Sapatinhos Estilo Boneca escrita por Ryoko_chan


Capítulo 1
Sapatinhos estilo boneca




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Sapatinhos estilo boneca, brancos e lustrosos, com um lacinho na frente, e saltos médios e grossos. Meia-caça branca, saia rendada e rodada, cor-de-rosa, que esvoaça e flutua a cada passo dado. Blusa de babados com mangas, bolsinha de alça curta segura pelas duas mãos pequenas e delicadas; dentro dela, o collant e as sapatilhas de ballet. Longos cabelos, dourados como os campos das plantações de trigo, com cachos caindo pelas laterais da face que mais pareciam porcelana. As bochechas se encontram no mais perfeito tom entre a palidez de sua pele e o rubor de sua vergonha, enquanto os cílios longos e volumosos ornam com graça os inocentes olhos verdes.

Chinelos dois números maiores que os pés dela, masculinos e surrados, mas muito confortáveis. Calça jeans rasgada e larga, arrastando pelo asfalto. Por baixo, bermuda de tacktel vermelha. Camiseta preta estampada com a capa de um CD de black metal. Munhequeira no pulso e pingente de caveira no pescoço. Dois piercings transversais na orelha esquerda. Mochila grande nas costas, dentro dela: uma toalha, um livro, ataduras e um par de luvas de boxe. Cabelos louros, mas escuros, e muito curtos, escondidos por um boné, que fazia sombra sobre a face levemente avermelhada graças a caminhada sob o sol em direção à academia.

Em comum nas duas imagens, os olhos verdes, sempre puros e belos.

Em comum nas duas imagens, também, a menina: Richele, embora que em situações diferentes. A primeira tratava-se de um ideal, construído durante os anos de sonho de sua mãe, que foram da gestação até o início da adolescência; A segunda era a realidade... E era assim, desde que Richele se entendia por gente.

 A mãe, é claro, ficou horrorizada a princípio, e depois também... Mas com o tempo viu que não tinha jeito, e acabou se acostumando com aquela maneira que a bonequinha de seus sonhos tinha de se vestir e de agir. O pai nunca se importou muito. Tinha duas filhas de um casamento anterior, por isso sentia falta de um moleque para jogar bola... e bem, Richele era boa de bola como poucos meninos conseguiam ser.

E assim a menina que se vestia de menino vivia, na boa, sem se preocupar com saltos altos e pernas cruzadas para quando estivesse de vestido. Não que ela quisesse ser menino, só não gostava das frescurinhas que sua mãe adorava lhe impor. Maquiagem? Para quê? A pele dela era boa, e o batom só servia para sujar copos. Bolsas? Desconfortáveis e pequenas, não cabia quase nada, e ainda deixava a coluna torta por serem carregadas só de um lado. Anéis não eram permitidos durante o treino, e nem brincos grandes. E sinceramente? Ela gostava era de comer pizza com as mãos e andar de skate.

Você já viu alguém andando de skate com saia e salto alto? Pois é.

-Não sei como você consegue usar isso... –Comentou certo dia no vestiário da escola, quando sua amiga Laura pediu para que a ajudasse a fechar o zíper do apertado corset que comprara.

-É bonito, oras! Marca minha cintura, e faz meus peitos parecerem maiores, não acha? –A moreninha respondeu animada, exibindo suas belas formas para Richele.

A menina que vestia a camiseta larga de sempre fez pouco caso, e desviou o olhar. Para que ia querer ver os seios de Laura? Tinha os dela, oras... Podiam não ser tão grandes, mas eram dela. Podiam não ser tão bonitos, mas eram dela... E ela não tinha para que ficar mostrando. Seios não eram nada de mais.

Laura obviamente notou a expressão pensativa de Richele, e não perdeu a oportunidade para provocar.

-Que foi? Vai dizer que não gostou do que viu? –Perguntou em tom brincalhão, enquanto apertava os seios com os dois braços, fazendo-os parecer ainda maiores do que eram, quase saltando para fora do corset.

Richele corou, mas ignorou. Estava acostumada com aquilo, Laura provocando-a e se exibindo. Sabia que aquilo provavelmente fazia parte da personalidade de sua amiga, mas às vezes pegava-se pensando se talvez a morena não estivesse ainda tentando seduzi-la. Soube desde que o início da orientação sexual de Laura, afinal, a morena ‘chegou chegando’, querendo beijá-la e convidando-a para sair, certamente pensando que a loirinha era lésbica também.

A menina que se vestia de menino quase teve um troço, tamanho o susto. Custou um pouco para conseguir explicar a Laura que aquele era apenas o seu jeito de ser, e que nada tinha haver com gostar de meninas ou meninos. Resolvido o mal-entendido, logo as duas eram melhores amigas, algo que Richele jamais tivera, uma vez que sempre preferira brincar com os meninos. Afinal, bonecas são tão chatas...

“Mas nem todas”, pensou. Gostaria de ter uma boneca que fosse como Laura. “Tão bonita...”

Mais uma vez corou, e as duas saíram do vestiário.

Do lado de fora, Luis as esperava.

Luis era um menino normal, um menino menino, como poderiam dizer. Nem bonito, nem feio. Inteligente e legal, e era isso o que importava para Richele. Eram amigos de infância, desde os 5 anos de idade, quando ele se mudou para o prédio dela. Jogaram basquete juntos, perderam juntos horas e horas na frente do Mario Kart, e juntos se fraturaram caindo de uma mangueira. Uma amizade profunda e verdadeira, mas que parecia ameaçada no momento.

Richele não sabia o motivo, e não se atrevia a conversar a respeito. Tinha medo... Tinha medo porque algo dentro de si lhe dizia que era algo relacionado com a forma que Luis olhava para Laura. Sim... Aquela cara de bobo que ele fazia agora mesmo, enquanto olhava para o colo exposto da morena. Aquilo estava errado. Não sabia porque, mas estava.

Passara noites e mais noites pensando naquilo, tentando descobrir o motivo do desconforto que sentia quando estava entre ambos. “Talvez seja ciúmes...” Ela supôs, assustando-se com aquela conclusão. “Mas que bobagem...” Pensou logo depois. “Ciúmes de que?” Eram só seus amigos...

“Mas eu queria que o Luis me olhasse da maneira que ele olha para ela...” –Pensou triste encarando o próprio corpo no espelho.

O corpo bonito que ela sempre manteve escondido atrás de roupas largas.

“Mas eu queria que a Laura se mostrasse só para mim...” Continuou pensando enquanto encarava o seu sutiã simples e bege.

“E se ele vier me pedir para fazer os papos com ela?” Quase se desesperou, pensando naquela possibilidade.

Abriu o guarda-roupa e olhou desolada para suas camisetas. Talvez ela pudesse usar uma regata um pouco mais justa naquele dia... Ela tinha uma blusinha, não tinha? Sim, sua mãe havia lhe dado uma... Era verde, não era? Onde poderia estar? “Quem sabe...”

E se passasse aquele batom que Laura lhe deu de aniversário... E tinha uma bermuda bem curtinha, que mostrava bem as suas pernas. Olhou-se melhor no espelho, encarando os cabelos... “Como seria se eu deixasse eles crescerem...?”

Por fim ela suspirou cansada e vestiu qualquer coisa, não conseguido deixar de pensar no quão difícil era ser menina, mesmo que se vestisse de menino.

 


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Notas finais do capítulo

Mais um texto bobinho, como todos os meus Yuri...