Amor à última Vista escrita por M4r1-ch4n


Capítulo 3
Capítulo 2




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 Terminando de alongar as pernas, Ken voltou para a posição vertical, girando os dois braços antes de lançar-se a uma barra que estava presa horizontalmente entre duas estacas de madeira, começando uma série de flexões.

 Mal tinha concluído a primeira delas quando se viu de volta ao piso de terra batida do parque, alongando o braço esquerdo e massageando de leve um pedaço enfaixado; o corte que havia levado durante o último confronto com os integrantes do Schwarz ainda estava ali, e não raro sentia fisgadas de dor quando passava dos limites.

 Revirando os olhos em um claro gesto de irritação, o moreno assoprou parte das mechas castanhas que ficavam na frente dos seus olhos e decidiu mudar de exercício, esquecendo as flexões temporariamente. Colocou o calcanhar direito sobre um toco de madeira bem alto, quase na altura da sua cintura e passou a alongar a perna, equilibrando-se com a esquerda no chão.

 Praticamente deitado sobre a perna apoiada na madeira, ele não percebeu que uma das várias pessoas que passavam pelo parque àquela hora da manhã havia parado de andar justamente ali, nos aparelhos de ginástica. No entanto, ele sentiu a familiar sensação de ser observado, virando-se com tanta rapidez para onde ele julgava que a outra pessoa estava que quase foi ao chão, esquecendo-se de que não estava sobre as suas duas pernas.

 Uma largo sorriso foi a sua recepção.

 - Guten Mörgen [1].

 Olhos turqueza se arregalaram, a mente de Ken processando em alta velocidade o que fazer com o nada esperado encontro com Schuldig naquela manhã. Pessoas continuavam passando por trás deles, na pista de corrida que circundava quase todo o parque, não dando uma brecha para que ele de fato atacasse o outro assassino sem ser visto.

  Pensamentos tão hostis à essa hora? - Schuldig continuou, se aproximando dos aparelhos e fazendo Ken recuar vários passos por instinto, seu corpo claramente em estado defensivo - Você é realmente divertido, Siberian.

 O alemão prendeu os longos fios de cabelo laranja em um rabo de cabelo na altura do pescoço, e Ken achou o gesto um pouco estranho. Parando para observar melhor o seu inimigo, percebeu que Schuldig trajava roupas diferentes das habituais: ele estava usando apenas uma calça escura de moletom juntamente com uma camisa branca. Semelhante ao jeito que ele próprio estava vestido, exceto pelo fato de que havia escolhido shorts largos ao invés da calça.

 Ainda sem falar nada, Schuldig equilibrou-se perfeitamente em uma das barras horizontais menores que serviam para a ginástica, olhando Ken ainda com o mesmo sorriso estático nos lábios. O moreno não fazia idéia se aquele jeito de sorrir do alemão significava alguma coisa ou não.

 - Por que você está aqui, Siberian? Tenho certeza que com o dinheiro da floricultura e do seu outro... Como direi, emprego? - o sorriso se alargou mais alguns milímetros - Seria suficiente para pagar a melhor academia da cidade, não?

 O mais novo dos dois homens piscou, acirrando os olhos e não vendo utilidade prática na pergunta. No entanto, vindo de Schuldig, até mesmo uma frase inocente como "bom dia" poderia ter significados obscuros.

 Uma risada encheu o ar matutino antes que Ken sequer respondesse alguma coisa.

 - Kätzchen, Kätzchen. Sua cabeça é realmente engraçada. Você pensa em coisas que ninguém cogita... Mais divertido que o Farfie, posso assegurar. - o alemão acrescentou balançando a cabeça afirmativamente algumas vezes antes de erguê-la novamente e encarar o assassino bronzeado com olhos azuis que perfuravam sua alma - E então?

 Ken piscou. Várias vezes.

 - Então o quê, Schwarz?

 - Mein Gott, Hidaka. Você não é tão burro assim, certo? Você faz isso de propósito para me irritar. - a expressão até então risonha do rosto de Schuldig desapareceu, dando lugar a uma carranca falsa que arrancaria risos de Ken se ele não fosse inimigo mortal do homem apoiado na barra horizontal de exercícios - Sobre a academia.

 O assassino mais novo percebeu que havia andado tanto para trás que agora estava apoiado no mesmo toco de madeira que havia usado para se alongar momentos antes.

 - Nem mesmo a melhor academia do Japão iria aceitar um cliente que está oficialmente morto.

 A resposta pareceu surpreender ambos, mais a Ken do que Schuldig, na verdade. O ex-jogador de futebol não tinha idéia de por que havia revelado tal informação, mas pelo menos ele sabia por que sua voz havia soado tão amarga. O alemão piscou, desencostando-se do aparelho de ginástica que estava usando de apoio e espreguiçando-se vagorasamente.

