Be My Friend escrita por milena_knop


Capítulo 24
Passado


Notas iniciais do capítulo

OIII povo
Demorei um pouquinho mais essa semana né? Mas como sou uma pessoa muito boa vou postar um capítulo mega grande. Não sei o que tá acontecendo comigo, quando eu vejo já tem 10 páginas de word, prometo tentar parar com isso pra não ficar tão grande :D
Bom o capítulo de hoje explica tudo, mesmo, e olha eu demorei pra escrever e refiz algumas vezes e ainda assim não gostei dele, sei lá não ficou como eu queria :/
Vou para de enrolar e vou postar logo essa coisiinha aqui.
Boa leitura 8)



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Mergulhei mais fundo minha cabeça sobre o travesseiro visivelmente encharcado. Eu já não fazia questão alguma de controlar minhas lágrimas; parecia que depois de horas, elas já faziam parte de mim, do meu ser, derrotado e acabado sobre a cama. 
Desde que cheguei em casa permanecia aqui. Depois de conversar e desabafar no colo de Jen, precisava desse momento sozinha: precisa pensar, colocar a cabeça no lugar. Jurava que minha dor havia se materializado e se transformado em uma dor física, pois meu peito estava extremamente apertado. Estava com ódio, culpa, saudade, tudo se misturando em minha mente e me ferindo cada vez mais. Estava tão magoada com as atitudes de Tom que perdoá-lo nem sequer passava pela minha cabeça. Confesso que sei a minha culpa nisso tudo. Falei coisas que não deveriam ser ditas, mas jamais mexeria numa ferida tão profunda. 
Quase seis anos haviam se passado, mas esse fato é algo que vou guardar pelo resto dos meus dias. Mesmo que eu não tenha isso em meu pensamento a cada instante, não quer dizer que não seja importante, porque é. E eu já me culpo silenciosamente e secretamente o suficiente para Tom também fazer isso. Outra coisa me fazia sofrer mais era Anne. Eu precisava falar com ela, precisava explicar tudo a ela e precisava rezar para que ela entendesse e me perdoasse. Necessitava mais do que qualquer coisa de sua companhia agora, embora eu saiba que isso é algo meio improvável, pois ela deve estar me odiando no momento. Minha única esperança era de que o seu bom senso e a sua curiosidade em saber de tudo a trouxessem aqui. Eu me apegaria a isso para que essa esperança de que ela venha logo não se vá. 

Simplesmente não conseguia pregar o olho. Olhava pelo grande vidro da sacada, observando as gotas grossas de chuva caírem e logo dando lugar a um céu levemente avermelhado. Suspirei pesadamente, sentindo que a noite seria mais longa do que de costume. 
As luzes do quarto estavam apagadas ainda. Calmamente, me levantei da cama e encarei por minutos a paisagem lá fora. Minha cabeça parecia girar a mil por hora, e eu ainda não conseguia acreditar em tudo o que havia acontecido. Segui na direção do banheiro, mas meu olhar parou em frente ao porta retrato situado no balcão de mogno em frente a cama, o único objeto dali que era iluminado pelo feixe de luz que vinha da rua. Era a nossa foto de alguns meses atrás, onde parecia que nada mais abalaria esse relacionamento. Tom sorria, eu sorria, sempre assim. Inevitavelmente, senti lágrimas grossas se formarem em meus olhos. Meio tonta, me sentei ao pé da cama e novamente deixei que o choro me dominasse. Aquilo não sararia tão fácil, isso agora era uma certeza. 
Sonne se levantou do meu lado abruptamente e seguiu até a porta. Notei então que ela estava sendo aberta; deveria ser Jen, mas a surpresa me atingiu em cheio quando reconheci aquela voz reconfortante soar no quarto. 
- Rachel? – Anne chamou, acendendo a luz do quarto. Rapidamente pulei em sua direção e abracei-a, segurando fortemente seu pescoço e deixando as lágrimas rolarem pela minha face. Não sabia mais nem ao certo o motivo delas caírem. 
