Apesar de não aparentar ser nada além de um garoto alto, magro e inofensivo, (além de novo no colégio), Minato era aceito no colégio como alguém importante o suficiente para que ninguém mexesse com ele. Levou algum tempo para que ele percebesse que recebia uma espécie de tratamento especial, mesmo entre os seus colegas que claramente nunca o teriam em seu grupo de amigos. Era curioso passar pelo corredor e ver outros garotos que não eram muito diferentes dele serem perseguidos por qualquer bobagem, enquanto ele permanecia ileso. Talvez estivesse apenas vendo coisas, imaginando uma situação que não existia de fato, mas era uma sensação tão nítida, que sua intuição lhe dizia que era verdade.

E Minato não era do tipo que ignorava sua intuição. Ainda mais uma tão forte. Porém, sua primeira providência foi observar mais atentamente as coisas que aconteciam ao seu redor e como ele próprio se encaixava naquele organização social que a escola representava.

Não demorou muito a perceber que ele não era o único a receber um tratamento parecido dos grupos mais populares do colégio. Seus amigos Kenn Sabaku e Fugaku Uchiha também pareciam ter certa importância. No caso deles, no entanto, não era difícil imaginar que o distanciamento respeitoso que recebiam se devia muito mais ao porte autoritário e severo de Fugaku, e o temperamento agressivo de Kenn, do que a qualquer outra coisa. Características que Minato sequer possuía.

Cansado de tentar adivinhar tudo sozinho e na esperança de que os dois tivessem alguma ideia do que estava acontecendo.

Ao ouvir a pergunta dele, porém, a primeira reação dos garotos foi rir. Logo em seguida, percebendo a confusão no rosto de Minato, pararam.

— É uma pena, um cara tão inteligente quanto você realmente não sabe como esse lugar funciona? – disse Fugaku, colocando três fatias de presunto na chapa. Estavam na cozinha da casa do Uchiha, em um dos raros dias de semana em que Minato tinha disponível agora.

— Não. Adoraria que você me explicasse.

— Como assim, você não sabe? – Kenn perguntou, transmitindo quase a mesma confusão de Minato. - Você por acaso se lembra de como nos conhecemos? – perguntou, colocando refrigerante em três copos de vidro azul.

— Lembro. – Minato não gostava de lembrar daquele dia. – Vocês me livraram de virar saco de pancada do Mizuki.

— Exato. – Fugaku e Kenn falaram juntos, como se a resposta fosse óbvia.

— O quê? – A cada segundo, Minato tinha mais certeza de que estava perdendo algo.

— Você foi iniciado, Namikaze, pelo amor de seu Deus! – exclamou Kenn, numa mistura de exasperação e diversão. – Você foi iniciado no ciclo dos intocáveis.

— Do que você está falando?

— Você realmente não sabia? – Kenn olhou de Minato para Fugaku, como se o outro pudesse explicar o que estava acontecendo.

— Eu estava sendo iniciado em quê?

— No Clube.

— Clube?

Minato ainda não entendia muito bem do que estavam falando. O único clube de que fazia parte era o de ciência, o tipo de clube que o colocaria diretamente na mira dos valentões descerebrados do colégio. Esse era uma das razões que o levou a acredita que havia alguma coisa estranha. Afinal, todos os seus outros companheiros de clube, especialmente Shuya Kuronaga, eram perseguidos. Mas o que o que Kenn estava dizendo despertou um arrepio que percorreu todo o corpo de Minato, e, ao olhar para o amigo, percebeu que tinha sido um erro aceitar entrar naquela briga com Mizuki. Como poderia saber que aquilo significaria qualquer outra coisa além de uma simples disputa de força?

— Mas eu nunca quis…

— Quis sim. – Fugaku interrompeu, no seu costumeiro tom irritado. – Ninguém te obrigou a entrar naquela briga, nem a ir para o local de encontro do clube. Quem te convidou para ir não explicou para que era?

— Obviamente não. - Minato estava achando que tudo aquilo era uma loucura. – De que clube estamos falando exatamente? Que história é essa de intocáveis?

— Isso é bobagem do Kenn, que só precisa de uma desculpa para se sentir mais importante do que realmente é. – Fugaku tirou as fatias de presunto da chapa, colocando-as sobre as fatias de pão na pia. Depois substituiu-as na chapa por fatias de queijo. – É um clube da luta, Minato. – continuou, dessa vez virando a cabeça para olhá-lo. – No primeiro dia, todos os novatos são levados para aquele galpão e testados.

— Na verdade, há três testes. – Kenn interviu. – O primeiro, é a simples decisão de ir ao local indicado. Os novatos que não aceitam ir para o galpão já são descartados. O segundo acontece no galpão. Aqueles que aceitam entrar numa luta, como você aceitou, passam. E por último, é observada a capacidade de luta.

A expressão de Minato falava por ele. Estava chocado e horrorizado.

— Eu nunca teria participado disso se soubesse. Por que não nos disseram? – Minato ficou irritado com toda a situação. Não apenas com a situação, que era ridícula, mas com Fugaku e Kenn. - Por que vocês não me falaram antes?

— Quem convidou você? – Fugaku perguntou. - Quem te falou para ir ao galpão?

