Sem Barreiras escrita por Arlequina


Capítulo 8
Risco de perda


Notas iniciais do capítulo

A festa não acabou bem, o que vem agora?
Boa leitura...
Muito obrigada Al, mais uma vez ^^



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A ambulância havia chegado. George sangrava muito, estava desacordado e com a respiração muito fraca. O número de convidados diminuiu. Muitos fugiram com o barulho do tiro, e os poucos que ficaram buscavam entender qual o motivo daquele crime.

Nikolai e Cassandra estavam logo atrás de mim. Cassandra me olhava com tristeza, e Nikolai me olhava com pavor.

E eu, eu estava em choque, também me perguntando o motivo de tudo isso. Será que o tiro era pra me atingir? Ou era para George mesmo? Ou até para outro alguém... Não sei, o que me importava no momento era a vida de George.

Os paramédicos o puseram numa maca, colocaram alguns fios em seu corpo que eram ligados a um aparelho que monitorava os batimentos cardíacos e, logo em seguida me chamaram.

— Senhorita, por acaso é parenta do jovem atingido?

Eu não conseguia falar, minha voz estava presa na garganta. Não consegui responder a pergunta, então mostrei minha mão esquerda, na qual estava minha aliança.

— A senhora não pode falar, entendo, mas preciso de alguém que nos dê algumas informações que serão necessárias para a ficha do paciente. Creio que também será necessário um boletim de ocorrência.

Cassandra estava perto, acompanhando o paramédico falar, então ela se propôs a me ir em meu lugar.

— Menina, você precisa ficar, não está em condições de responder nada, nem de passar informações, fique aqui, tente se acalmar, eu volto logo. George vai ficar bem, não se preocupe.

Nikolai estava debruçado sobre George, como se lhe falasse algo, mas sem resposta. Voltou para meu lado e me abraçou.

— Eugenee, não se preocupe, George vai sair dessa, ele é forte, e os médicos são excelentes. Ele vai ficar bem, eu prometo.

Naquela hora eu não sabia definir qual o tom usado por Niko, mas estava entre algo como raiva e decepção. Mas relevei a situação. Não poderia contestar nenhuma atitude no momento.

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Na secretaria do hospital

— Boa noite, a Senhora é parente do paciente? — Perguntava um atendente
— Eu sou a governanta da casa. A esposa dele está em estado de choque e não pode vir.
— Tudo bem. Preciso que me empreste seus documentos, e os do rapaz para que eu possa fazer a ficha.
— Aqui está. E... Como está o estado dele? Alguém pode me informar alguma coisa?
— No momento ele está na sala de cirurgia pra remoção do projétil, que atingiu o coração, mas nada tão profundo. A cirurgia deve acabar em breve, e por hoje ele não vai poder receber visitas; primeiro pelo horário, e segundo, ele vai estar desacordado.
— Está certo, mas eu não posso deixá-lo sozinho.
— Não se preocupe, nossa equipe cuidará bem dele.
— Não poderiam nos ligar, avisar qual o estado dele ou coisas do tipo?
— Veja bem, senhora: passar informações de algum paciente não é permitido, até mesmo por questão de segurança.
— Entendo.
— Amanhã é dia de visita, a partir das sete horas da manhã.
— Tudo bem, obrigada. Tenha uma boa noite...
— De nada, a senhora também.

Cassandra saiu da recepção com os documentos de George e também os seus. Voltaria de táxi pra casa.

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Eu estava ainda na sala de festas, sentada num degrau da escada apoiada no corrimão. Os convidados? Todos já tinham ido, menos Niko. Pedi para que me deixassem sozinha, precisava chorar.

— Niko... Por quê? Por quê?... Quando tudo parecia se acertar, acontece uma tragédia... Eu não mereço ser amada? George não merece uma segunda chance?

Nikolai apenas me olhava, ele estava parado de pé na minha frente.

— Qual o motivo disso tudo? George não merece morrer...
— Eugenee, George vai ficar bem, não se lamente, eu te garanto isso. Vou deixá-la sozinha, isso tudo também está sendo difícil pra mim, tenho George como um filho... Boa noite...
— Tudo bem, snif... Boa noite...

Nikolai saiu, cabisbaixo, mas não havia derramado uma lágrima sequer.

Continuei sentada no mesmo lugar. Não tinha forças pra mexer um músculo sequer, dormi ali mesmo.

