~ POV Renesmee

Eu sabia que mesmo em um dia que estivesse de bom humor, odiaria ter física nas primeiras aulas. Nos próximos seis meses, logo de manhã, estaria lidando com equações confusas e experiências de laboratório chatas. Acho que ninguém deveria ter de encarar assuntos como matemática ou coisa parecida antes do almoço.
Sentada, ouvindo a voz de Dona Eloá para lá e para cá resmungando alguma coisa sobre velocidade, eu olhava para o rosto de Jacob. A expressão dele variava como se estivesse meditando sobre algum fato que tivesse achado realmente interessante. Pressenti que pensava sobre a nossa aposta, a maneira arrogante com que se sentava, com os ombros jogados para trás, me provocou uma sensação de mal-estar.
Não era justo. Jacob sempre tinha muita sorte e eu não. Uma vez ele tinha me convencido a ir junto com ele e sua avó a um bingo em um centro para pessoas da terceira idade. No fim da noite, Jacob havia ganho uma boa grana. Quando eu finalmente consegui vencer uma rodada, o prêmio não era em dinheiro, mas uma daquelas camisetas com a inscrição: “Minha vó esteve nas cataratas do Iguaçu e tudo que ela me trouxe foi esta camiseta vagabunda”. Depois daquele noite, toda vez que a avó dele estava por perto, ela insistia para que eu usasse essa camiseta. E ainda por cima verde-limão NÃO é uma das minhas cores preferidas.

Quando o sinal tocou, a Dona Eloá ainda resolvia o primeiro conjunto de questões. Tinha tanta coisa anotada que dava a impressão de que a gente estava escrevendo um tratado. Antes de sairmos da sala, Jacob me passou um pedaço de papel que estivera rabiscando durante a aula. Tinha desenhado a si mesmo dentro de um grande coração e eu do lado de fora, tentando lançar uma flecha. Sobre a cabeça da minha figura estava um balão com a inscrição: “Loiras oxigenadas se divertem mais”.

- HAHAHA – ri ironicamente – Você vai ficar pensando nessa aposta idiota durante os próximos 5 meses?

Jacob arreganhou um sorriso meio safado e me deu umas tapinhas nas costas.

- Claro que não. Logo, logo vou estar apaixonado que não vou ter mais muito tempo para curtir a minha vitória. – respondeu dando um puxãozinho em meu cabelo e foi embora.

Arrastei para o meu armário aquele enorme livro de física que mais parecia de chumbo. Mal tinha dado dez horas e o dia já estava com cara de ser o pior de toda a minha vida no colégio.
Fechei a porta do armário com tanta força que, além do barulho, fiz chacoalhar todo conjunto de armários.

- Mal dia na escola?
- ALICE! Liguei para você umas 5 vezes ontem.
- Desculpe. Meu pai insistiu para que nós visitássemos o Museu de Cera. Daí, demoramos mais meio dia andando de carro e só chegamos tarde da noite. Meu traseiro ainda está adormecido de tanto tempo que fiquei sentada.

Dei uma risada e a abracei forte. Depois de Jacob, Alice, era a minha melhor amiga.
Meio baixa, corpo delicado e cabelos castanhos, curtos e espetados, tinha aquele olhar perdido que se vê nas modelos de revistas de moda. Era, porém, muito realista e não se considerava nada de especial. Ao contrário, chegava mesmo a se achar um tanto esquisita, por não ter muito seio.

- Então, como foi a reunião da família Hale?

Ela olhou para o teto e juntou as mãos como quem reza:

- Meu pai e meus tios ficaram 3 dias competindo para ver quem era o melhor pescador. A noite eles jogavam xadrez até tarde, e isso provocava chiliques em minha mãe. Enquanto isso, meus priminhos toda hora precisavam trocar as fraldas. E adivinhe quem sobrou para fazer isso?
- Em outras palavras, foi exatamente como você esperava.
- Sim, foi exatamente como eu pensava... Mas aconteceu uma surpresa legal.
- Já sei, você se apaixonou!
- Muito melhor.

Como naquele momento se apaixonar era um assunto da maior importância para mim, não consegui imaginar o que poderia ser melhor.

- O quê?
- Em duas palavras. Sutiã Maravilha. Minha tia me deu um.
- Você é uma doida.
- Não sou mais. Com esses truques de mulher, eu finalmente vou ter aquilo que mereço.

