Anjo da Noite escrita por MsWritter


Capítulo 30
Capítulo 30. Desmoronamento (ruptura)


Notas iniciais do capítulo

Hey hey! Rstava com saudades de vocês!Sinto muito pela demora, mas a vida anda uma grande confusão. Texto não betado, então perdoem-me os erros. Por favor, me avisem se encontrarem algum. Aviso: o capítulo está meio emo, mas é necessário. E esse é todinho do Vlad!A música de hoje é "O mundo é um moinho" do Cartola. Não resisti. Espero que gostem!



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Ainda é cedo amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora da partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Preste atenção querida
Embora saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és

“– SE VOCÊ NÃO SOLTAR ISSO AGORA VAI FICAR SEM JANTAR POR UM MÊS! SOLTE JÁ! AGORA! É UMA ORDEM!

– Minha cara, o que isto significa afinal? – Vlad perguntou, perplexo, observando sua noiva brigando com o cachorro por um pedaço de couro.

– Ele roubou! Mas é meu! – Doamnei respondeu do chão, tentando puxar o objeto com mais força que o cão negro. O animal reagiu, puxando com mais força e a fazendo a jovem se desequilibrar e cair para a frente.

– Doamnei, minha bela e delicada noiva. Está realmente discutindo com um cachorro?

Os olhos azuis de Doamnei se arregalaram naquele momento, travados em algum ponto imaginário do espaço sideral. Soltou o pedaço de couro por instinto. Na súbita falta de uma força contrária a sua, o cão acabou perdendo o equilíbrio e saiu rolando até atingir a parede.

A loira fechou, então, os olhos com força, tomando coragem para o que ia dizer. Não havia percebido seu noivo adentrar o salão, e certamente não desejava que ele a visse naquela situação tão... incomum.

– Eu... eu... não estava discutindo com um cachorro... é que ele...

– Então não ameaçou tirar o jantar dele durante um mês se...

– ELE QUE COMEÇOU TÁ! Foi ele quem roubou o meu. – Doamnei se calou imediatamente, como que se impedindo de dizer mais alguma coisa.

– O seu? – Vlad perguntou, exigindo uma resposta. No fundo estava se divertindo com a situação.

–Com o meu... com o meu presente para o senhor, Alteza. – Doamnei respondeu tão baixo e com tanta vergonha que Vlad quase não a ouviu.

– Doamnei, levante-se.

A moça o fez devagar, sem coragem de encarar os olhos de seu noivo.

– Peço perdão pelo meu comportamento, meu senhor. Na euforia do momento creio que tenha me excedido...

Vlad passou uma mecha falsamente cacheada dos cabelos claros de Doamnei para trás da orelha da moça, observando como seus olhos azuis ficavam mais escuros quando ela estava triste.

– O que fez para mim?

Doamnei pareceu sentir mais confiança depois da pergunta, mas ainda não tinha coragem de olhar Vlad nos olhos. Começou a procurar o artefato pelo chão, apenas para encontrar o mesmo cachorro mastigando-o. Por um instante, Vlad pensou que ela ia tentar recuperar o objeto outra vez, mas ela se conteve.

O príncipe resolveu tomar as rédeas da situação, chamando o cão pelo nome e lhe direcionando um olhar tão severo que seus olhos amarelos chegaram a faiscar.

O animal só não trouxe a peça de couro até seu mestre porque não teve coragem de se aproximar, chegando a empurrá-la com o focinho, antes de sair correndo porta a fora.

Doamnei olhou do objeto abandonado no chão para seu noivo umas cinco vezes, até se conformar com o fato de que ela não sabia como ele fazia aquilo e nunca iria entender. Foi buscar o couro mastigado, tentando limpá-lo com uma ponta do vestido.

– Estava costurando uma bolsa para prender na cela do cavalo, meu senhor.

– Uma bolsa? Doamnei...

– Para carregar seus livros meu senhor! E quem sabe...

– Quem sabe? – Vlad perguntou preocupado, estranhando o silêncio repentino da noiva impulsiva, que minutos atrás estava se arrastando no chão, tentando recuperar um pedaço de couro de um animal quase do seu tamanho.

– Peço-lhe perdão Alteza, em minha ingenuidade e prepotência achei que talvez fosse de vosso interesse carregar alguma lembrança minha em suas viagens...

“Cruzadas” Vlad a corrigiu mentalmente.

Com a mão direita segurou a esquerda da moça, enquanto a outra procurava por alguma coisa num bolso interno da camisa mais fina que usava rente à pele.