— Menina, Eugenee, acorde! Cheguei.
— Cassandra! E George, como está?
— Não sei, não pude vê-lo, mas o atendente informou que amanhã é dia de visita. Você pode ir?
— Nossa, por quanto tempo dormi?
— Alguns minutos, talvez.
— Não importa, mas então posso ir amanhã?
— Isso é você quem tem de me dizer, menina. Como é que você está, filha? Ainda está abalada?
— Estou confusa, já tentei achar respostas, chorei... Mas de nada adiantou... Acho que estou melhor...
— Certo então você vai amanhã.
— Sim, eu preciso saber como ele está.
— Não tenha medo! Pense positivo! Pense que quando você for visitá-lo os médicos o vão liberar dentro de dois dias. Ele estará bem, apenas com os pontos da cirurgia.
— Sim, tem razão, e eu ainda preciso fazer o boletim de ocorrência.
— Isso mesmo, deixe as investigações para a policia. Onde esta o Niko?
— Ele estava aqui pouco antes de eu cochilar, e depois foi embora. Estava com uma expressão dura no rosto...
— Hum... Algo não me cheira bem nessa história... Vamos dormir, amanhã será um novo dia.
— Tem razão. Boa noite Cassandra, obrigada.
— Boa noite menina. Não agradeça, fiz isso por você.

Já era tarde da noite, o dia seria pesado, e eu ainda não havia pregado os olhos. A lua estava escondida atrás das densas nuvens, assim parecia estar meu coração, envolvido por uma sensação ruim, angustiante. George... Se ao menos pudesse vê-lo...

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Os pensamentos me deixaram exausta. Dormi brevemente, não sei ao certo a que horas. Sinto como se com o abrir e fechar de olhos o dia já clareasse.

Cassandra já havia preparado e posto o café na mesa, mas eu estava sem fome alguma, não conseguia comer nada. Ela não me forçou, mas me deu alguns avisos, como uma mãe cuidando da filha.

— Cassandra, eu vou ao hospital.
— Mas você não comeu nada, filha. Não pode sair por aí assim, de estomago vazio; pelo menos vê se toma um copo de suco.
— Não quero nada, e não se preocupe; não faz tanto tempo assim que eu comi alguma coisa.
— Certo, certo, você quem sabe, mas cuide da sua alimentação, ta bem? Você precisa estar forte pra cuidar de seu marido.

Aquilo me fez pensar, e realmente era verdade, George precisava de mim mais do que nunca.

— Tudo bem, eu vou tomar apenas um iogurte. Não posso me demorar, preciso chegar o mais rápido possível ao hospital.
— Está bem menina.

Terminei o tal iogurte e então saí rumo ao hospital. O motorista corria, atendendo ao meu pedido e em poucos minutos cheguei ao meu destino final. Saí do carro e o motorista ficou me aguardando enquanto eu entrava no recinto.

— Bom dia. Sou Eugenee Leminski. Meu marido, George, deu entrada nesse hospital ontem à noite.

Enquanto eu falava, o atendente procurava as informações e pediu meu documento para confirmá-las.

— Certo, Sra. Eugenee, o Sr. Leminski está no quarto, se recuperando, ainda se encontra sedado, o médico autorizou a visita, mas pediu para que a Sra. aguardasse.
— Aguardar? Mas, por quê?
— Isso eu não posso dizer, apenas estou passando a informação que me foi dada. Sente-se e aguarde, por favor, o médico logo virá conversar com a senhora.
— Tudo bem, obrigada.

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Na sala de recuperação...

Após todos os exames de praxe e do diagnostico pronto, os médicos trabalharam para livrar George da morte. Este tinha uma boa chance de não sobreviver devido à quantidade de sangue que foi perdida e da gravidade do ferimento.

Algumas horas foram gastas, os uniformes, luvas e aparatos cirúrgicos estavam cobertos com sangue. A cirurgia foi complicada, o ferimento estava num lugar de difícil acesso e o paciente parecia não responder bem, os batimentos estavam fracos, o pulso também.

Fim da cirurgia. Todos os procedimentos possíveis foram feitos, o paciente continua instável. Resta-nos aguardar.

Um dos enfermeiros foi avisar que Eugenee havia chegado.

— Doutor, a esposa do Sr. Leminski está aqui. Pedi para que ela aguardasse.
— Certo, em instantes falo com ela. Obrigado.
— E então, o paciente tem chances?
— Vamos aguardar. Vou falar com a esposa dele.
— Doutor, o paciente é um homem, 25 anos, peso 79 Kg., não apresenta ingestão de álcool ou alguma droga. Levou um tiro no peito a pouco mais de uma hora, o sangramento foi contido, ele respira com ajuda de aparelhos, está com tamponamento pericárdio agudo [1].
— Certo, vamos ver qual a melhor maneira de salvar a vida desse rapaz.

O médico estudou durante certo tempo qual a melhor maneira de salvar a vida do paciente. Por se tratar de um órgão muito frágil, ainda mais no estado que se encontrava.

— Certo, vou arriscar algo, é provável que ele não sobreviva, mas caso contrário, ele ficará como novo.

