adentrava Cien Fleur. E a observava atentamente. Não, nunca havia sido uma pessoa observadora e agora, sentado a uma das mesas de blocos de mármore brancos e pretos, dispostos tal qual estariam num tabuleiro de xadrez, forçava-se a compreender o meio que o cercava, reparava nas pessoas e ouvia os murmúrios alheios com atenção. Nada do que se falava parecia ter sentido algum para ele, e novamente sentiu-se como um estranho no ninho. Mas aos poucos, passava a compreender o que significava aquele local, aquele tabuleiro de xadrez diante dele e aquele ir e vir de pessoas que lhe pareciam tão próximas umas das outras. E a ele digamos: Luke, esta é Cien Fleur.

Mas em verdade, isto nada significava. Sinto decepcioná-lo, amigo leitor, mas Cien Fleur era apenas uma praça. Era apenas uma praça diminuta numa cidade diminuta e sempre o foi, da mesma forma que humanos sempre foram e serão criaturas frágeis e tão certo quanto o fato de que morrerão como tais, recolhidos a sua própria e não muito significante significância no grande ciclo da vida. Entretanto, por algo que tais observações não ajudaram a concluir, constituía atração a um tão magnífico contingente, e sediava eventos tão inesquecíveis e marcantes a certos personagens desta história, que em vários desses eventos chegava a dar inveja àquele que vos fala, por ele não ser capaz de fazer nada que não fosse observá-la de longe. Somos reis em nosso próprio castelo, somos deuses em nosso próprio mundo, mas por mais que queiramos, dele não podemos fazer parte, por mais que coloquemos a nós mesmos na história como personagens. Eis a frustração mor do escritor.

Estou certo de que meu leitor, como sempre ávido e observador, notou que as mudanças em Luke já estão ocorrendo desde o começo deste capítulo, ou melhor, desde o capítulo anterior. Se não notou, ajuda-lo-ei mostrando-o a linha temporal de Luke até onde se seguiu a narrativa:

* * *

   Período I          C.F.
☼ -------- ( . . . ) --------- | ---3--- →

* * *

Perdoe a pobreza de recursos de que detenho para desenhar uma linha temporal.

Imagine que o numeral cardinal “3”, derivado do sistema de numeração indo-arábica que hoje utilizamos, e que na linha do tempo permanece entre dois hífens, marque um certo evento ocorrido em um capítulo por ele indicado (o capítulo terceiro, nesse caso), e que daqui para a frente os marcaremos todos com os mesmos numerais indo-arábicos, não necessariamente em ordem cronológica, posto que esta história não segue uma narrativa linear, mas sim aquela que acho conveniente para a compreensão de certos fatos. Não te zangues, querido leitor. Se as coisas não fôssem desta forma, estarias descobrindo apenas agora o que é Cien Fleur, ou melhor, poderias ainda estar acompanhando Luke em sua mudança de Francesca para Greenville.

Talvez te pareça confuso, mas ao serem colocados os capítulos na linha temporal, verás que os narro em ordem conveniente.

Era nosso objeto de estudo. E o número “3” em sua linha do tempo marcou sua primeira mudança. Em seus olhos, evidencia-se um novo brilho, como se um interesse completamente novo brotasse no garoto. O primeiro ponto a ser levantado é as observações constantes do novo meio, que estranhamente o fascinava. Deixava aos poucos a casmurrice¹  de outrora, tentando incluir-se nos estranhos e densos grupos que se formavam na diminuta praça da diminuta Greenville. E não demorou a perceber que se encaixava perfeitamente ali.

Eis aqui a primeira mudança significativa, e eis o primeiro grande evento de nossa história.

Nota¹: casmurro: adj.: retraído, sorumbático, taciturno / casmurrice: subst. comum criado a partir de 'casmurro' por derivação imprópria


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