- Eu... Sabia que você viria! – disse meio alterada. - Eu sinto muito Anne, por tudo!
- Está tudo bem. Você precisa se acalmar - sussurrou em meu ouvido. Respirei fundo e desmanchei o abraço, ergui meu olhar até aqueles olhos negros e percebi o quanto ela também estava emocionada. – Vá lavar o rosto... Precisamos conversar - pediu sorrindo ternamente. Assenti afirmativamente e rapidamente me encaminhei ao banheiro, passando uma quantidade grande de água extremamente gelada em meu rosto. Amarrei os cabelos em um rabo de cavalo alto e logo voltei ao quarto. 
Anne seguiu em direção a sala e eu a acompanhei. Nos sentamos no grande sofá localizado no meio da enorme sala, em frente à lareira, uma em cada ponta. Notei que ela me encarava curiosa e, ainda que escondesse, estava nervosa e muito ansiosa. Baixei meus olhos e fitei minhas mãos, que estavam achando o cordão do meu pijama algo super interessante no momento. 
- Vamos Rachel, me ajude a entender tudo isso - exclamou ternamente. Eu a encarei por alguns segundos e dei um longo suspiro, buscando em algum lugar do meu cérebro a ajuda para começar a contar tudo.
- É uma longa história - comecei, me ajeitando no sofá, cruzando as pernas e abraçando os joelhos, deixando minha mente vagar por lembranças de alguns anos atrás. – Acho que deveria começar te confessando que eu omiti alguns fatos do meu passado – comecei, e vi Anne respirar fundo e baixar a cabeça, como se consentisse com o que eu acabara de falar – O modo como nos conhecemos foi real, mas o que aconteceu depois era até então tudo segredo – passei a mão sobre o rosto. Demorei um pouco até prosseguir falando.
“Você não sabe o que é viver como eu vivia - soltei um riso irônico. - Estudar em um colégio de elite, com gente com dinheiro demais, adolescentes e crianças fúteis e desinteressadas... Esse negócio de estudar era só fachada. O que quer que acontecesse por ali era bem diferente... – Anne prestava atenção em tudo que eu falava. 
“Fui criada completamente sozinha e desenvolvi uma difícil capacidade de confiar nas pessoas. Aliás, eu raramente confiava em alguém. Eu achava que gostava da minha vida, daqueles que com muito custo chamava de amigos... E bom... – suspirei. – Tom chegou transformando tudo que eu sentia. Ele era diferente, era real, então não tive problemas pra adquirir aquela tão rara confiança. Nos aproximamos, nos envolvemos, nos comprometemos, mesmo nem sabendo ao certo naquela época o que tudo aquilo significava - Anne parecia estar meio confusa. Cruzou os braços em frente ao corpo e manteve o contato visual.
“Eu era uma adolescente solitária e extremamente vulnerável, e ele, uma recém estrela descobrindo o tão almejado sonho americano. O Tokio Hotel estava gravando seu primeiro álbum nos EUA, e enquanto ele não trabalhava, eu mostrava-lhe o meu mundo, aquele meu perigoso mundo - pensei por alguns segundos e continuei. – Eu havia me envolvido com drogas, Anne. Drogas, bebidas, festas todos os dias, jogos e dinheiro sendo esbanjado por criaturas mimadas e sem capacidade nenhuma de raciocínio sobre o certo e o errado. Tom, muito alucinado com tudo aquilo, entrou nessa junto comigo. Como eu disse, confiava tão absurdamente nele que queria compartilhar com esse alguém as mesmas coisas – Anne, ainda concentrada, dobrou as pernas sobre o sofá, mexendo distraidamente em suas mãos sobre os joelhos. 
