O chão onde caira estava gelado devido a terra molhada, minhas roupas se umedeciam com o contato. Acima de mim a lua estava brilhando em seu auge, cheia e grande de modo que se podia ver todas as suas imperfeições. Greyback, em sua forma de lobisomem, uivava preso em uma árvore implorando por liberdade de suas correntes, ele sentia o cheiro da minha dor e aquilo o deixava louco, mas os comensais que formavam um circulo a minha volta só o soltariam quando ele revertesse a sua forma humana pela manhã, afinal ele não era conhecido pelo seu autocontrole e só estava ali para me amedrontar e nada mais.

Mais uma risada estridente de Bellatrix e a dor tomou conta de meu corpo novamente, como milhares de adagas entrando por minha pele e a cortando por dentro, meu rosto bateu contra o solo quando eu tentei inutilmente me levantar  e ali em minha semi consciência eu o vi pela primeira vez naquela noite, ele me observava sem piscar, seu rosto era como uma mascara sem sentimentos, como se eu não representasse nada para ele e provavelmente era isso que eu realmente significava, nada. Mas mesmo depois de toda dor que ele me fizera passar nesse maldito ano, isso que estava fazendo agora me surpreendia, era incrível sua capacidade de me machucar e de não demonstrar remorso, essa era sem duvida a pior das dores:  humilhação, saber que nada significo para ele.

-Acabe logo com isso, Bellatrix, o Lord das trevas não tem tempo a perder . – Ele disse indiferente sem desviar os olhos do meu corpo caído.

Ele havia desistido de lutar por mim, ou melhor, nunca lutara, então por que eu lutei por ele? Ele não tentou impedir que Bellatrix me torturasse em momento algum, pelo contrario, mesmo antes de ter sido capturada ele mesmo fizera o trabalho com suas próprias mãos, então por que eu havia perdoado-o antes? Ele não merecia perdão e eu sabia disso desde o momento que o vira, talvez meu lado masoquista falasse mais alto, talvez o simples fato de ser proibido me excitasse, talvez eu realmente gostasse dele por mais que isso me machucasse. Agora ele pedia aquela mulher que parasse de me torturar, parasse de fazer o trabalho que ele gostava tanto  porque ele não agüentava me ver sofrendo de outro modo que não fosse por suas mãos, maldita egoísta. Como eu me amaldiçôo por ter começado tudo isso, por ter corrido atrás dele mesmo depois de toda dor, toda humilhação, tudo que ele me fizera passar.

A mulher o olhou com ódio e desaprovação, mas se virou e se afastou do circulo dando as costas para o meu corpo e foi se divertir provocando o lobisomem acorrentado, mas antes que pudesse se afastar o suficiente para não ser ouvida ela gritou com acidez para o homem:

-Se quer algo bem feito faça você mesmo, não è mesmo, Snape?Se foz capaz, é claro.

Então Severus se virou para mim e eu pude ver algo que a mascara de indiferença tentava esconder, algo que não deveria estar ali, não depois de tudo, eu vi amor, ou talvez eu só quisesse transformar piedade em amor porque eu queria que fosse verdade. Eu, caída sobre a lua cheia, na terra molhada, suja, frágil, indefesa, desarrumada, sem nenhum poder ou autoconfiança, sem tudo o que ele sempre amou em mim e mesmo assim ele hesitou, mesmo assim ele perdeu o controle sobre a mascara em seu rosto e me mostrou algum sentimento mesmo que eu não soubesse ao certo qual era e eu quis acreditar que tudo o que ele fizera fora para tentar evitar aquele momento inevitável . Ele parecia não ser capaz de me matar naquele momento. Mas talvez eu estivesse errada.

-Severus, por favor. -Tentei falar, mas meu corpo todo doia devido as longas horas de tortura.

Ele não me deu uma chance de falar, levou a varinha em direção ao meu corpo caído em posição fetal e me amaldiçoou antes mesmo que eu pudesse me despedir.  Ele não se importava de verdade. A culpa de tudo aquilo estar acontecendo era minha, segundo ele, ele tinha sua consciência limpa e eu tinha meu corpo sujo de todas as maneiras possíveis,  ele finalmente havia conseguido acabar com o nosso relacionamento para sempre, pois o que ele não conseguia evitar ele destruía, e eu sabia disso, o que me fazia uma pessoa auto destrutiva por correr atrás dele.

-Avada Kedavra. – ele tirou a vida de meu corpo do mesmo modo que ele a havia devolvido a muito tempo atrás,  fazia tanto tempo e as imagens iam embora como se tudo fosse se perdendo, como se eu estivesse sendo levada para outro mundo, mas eu ainda lembrava, quando eu havia desistido da vida por orgulho ele me salvara, pois eu sabia que ele faria e foi assim que tudo começou.

Disso eu me lembro e preciso me ater a essas lembranças enquanto aos poucos tudo esta se perdendo a minha volta.

Continua...