 - Ja, ja. Até que faz sentido.

 - Faz todo o sentido, Mastermind.

 O sorriso voltou com força total ao rosto do telepata.

 - Mastermind. Você tem um sotaque engraçado.

 - Como se você não tivesse essa voz anasalada inconfundível em qualquer idioma. - o moreno devolveu, ficando cada vez mais irritado com Schuldig e consigo mesmo: primeiro por não tentar matar o outro homem e em segundo por ficar conversando com o mesmo.

 - Ah, Brad às vezes reclama da minha voz. Acho que é sexy demais para ele, sabe como é. - Schuldig piscou um olho azul sedutoramente para Ken, que apenas retribuiu o gesto com um olhar muito confuso.

 - Se você não veio me matar nem ser morto, dê o fora. - o moreno sibilou, lançando um olhar para dois homens de meia-idade que passaram correndo por eles e que, entretidos na conversa sobre o mercado de ações, acabaram por não ouvir as ameaças.

 - Nein. O parque é público; você não pode me expulsar daqui.

 O integrante do Weiß bufou com irritação, disparando pela pista em uma corrida que não havia sido planejada. Não era algo muito sensato que ele tinha acabado de fazer; afinal, dar as costas para um inimigo era um ato de suprema burrice, mas Schuldig já poderia tê-lo matado pelo menos dez vezes antes de ter iniciado sua corrida. Se ele não se importasse com testemunhas.

 - Absolutamente sem problemas. Farfie adoraria terminar com elas, sabe. - Schuldig comentou ocasionalmente, completando o pensamento de Ken. O ex-jogador de futebol quase gritou de susto, assustado com a presença do homem de cabelos laranja ao seu lado. O alemão não somente lia mentes mas como também possuía velocidade acima do normal. Ou pelo menos era o que constava nos documentos da Kritiker.

 - Vá embora.

 - Não. Eu decidi fazer companhia durante o primeiro metro.

 - O primeiro metro já terminou.

 Schuldig pareceu que ia chorar.

 - Você não me ama, Kätzchen?

 Por obra da providência divina, o trecho onde ambos estavam correndo era arborizado, o que deu a Ken a possibilidade de praticamente atirar o telepata contra a árvore mais próxima. Schuldig falou alguma coisa em alemão e pareceu sentir dor, atitude que deixou o moreno muito contente.

 - Me deixe em paz.

 - Só quando eu enjoar de você. - o alemão comentou, sua voz estranhamente esganiçada por causa do repentino ataque que sofrera. No entanto, ele levantou a cabeça e encarou os olhos claros do ex-jogador de futebol novamente com um sorriso no rosto - Não é à toa que Balinese diz que você tem braços fortes.

 Incerto quanto ao significado daquilo tudo, Ken largou o outro homem como se o contato com o corpo do outro queimasse, arregalando os olhos e voltando para a sua corrida. Quando virou a cabeça momentos depois para trás, não viu mais traço do cabelo flamejante do telepata ou dele próprio.

 - Ken-kun! Vamos, por favor!

 - Não, Omi. Eu já disse que não quero. E Yohji não pode me obrigar a isso! - a voz que misturava irritação e exasperação ecoou pela sala mais uma vez, fazendo Omi piscar rapidamente, como se estivesse tentando impedir lágrimas de rolarem pelos olhos e Yohji sorrir que nem um maníaco.

 - Ken. Eu tenho uma teoria sobre essa sua falta de vontade de sair.

 - Eu não quero ouvir sobre as suas teorias, Yohji. - olhos turqueza faíscaram na direção do playboy, calmamente sentado em um sofá e fumando - E apague essa coisa! Kami-sama, Yohji! Não é porque é seu aniversário que você pode fazer tudo que você quer.

 - Errado! Eu posso e eu vou fazer. E é por isso que você vai subir as escadas e vestir a roupa que eu separei para você.

 O moreno engasgou, sentindo seu rosto esquentar.

 - Você tem idéia de que roupas são aquelas?

 - Levando em conta que elas vivem no meu guarda-roupa, sim. Eu tenho.

 - E não deveriam ter saído de lá! Yohji, aquilo é praticamente atentado ao pudor!

 - Aw, Kenken. - o loiro sorriu sedutoramente do seu lugar - Você tem noções totalmente deturpadas sobre a vida. Afinal, você se incomoda mais em se vestir daquele jeito do que abraçar um bando de homens suados quando se marca um gol no futebol?