“Eu não obriguei Tom a experimentar nada, Anne. Ele entrou nessa porque quis, da mesma maneira que eu, achando que aquilo era divertido, que nos faria bem... E ainda tem gente que acredita que isso só acontece com as classes menos favorecidas... Ledo engano - sorri fraco. - Eu e Tom saíamos sempre que podíamos, com os amigos em comum que tínhamos... Éramos amigos, mas não posso mentir e dizer que não havíamos ficado algumas vezes, mas em nenhuma ocasião era a nossa lucidez que ponderava, pelo contrário: estávamos sobre efeito de droga e bebida, e na hora, achávamos o máximo. Era errado, mas isso deixava tudo muito mais excitante – notei certo desconforto em Anne ao me ouvir terminar. Ela deixou de manter o contato visual por alguns instantes e suas íris negras focavam as labaredas da lareira. Aquilo também não estava sendo fácil para ela. 
- Anne, tudo bem? Quer que eu pare? – perguntei calmamente, tocando em seu joelho. Ela me olhou e suspirou, negando com a cabeça. 
- Não Rach... Tudo bem sim, continue, por favor - tocou a minha mão que estava sobre ela. 
- Bom... Nos dávamos super bem, era incrível a nossa compatibilidade e a nossa irresponsabilidade também... Eu era feliz, não posso negar - sorri com um falso encanto. - Achava que o mundo se resumia naquilo: gente bonita, rica, festas, bebidas, artistas inconseqüentes, sem preocupação nenhuma, nem comigo nem com ninguém... – balancei a cabeça negativamente e bufei, lembrando de tudo aquilo. - Com Tom era diferente: eu me sentia normal, sem ter que fingir pra agradar, sabe? – questionei, virando minha atenção para a sacada. - Sem ter que pagar uma dose de bebida ou dar alguma festa pra chamar a atenção dele. Ele gostava de mim, e eu dele. Eu me sentia mais só do que sempre costumei ser quando ele não estava presente – fiquei em silencio por alguns segundos e respirei fundo.
“Algum tempo havia se passado e ele teria que voltar para a Alemanha e começar a primeira turnê com os meninos... E eu... Bem, não havia gostado nenhum pouco. Combinamos de ele passar lá em casa e vermos alguns filmes, e fazermos uma simples ‘despedida’ - voltei a olhá-la e coloquei uma mecha teimosa do meu cabelo para trás da orelha. - Papai estava viajando como sempre - soltei um riso debochado. - Não que eu ligasse muito pra isso naquela época - parei, ponderando toda e qualquer palavra que eu pudesse falar a seguir. – E então, você já deve imaginar o que aconteceu – engoli a saliva, receosa. – Nós transamos e... Eu... Foi a minha primeira vez – soltei em um fio de voz. Cheguei a pensar que fosse impossível Anne me ouvir.
- Mas vocês estavam... Sabe...? – Anne perguntou, meio atordoada. 
- Não Anne, estávamos completamente lúcidos, sem uma mísera gota de álcool no sangue ou outro entorpecente. Não sei por que aconteceu... Simplesmente aconteceu. Carência, afeto, cumplicidade, lealdade, não sei até hoje quais foram os fatores que nos levaram a isso... E na hora, não existia entre nós nenhum tipo de arrependimento, pelo contrário. Tom disse depois que estava tão envolvido que esqueceu a proteção... - pensei em voz baixa. - Mas pela manhã, quando acordei, eu estava sozinha, e tinha plena consciência de que seria por mais tempo do que esperava – Anne parecia incrédula, e eu não lhe tirava a razão. Era meu dever ter contado toda a verdade. 
- Rachel... - insistiu que eu prosseguisse.
- Bom... - ajeitei minhas pernas, entrelaçando-as. - Tempos depois, os sintomas começaram a aparecer: tonturas, náuseas, pressão baixa, alguns desmaios, enjôos... Mas não pense que mudei meus hábitos por culpa disso. Continuei levando aquela vida turbulenta de antes, senão pior... Mas a situação chegou a um extremo, e foi aí que Jen percebeu, e não tendo outra saída, contei tudo a ela, e com a experiência que tinha, me obrigou a fazer um exame de farmácia. Me lembro como se fosse hoje o escândalo que eu fiz por culpa disso, pobre Jen... – suspirei, sentindo a saliva engrossar em minha boca e meus olhos serem tomados por um leve ardor. Essa era a parte mais difícil e mais perturbadora de toda a história.