Começamos a caminhar pelo saguão. Olhei para ela e até onde podia perceber, Alice parecia a mesma.

- Não quero ser desmancha-prazeres, mas não estou notando nenhuma diferença.
- Bem, é que eu não estou usando agora. Hoje de manhã acordei tão atrasada, que esqueci. Mas deixa estar que amanhã mesmo eu mando ver com meu super sutiã.

Estávamos indo para aula de redação, que era uma das matérias que eu queria fazer desde o primeiro ano. Alice e eu adorávamos fazer poesias e às vezes escrevíamos histórias juntas, cada uma redigindo uma parte.
Chegamos a sala da Sue. Como a porta estava aberta pude vê-la arrumando a classe em círculo. Ela acenou quando nos viu.

- Renesmee e Alice, que bom vê-las. Sabiam que vocês serão as vítimas de minha primeira atividade em classe? Sempre tenho dificuldade para arrumar alguém que leia os textos para o resto da turma.
- Não olhe para mim. Não vou ler nada em voz alta no primeiro dia de aula.

Sue virou-se para mim:

- Renesmee, posso contar com você?

Dei de ombros, não tinha certeza se estava afim de fazer a leitura.

- Pode ser.

Alice e eu sentamos uma ao lado da outra. Peguei meu caderno novo (tinha uma capa preta brilhante) e estava usando o corretivo para escrever “Redação” na capa, quando Alice me cutucou...

Chace Crawford circulava pela sala de aula e vinha direto para nosso lado. Fiquei sem fôlego por um instante e, sem querer, coloquei a mão em cima do título “Redação”, que ainda estava molhado.
Eu sentia uma grande queda por Chace desde o dia em que tinha assistido sua atuação, durante a apresentação dos calouros do colégio. Cabelos castanhos e olhos verdes e covinhas nas bochechas, Crawford sempre chamava a atenção. Agora o vocalista de uma banda chamada Radio Hits e todas as garotas de todos os graus eram caidinhas por ele. Nos últimos três anos fomos colegas em várias matérias, porém mal nos falávamos. Uma das razões é que ele namorava Thaís, uma garota linda, que era um ano mais velha que nós. E, mesmo que estivesse sozinho, uma garota como eu não teria a menor chance. Ele poderia namorar qualquer aluna da escola...
Alice debruçou-se para o meu lado.

- A fofoca é que Thaís deu um fora em Chace quando ela se formou. E que ele agora está livre.

Procurei manter a calma me lembrando de que não havia chance de Chace vir se interessar por mim. Tudo o que a notícia inesperada de Alice significava era o fato de que eu teria que me acostumar com a idéia de ver Chace abraçando uma garota diferente a cada dia,mas nunca a mim. Não era isso o que eu queria. Apoiei o queixo sobre uma das mãos e fiquei disfarçadamente olhando para ele.
Mesmo adorando a aula de Redação, fiquei a maior parte do tempo disfarçando umas olhadinhas para Chace. O fato de ele ter escolhido esta matéria o tornava misterioso e atraente. Talvez ele fosse um novo Mário Quintana. Suas pernas longas esticadas cortavam o círculo formado pelas cadeiras. Não me lembro nunca de ter achado uma calça jeans tão fascinante.
Depois que Sue explicou a estrutura dos poemas haiku, nos deu quinze minutos para escrever um. Tudo o que consegui foi colocar meu nome no alto da folha. Acho que Sue percebeu que eu estava distraída e pediu para que Jack Duarte lesse seu poema para a classe.

Num dado momento Alice me passou um bilhetinho perguntando:"Como vai o Jacob?". Um dia ela tinha tido uma grande queda por Jake, mas, se me lembro bem, nunca fez nada em relação ao assunto. Acho que era porque ela sabia das histórias de Jake com as garotas e não o considerava um bom candidato a namorado. Alice tinha uma teoria esquisita de que nosso destino, meu e de Jacob, seria ficarmos juntos. Cansei de falar que não sairia com Jake mesmo que ele fosse o último dos garotos disponíveis na face da Terra, e ela apenas me encarava com um sorrisinho cínico nos lábios.

Nos últimos minutos de aula, Sue determinou a tarefa para a próxima sexta-feira. Nós teríamos de escolher uma poesia, ler em voz alta na sala e depois explicar seu conteúdo. Mentalmente repassei a lista de meus poemas favoritos, sempre relembrando o que cada um deles significava para mim.