— Um garoto do último ano, aquele que está sempre com os olhos vermelhos.

— Saito. – Kenn informou, como se as coisas finalmente começassem a fazer sentido. – Aquele garoto que fuma maconha no café da manhã.

— Ele deveria ter explicado alguma antes de te levar ao galpão. – Fugaku deixou escapar um som irritado. - Ele não é confiável. Se eu soubesse que ele tinha sido o seu coletor, teria falado sobre isso antes.

— Coletor?

— Coletor é o cara responsável por abordar os novatos e explicar o básico. Nada que comprometa o Clube ou os membros.

— Eu não consigo acreditar nisso. – Minato levantou-se e deu as costas para eles por um momento. – Eu não quero fazer parte desse clube. Eu não quero…

— Só me diga uma coisa – Fugaku colocou as fatias de queijo nos pães e virou o corpo para encarar Minato. – Por que você aceitou brigar com o Mizuki naquele dia? O que te fez se apresentar diante de todos e lutar com ele?

Minato olhou-o sem saber o que responder.

— Há várias respostas possíveis, Minato. – Fugaku continuou. – Adrenalina. Desafio. Vontade de descontar a raiva em alguém que está lá com o mesmo propósito que você. Senso de justiça, talvez. – Hoje eu te conheço razoavelmente bem. Você viu vários garotos entrarem naquela roda e apanhar. Você viu Mizuki ser desonesto com os que cairam. Se quer a minha opinião, foi por isso que quis entrar. E o que te fez ir até lá, foi a raiva que você esconde ai dentro pelo que aconteceu com sua família.

— Não fala da minha família.

Fugaku balançou a cabeça acatando o pedido de Minato. Os dois se encararam em silêncio por um momento.

— O que eu faço para sair? – Perguntou enquanto Kenn distribuía os pães entre eles.

— Você não pode simplesmente sair. – Kenn olhou-o sério. – Você precisa ter certo status para ser considerado confiável.

— Está dizendo que não posso sair de um clube no qual eu nem sabia que tinha entrado?

— Não é isso. – disse Kenn.

— O que você quer dizer com confiável?

— Não podemos falar sobre o clube fora do clube. Tecnicamente estamos quebrando as regras. Mas nenhum de nós vai entregar o outro, então… Quando alguém sai do clube, ele é vigiado. Se ele falar alguma coisa, ele vai sofrer as consequências.

— Eu não contaria isso para ninguém. Só quero sair.

— Por que você quer sair? – Kenn perguntou. – Qual o problema?

— Eu… - Minato parou. O que poderia dizer para que eles entendessem. – Os garotos que não entraram no clube, eles são perseguidos, não são? Os que são considerados fracos. Eu não fazer parte disso. Eu não sou assim. Eu não posso permitir que isso aconteça.

Fugaku emitiu um som de irritação, deixando o pão e o copo com refrigerante sobre a mesa.

— Não é tão simples assim. Se você sair, a coisa vai ficar séria para mim e para o Kenn também. Você perdeu aquela primeira luta com Mizuki, não deveria ter sido “aceito”. – Fez um gesto para que Minato se calasse. – Eu sei que você não queria. Saito deveria ter explicado as regras e as condições. Mas o fato é que você foi aceito. Não por causa das suas habilidades na luta, mas porque, quando eu e Kenn nos tornamos seus amigos, o resto do pessoal considerou que estávamos apadrinhando você. Era para você ser exatamente como seus colegas de clube de ciência, se não fosse por mim e por Kenn.

Minato encarou-o. As emoções se confundindo. Embora a raiva ainda prevalecesse, sabia que colocaria os amigos em problemas se fizesse as coisas do jeito que queria.

— Eu não posso fazer parte de um clube desse. Por favor, só me diga o que eu tenho que fazer.

Kenn e Fugaku se entreolharam. Kenn tinha a expressão preocupada, a descoberta de que Minato não sabia de nada tinha pego-o de surpresa. Fugaku, por outro lado, mal conseguia esconder a profunda irritação que sentia pela insistência de Minato em sair do clube. Porém, por fim, falou:

— Você precisa participar de vinte lutas, antes de poder desafiar Mizuki. Se ganhar dele, pode pedir para sair.

— Só isso?

— Só isso? – Kenn riu, nervoso. – Você só tem que lutar vinte e uma vezes. Você tem que ganhar vinte lutas só para chegar ao Mizuki. E, já que estamos nesse assunto, você perdeu para ele da última vez.

Minato tinha perdido a fome, mas estava decidido a seguir em frente. Só havia um problema.

— E quanto a vocês?

— Vamos ter que sair também. – Fugaku deu de ombros, como se não fosse nada. – E para isso, lutar.

Minato olhou para ele, mas Fugaku já estava ocupado com seu sanduiche. Quando olhou para Kenn, o garoto não conseguiu esconder a preocupação, mesmo que seu sorriso displicente estivesse no lugar, Minato sabia que estava colocando os dois em problemas.

Porém, ele era um garoto intuitivo. E, por mais que a situação parecesse complicada, sabia que era a coisa certa a fazer, antes que algo pior acontecesse.