The difference between us

 - Me deixa! - eu gritei simplesmente, colocando ambas as mãos em meus ouvidos e ficando de costas pra você. - Sai daqui!

E você bufava irritado. Gritava de volta que era sempre assim e que eu devia ter algum problema. Ninguém mudava de uma hora pra outra como eu, ninguém era assim tão imprevisível! Tão infantil... tão... tão pouco flexível!

- Você não era assim quando eu te conheci! - ouvi você despejar aquilo sobre mim como se soubesse... E você sabia....sabia que eu odiava quando me dizia essas coisas.

“Seu idiota!” eu só pensava, ainda evitando seu olhar, que me julgava sem perceber. Eu não sou exatamente do jeito como você me encontrou pela primeira vez, sabia? Na verdade, nunca fui aquela pessoa que você só vê de vez em quando... da qual você conhece apenas partes.

- Um dia você tá bem, e no outro parece que foi atropelado e que o mundo todo ta contra você!Qual é o seu problema??

Meu problema? É que você quer que tudo seja sempre o mesmo. Porque é mais fácil pra você, eu imagino. Você fica esperando por uma pessoa que não existe. E é claro que eu te decepciono.

É essa a diferença entre nós? Você é sempre você, e eu mudo com freqüência.

- Sai daqui! Eu não quero mais falar com você! Você me irrita, sabia? Fica exigindo coisas que eu não posso fazer! - eu disse então, caminhando resoluto em direção a janela do apartamento. Olhando as luzes lá fora.

- Você não pode? Você não quer! Você não quer mudar! - o tom de sua voz conseguia superar o da minha, e aquilo era quase como uma afronta. Um desafio. Vejo você se aproximar pelo canto dos olhos e sinto um puxão em meu braço.

“Eu quero mudar sim!”- grito em pensamento. Mas pra outra direção! Por que tenho que mudar pra onde você quer? Por que eu me forço a isso?

Minha cabeça roda... é porque eu quero você.

- Por que você não consegue aceitar? - pergunto então, sentindo ainda seus dedos me segurando firmes.

- Aceitar o que? - você me pergunta, irritado, soltando meu braço logo em seguida. Seus olhos tentando me ler. Se esforçando tanto para tal, que me assusto.

Não quero ser lido. Analisado, descoberto.

O empurro novamente, um sussurro deixando meus lábios em contraste com a força aplicada pra me afastar.

- ...que você não me conhece...

Você arregala os olhos estupefato. Se aproxima mais uma vez, caminhando em minha direção e me forçando a andar pra trás até encontrar a parede atrás de mim. Fecho os olhos, tentando ainda me proteger de seu olhar. “Eu não quero conversar agora. Vai embora!”

- Eu não te conheço porque você não deixa. - você me diz, sua voz ressentida, sincera e ressentida, seus braços me cercando contra a parede. - Por que você não deixa?

Eu também queria saber porque...Talvez porque eu não saiba pra onde vou, e tema que você não goste do caminho que eu vier a escolher...

É essa a diferença entre nós? Você consegue chorar enquanto eu rio e rir enquanto eu me esforço pra achar graça? Você consegue amar o que eu amo e ainda assim ter prioridades e valores tão diversos dos meus?

E ainda assim...

- Como você faz isso? - pergunto, a voz ainda baixa. Como é possível que eu não tenha resposta pra tudo? E que você sempre tenha ótimas perguntas pra me fazer? Abro os olhos, tentando aceitar você... te odiando e te adorando pela forma como você age.

É essa a diferença entre nós? Você tem mais coragem que eu? Eu me jogo em ações que te magoam porque é a única forma de me proteger? E você me faz perguntas diretas?

- Isso o que? - você diz então, se aproximando mais, até que sinto sua testa tocar a minha e sua respiração quente sobre meu rosto frio pelo vento.

E eu crio entrelinhas que só eu conheço...

Mas você... você precisa saber exatamente o que eu quero dizer. Você precisa que eu não faça rodeios. É essa a diferença entre nós? Eu não consigo estar em um lugar só...e eu nunca vou ser a pessoa que você um dia conheceu.

Você facilita pra mim o tempo todo, eu só dificulto pra você.

- Nós somos diferentes... - respondo então, sabendo que não é o que você queria ouvir. Você me lança o olhar mais triste que já vi estampar seu rosto e sinto uma pontada no peito ao perceber que dessa vez, mesmo minhas palavras vagas te tocaram. E te afastaram de mim instantaneamente. Você se distancia, dando passos para trás como se temesse atingir algo invisível.

E eu não sei o que dizer.

O silêncio que se instaura parece pesado como chumbo.

- Eu to aqui com você... - sua voz chega aos meus ouvidos, muito baixa, como se ele quisesse que eu me esforçasse para ouvi-la. Que eu fizesse aquele esforço por ele, apenas. Levanto os olhos, antes cravados no chão, para ver seu rosto se modificar mais uma vez, raiva ocupando o lugar da dor.

- Eu to bem na sua frente! Bem na sua frente!! - você grita então, como se não acreditasse que ainda precisava me provar aquilo.

- Eu sei... Eu sei que sim...- sinto as palavras deixarem meus lábios antes mesmo que eu possa pensar em algo.

É essa a diferença entre nós? Você sempre consegue me mostrar o quanto eu sou contraditório e, por vezes, ridículo em minhas dúvidas. E você me faz ver o pior de mim... e me faz ver o quão puros são seus sentimentos.

Você todo... tão verdadeiro. E eu mudando e mudando... e nunca me permitindo ser quem eu sou, nunca deixando que você me veja por completo.

- Eu tenho medo de que você não me escolha no final...- digo então, sentindo meu rosto vermelho de vergonha, me sentindo humilhado e inferior a todo aquele poço de certeza e sanidade que você parece ser.

E não escuto palavra alguma vinda de seus lábios. Nem um riso de escárnio, nem um suspiro de cansaço, nem um murmúrio aborrecido. Você se aproxima, parando bem diante de mim e me olha. Só me olha... como quem acaba de entender algo. Não me toca, porém. Respeita meu momento de vergonha e de sinceridade. Meu momento de dor e de necessidade.

É essa a diferença entre nós? O que eu sinto me corrói e eu não quero que você perceba isso em mim. Mas você quer que eu saiba que você gosta de mim.

Talvez... você até me ame.

Eu não te toco também, mas sinto sua respiração próxima. E consigo acreditar que algo ali, o que quer que seja, é real. Eu me deixo acreditar.

E nos damos por vencidos mais uma vez. Eu não quero que você se afaste. E você não quer se afastar. E nos olhamos até que sinto seus dedos suaves deslizando por meu rosto, me fazendo sentir compreendido, como jamais me senti antes.

E é assim que nós vamos para um lugar longe daqui, um lugar onde ninguém pode nos ver... você deixa que eu faça o que eu quero, que eu mude pra pior... você continua sendo quem eu sei que você é, e eu me delicio de você.

E nesse lugar só nosso, nesse momento só nosso, nessa estranha relação desigual entre nós... as diferenças não significam nada.