Sorrisos de Guache escrita por IsaS


Capítulo 3
CAPÍTULO 2º




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CAPÍTULO 2º

 

         Eu não conseguia me ver de roupas sociais. Talvez porque minha vida sempre fora jeans, jeans e mais jeans. Eu adorava. E por isso, escolhi, no final das contas, um jeans claro. Calcei um all star que nunca havia usado – mesmo tendo-o comprado há um tempo – e coloquei minha jaqueta de couro por cima da camiseta dos The Killers. Prendi meu cabelo castanho num rabo de cavalo e peguei minha mochila. Olhei para minha cama pela ultima vez, e pensei num adeus, meio melancólico, mas no todo, firme. Caminhei pelas ruas de Londres e peguei um ônibus, descendo quase em frente a minha cafeteria. Pelo vidro, constatei que havia acabado de ser aberta, enfiei as mãos no bolso da jaqueta.

         As placas com o nome Rock’s Coffee Paradise brilhavam dentro e fora da loja. Quando entrei, o sininho da porta fez seu habitual barulho, e percebi que isso me fazia falta. Olhei a paisagem: mesas distribuídas por todos os lugares do imenso salão com piso de madeira escura e brilhante, algumas poltronas com mesinhas e abajures decoravam a cafeteria, de tons de marrom e patéis. No balcão, além das revistas e jornais que vendíamos, os doces e cupcakes pareciam brilhar de tão deliciosos, assim como os bolos, os brownies, os muffins e afins. Caminhei lentamente até o balcão. A loja ainda estava consideravelmente vazia, sem música, e sem nenhuma atendente. Não poderia culpá-las por serem incompetentes, afinal, um chefe que ficava uma semana inteira sem ir ao serviço não era um chefe lá muito responsável.

 

– Srta. Swan! – Jessica se surpreendeu. Sorriu simpática, como sempre. Ela tinha cabelos enrolados e escuros, tinha estatura tão baixa quanto Alice, e quase sorri com sua lembrança. – É um prazer tê-la da volta. – eu lhe sorri. – Mas acabamos de abrir...

 

– Eu sei, eu sei. E onde estam as meninas? – coloquei um avental marrom com o nome da cafeteria.

 

– Angela e Lauren estam arrumando tudo lá dentro. – respondeu.

 

– Claro, claro. – assenti. – Por que não coloca um jazz, hm?!

 

         Ela sorriu e ligou o rádio que havia ao lado das máquinas de café, fazendo com que o som envolvente do jazz saísse pelas caixas do som espalhadas pela cafeteria.

 

– Bem melhor... – sorri e ela concordou.

 

– Srta. Bella! – Angela me cumprimentou. Era mais alta que Jessica, possuía uma pele morena clara e os cabelos levemente ondulados, combinando com seus olhos castanhos. – Que bom que está de volta.

 

– Depois de acabar com duas garrafas de vinho do Porto, tinha que estar em pé hoje. – sorri. – Podem limpar as mesas, por favor?!

 

– Claro. – respondeu Lauren, querendo puxar o saco, e Angela apenas sorriu e acompanhou-a. Lauren era loira, de olhos verdes e pele clara, quase da mesma estatura de Angela, e eu não era muito fã dela. Mas não me permitia ser fã de ninguém que trabalhasse para mim. Minha visão periférica captou um cliente se aproximando. Era um senhor loiro e muito bonito, por sinal. Tinha olhos azuis e pele alva, alto e parecia um romântico de décadas atrás. Ele se aproximou do balcão e sorriu, quase babei. Parecia ter saído de “Dançando na Chuva”.

 

– Bom dia. – cumprimentei-o educadamente. – O que vai ser hoje, senhor?

 

– Conseguiu beber as duas garrafas de vinho do Porto ontem, e ainda estar de pé hoje, Bella?! – reconheci a voz de Alice. Passei a mão na cara corada e olhei-a quicar ao lado do senhor. – Você faz milagres.

 

– Desculpe-me por isso. – pedi ao homem, olhando-a incrédula. Se estivesse sozinha com ela, viraria as costas e ignoraria, fingindo não conhecer. Mas era falta de educação com o cliente.

 

– Eu que peço. – ele abraçou a menina. – Minha filha é assim mesmo pela manhã.

