Memorilles escrita por Caroline White


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Memorilles é o nome de um dos capítulos do anime, significa "sem memória". Mas bem, aproveite ai.



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Meu peito doía, eu não lembrava de antes na vida ter tido que buscar tanto ar assim com meus pulmões. Não, não era apenas pelo fato de eu ter corrido como nunca, fugindo para o meu quarto tão rápido como pude e agora estando aqui trancado, ouvindo aquela mulher surrar minha porta e gritar, gritar como se não houvesse amanhã, para eu devolver-lhe o que é dela. Jogado como um trapo velho no canto do quarto, todo machucado graças aos pratos e talhares que ela conseguiu acertar de alguma forma em mim pelo caminho. Pateticamente caído, vendo meu sangue tingir o chão de vermelho aos poucos.

Talvez hoje ela possa ter o que tanto deseja, o motivo dela ter feito isso tantas vezes em seus surtos. Não é como se eu quisesse, mas não é como se eu tivesse escolha. Como também eu só posso ter esquecido tudo, de novo. Eu não lembro quem são meus amigos, se é que eu tenho amigos, não lembro de suas faces, nem de nomes. Talvez nem de mim mesmo. Mesmo tendo essa forte sensação de Déjà vu no peito, como se se fosse tudo acontecendo mais uma vez. Quem eu serei amanhã? Talvez a pessoa que aquela mulher procura, talvez eu só comece tudo de novo. Mas... Tem alguém, alguém importante que eu não posso esquecer...

Posso sentir nos lábios o sabor de um beijo que já se foi, um leve gosto de cigarro junto do macio dos lábios. Seu rosto... Como era mesmo? Lembro que usava umas faixas estranhas no pescoço. Mas, por que mesmo? Os cabelos são compridos e a cor... Loiro ou moreno? Droga. Usa óculos, sim, óculos e os olhos... Eu não sei. Minha cabeça dói, dói como se fosse explodir. Sentia o sangue quente escorrer pelo meu rosto do corte em minha testa, até se manchar mais um pouco minha roupa ou se juntar a poça que se faz no chão.

Por algum milagre aquela mulher finalmente parou de esmurrar a porta e berrar, ou eu que só não a ouvia mais, como se meu cérebro não deixasse mais eu ouvir aquilo.

Minha visão começou a embaçar, por alguns segundos achei que finalmente fosse morrer e o desespero bateu em meu peito, até sentir escorrer junto do meu sangue aquelas lágrimas que deixavam meu olhos sem destino. Eu só comecei a chorar, sem mais nem menos. É algo que eu achei que só acontecesse na ficção, mas infelizmente é real. Quanto menos eu lembro, quando menos me resta daquela pessoa mais me dói, mais as lágrimas caem. Eu sei, eu tenho certeza, que tirei fotos com essa pessoa e quero vê-las, mas eu não consigo agora. Não consigo me levantar e procurá-las, muito menos enxergar algo mais ao longe.

Tudo isso dói, dói muito mais que essa dor física, dói como se me matasse. Eu não sei mais dizer o que vai me acontecer, na verdade eu nunca soube. É como se a vida, pouco a pouco, fosse saindo de mim, me deixando cada vez mais rápido e levando o que me é importante consigo. Eu nem sei mais se ainda estou sangrando, sei que já sujei o chão e a mim o suficiente. A única coisa que sei é que quanto mais eu tento me lembrar daquela pessoa, mais eu a esqueço e fica aquela sensação no peito de... Ter sido amado. Mesmo que um pouco, é como se eu perdesse a única pessoa que um dia gostei.