“Convencida disso, fiz o dito exame, e olhe só! – exclamei – O resultado foi positivo. Eu estava grávida com apenas quinze anos! - senti a emoção começar a reinar sobre meu ser. - Pensei que minha vida estivesse arruinada, eu nem sequer fazia idéia do que aquilo significava. Depois de semanas, tomei coragem e pedi a Tom ajuda. Ele viria fazer algumas apresentações pelo país e eu exigi sua presença. Foi terrível ter que contar aquilo a alguém tão jovem quanto eu, alguém que julgava sua carreira o maior e mais promissor feito da sua vida... Ele não aceitou no primeiro momento. Nós discutimos, nos culpamos, e ele fugiu - apoiei minhas mãos sobre o rosto fechando os olhos por segundos, sentindo que tocar naquele assunto seria pior do que o imaginado. – Ele fugiu por um tempo, me deixando mais sozinha e desesperada do que já estava.
- Então ele não te apoiou, foi isso? – Anne perguntou curiosa, com certo desprezo em suas palavras. Neguei com a cabeça e dei continuidade à conversa.
- Ele voltou alguns dias depois, disse que havia contado tudo para a mãe e a teria ouvido, prometendo assim estar do meu lado pelo tempo que fosse necessário. Contamos tudo ao meu pai, que acredite, não reagiu de forma nenhuma. No fundo ele sabia tanto quanto eu que havia certa culpa sua nisso... – sorri, controlando a emoção. – Ele nos deu apoio e pediu o máximo de segredo nisso, até que minha barriga não deixasse mais isso em sigilo. Tom concordou, lógico – senti novamente uma dor insuportável no peito, e apertei as mãos com força, tentando fracassadamente controlar o choro que não tardaria muito a chegar. – Durante um tempo, ele se dividiu entre a banda e eu. Papai havia nos dado um apartamento para termos melhor intimidade... Estava indo tudo tão bem! Os nossos vícios e maus hábitos haviam sido deixados de lado, embora em vários momentos nos fizessem extrema falta, mas o apoio emocional que passávamos um para o outro supria de certa forma essa necessidade – parei um pouco, lembrando de algo que por muito tempo eu havia esquecido.
“Anne, nós passávamos horas deitados na cama imaginando a carinha dele, o sorriso, as manias, até o nome já tínhamos... Passávamos as madrugadas de insônia cantando pra ele ou pra ela... Eu queria uma princesinha, mas Tom, lógico, queria um menino, para ser um artista também – sorri fraco e notei um tímido sorriso se instalar nos lábios da minha amiga. - Éramos duas crianças sim... Mas não estávamos imunes daquele amor por aquele ser que nos envolvia. Eu estava feliz e Tom também estava... Com o feto ainda em crescimento, e eu com os hormônios em alta, nós dormimos algumas vezes juntos depois da primeira vez – olhei diretamente em seus olhos. - Aquilo tudo me fazia tão bem... Era, depois de Tom, a única coisa que eu senti ser real na minha vida, entende? 
- Você... Estava apaixonada por ele? – Anne hesitou um pouco antes de perguntar. Sorri em meio às poucas lágrimas.
- Não Anne... Eu achava que estava, mas nunca passou de um grande afeto. Naquele tempo eu era incapaz de sentir algo por alguém, senão por aquele ser que carregava no ventre, e ainda sim, não sabia como transmitir isso – me puni de certa forma. - Ficamos juntos algum tempo e ele teve que voltar, tinha uma vida para dar continuidade também, e apesar de não parecer, ele batalhava mais do que eu um dia sonhei em fazer pra ter tudo aquilo que ele sempre almejou. 
“Ninguém ainda sabia de nós, apenas Simone e meu pai. No tempo em que ele ficou fora eu piorei, me senti perdida novamente e com um imenso medo de ter que agüentar tudo sozinha. Eu era muito egoísta Anne... Mas meu subconsciente tinha razão. Tom mudou completamente, estava em turnê com a banda e me ignorou o máximo que pôde: não atendia minhas ligações, não respondia meus emails, não respondia minha procura, e quando estabelecia contato nós discutíamos. Ele me chamava de obsessiva, me acusava de querer controlá-lo, dizia que estava de saco cheio de tudo aquilo... Exatamente como fez hoje - fechei os olhos e deixei que o líquido caísse sobre meu rosto, e quando os abri, encontrei um par de olhos preocupados me fitando. 