O médico, decidido, optou por realizar uma toracotomia de emergência [2]. Tal procedimento ia sendo feito passo a passo, o que demorou cerca de quatro horas. Depois de concluída, tratou de fechar as aberturas que a bala havia aberto no caminho, e então o puseram sob observação na unidade de terapia intensiva.

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Em algum lugar inóspito e estranho...

Antes era tudo um breu só. Porém, algo parecia clarear. Não muito, posto que um ambiente muito, mas muito escuro, foi se revelando diante de seus olhos. Na verdade, era um lugar terrível, cujo aspecto era como o que se costumava ver em filmes de suspense.

Ele viu que estava de pé. Porém, não sentia a vida em si. Não falava, não respirava, não sentia o coração bater...

E se pôs a caminhar naquele vasto campo, sob um céu sombrio, carregado e rajado. Era uma campina que parecia ser o cume de uma pequena elevação, suavemente desenhada pela natureza. Havia apenas uma árvore. Uma grande árvore, distante de onde agora estava, a qual se apresentava com folhas secas. Isto é, as que não havia caído. Notou ainda algo como quatro frutos que, de longe, pareciam bolinhas. Ele decidiu ver mais de perto, e caminhou até lá.

Chegando mais perto, ele viu que a árvore era maior do que o normal. Porém, os frutos estavam ao alcance da visão dele. De repente notou que havia escrito algo neles. Notou que havia um fruto belo, puro e perfeito. Nele havia escrito “Eugenee”. Havia um outro, que não era tão belo e perfeito, mas que aparentava um certo frescor. “Cassandra” estava escrito ali.

Quando ele se volta para o outro lado, vê dois frutos muito, mas muito podres. Tanto que parecia certo que em breve eles cairiam do pé. Nestes dois frutos ele viu “Nikolai” e “Philip”, e estes nomes neles gravados. Daí deixa sua cabeça pender para o chão.

Foi aí que percebeu que havia um fruto, recém caído, naquele solo. Ele se abaixou e o pegou. Estava muito podre, obviamente, porém ele não parecia sentir mais repugnância pelo aspecto horrível do fruto. O que fez mesmo ele se espantar foi o nome que encontrou gravado na casca do mesmo. Havia apenas um nome escrito. E este, constatou, era o seu próprio nome: “George”.

Seus olhos se abriram de forma desmesurada, ficando aterrorizantemente assustadores a qualquer que os visse naquela hora. Ele ficou paralisado, ali, diante da premente e incontestável verdade: seu tempo havia terminado.

Porém, alguns instantes depois, o fruto que ele segurava em mãos, do nada voou da sua mão para cima, em direção à árvore. Ele foi como que reenxertado, de uma forma claramente sobrenatural, ao ramo de onde havia caído. O mesmo ramo em que se encontravam os frutos chamados “Cassandra” e “Eugenee”. E, na mesma hora, tudo se apagou. Ele desabou, como que de cansaço, e ficou ali, no chão, diante daquela árvore. E um sono profundo o acometeu.

Nee kikoeru

Kioku wo samayotteru

Nee kokoro wo shinjite ikiteyukereba

Ei, está ouvindo?

Estou vagando pelas lembranças

Ei, se você viver acreditando em seu coração

Ikiru sekai ga tatoe chigatta to shitemo

Mamoritai mono ga aru nara...

Mesmo que o mundo em que vivemos seja diferente

Se tiver algo que queira proteger

Sashidashita CHIKARA wa dare no tame ni?

Tokihanatsu ikusen no MANA

Sono shigusa ga

Sono manazashi ga kokoro wo shimetsukeru

Tebanasanai

Para quem é o poder que você ofereceu

Milhares de regras que são soltas

Esse seu costume...

Esse seu olhar que aperta o meu coração

Não soltarei...


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Notas finais do capítulo

[1] e [2]: Uma causa comum de derrame cardíaco, ou seja, de derrame de sangue neste espaço entre o folheto (espaço ou cavidade) visceral e o folheto parietal do pericárdio são os traumas de tórax, ou seja, principalmente os traumas abertos, tiro e facada. Quando um indivíduo leva uma facada ou tiro no coração e ocorre um derramamento de líquido, isto abre uma passagem entre a cavidade, o ventrículo e o átrio e esses dois folhetos. Estes últimos se enchem de sangue (tamponamento pericárdico agudo). Uma das várias soluções para este tamponamento consiste em abrir o peito do indivíduo na sala de emergência e esvaziar o pericárdio dele (toracotomia de emergência). Dificilmente o paciente sobrevive a tal procedimento.
(FONTE: http://www.medsara.hpg.ig.com.br/aorta.htm, consultado em 04/12/2010)