Seu olhar fixo no rosto de sua noiva exercia um peso tão grande que ela não teve alternativa a não ser fixar seus olhos azuis dentro dos amarelos, procurando redenção. O que encontrou foi afeto.

– Não seria em uma bolsa, em algo mais próximo ao cavalo que a mim, algo que facilmente seria roubado durante a noite, que eu levaria alguma lembrança sua. Seria perto de mim, na minha própria pele se possível.

Dizendo essas palavras, retirou um pequeno lenço de seda que a noiva havia bordado para o enxoval. Um trabalho tão preciso e delicado que Vlad não havia resistido a tentação de pegar para si. Se a dedicação e cuidado que Doamnei estava dedicando àqueles pequenos pedaços de pano, tão sem valor para o príncipe, eram alguma indicação de o quando ela zelava e se importava com ele, a moça o amava em uma proporção que Vlad não conseguia avaliar. Essa ideia sempre lhe foi reconfortante: alguém lhe esperava em casa. Alguém se importava mais com o fato dele voltar vivo que vitorioso.

Doamnei observou com olhos surpresos o lenço. Primeiro porque realmente não esperava que seu noivo levasse o que quer que fosse com ele durante as batalhas, quanto mais durante sua curta estadia na Valáquia. Segundo, porque não havia notado a falta de um dos lenços de seu enxoval tão vigiado e bem guardado. Como é que Vlad tinha visto aquilo?

– Não se lembra de tê-lo dado a mim? – Vlad perguntou de repente, percebendo a confusão nas feições da noiva. – Percebo que minha curta estada não possui mais o devido valor, então.

O pavor estampado nas feições de sua noiva divertia Vlad de uma forma como ele jamais pensou que seria possível. Depois que ela tentou se justificar por um tempo, Vlad finalmente a tranqüilizou dizendo que era brincadeira e que ele realmente havia pegado sem avisar, desculpando-se por isso. Por algum motivo estranho a ele, o fato dele se desculpar só fez sua noiva mais desesperada que antes. Muito curioso.”

Sua pele era tão clara e que se misturava com os raios de luar refletidos na superfície das águas geladas. Estava escuro, não via o sangue tingindo o lago enegrecido de vermelho, mas sentia o cheiro adentrar a noite, mesmo no frio. Seus sentidos nunca estiveram mais atentos. Ele nunca quis tanto esquecer uma noite como a que ficou gravada mais firmemente em sua alma e sentidos.

O perdão libertava a alma. Ele sabia daquilo. A despedida era triste, mas o fim finalmente determinado era um balsamo para seu coração cansado. O problema é que o veneno ainda estava lá.

Sozinho em seu quarto de hotel, as lembranças ainda o assombravam.

Era passado, estava para trás. Estava perdoado, tinha perdoado. Já tinha se resolvido com o mundo. Mas ainda não tinha se perdoado.

Afinal de contas, quem era ele para macular a santidade e a pureza de uma alma tão bela como a Doamnei?

Quem era ele para tomar para si a vida e a alegria de algo tão puro quanto o amor desprendido que a jovem lhe deu?

Foi essa realização que fez tudo ruir. Sentimentos há muito reprimidos, que finalmente tiveram a oportunidade de escapar explodiram em seu peito e olhos como erupção vulcânica e tempestade. Devastador, desolador, catastrófico. Em meio a puro ódio e ira, de uma forma que seu auto-controle jamais o permitiu mesmo durante as batalhas, atirou o abajur que ficava próximo a cabeceira da cama na parede. O vidro despedaçado ficou espalhado pelo chão e Vlad não sentiu os estilhaços fincarem em seus pés descalços enquanto ele avançava para perto da porta, dando socos diretos, fortes e estúpidos, a carne das juntas de sua mão sendo exposta na mesma proporção em que a madeira nobre da porta maciça cedia. Vlad atacava seu passado, seu destino, sua sorte. Ver a porta ruir seria como abater seu maior inimigo. Mas acontece que seu maior inimigo era ele mesmo. Essa realização veio ao mesmo tempo em que percebeu que jamais conseguiria estilhaçar a porta maciça e pesada apenas com as mãos. Começou a chutar e bater na porta com os ombros, até por fim dar uma cabeçada que arrancou sangue de sua sobrancelha.

Despedaçado física e emocionalmente, foi aos poucos escorregando para o chão, sentando-se no vão entre a parede, agora ensangüentada, e a porta, que apesar de muito danificada, ainda permanecia no lugar. Levou a mão direita aos olhos, tentando limpar a mistura de sangue, lágrimas e suor que se formava ali, nublando sua visão, apenas para perceber que sua mão trêmula e quebrada não permitiria que o gesto fosse eficaz.

