- Eu gostaria de dois bifes a parmegiana, bem passados. Também duas cocas e uma cestinha de pãezinhos, só para beliscar. Ok?

Anotei tudo cuidadosamente e encarei o senhor de olhos negros e petulantes. Seu rosto era cheio de rugas, seu lábio inferior era murcho. O nariz parecia uma árvore plantada o lugar errado, e se houvesse um concurso de maior napa do mundo com certeza ele seria eleito o napa man da vez. O nariz, aliás, combinava com sua postura ereta demais. Parecia que o cara tinha entalhado um cabide nas costas. Velho insuportável. Ele já havia pedido duas garçonetes, eu era a terceira. Tudo porque ele não havia gostado do atendimento. Suspirei e acenei positivamente. Sorria. Apenas sorria.

 - Ok. Dentro de alguns instantes irei trazer seu prato. – Respondi, com uma doçura forçada.

Ele demorou alguns segundos me analisando.

 - Ótimo – Disse por fim, e voltou a conversar com sua acompanhante, uma garota de 19, talvez 20 anos. Ruiva de olhos verdes. Muito bonita para estar com um cara tão… eca. Ele devia ter muita grana…

  Caminhei entre as mesas, contornando-as automaticamente. Eu trabalhava naquele restaurante a 2 anos. Conhecia tudo ali, tudo. Sorri ao passar pela porta da cozinha, colocando o papel onde havia anotado o pedido do velho chato na abertura de pedidos.  James, o chefe, imediatamente o pegou e o leu ajeitando o óculos no nariz fino. Enquanto ele lia o pedido, fiquei o analisando. Eu o adorava. Na cabeça ele tinha um chapéu branco de chefe. O cabelo era prateado pela idade, e quase roçava nos ombros. Ele era um coroa muito bonito. Seus olhos azuis se fixaram nos meus quando ele terminou de ler.

 - Quem é esse, querida? – Me perguntou, com a mesma voz baixa e calma de sempre.

 - O chato da mesa 7. Capriche no pedido Jay – Suspirei, dando ombros.

 - Pode deixar - Ele respondeu, a nota de alegria na voz.

 - Mesa 7! – Lorens exclamou, me chamando.

 Me aproximei do balcão e peguei a bandeja com duas latinhas de Coca que ela estava indicando. Lorens era responsável pelas bebidas.

 - É o chato do velho do beiço murcho? – Ela me perguntou, entediada.

 - Sim – declarei, sem emoção alguma na voz.

 - Imaginei – ela girou os olhos e apontou para a outra bandeja. – Leva essa, é da mesa 5. Mandy ia levar, mas o celular dela tocou e até agora nada!

 Apenas maneei a cabeça, e com a mão livre, peguei a outra bandeja. Duas latinhas de cocas e dois copos, ambos com limão e gelo. Preocupada com Mandy, equilibrei as duas e saí andando totalmente avoada. O lado bom de trabalhar num lugar a muito tempo é saber onde pisar sem se preocupar. Embora eu estivesse avoada, consegui chegar a mesa do velho rabugento rapidamente, sem esbarrar em nada em ninguém. Com toda delicadeza que pude coloquei os copos na mesa com todo cuidado do mundo e abri as latinhas, servindo-os, mesmo com uma bandeja na outra mão.

- Obrigado – Ele disse, para minha surpresa. Wow. Ele tinha educação.

- De nada – Forcei um sorriso e me encaminhei para a mesa cinco, que ficava perto da janela.

  Foi então que aconteceu. Primeiro eu vi Mandy entrar assim que a porta bateu suavemente. Foi um som baixo, mas mesmo assim eu escutei. Ela tinha um sorriso suave nos lábios. Um sorriso de alívio. Mas o que aconteceu foi que eu não entendi. Quer dizer, eu entendi. Meio segundo depois, mas entendi.

  Veja, Mandy estava sorrindo quando passou pela porta. Mas quando me viu seus olhos verdes se arregalaram levemente e ela disse “Cuidado!” num berro alto e coletivo, já que alguém berrou exatamente isso ao mesmo tempo. E aí… bom, eu só senti que esbarrei numa coisa alta e forte. Eu estava distraída, a pessoa também. A colisão foi inevitável. A bandeja voou, os copos caíram no chão, o refrigerante escorreu pelo piso claro.

  Mas tudo isso foi afastado de minha mente quando encontrei os olhos mais intensos que já havia visto enquanto sentia algo atingir minha cabeça com força.

  Repentinamente meus olhos ficaram pesados e perdi a consciência quando minha mente escureceu num breu total.