Os Outros escrita por Sochim


Capítulo 31
Especial 2 - Cabelo vermelho, olhos verdes (editar)




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O lugar preferido de Minato no colégio era a biblioteca. Era para lá que ia quando tocava o sinal para o almoço. Kenn cansara de convidá-lo para se juntar a ele e Fugaku na mesa do refeitório, Minato apenas sorria e começava a se afastar em direção à escada. A biblioteca ficava no terceiro andar do prédio, não tinha muitos livros de ficção, mas os que tinha eram suficientes para ele. Naquela semana começara a ler Os Três Mosqueteiros, livro que Jiraya indicara desde que era pequeno demais para se lembrar. Seu interesse pela leitura não era compartilhada por seus dois novos amigos, embora às vezes, eles achassem que era uma boa ideia visita-lo na biblioteca e atrapalhar sua leitura. E, em geral, a leitura daqueles que, como Minato, não viam na interação social um elemento de primeira necessidade.

Fora da escola, Minato se mostrava mais paciente para as brincadeiras de Kenn e o mal humor de Fugaku, inclusive com a disposição dos dois para começar uma discussão nem sempre edificante. Passar sua hora de almoço na biblioteca era o modo como encontrou para descansar das besteiras daqueles novos amigos que encontrara tão repentinamente e se preparar psicologicamente para aturá-los durante a tarde que se seguiria.

Separou seu livro, sentou-se no mesmo lugar de sempre – no fundo da sala, longe dos olhos astutos da bibliotecária – e abriu na última página que leu. Geralmente, nada conseguia tirar sua concentração, pelo menos até a chegada barulhenta de seus amigos, que ignoravam categoricamente os sussurros por silêncio dos demais. Minato mergulhava na leitura com facilidade, visualizando cada frase da melhor forma que podia, levando algum tempo para perceber que o sinal para o fim do almoço já havia tocado. Naquele dia, no entanto, algo estava diferente ali. Olhou em volta, vendo os mesmos colegas, lendo os mesmos livros da semana anterior, sentados nos mesmos lugares, espalhados pela sala. O garoto gordo com suor na camisa, o rapaz com a cabeça pequena demais comparada com o resto de seu corpo, a garota de óculos e aparelho, o menino pequeno com tênis rasgado, e a garota de cabelo vermelho que aparentava ter grande dificuldade para decidir entre comer seu sanduíche ou ler o livro. Ela ficava parada, com o sanduíche quase chegando à boca, preparava-se para morder e então algo parecia chamar sua atenção no livro e o sanduíche se afastava novamente.

De todos, ela era quem Minato menos encontrava fora da biblioteca. Via um ou outro sendo jogado contra armários, ou feitos de alvo em jogos de queimada, mas dificilmente conseguia ver aquela garota. Uma ou duas vezes a vira passar apressada por ele, com os olhos atentos em suas próprias coisas, parecendo distraída e não se importando em trombar com alguém. Uma vez, até trombara com Minato, murmurara um pedido de desculpas e desapareceu no instante seguinte, já bem longe dele. Minato tinha algum interesse no porquê dela estar sempre com tanta pressa e para onde ia, mas não tinha mais interesse nisso do que em descobrir como o professor de biologia parecia não ser muito mais velho que seus alunos…

No entanto, enquanto tentava se concentrar nas páginas abertas de Os três mosqueteiros, Minato não conseguia tirar os olhos da menina de cabelos vermelhos. Ela estava sentada duas mesas em frente a ele. Geralmente se sentava ali, de costas para ele. Mas, naquele dia, estava sentada de frente e Minato começava a achar graça de sua indecisão com o sanduíche. Além disso, tinha aquele cheiro. Tinha quase certeza de que era atum. O cheiro se espalhava pela sala, sobressaindo-se ao cheiro de livros velhos e novos, ambos que Minato adorava.

Por algum motivo, de repente, a menina parou de demonstrar interesse tanto pelo livro, quanto pelo pedaço de sanduíche em sua mão. Seus olhos se levantaram assustados para onde Minato a olhava e, por um momento, ele se sentiu culpado, sem saber ao certo do porquê. Atrapalhar uma pessoa que conseguia se concentrar em sua leitura quase tão bem quanto ele, não parecia ser muito legal. Reparou naqueles olhos verdes assustados olhando na sua direção e precisou desviar os seus próprios o mais rápido possível. Era incomodo ser encarado por eles.