Desistindo finalmente de qualquer gesto de auto-preservação, cuidado ou dignidade, puxou os joelhos para perto do peito com a pouca força que ainda mantinha nos braços, em uma macabra imitação de um abraço masoquista que só lhe causava dor, nenhum conforto, apoiando a cabeça ali, no vão formado pelos joelhos, apoiando fortemente os pés cortados no chão, que ainda mantinha os cacos de vidro.

E pela primeira vez chorou não o que foi sua vida, não o que poderia ter sido, mas a morte de Doamnei. O futuro lindo que aquela jovem teria se não fosse ele. Porque Vlad tinha a absoluta certeza de que Domnei era a luz do mundo, e iluminaria quem estivesse ao seu lado, sendo este alguém um príncipe, um general ou um plebeu.

A sinceridade de suas próprias lágrimas abriu as últimas portas de seu coração. Chorou a morte de seu pai, um luto contido em seu peito por tantos anos que tingiram não suas roupas, mas sua alma de negro. Chorou a traição de seu irmão. Chorou o descaso de sua mãe. Chorou a morte tão prematura de sua irmã, que pouco conheceu, mas sabia ser uma das pessoas que mais se importavam com ele. Chorou pelo deus que dele tudo levou e nada deu em troca, pelo qual lutou e morreu. Chorou pela miséria que sentia por si mesmo. Chorou pelo amor torpe, errado e distorcido que sentia por uma mulher cujo coração era tomado por um amor ainda mais torpe que o dele.

E depois, simples assim, seu coração cansou de chorar. Ou não tinha mais forças, ele não sabia ao certo, sabia apenas que a dor havia passado.

Mas a falta da dor não necessariamente traz alegria. Vlad ficou naquele estado quase catatônico por horas ainda, piscando de vez em quando, seus olhos desfocados abertos entre o vão formado pelos seus joelhos e nariz.

Os cacos de sua alma haviam caído. Estava em branco, novo. E vazio. Não tinha porquê levantar-se de onde estava, nem vontade na verdade.

Como se estivesse latente em sua alma, uma voz ao fundo, sabia que teria que se acostumar com seu novo rosto em algum momento, que tinha decisões a tomar, coisas a fazer, mas não tinha forças para tomar o verdadeiro conhecimento de exatamente o que ou quando teria que fazer tudo isso.

Em meio ao vazio que se tornou seus pensamentos, acabou adormecendo onde estava, ensangüentado, encharcado, ferido, trêmulo de frio e dor no inverno romeno... E sozinho.

Não foram as batidas frenéticas na porta que o despertaram, horas depois. Nem foi o barulho que fizeram quando derrubaram a porta já destruída por dentro, nem tampouco foram os passos apressados de funcionários do hotel percorrendo seu quarto. O que de fato o acordou foi um toque gentil, tímido, preocupado e quente de uma mão pequena em seu braço.

Abriu os olhos devagar, sem pressa de saber onde estava ou se ainda estava vivo. Sem necessidade de conhecimento. Sem instinto de sobrevivência.

Aos poucos sua vista nublada foi se focando. Primeiramente se ajustou à claridade do dia que passava pela janela entreaberta. Depois, percebeu as nuances de sombras ao seu redor, até focar nos cabelos vermelhos e armados.

– Ileana... O que...

– Milord. O senhor precisa se levantar e vir comigo para o hospital.

– Eu não...Eu sinto muito se...

– Conde. Não precisa me explicar nada. Mas temos que ir para o hospital. Tem um carro esperando lá embaixo. O senhor consegue se levantar sozinho ou prefere que eu chame alguém?

Vlad tentou se levantar, apenas para descobrir que sua mão direita era um apoio terrível. Mãos quebradas não tem força. Aceitou por fim uma mão que Ileana lhe oferecia, usando a esquerda para se levantar. Apesar de machucada, a esquerda não havia quebrado.

Devagar, os dois fizeram seu caminho até o carro que os esperava, Vlad não aceitou mais nenhuma forma de ajuda depois de estar finalmente em pé. Ileana passou o endereço do hospital para o motorista, enquanto Vlad se acomodava no banco de trás.

A moça tentou analisar a profundidade do corte na sobrancelha do conde, apenas para ter seu gesto interrompido e o rapaz virando o rosto contra ela. A mensagem era clara: não me olhe, não me toque.