 Omi não conteve um sorriso, colocando as duas mãos na frente da boca para não rir alto demais, o sorriso de Yohji se alargando conforme Ken abria e fechava a boca como um peixe fora d'água, sem saber o que responder.

 - Mas... Mas e Aya?

 O loiro arregalou os olhos e apagou o cigarro imediatamente, queimando um pouco do tecido do sofá no processo:

 - Onde?

 Foi a vez de Ken se dobrar, rindo.

 - Eu perguntei dele. - o ex-jogador olhou para Omi, que também ria - Não disse que ele estava aqui. - controlando o riso, ele olhou para a marca no sofá - Mas ele com certeza vai te matar por isso mais tarde.

 - Ah, é um mero sofá! - Yohji fez um aceno com a mão, encerrando o assunto. - Mas o que tem o nosso temível líder a ver com você sair conosco?

 - Eu não vou sair. - Ken acirrou os olhos e fechou o punho, parecendo uma criança - E por que Aya não tem que ir junto?

 - Aya-kun disse que vão fazer alguns testes importantes na sua irmã esta noite, Ken-kun. - Omi explicou ao seu lado, trocando o peso do seu corpo de uma perna para outra, ainda de pé na sala - Ele disse que não irá por causa disso.

 - Eu aposto que ele marcou os testes para hoje.

 - Eu não duvidaria. - Yohji concordou - E então, Kenken? Vai demorar muito para se arrumar?

 - Eu. Não. Vou. - o assassino quase rugiu para o playboy, tamanha raiva estava sentindo.

 - Uma pena de fato. - o loiro suspirou dramaticamente, lançando um olhar que o ex-jogador de futebol não entendeu direito - Eu vou terminar de arrumar meu cabelo e vou sair com o chibi, então. Vamos encontrar uma garota com que eu estou saindo...

 - Só uma? Que novidade. - rebateu Ken ironicamente. O outro ignorou.

 - E ela é irmã de um dos maiores jogadores de futebol da atualidade, sabe? Me prometeu ingressos exclusivos para a final do campeonato, se eu quisesse fazer companhia a ela. Estava pensando em doar os convites para você e aproveitar a companhia dela em outro lugar, mas já que você não vai...

 Yohji não precisou terminar a sua frase, sendo ultrapassado por Ken que seguia para as escadas, que depois de vinte minutos estava pronto para sair. Omi sugeriu que o playboy seguisse a carreira política um dia.

 Ken não se considerava claustrofóbico, mas ele não conseguia evitar esse pensamento quando dentro de alguma boate; a quantidade pessoas era sufocante, mas não pior do que o cheiro de cigarro, que já impregnava seu cabelo e roupas, ou o que faltava delas.

 Movimentando-se com dificuldade e tentando não ser queimado por pontas de cigarro acesas, o moreno, em um esforço histórico, chegou ao outro lado da pista de dança, ofegando ligeiramente. Ele sentia o tecido da blusa de Yohji, que funcionava quase como uma segunda pele, acompanhar cada movimento que seu corpo fazia ao inspirar e expirar, a sensação deixando-o desconfortável.

 Bufando, o ex-jogador de futebol tentou entender por que o playboy havia insistido tanto para que ele e Omi viessem; o aniversariante havia sumido assim que a garota que havia mencionado fora encontrada, e Ken nunca mais sequer esbarrou com o alto colega loiro no meio da pista de dança. Aquela luz maluca que piscava e dava a impressão de que tudo se passava em slow motion também não ajudava.

 Uma leve preocupação com Omi cruzou sua mente; o menor dos Weiß não era um adulto legal na maioria dos países mundo afora, muito menos no Japão. No entanto, seus temores se dissiparam quando ele se lembrou que o jovem Bombay fora criado como um assassino, sendo possível que tivesse muito mais jeito para se livrar de pessoas inconvenientes do que qualquer outro na sua equipe.

 Finalmente relaxando pela primeira vez desde que entrara naquela casa noturna, Ken deixou seu corpo cair para trás, certo de que o encontro do mesmo com a parede o sustentaria. No entanto, suas costas sentiram calor ao invés do frio do concreto, além de formas irregulares no lugar de uma retidão impecável. O ar quente na sua nuca também era um sinal de que não era exatamente a parede que estava atrás dele.

 - Boa noite, Siberian.

 O moreno efetivamente pulou de susto, virando-se com ferocidade e grudando seus olhos em turquesas que estavam claramente se divertindo. Os punhos de Ken se fecharam, e apesar do pouco espaço que tinha, seu corpo se posicionou para atacar o outro homem.

 Estando com seus olhos presos aos de Schuldig, o ex-jogador de futebol notou quando este desceu as íris azuis pelo seu corpo, para depois focá-las no seu rosto e sorrir com aprovação.