A menina amassou o sanduíche no meio do papel alumínio e fechou o livro produzindo um barulho não proposital. Pegou sua mochila surrada e começou a se dirigir para o balcão. Minato não pensou direito no assunto, mas quando deu por si, estava pedindo desculpas em voz alta, para uma menina que mal conhecia e que apenas se limitou a voltar a cabeça em sua direção e saiu apressada. Na porta, trombou em Fugaku, que mal teve tempo para virar e ver o que, ou quem, o tinha atingido.

Kenn foi ao encontro de Minato com um sorriso.

— Nós estamos atrapalhando? – um murmúrio de resposta acompanhou a pergunta cínica de Kenn, que ignorou aquilo, como de costume.

Minato fechou o livro, pela primeira vez, desde que Kenn e Fugaku entraram naquela rotina de tentar atrapalhá-lo na leitura.

— Não. – respondeu, com a voz baixa, começando a se levantar. – Acho que hoje não é um bom dia para leitura.

— Quem diria? – Fugaku se aproximou, com sua voz profunda enchendo a sala. – Vai descer para o refeitório com a gente, hoje?

— Vou, dessa vez, vocês venceram.

Os três rapazes seguiram juntos para o refeitório, Minato ouvindo com mais paciência do que costumava demonstrar os comentários pouco inspirados dos amigos sobre coisas que, na verdade, não lhe interessavam. Pegou-se procurando pelos corredores pela ruiva assustada, ainda sentindo-se culpado por desviar sua atenção, mesmo sem saber ao certo como, nem se deveria se desculpar novamente.

— Eu entendo que você goste de ler, Minato. – Fugaku estava dizendo, e Minato resolver dispensar-lhe um pouco mais de atenção. – Mas seria melhor se você fizesse isso em casa. Se não tomar cuidado e passar o dia inteiro com a cara enfiada nos livros, vai acabar como aquela menina, a Kushina.

— Quem?

— Aquela maluca que tentou passar por mim como se eu fosse um fantasma transparente.

Minato olhou para ele.

— Ela é esquisita. – Kenn deu de ombros.

— Vive enfurnada naquela biblioteca, como você e está sempre correndo. Parece que todo o tempo tem algo muito importante para resolver e não pode esperar por nada.

— Talvez tenha mesmo, quem pode saber? – Minato sorriu, sem afastar aquela possibilidade.

— É, quem pode saber. – Kenn levantou uma sobrancelha. – Acho que ela não bate bem da cabeça. Entramos juntos no colégio e eu faço três aulas junto com ela. Não lembro de ter ouvido a voz dela.

— Você também não bate bem da cabeça, Kenn. – Minato brincou, conseguindo arrancar um sorriso até de Fugaku. – E eu também gostaria de não ouvir sua voz às vezes. – dessa vez o riso de Fugaku fez mais barulho e Kenn ameaçou dar um chute no traseiro de Minato.

— Não enche. – murmurou, finalizando o assunto.

 

Pouco antes de chegarem ao refeitório, Minato e os outros deparam-se com a ruiva, Kushina, novamente. Dessa vez, ela andava na direção deles, também como se não os tivesse visto e seu rosto parecia ainda mais apavorado que antes. Minato a parou, seguindo seu instinto e tentando olhar em seus olhos. Durou apenas alguns segundos, mas naqueles olhos verdes, viu medo e mágoa. Queria falar com ela, perguntar o que houve e ouvir sua voz, mas foi a de Kenn que o tirou daquele momento.

— Aterrorizando menininhas de novo, Mayumi?

Minato olhou para a outra garota, com os cabelos loiros e olhos escuros e cínicos. Ela sorria com malícia olhando para Kushina. Ela não disse nada quando se afastou, mas ao lado de suas amigas, ria como se tivessem acabado de ouvir uma piada muito engraçada. Minato não precisava que lhe dissessem, sabia que a piada estava agora seguindo para o outro lado do corredor, afastando-se dele novamente.

— Isso explica porque ela está sempre correndo. – Kenn verbalizou aquilo que se passava na mente de Minato.

Os três rapazes entraram no refeitório, Kenn e Fugaku logo esqueceram o assunto, começaram a falar de outra coisa e, eventualmente, entraram em outra de suas discussões inúteis. Minato não se importou dessa vez. Sua mente estava longe e não conseguia se concentrar em outra coisa, que não naquela ruiva de olhos verdes. Kushina.

 


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