Seguiram em silêncio, em silêncio foram atendidos e em silêncio teriam saído do hospital, se um fato não tivesse chamado a atenção do conde: os funcionários cumprimentavam Ileana com um pequeno sorriso, que ela respondia com um manear disfarçado de cabeça. A moça parecia conhecer todos ali, e sua presença não era algo inesperado.

            Vlad chegou a abrir a boca para falar alguma coisa, mas no meio do caminho decidiu que não importava. Nada lhe importava. Foi Ileana quem, lendo a dúvida nos olhos amarelos do conde, quebrou o silêncio:

            – Eu venho aqui com bastante freqüência.

            – Trabalho voluntário? – Vlad perguntou, no fundo aliviado de ter algum tipo de interação para se ocupar, enquanto examinava as bandagens que prendiam seus ossos no lugar.

            – Na verdade não, questões médicas mesmo.

            – Algum doente na família?

            –Leucemia. Meus pais já morreram e não encontraram um doador compatível.

            Vlad parou no meio do corredor, pela primeira vez desde que acordou erguendo seus olhos para encontrar os verdes e conformados de Ileana.

            –Conde?

            – Está doente?

            – Estou morrendo conde.

            Vlad ponderou o que dizer, mas apenas perguntas idiotas passavam por sua cabeça. Por que trabalhar daquele jeito? Por que sofrer nas mãos de um chefe tão mesquinho (sim, Vlad já tinha sacado qual era a do chefe dela), por que se preocupar com um conde estrangeiro que nada faz além de lhe ocupar o tempo? Por que não sair pela vida, ser feliz?

            Novamente, foi Ileana quem leu a dúvida nos olhos do conde e respondeu por ele:

            – Eu tenho como me manter. Sabe, poderia passar os meus últimos meses de vida confortavelmente caso decidisse parar de trabalhar. Mas acho que, na verdade, se eu deixar de me ocupar, de ser útil, minha alma vai morrer antes do meu corpo. Eu quero fazer algo por esse país, pela minha gente. Foi por isso que escolhi a profissão que tenho, em primeiro lugar.

            – É por isso que está me acompanhando nas visitas ao castelo? Para assegurar o futuro do lugar?

            Ileana baixou os olhos, mostrando certa vergonha em admitir. –Sim conde. Querem transformar a estrutura em uma área de lazer, para crianças, será o fim do castelo de Bran... Se o senhor não desejar a obra e vender as terras isso será...

            – Será o fim do valor histórico do castelo de Bran. – Vlad continuou por ela. – As obras de arte serão vendidas e perdidas, a própria história do país vai se fragmentar. – E apenas um pensamento corria em sua mente, em um plano de fundo: “Ainda que os túmulos sejam preservados, o fosso jamais se manterá daquela forma”.

            Depois de alguns minutos em silêncio, Vlad continuou:

            – Eu jamais tive interesse em me desfazer da propriedade Ileana, mas acredito que ela possua um valor histórico muito maior que a duração de uma vida seja capaz de manter. Diga-me, o que é necessário fazer para assegurar a proteção do castelo?

            Os olhos de Ileana brilharam naquele momento:

            – Transforme-o em algo de interesse nacional e o dê ao povo.

            – Um museu, então. – Vlad disse, aceitando alguns papéis que Ileana lhe entregava, autorizando e principalmente, se comprometendo a financiar a recuperação do palácio, para depois presenteá-lo ao governo da Romênia.

            Aquela terra manchada de sangue não precisava mais abrigar as dores de um rei traído. Poderia abrigar a beleza de um passado e a promessa de conhecimento para o futuro.

            Ileana quase podia sentir o calor que irradiaria do rosto irritado de John Richards Jr quando ela levasse os papéis assinados. No final, o tenebroso e vingativo conde havia cedido suas propriedades para o bem maior do povo. Túmulos, fossos, tijolos, tudo seria considerado patrimônio histórico e nada seria maculado dali para frente. Quem sabe ela até não receberia uma promoção?

            – Deseja acompanhar o processo, conde?

            – Não, já é hora de voltar. Mantenha-me informado.

            – Sim, Milord.

            –Ileana?

            – Sim conde?

            – Gostaria de tomar uma xícara de café?

            – Certamente, Milord.

Ouça-me bem amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões à pó.

Preste atenção querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás a beira do abismo
Abismo que cavastes com teus pés


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Notas finais do capítulo

^^Espero que tenha valido a espera. Se tudo correr bem, o próximo não demora tanto!(vontade de abraçar e apertar o Vlad!)


lembre-se: a cada review que vc não deixa, um autor morre.



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