“E eu voltei a cair na real e a me sentir um lixo, sozinha, desprezada e feia... Eu estava me sentindo feia, e meus pensamentos começando a achar que tudo aquilo havia passado dos limites – parei, tentando engolir parte do choro que se aglomerava em minha garganta. - Tom voltou e agiu rispidamente comigo, deixando transparecer nitidamente a sua falta de paciência... E... Eu não tinha apoio nenhum, não podia contar com meu pai, não tinha uma mãe que me instruísse, não poderia contar a verdade aos meus amigos por enquanto, e a única pessoa que eu julgava ser diferente estava agindo como um completo idiota... – mordi os lábios com força e encarei o vazio.
“Depois de várias discussões, decidimos que eu ficaria na Alemanha por um tempo – respirei fundo. - Naquele final de semana, iríamos contar toda a verdade para a família dele. Tínhamos uma festa para ir, eu queria me despedir de todos, mas Tom não demonstrava vontade nenhuma de comparecer. Eu insisti muito, e ele, contra gosto, acabou cedendo, mas sua cara amarrada e seu tédio declarado por estar ali não passaram durante toda a festa, e em um momento ele me deixou sozinha - fechei os olhos com força outra vez e enxuguei parte das lágrimas com a manga do pijama.
“Apesar de estar rodeada de pessoas que eu acreditava que fossem boas, eu queria que ele também estivesse feliz, mas acho que Tom havia percebido que aquilo ali não era felicidade há muito tempo. Sozinha, aceitei tudo que me ofereciam: drogas leves e pesadas, bebidas, porcarias... Eu queria me lembrar pela última vez daquilo, queria esquecer só por um momento que meu mundo e minha vida mudariam completamente dali por diante, e principalmente, queria me esquecer de que eu provavelmente estaria sozinha nisso – deixei as lágrimas crescerem e senti Anne segurar minha mão como forma de consolo. Sorri fracamente e ela retribuiu. 
“Os efeitos daquilo que eu havia ingerido não tardaram a chegar, e eu comecei a sentir dores terríveis. Procurei por Tom em todos os cantos daquela mansão, e o encontrei... – puxei o ar com força. - Ele estava muito ocupado comendo qualquer vadia de lá, em um sofá escondido em uma sala qualquer, o que eu poderia fazer? Acabar com a diversão dele e sofrer mais ainda pela sua fúria e indiferença? – questionei, e Anne balançou a cabeça negativamente, com certo desprezo. – Voltei pra casa sozinha, e ao chegar ao apartamento, mandei uma mensagem avisando que o havia procurado e que o havia visto e que estava passando mal, e que assim que ele terminasse seu serviço, que viesse até em casa... Foi aí que eu fiz a pior burrice da minha vida, algo que eu carrego comigo por todos os meus dias... Eu bebi tudo que havia por lá, e não era pouca coisa. Alguns amigos antigos estavam guardando lá varias bebidas para a próxima festa... Bebi por estar cansada de tudo. Eu queria minha vida de volta, queria aquela ilusão do perfeito pra mim novamente, queria meus amigos, queria a amizade de Tom que me fazia bem, e não essa que estava me auto destruindo... Queria meu corpo de volta ao normal, queria tudo, tudo, menos estar naquela situação, e o pior, sem apoio nenhum... Eu tinha só quinze anos, não tinha suporte emocional nenhum pra passar por aquilo, e completamente transtornada eu fiz essa besteira... Tempos depois, as dores que eu sentia no inicio só pioraram. Eu tentei pedir ajuda, mas estava bêbada demais pra isso. Algumas vezes o celular de Tom chamou, mas bastavam dois toques pra que ele desligasse... E eu fui fraca e desisti, desisti de tudo... - tapei meu rosto com as mãos e desabei. Anne se aproximou e me envolveu em seus braços, emocionada.