- Me encontre na fila do almoço.

Pedi a Alice, ela fez um gesto de cabeça, que concordava, e me voltei, seguindo até o armário. Ainda tinha mais duas horas de aulas antes de enfrentar aquele ambiente chato do restaurante. Antes que eu saísse, porém, senti alguém pegando em meu braço. Fiquei vermelha imediatamente. Mesmo ele nunca tendo tocado em mim, meu sexto sentido me dizia que, quando me virasse, daria de cara com Chace Crawford.

- Oi Renesmee, como vai?

Seus olhos verdes eram quentes, e me senti quase desmaiando, como uma donzela dos tempos antigos.

- Ah, bem. Eu estou bem.

Odiei a mim mesma naquele momento. Chace provavelmente era um poeta incrível, e eu acabara de murmurar a resposta mais sem graça do mundo.
Ele se aproximou ainda mais de mim, o que me fez sentir um arrepio. Troquei os livros de braço e procurei parecer descontraída.

- Você me faria um grande favor? Pelos velhos tempos?

Não sabia que velhos tempos eram esses de que ele falava, mas eu estava, sim, querendo lhe fazer um grande favor.

- Claro... Como posso ajudar?

- Eu não sei muito sobre poesia. Você poderia me dar umas dicas? Talvez me explicar sobre o que é bom e o que não é, e todas aquelas coisas?

Ele parecia envergonhado de verdade, e isso me derreteu o coração.

- Sem problemas. Mas, se você não é muito chegado em poesia, porque escolheu essa matéria?

Ele fez uma cara de surpresa e apontou a secretaria.

- Problemas com o horário.

Concordei em silêncio. Mesmo que Chace não fosse o próximo Quintana, ainda continua sendo um dos garotos mais bonitos da escola.

- A gente se encontra na biblioteca, amanhã depois da aula.

Combinei, como se aquele encontro fosse normal.

Ele me deu um apertãozinho no braço e foi embora. Pensei em minha aposta com Jacob enquanto reparava que toda garota no saguão arriscava um olhar na direção de Chace. Era possível que um novo dia estivesse nascendo na vida de Renesmee Carlie Cullen. E não me importava qual era o motivo, se o destino, se uma confusão de horário, o que quer que fosse. Chace Crawford tinha pedido a minha ajuda para o trabalho.

Depois da aula encontrei Jacob correndo na pista de atletismo do colégio. Ele dizia que gostava de usar aquela pista porque era fácil de saber quantos quilômetros havia corrido. Mas sempre achei que gostava mesmo era de ter todas as garotas olhando pra ele.
Ele diminuiu a velocidade quando me viu. Eu estava contente e não pude esconder um sorriso. Não era sempre que tinha a oportunidade de apresentar boas notícias a Jacob a respeito de minha vida amorosa.

- Ei, Nessie. O que foi?

Perguntou ele, apoiando-se em meu ombro para poder esticar e alongar os músculos da perna.

- Bem, acho que não vai dar em nada, mas Chace Crawford me pediu ajuda com o trabalho de redação.

Nunca fui de falar sobre meus romances sem me subestimar, então esperei que Jacob comentasse para ter certeza de que o pedido de Chace significava alguma coisa.

Ele ficou quieto por alguns instantes. Em seguida voltou a ficar em pé normalmente e me olhou.

- Chace Crawford? Não me diga que você gosta daquele panaca?

Não acreditei que Jake acabara de chamar Chace de panaca.

- AH, qual é?... Chace é maravilhoso, talentoso, sexy...

Ele deu uma risada.

- Cai na real, Renesmee. O cara é um cabeça-oca. Além disso, namora a tontinha da Thais desde garotinho.

Balancei a cabeça negativamente. Sempre me surpreendo com a falta de percepção dos homens em saber o que as mulheres vêem de atraente em um garoto.

- Só para você ficar sabendo, Thais foi para uma faculdade bem longe. Chace está disponível.
- Bem, então sorte sua.

Jacob começou a se exercitar sem sair do lugar e senti que ele não teria mais nada de útil para dizer sobre o assunto.

- É isso aí. Pelo menos dessa vez, SORTE MINHA. Agora se me der licença, tenho de ir a biblioteca.