 - Por que você não se veste assim com mais freqüência, Hidaka?

 O punho direito do moreno chegou mais perto do rosto do telepata.

 - Porque meu corpo não está a venda, Mastermind.

 Uma risada baixa e que deixou Ken arrepiado se seguiu. Havia algo... De diferente nela.

 - Uma pena. Eu tenho certeza de que ficaria milionário se estivesse.

 Aquela resposta de Schuldig desarmou o assassino do Weiß mais do que qualquer golpe físico ou mental, fazendo o ex-jogador de futebol corar furiosamente, desviando o olhar. Por obra do acaso, Ken se encontrou observando as roupas do outro assassino, notando um estilo parecido com o de Yohji. 

 Enquanto ele próprio usava calças pretas, justas, e uma blusa de mangas curtas azul escura que parecia cintilar de forma metálica na luz negra, Schuldig trajava calças que pareciam vermelho ou laranja vibrante, coladas ao seu corpo e com vários bolsos e zíperes, combinando com uma blusa preta e mais larga, porém toda furada e deixando a parte superior do mesmo totalmente exposta aos olhos de qualquer pessoa. Alguns botões da mesma ainda estavam abertos, e Ken honestamente não via função para aquela peça de vestuário a não ser enfeite.

 - E não é exatamente o que todas as peças de roupa são? Enfeites? Ninguém liga mais para elas uma vez que se chega à cama.

 Ken não sabia dizer o que aconteceu, mas as posições se invertaram e ele agora sentia a parede gelada atrás, nas suas costas, mas o peso e o calor que vinham do corpo do telepata totalmente pressionados contra o seu eram um contraste e tanto.

 A aproximação excessiva do outro homem despertou a noção de perigo e de quão ridícula aquela situação era, fazendo com que o integrante do Weiß empurasse o outro para trás. O alemão, no entanto, conseguiu capturar os pulsos de Ken, voltando para perto dele logo depois, sentindo prazer com o olhar feroz que lhe era dirigido.

 - Você fica ainda mais sexy desse jeito, Hidaka... - a voz de Schuldig era baixa, mas inexplicavelmente audível na boate, o cabelo flamejante do telepata fazendo carícias no seu rosto enquanto ele se preocupava em mover os lábios perto da sua orelha.

 O ex-jogador de futebol fez barulhos incompreensíveis com a garganta, tentando jogar o outro homem para longe de si várias fazes, mas falhando em todas. Seus pulsos estavam sendo mantidos contra a parede como se as mãos do telepata fossem algemas de ferro, e Ken tinha a sensação de estar acorrentado e preso ali.

 - Mas que diabos, Schuldig! - o ex-jogador acabou por gritar, usando o nome do outro nome e fazendo com que este o encarasse com com a mesma expressão divertida de sempre, quase marca registrada do telepata - Você está me seguindo? Está querendo me deixar insano?

 - Muito perto da verdade... Ken. - o alemão devolveu o discurso na mesma pessoa que Ken usara, valendo-se do primeiro nome do outro também. Lábios brilhantes de um modo que não era normal se partiram para falar, mas rapidamente se fecharam e todo o corpo de Schuldig se descolou do seu. Aquilo, no entanto, não representou uma folga para o assassino do Weiß, que foi puxado juntamente com o seu inimigo para um corredor ali perto, sendo quase jogado para dentro do banheiro.

 Uma vez dentro do mesmo, Ken foi empurrado para uma das cabines onde ficavam os vasos sanitários, sentindo Schuldig entrar com ele na mesma e trancá-la logo depois. O homem de cabelos flamejantes retomou o controle dos seus pulsos como fizera do lado de fora, e quando o ex-jogador de futebol tentou reclamar e gritar, foi calado rapidamente pelo membro do Schwarz.

 Com um beijo.

 Estando as mãos de Schuldig ocupadas com os pulsos de Ken, o único jeito que havia restado para calar o homem mais novo havia sido aquele, e parecia ter jogado todas as defesas de Ken por terra; na verdade, aquele efeito era quase que uma resposta padrão aos beijos do telepata, muito mais talentoso para a área dos prazeres do que a maioria das outras pessoas.

 O beijo era como se fosse fogo, mas em um estado líquido, que preenchia o corpo do moreno por completo e substituía seu sangue. Isso tudo morreu, no entanto, quando a porta do banheiro foi aberta segundos depois de iniciado o beijo, duas vozes muito conhecidas falando e trazendo a consciência de Ken de volta à realidade.

 Yohji e Omi.




[1] Bom dia.


Continua...

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