- Tudo bem Rach, não precisa continuar se não quiser – sugeriu, mas eu neguei.
- Eu... - limpei meu rosto com a palma da minha mão. - Só acordei dois dias depois e descobri que estive em coma alcoólico e que eu havia perdido o bebê... Eu matei aquela criança, Anne... Eu... – tampei fortemente meu rosto e solucei auto, sentindo aquela enorme dor tomar conta de mim novamente. Anne apertou mais o abraço e eu me permiti chorar por um tempo.
- Quando eu acordei, Tom estava lá... No momento que nos encaramos não foi dito nada, nenhuma palavra. Apenas um pedido mudo de desculpas por ambas as partes que estavam tristes, mutiladas por dentro e carregando consigo uma enorme culpa por tudo. Nós dois sabíamos o quão inconseqüentes havíamos sido durante todo o tempo, e não cabia a ninguém nos julgar, pois já estávamos fazendo isso... – desfiz nosso abraço, e meio embargada pelo choro, prossegui. Precisava falar tudo.
“Decidimos que eu iria para a Alemanha. Eu precisava sair dali, de tudo que me fazia mal, das amizades, dos vícios... Eu precisava recomeçar, e Tom prometeu ficar ao meu lado... Mudei-me pra casa da minha avó que me acolheu e me ajudou muito... Durante muito tempo, eu e Tom nos consolamos um ao outro, ficamos juntos, guardando esse segredo... E tentando esquecer por mais difícil que fosse... Daí em diante você já sabe... Tornamo-nos o que somos hoje: amigos, irmãos, companheiros... Bom, pelo menos até agora à tarde, quando ele pôs tudo a perder... – fechei os olhos e respirei fundo, sentindo que havia descarregado várias toneladas das minhas costas. - Depois você apareceu e tornou tudo tão fácil, tão simples, tão feliz... Desde o começo, pra mim, nossa amizade foi verdadeira, como a tempos eu não sentia... Jamais me perdoaria se algum dia te magoasse – olhei ternamente para Anne, que me envolveu em um abraço que conseguiu amenizar um pouco do sofrimento que eu sentia.
- Eu... Eu não sei nem o que falar - Anne disse em um tom de voz mais baixo, suave. – Eu só quero que você saiba que eu nunca... Nunca vou te abandonar como fiz hoje... Desculpa Rach... Você precisa saber que sempre poderá contar comigo... Pra tudo – sorriu, deixando as lágrimas escorrerem livremente pelo seu rosto, e ternamente secou as minhas com as mãos. Abracei-a novamente e me permitir chorar mais uma vez, só que agora, sabendo que eu havia com quem contar e que eu não estava sozinha, e mesmo que me doesse demais admitir, agora eu só tinha a ela. Tom não fazia mais parte da minha vida como antes. Não por enquanto. 

Contei a Anne o motivo da minha discussão com Tom, e ela não pôde conter certa felicidade logo após eu admitir que ela tinha razão sobre Kristen, mas naquele momento, isso não me importava mais. Iria cuidar mais de mim e da minha vida, tanto pessoal como profissional, isso sim valia a pena. Anne prometeu me fazer companhia pelo resto da noite, pelo menos até meu corpo não agüentar mais e ceder à pressão do cansaço. Sua presença me divertiu, e por mais incrível que possa parecer, me fez esquecer a turbulência por algumas horas.

O vento forte devido à altura levava meus cabelos soltos pra trás com certa violência, mas eu não estava nem ligando. No céu reinava o nosso astro rei em toda a sua magnitude, e sentir o rosto aquecido por ele fazia qualquer outro fenômeno ficar insignificante. Era sábado de manhã, e após muita insistência de Jen, eu havia levantado e feito alguma refeição, e ainda sob suas ordens, resolvi acatá-las e subir até o terraço para tomar um pouco de sol e pensar, tranqüilizar meus pensamentos, e só assim, quando estivesse tudo em ordem, tomar alguma providência.