Comecei a sentir meu corpo pesar para o lado aos poucos, logo eu teria a infeliz sensação de sentir meu corpo se chocar contra o piso do quarto. Mas um barulho chamou minha atenção, vindo da varanda, um estrondo um tanto alto, como se tivesse sido aberta com força. Usei das poucas formas que me restavam para olhar para lá, vendo o que parecia ser um homem, alto, mesmo que a minha visão estivesse embaçada para saber ao certo. Observei-o enquanto ele corria rápido até mim, ao menos acho que até mim. Quando ficou perto suficiente puder ver um pouco melhor ele, principalmente seus cabelos compridos loiros. Por que eles me parecem tão familiares?

Senti duas mãos em meu rosto, eu já conhecia aquele toque confortante de algum lugar, fechei os olhos para apreciá-lo, mas senti um leve sacudida no rosto, me fazendo abrir os olhos um pouco.

— Ei! Ritsuka! Olhe para mim! — Berrou, me fazendo encará-lo nos olhos. — Isso... — Parecia ter um pequeno alívio na voz.

Minha boca se abriu sozinha, como se fosse falar por conta própria com ele, mas ficou apenas sem falar nada, deixando o silêncio um pouco ali. Fui tomado pela surpresa de sentir ele me colocando apoiado em si, tirando as mãos de meu rosto e logo em seguida, as colocando de novo e sem nem me dar tempo para encará-lo novamente beijou-me. Como se meu abrir de lábios antes tivesse sido um convite. Ele não forçou o beijo, não aprofundou nem nada, apenas ficou um pouco assim comigo e me soltou.

— Diga alguma coisa, qualquer coisa. — Pediu.

Encarei-o novamente, tentando focar em seu rosto — não é algo muito fácil quando você sente que vai desmaiar a qualquer segundo —, mas eu pude ver, mesmo um pouco, os traços daquele rosto, os óculos redondos e os olhos um pouco acinzentados, as faixas em seu pescoço, elas escondiam seu verdadeiro nome como um segredo guardado a sete chaves. Como eu podia ter esquecido dele?

— Soubi... — Sussurrei para ele.

Vi um sorriso aliviado aparecer no rosto dele, o senti me pegando no colo e colocando na cama, mas em seguida senti seu toque me deixar e tudo pareceu tão ruim novamente. Entretanto ele logo voltou, com uma caixa de primeiros socorros. Eu nem tinha lembrado que tinha isso no meu quarto. Ele começou a limpar minhas feridas e fazer curativos, o remédio ardia um pouco, mas eu não posso reclamar disso. Eu não sei quanto tempo levou, mas logo ele parou e me puxou novamente para o colo dele.

— Consegue falar? — Perguntou me ajeitando ali.

— Um pouco... — Respondi baixo, meio sofrido.

Talvez a presença dele tenha despertado um pouco de adrenalina no meu corpo, o cansaço já não parecia esmagador, mas ainda estava ali caminhando para voltar a aquilo.

— Você vai ficar bem, não se preocupe. — Sussurrou perto de minhas orelhinhas.

Estremeci de leve e apertei de leve o tecido da calça dele com a mão. Não diga o que não sabe, não saia afirmando que eu vou ficar bem como se fosse algum tipo de especialista.

— Não... — Sussurrei. — Eu não vou... Eu estou esquecendo — fiz uma pausa, já sentindo as lágrimas voltarem. — De tudo. De novo...

— Não se preocupe com isso. — Colocou as mãos em meu rosto, o acariciando e me fazendo encará-lo. — Eu estou aqui, se você esquecer eu vou te dar novas lembranças, eu sempre vou estar aqui. Porque eu te amo. — Sorriu. — Descanse agora, você precisa.

— Promete? —Perguntei.

Foi a última coisa que consegui fazer antes de fechar os olhos.

— Sim. — Ouvi o sussurro perto de minha orelhinha.

Apenas deitei a cabeça no peito dele e me deixei dormir. Eu precisava. Não importa se eu esquecer, não importa o que acontecer.

Vai ficar tudo bem.

Fim


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Notas finais do capítulo

Sinta-se a vontade para comentar, ou não, para favoritar se quiser, ou até mesmo mandar uma MP para mim, eu não mordo.