Senhor do Tempo escrita por otempora


Capítulo 4
Gestos


Notas iniciais do capítulo

Não gostei muito desse capítulos, mas ele é necessário para entender algumas coisas.



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  Sophie abriu os olhos e me encarou sorrindo, eu sabia que estava conferindo se eu ainda estava lá, meu sorriso em resposta não deve ter sido menos deslumbrante. A cada dia que passava ela parecia estar melhor, mas suas crises nunca foram tão agressivas; ela tentava se esforçar para ficar bem, porém por algumas vezes seu coração ficava tão fraco que eu imaginava que seria o fim.

  - Bom dia. - ela sussurrou indo para o banheiro.

  Quando retornou estava imersa numa nuvem limpa e perfumada. Estancou no meio do quarto, olhando para mim.

  - O que foi? - perguntou.

  - Você está mais brilhante. - olhei para as minhas mãos. Era verdade. - Está se sentindo bem?

  - Sim.

  - Avise caso se sinta estranho.

  Assenti. Ela se sentou na cama e suspirou, olhei para Sophie; ela parecia um tanto inquieta, seus olhos estavam com um brilho estranho. A enfermeira entrou no quarto anunciando:

  - Hora de sua injeção! - e logo que pode foi embora, fazendo comentários alegres que Sophie respondeu com monossilábicas enquanto pegava o livro que estava lendo. Mas logo bufou e o jogou na cama, fechando os olhos com força; escutei um suspiro e rapidamente fui para a frente dela.

  - O que foi? - perguntei segurando o seu pulso. Ela ficou olhando para mim por alguns segundos até que baixou os olhos. Não me permitindo confirmar se ela estava chorando.

  - Nada. - sussurrou e depois passou os dedos na testa, como que para afastar algo. Percebi que estava irritada com algo que não queria me contar. - Desculpe. - ela falou, olhando para mim.

  - Você está bem, Sophie? - perguntei preocupado, e ela somente balançou a cabeça fazendo que sim. Ia embora, contudo seus dedos seguraram os meus. Procurei seus olhos, mas eles logo se foram de mim e ela desfez o toque.

  Fui para um canto do quarto, perto da janela, fiquei olhando para fora, ouvindo Sophie virar as páginas de seu livro e as batidas uniformes de seu coração.  Ela suspirou novamente. Quis lhe forçar a dizer o que estava acontecendo, mas não achei prudente. Ela ficava desconfortável em me fazer confidências. Somente fazia seus gestos retidos; e, quando sua frustração atingia o limite, ela desabafava numa torrente, tornando-se afastada. Eu quase nunca ia embora e nossas conversas eram pontuadas por longos períodos de um silêncio por vezes doloroso. De quando em quando algo estranho tomava sua mente e ela baixava a vista, mordendo o lábio inferior com força, toda vez que isso ocorria eu tinha vontade de lhe amparar, mas não fazia por medo.

  Sabia que nossa relação vinha ficando mais estreita, Sophie tinha dezessete anos e ninguém mais com quem conversar; da janela, eu podia observar pessoas da sua idade fazendo brincadeiras, rindo, indo para festas; e, por algumas vezes, passavam casais abraçados ou somente juntos e uma tristeza enorme invadia meu coração. Eu nunca seria assim, nunca poderia permitir que ela me visse por inteiro, teria de ocultar a aflição sem igual que me invadia quando ela empalidecia ainda mais.

  Nem mesmo poderia guardar para que ela fosse feliz com algum outro, que não eu, mesmo assim eu continuaria a amando e ficando feliz por ela somente estar sorrindo. Mas nós dois sabíamos que ela possuía pouco tempo e eu desejava tomá-lo completamente para mim. Involuntariamente a imagem de nós dois se formou em minha mente. Sophie segurando minhas mãos, apertando o corpo junto ao meu. Passei as mãos por meu rosto, isso não era certo. Tentei pensar em outras coisas.

  A luz que emanava da minha pele ainda estava forte, precisava perguntar a Julian o que isso significava. O anjo estava estranho ultimamente, andava resmungando pelos cantos, sempre acompanhado por Otempora e, segundo ele, tentava achar alguma lacuna que havia perdido, vasculhando ininterruptamente o futuro, algo que somente os velhos anjos escolhidos podem fazer. Todas as vezes que lhe perguntava ele negava ter conseguido algum vislumbre do futuro de Sophie.

  Respirei fundo, tentando afastá-la de minha mente, voltei meus pensamentos para Julian, divisando seu andar manco e apressado e o olhar absorvido que levava; tentando juntar as peças do que somente ele sabia. Quanto a mim, eu somente desconfiava o que era; Julian queria encontrar o Senhor do Tempo. Encostei a cabeça no vidro, eu também deveria estar pensando, buscando uma justificativa para Sophie poder me ver. Seria simples fazer isso parar se eu soubesse as causas. Alguns anjos são presos a teoria de Otempora, pois todos trazemos consigo o poder de manejar o tempo, mas com um pacto realizado, juramos não nos utilizar desse poder; isso me fez acreditar que o livro narre somente uma história inventada, um conto moralista para que inutilizemos este poder. Decisão a qual eu considero acertada, não se pode o rumo dos acontecimentos a um simples desejo, isso causaria um descontrole sem medidas no equilíbrio que rege este mundo.

  Mas, o tribunal dos anjos poderia fazer uma exceção a meu caso, a quebra inconsciente de uma regra iria ser corrigida.

  Perguntei-me o porquê de desejar tão ardentemente que Sophie não pudesse me ver. Quis ser verdadeiramente sincero na resposta, não adiantaria mentir para mim mesmo, embora eu tentasse fazer isso tantas vezes com Julian. Pesei, principalmente, o lado que, se a situação continuasse dessa maneira, Sophie iria me amar, inevitavelmente, eu era seu consolo. E este fato, em particular me entristeceu. A resposta que encontrei para isso foi que ela se apaixonaria por um ser que nem humano era. Eu queria que ela fosse feliz, acima de tudo, daria a minha vida para que ela pudesse viver de verdade, para que ela pudesse correr, realizar desejos de adolescentes comuns. Que pudesse ser uma transeunte sorridente, andando de mãos dadas com um cara qualquer.


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Notas finais do capítulo

grandes agradecimentos para sp_little e faith por seus comentários. Fiquei extremamente feliz com eles.
Obrigada também para quem mais estiver lendo esta história.



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