- Sabe, eu prefiro a paisagem da noite... Sei lá, todas aquelas luzes fazem tudo parecer mágico - baixei a cabeça e sorri tímida ao reconhecer o portador daquela voz. Bill se aproximou mais e apoiou os braços no parapeito do muro de vidro do terraço, ficando assim ao meu lado. Ficamos alguns minutos em silêncio, olhando para o horizonte, onde as águas daquele rio estavam agitadas, devido ao forte vento. Tomei coragem e, lentamente, encarei seu rosto. A beleza de Bill era algo que impressionava, e ali naquele momento, ele se mostrava tão sereno, tão encantador... Sua presença transmitia paz. Ele demorou algum tempo até deixar os seus olhos pousarem nos meus, e quando o fez, senti uma sensação de bem estar tomar conta de mim. 
- Com você está? – perguntou em tom de voz baixo, delicado, carinhoso. Voltei a olhar pra frente e Bill me acompanhou. Eu sabia que se não quisesse falar nada, ele não forçaria e continuaria ali me fazendo companhia. Mas Bill tem me feito tão bem que eu seria incapaz de chateá-lo.
- Digamos que eu esteja... Melhor – sorri fraco.
- Ufa... Pensei que fosse ouvir algo do tipo “estava pensando em me atirar daqui, mas você chegou e estragou tudo” – falou divertido, e eu não pude conter uma pequena risada. - Isso aí Bill, você a fez rir, bom garoto! – comemorou divertido, batendo palmas como uma criança feliz. – Acho que você merece uma recompensa, Bill... Eu quero recompensa, Rachel! – ele me olhou, fazendo um bico com os lábios extremamente infantil. Soltei uma gargalhada e Bill me acompanhou. 
- Bobo – rebati, e ele balançou a cabeça negativamente.
- Só quando eu quero te fazer sorrir – respondeu sério, me olhando por um tempo. Fiquei em silêncio, apenas aproveitando aquele momento. 
- Como ele está? – perguntei após alguns segundos, me limitando a deixar a pergunta nessa proporção. 
- Bem pior do que já o vi... Passou a noite em claro... Saiu apenas pela manhã com Scott – respondeu simplesmente, soltando um longo suspiro e uma pequena quantidade de fumaça saiu de sua boca. – Rach... Tom me contou tudo... – olhei para Bill nesse instante e arqueei a sobrancelha direita, demonstrando o meu interesse em que ele continuasse falando. – Eu devo admitir que já desconfiava – Bill soltou um pequeno riso nasalado. – Conhecendo meu irmão como conheço, sempre achei meio impossível ele manter esse tipo de amizade com uma mulher sem ter alguma coisa a mais envolvida – justificou. Voltei minha atenção para minhas mãos apoiadas sobre o parapeito de vidro. 
- Você não ficou chateado com isso... Sabe, de o Tom ter escondido algo assim? – perguntei voltando a olhá-lo, e Bill deixou um sorriso escapar pelo canto dos perfeitos lábios. 
- Não... Apesar de vivermos quase vinte e dois anos juntos, sempre achamos importante a nossa individualidade dentro do possível. O fato de Tom ter guardado esse segredo fez isso valer, e de qualquer forma, eu não poderia ajudar muito se soubesse - deu de ombros, e retirou do grande sobretudo preto um cigarro e seu isqueiro, acendendo aquele, e logo após uma tragada ,voltou sua atenção para o horizonte novamente. – Eu admiro vocês dois... – deu outra tragada e continuou. – Ter passado por tudo isso ainda tão jovens, e mesmo assim, superar, guardar algo desse tipo por anos, e ainda assim, manter essa relação intacta e a cada dia mais forte... Me fez passar a noite pensando nisso e de certa forma tomando como exemplo. 
- A cada dia mais forte... – repeti as últimas palavras de sua frase sorrindo fraco e negando delicadamente com a cabeça. Suas palavras eram de alguma forma, bonitas, mas ao ouvir o fim, senti que algo ali permanecia errado. Algo ali agora era errado. 