 

         Senti meus olhos se abrirem mais e minha cara arder mais ainda. Quer dizer que era só eu pisar no café que acontecia algo para me constranger? E pior de tudo, com Alice no meio?! Ê vida injusta, viu! Suspirei, reprimindo meu medo de gente e a vontade de sair correndo dali, sem rumo.

 

– Papai, lhe apresento Isabella Swan. – peguei sua mão macia que estava estendida, cumprimentando-o. – Ela estudou comigo, e bom, hoje é dona desse império.

         Ela falava com orgulho, e eu apenas os olhava. Eram tão lindo juntos, tão bonitos, tão gloriosos, e pareciam tão felizes que chegava a me machucar.

 

– Não é um império, Alice. – repreendi-a.

 

Ainda não. – constatou, se auto-afirmando.

 

– Aham, - senta lá, tive vontade de dizer, mas o pai dela estava do lado e ia ficar meio chato. – o que vão querer hoje?

 

– Um café puro e, - ele olhou para Alice, que perto dele, parecia uma criança. – um chocolate quente.

 

Desnatado! – acrescentou ela sorrindo.

 

– Sentem-se. Já levo os pedidos. – pedi, e logo eles estavam acomodados numa mesa num canto afastado. Eu os observei conversar de longe, seus sorrisos e as risadas discretas do pai de Alice, e percebi que não sabia o nome daquele senhor.

 

         Comecei a fazer o café, enquanto continuava atenta ao que acontecia em minha volta. Ouvi Jessica atendendo outro cliente, ouvi Angela conversando com Lauren dentro da cozinha, e ouvi meu coração despedaçado, um pouco mais baixo e isso me lembrou da dor que sempre sentia, o que significava que estava atenta demais. Cautelosa, voltei para o mundo real, preferindo escutar a conversa das meninas na cozinha.

 

– Ora, Angela! Deixe de ser tão bobona! – escarneceu Lauren. – Se Bella tem dinheiro para comprar não sei quantos vinhos do Porto, tem dinheiro para nos pagar mais!

 

– Ela nos paga muito bem, Lauren! – defendeu-me Angela. – Melhor do que qualquer restaurante luxuoso paga a um faxineiro. – funguei orgulhosa de minha reputação entre os funcionários, considerando que eu ao menos construíra uma relação estável com eles. Também me considerava uma funcionária, afinal, além de dona, eu era a gerente, uma das atendentes, ajudava a limpar o chão no final de expediente... Coloquei o café na xícara.

 

– Pare de defendê-la, Angela. Um restaurante italiano de quinta paga melhor que ela!

         Bufei e segui resignada para a cozinha. Normalmente, eu não teria disposição para discutir, mas aquilo já estava me incomodando demais, e pior, estava me ofendendo, e eu nunca fui de ficar calada para desaforo dos outros. De alguma forma, a velha Isabella despertou-se em mim, e quando vi, já estava sendo encarada pelas duas atendentes.

 

– Então trabalhe em um deles, Lauren. – vi a pele clara da garota ficar mais branca ainda, seus olhos quase saltaram da cara. – Eu poderia pagar alguém para ser o gerente, ou contratar mais funcionários... Mas gosto do que faço, e se você não está feliz, e não está fazendo sua função direito, pode sair e correr para o restaurante de quinta, que você tanto adora. Angela, – ela piscou, ainda assustada. – Lembra aquelas suas primas que você disse que estava precisando de um emprego. Eram duas, não é?!

 

– Sim, claro. – ela sorriu, ainda rígida.

 

– Traga-as aqui. – pedi. – O movimento têm aumentado e precisamos de mais funcionários, já que Lauren vai sair. – sorri satisfeita e saí, pronta para entregar o pedido de Alice. Senti o gosto do sarcasmo em meus lábios, e os mordi para não sorrir com a resposta que havia dado àquela ingrata.

 

         Cheguei perto da mesa com a bandeja e esperei que eles me notassem. Riam felizes de alguma piada que Alice provavelmente contou. Ela me olhou e sorriu satisfeita, tentei corresponde-la, mas meu sorriso me parecia mais uma careta. Coloquei os pedidos na mesa e já estava pronta para sair.

 

– Por que não se senta com a gente? – perguntou o homem.

 

– Preciso trabalhar. – retorci o rosto, fingindo desgosto. Queria ficar longe daquela áurea de felicidade que os cobria. Eu parecia não fazer parte daquele mundo quando a rompia.