Não disse a ele que queria pesquisar alguns poemas antes de ajudar Chace no trabalho. Saí da pista com a cabeça erguida. Claro que o deixei com ciúmes. Eu tinha conseguido um ótimo começo em relação a nossa aposta, e ele certamente não aguentaria pensar que poderia perder.

Tarde da noite eu ainda me revirava na cama, tentando pensar no poema perfeito para Chace ler em sala de aula na sexta-feira. Podia até ver seu rosto se iluminando enquanto lia e a forma como iria entender o porquê de eu ter escolhido precisamente aquele poema. Ele tomaria minhas mãos nas suas e sua boca se aproximaria da minha. Bem na parte em que Chace se preparava para me beijar apaixonadamente, meu telefone tocou.
O som do toque fez meu coração acelerar. Será que Chace e eu podíamos nos comunicar mentalmente?
- Alô?

- Sou eu.

Imediatamente me senti uma boba. Sempre ficava contente em ouvir a voz de Jacob, mas não era bem ele quem estava esperando ouvir.
Olhei para o relógio.

- O que foi? É tarde.
- É sim. Adivinhe o que o seu super amigo tem para contar?
- Você já se apaixonou?

Só mesmo Jake para achar que encontrara a garota perfeita em apenas oito horas depois da última vez que tínhamos nos visto.

- Não, 10 THINGS I HATE ABOUT YOU está passando. Canal 12.
- Ligo para você em seguida.

Desliguei e pulei da cama, indo para a sala onde temos uma televisão e um telefone. Meus pais estavam dormindo e, por isso, não acendi luz nenhuma. Sob o clarão vindo do aparelho de Tv, disquei o número de Jake. Ele atendeu ao primeiro toque.

– Cameron está na sala da Orientadora. Ela acabou de falar com ele.
- Eu sei. Acabei de ligar a TV.

Sentei-me no sofá com o telefone ao ouvido. Jake e eu às vezes assistíamos a um filme falando ao telefone. Mesmo que não conversássemos muito, gostávamos de ter alguém para comentar as passagens que nos emocionavam mais. 1O THINGS era nosso filme favorito de todos os tempos.
Uma hora e meia depois eu tentava abafar meus soluços, mas mesmo assim Jacob sabia que eu sempre chorava quando Katherine lia o poema.

- Nessie, está chorando de novo? Você já viu esse filme umas trinta vezes.
- Eu sei... Mas mesmo assim continua sendo triste cada vez que vejo.

Eu estava quase sussurrando, porque não queria acordar meus pais.
Jake riu delicadamente.

- Você é romântica mesmo, não é?
- Ah, eu apenas sou sensível a filmes românticos.
- Bons sonhos, Renesmee.
- Bom sonhos, Jacob.

Desliguei o telefone e a televisão. Enquanto voltava para meu quarto, lembrei de que não tinha escolhido o poema para Chace.

- Chama-se Amor, é de Carlos Drummond de Andrade, ele fala sobre as razões do amor.
Quase desmontei quando percebi  o que havia dito, me senti mortalmente envergonhada. Será que Chace ia pensar que escolhi aquele poema de propósito, que estaria sugerindo que ele e eu ficássemos apaixonados ou coisa parecida?
Então resolvi não esquentar a cabeça. A maioria dos poemas é sobre amor, ele não iria pensar que eu tinha segundas intenções...
 Chace sorria de modo irônico ao meu lado.

- Sue vai ver só uma coisa. Ela sempre está falando sobre metáforas e coisas do tipo e tudo o mais sobre poesias.
- Sim, ela vai gostar deste. Podemos conversar mais sobre a interpretação depois da aula... se você quiser.

Ele fechou o livro de poesias e colocou a mão sobre meus joelhos. Tocou por apenas um instante, mas me fez estremecer toda.

- Você é a melhor Nessie.

Então se levantou segurando o livro. Fiquei observando enquanto ele ia embora e admirando seu jeans desbotado, que realçava seu corpo. Será que Chace nunca me enxergaria como Drummond descreveu a mulher do poema? Será que algum rapaz alguma vez me veria daquele jeito?
Toquei meu joelho onde Chace havia colocado a mão e pensei no que Jake poderia dizer nesse caso:"Você tem de ir a luta, Nessie. Ou a vida vai passar sobre você como um rolo compressor."
Bem, mesmo Jacob não achando que Chace fosse grande coisa, eu adotaria a filosofia de vida do meu melhor amigo. Já estava cansada de ficar de fora do jogo do amor.