- Rachel, vocês precisam conversar com calma e de cabeça fria, isso está errado - deu a última tragada no cigarro e deixou as sobras serem levadas com o vento, virando seu corpo em minha direção. Neguei veemente com a cabeça e voltei a olhá-lo. Bill sabia que aquilo era certo, eu sabia que aquilo era certo, mas nem sempre o fazemos. No momento, eu e Tom estávamos longe de tomarmos atitudes maduras. 
- Tom está certo, Bill. Eu e ele precisamos mesmo de um tempo. Algumas coisas foram ditas e às vezes as palavras machucam mais do que qualquer contado físico... Ele precisa criar a própria vida e eu a minha. Um dia, quem sabe, as coisas voltem ao normal – respondi, abraçando meu corpo e fechando assim meu grande casaco por cima do pijama. Agora era Bill quem rejeitava as minhas palavras. 
- Rachel, quando discutimos por bobeira, falamos sem pensar, maltratamos sem perceber, fazemos sem saber... E... E nos arrependermos é sinal de que estamos evoluindo para amadurecer – Bill disse, e eu, logo após assimilar o que tinha ouvido, sorri. Não imaginava que estaria sendo consolada por alguém que eu há pouco tempo atrás consolei. – Eu sei o que estou dizendo, você acaba se surpreendendo ao perceber o quanto pode suportar – sorriu ternamente.
- Acho que maturidade foi o que sempre nos faltou, Bill - percebendo que seria inútil persistir, suspirou derrotado e olhou a frente novamente.
- Tom também me contou o motivo da discussão - rapidamente olhei em sua direção e senti um pouco de medo. Ser chamada de mentirosa novamente não seria nada agradável. 
- E? – perguntei ansiosa 
- Você sabe que eu adoro a Kristen – bufei frustrada, mas Bill pareceu nem ligar. – Mas você também sabe o quanto eu já confio em você, e sei que não inventaria algo assim e nem procuraria Tom para conversar se não tivesse certeza de tudo – sorri aliviada e Bill continuou com a sua expressão serena que combinava perfeitamente com o seu cabelo bagunçado pela ventania e a sua pele claramente limpa. – Contei tudo ao Jost antes de vir aqui e exigi que colocasse alguém pra investigá-la tanto seu passado como para seguí-la. Se descobrirmos provas, será mais fácil de fazer Tom enxergar a realidade e, por mais apaixonado que ele esteja, não vai querer passar por enganado – nesse momento, senti uma emoção inexplicável tomar conta de mim. Me emocionava o fato de que alguém estava do meu lado e acreditava em mim.
- E o Tom não acreditou em mim depois de quase dez anos... E olha só você aqui... – soltei parte do meu pensamento em voz baixa e não pude mais controlar as poucas lágrimas que insistiam em cair. Meu estado sensível misturado com o início da TPM me deixavam uma boba chorona. 
- Estamos cansados de saber que o Tom é um idiota... Ah não, vem cá, odeio ver mulher chorando – Bill se aproximou e abriu os braços oferecendo seu abraço e seu melhor sorriso. Sem pensar duas vezes, afundei meu rosto próximo ao seu pescoço cheiroso e fechei os olhos.
- Seu molenga – sorri fraco, apertando mais o corpo dele contra mim e deixando Bill fazer o mesmo. Ele sorriu e depositou um demorado beijo em minha cabeça, acariciando os longos fios do meu cabelo por um tempo. Foi uma sensação única, gostosa, e que depois de horas parecia ser o remédio e a cura para todos os meus problemas. Sua presença me fazia bem, isso era fato, e Bill só fazia diminuir o medo que eu sentia. Se antes eu temia estar sozinha, Bill e Anne vieram para me provar o contrário, me fazendo ter (embora fosse só um pouco) a certeza de que tudo voltaria ao seu lugar bem antes do que eu imaginava.


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Notas finais do capítulo

E então? Sério gente, quero comentários super sinceros e críticas também, já disse que não me agradou muito, e quero saber de vocês, se quiserem me mandar parar, a vontade também :P
Beiijos lindas, até logo!



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