 

– Pode tirar um momentinho para mim... – Alice piscou os olhos sonhadores. Parecia uma criança, e revirei os meus ao sentar-se ao seu lado, com a bandeja no colo. – Linda! – ela me beijou no rosto.

 

– Não me apresentei direito, Bella. – o homem sorriu. – Sou Carlisle Cullen. Trabalho no Hospital Geral de Londres.

 

– É um prazer, Dr. Cullen. – reafirmei.

 

– O prazer é todo meu. – ele olhou o espaço em volta. – Puxa, nunca estive aqui, mas vou passar a freqüentar. É um ótimo lugar, e só de pensar que criou isso tudo sozinha...

 

– Obrigada. – respondi sem jeito. – Sempre será bem vindo, Dr.Cullen.

 

– Apenas Carlisle. – ele sorriu, e senti meu rosto quente. – Vou indicar esse lugar aos meus colegas de trabalho. O café é realmente espetacular!

 

– Seria ótimo. – assenti sorrindo.

 

– Pai, Bella poderia passar um final de semana lá em casa, não poderia?! – os olhos de Alice brilhavam enquanto eu tentava repreendê-la.

 

– Se ela concordar... – ele me sorriu. – Seria muito bem vinda em minha casa, Bella. Esme, minha mulher, iria adorar te conhecer. Ontem Alice não parava de falar em você.

 

– Bom, - passei a mão na nuca enquanto via o movimento da cafeteria aumentar. – eu não sei. – Vi o olhar pidão de Alice e sorri. – Acho que vai ser um incômodo, sem falar que estou trabalhando no fim de semana. É quando temos mais movimento.

 

– Bella! Economize-me, você é a dona! – Alice se enfureceu e eu reprimi um sorriso.

 

– Eu sei. E por isso mesmo, tenho responsabilidades. – sorri amarelo enquanto ela apertava os olhos para mim.

 

– Estou me sentindo traída! – reclamou.

 

– Agora me economize você, Alice! Deixe de ser exagerada! – agora nós duas estávamos furiosas, uma com a outra.

 

– Ta bem, meninas. Vamos parar com isso! – Carlisle chamou nossa atenção, com um meio sorriso. – Bella, se você puder, ligue. Será um prazer.

 

– Eu vou te atentar a semana inteira! – Alice era bipolar, só podia. Ainda agora estava brava, e depois, já estava sorrindo de novo. Mas como eu era cabeça dura, apenas franzi os lábios.

 

– Considerando que hoje é segunda-feira, posso me suicidar até o fim de semana. Suas ligações só vão me incentivar mais a isso. – ela me mostrou a língua e sorriu, assim como a pai.

 

– Temos que ir. – disse Carlisle depois de olhar o relógio caro no pulso direito. – Até mais Bella. E pense sobre o final de semana. Vai ser bom termos companhia.

         Assenti, e com certeza, corei também. Alice saltou em cima de mim e eu a abracei. Sim, eu tinha agora duas pessoas na minha vida: Branca e Alice, isso era confirmado.

 

 

         Fiz força durante a semana toda para lutar contra o calor da cama. Acordava e saltava para o chuveiro, com água bem fria. Vestia-me e passava reto á cama que sempre me prendia. Na quarta-feira pensava que já não agüentava mais e me senti verdadeiramente hipócrita por ter falado tudo àquilo a Lauren, sobre gostar do que eu fazia, como se eu o fizesse muito.

Disseram-me que iria ser difícil, e realmente estava sendo. Disseram-me que eu iria retornar ás atividades aos poucos, mas a cama me atraía cada dia mais, e a cada minuto eu tinha certeza de que não iria conseguir. Na quinta-feira, não levantei. Liguei para Angela e a nomeei, por telefone, gerente. Alguém teria de fazer o trabalho por mim. Dei-lhes as coordenadas e garanti que estava tudo bem suas primas trabalharem, desde que me mandassem o currículo delas por e-mail. Garanti que seria recompensada, mas como eu imaginei que faria, ela recusou.

         Enrolei-me no edredom macio e fiquei ali, de olhos fechados até não saber mais se era quinta , sexta, sábado ou domingo. Eu ouvia o telefone tocar, mas não tinha forças para pegá-lo, e mais uma vez, Anabelle, minha tão querida cama, me acolheu.  

 



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Notas finais do capítulo

Não consegui esperar até amanhã!