O Diário Secreto de Uma Caçadora escrita por FaaniZabini


Capítulo 7
Todo sonho tem seu preço (Parte I)




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Capítulo VII – Todo sonho tem seu preço (Parte I)

13 de novembro de 2009

Ninguém nunca vai acreditar no que aconteceu. Nunca.

Matthew está bravo comigo. "Seu namorado é mais importante do que seu Sentinela". Ah, qual é, todo mundo sabe que é a mais pura verdade. Juro que se ele tivesse uma estaca em mãos na noite de ontem, teria matado Tristan. "Você quase me deixou morrer". Quando ele fala assim, eu penso que realmente deveria ter deixado.

O fato é que ele me contou meio por cima a história de Tristan trabalhar conosco. A cada Caçadora escolhida, um vampiro é escolhido pelo Conselho dos Guardiões, o mesmo órgão que treinou – muito mal, por sinal – Matthew. É esse vampiro que precisa zelar pela vida da Escolhida, pois só ele tem força o suficiente para protegê-la e ajudá-la.

Tristan é o meu vampiro. Ele está condenado e amaldiçoado a viver comigo pra sempre, pra me proteger na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, até que a morte nos separe. Amém.

De qualquer forma, eu não havia engolido essa história de "hei, eu sou um vampiro, mas eu sou bom". Pelo menos não até hoje à noite. Mas, primeiro, deixe-me contar do sonho que tive anteontem, que foi quando tudo começou.

Eu estava em um beco sem saída. Não, eu estava correndo e me deparei com um beco sem saída. Enxerguei algo vindo em minha direção, uma sombra. Então o vislumbre ficou visível. Era aquela criatura que vi no cemitério na outra noite. Sorrindo pra mim.

Gritei. Acordei. Banhada em suor.

Demorei a perceber que estava em meu quarto, em segurança. Levantei-me, trêmula, e caminhei até o telefone. Disquei o número de Matt.

-Eu tive um sonho – disse, antes que ele dissesse alguma coisa – Aquilo estava correndo atrás de mim.

-Certo, certo – ele parecia desorientado – Estive pesquisando sobre ele. Tristan esteve fazendo investigações. É relativamente possível que ele esteja mesmo correndo atrás de você.

-Okay – comecei a fungar, nervosa. Ansiosa.

Sem ouvir mais nada do que Matt dizia, coloquei o telefone silenciosamente no gancho e fui até a janela. A idéia daquela coisa correndo atrás de mim de verdade me assustava. Tive a impressão de que, assim que olhasse através do vidro, veria aquela sombra a sorrir-me de forma sombria. Mas não foi isso que vi.

Num primeiro momento, pensei que era Tristan. Fumando. Quando ele colocou as mãos nos bolsos do casaco de couro comprido, percebi que Tristan não faria isso – ele acenaria e sorriria presunçoso. Apertei os olhos, vendo o cabelo loiro não bagunçado, como sempre, mas penteado para trás.

E, assustadoramente, um par de olhos me observava. Olhos que não eram de Trip, decididamente. Mantive meu olhar firme, apesar de estar morrendo de medo por dentro. Então, fosse quem fosse, ele deu um sorriso torto e uma enorme covinha se abriu em seu rosto. No momento seguinte, ele desaparecera.

Continuei olhando para o lugar onde estivera, puxando pela memória o máximo que consegui para ter certeza se que já não o vira de algum lugar. Ele me parecia estranhamente familiar. Familiar demais.

De qualquer forma, deitei-me de novo e dormi como se nada tivesse acontecido. Afinal, nada tinha acontecido. Na manhã seguinte, minha cabeça doía como o inferno. Matt me ligava insistentemente, preocupado.

-Nunca mais desligue na minha cara.

Adivinha o que eu fiz em seguida? É, eu desliguei. Não foi por vontade, mas sim porque mamãe apareceu à porta do quarto e daria um enorme trabalho explicar com quem estava falando às seis e meia da manhã e por quê.

Realmente não sei o que me deu. A minha manhã sempre é monótona – a noite é a parte interessante de ser uma Caça-Vampiros –, mas ela pareceu passar rápido demais. Tudo o que eu conseguia pensar era em Tristan. Ou, como descobri depois, no cara que eu queria acreditar ser Tristan.

Mas, no fundo, algo me dizia que nem todo vampiro loiro é... Espera, quem aqui falou em vampiros? Até onde eu sei – ou sabia, no momento em que formulei essa idéia – poderia muito bem se tratar de um cara normal. Um cara normal abaixo da janela da Caçadora que no instante seguinte desapareceu sinistramente.

Certo, havia um vampiro me observando. Um vampiro loiro que certamente não era Tristan. Isso não me cheirava bem.

Nathan simplesmente não ajudou muito naquela manhã. Eu estava sentada no banco, sozinha, pensando nos meus problemas e dilemas de Caçadora, quando ele se aproxima e senta ao meu lado, com cara de quem precisa dizer algo muito importante.

-O que foi? – perguntei, mal-humorada.

-O que acha de um jantar no sábado?

Eu o encarei, cética.

-Como um verdadeiro encontro? – abaixei o tom de voz – Sem cemitérios e vampiros e preocupações?

-Não como um encontro – ele ruborizou – É que, bem... Minhamãequerteconhecer.

-Hãn? – eu ouvi direito?

-Mamãe quer te conhecer – murmurou.

-Você fala de mim pra sua mãe? – juro que por essa, realmente não esperava.

-Você não fala de mim? - Nathan fez um bico ofendido.

-Claro que falo – mentira –, mas não sabia que você falava.

-Se você não quiser ir, tudo bem.

Se eu não quisesse ir? É claro que eu queria! Nathan falava de mim pros seus pais, que reação ele esperava que eu tivesse? Que dissesse que é muito cedo?

Qual é, se ele me dissesse que dissesse: "Anne, Las Vegas, um casamento rápido, topa?", eu já estaria lá.

O problema é que eu tinha problemas demais. A noite de sábado é, como facilmente se conclui, a mais movimentada da cidade. E, na função que há pouco tempo estou exercendo, percebi que o sábado também é assim para a Caçadora. É só fazer a conta: mais gente nas ruas, mais vampiros famintos em busca de comida.

Como se isso já não fosse o suficiente, havia aquele monstro que não se podia matar à solta, provavelmente me perseguindo. E um vampiro estranho, mas esperto – de alguma forma, eu tinha certeza disso – me observando.

-É claro que eu vou – esforcei-me para sorrir – Ouça, há alguma coisa errada.

-Vampiros não deveriam existir. É claro que há alguma coisa errada.

-Não, além disso – eu realmente preciso aprender a me expressar melhor – Ontem à noite, havia um vampiro na minha janela. Eu não sei o que ele quer, nem o que fazer para descobrir.

-Não era o idiota loiro? – de alguma forma, me doeu ouvi-lo falar assim de Tristan, embora tivesse que admitir que era a mais pura verdade.

-Não, por mais que de longe realmente parecesse. Antes disso, eu tive um sonho, aquela coisa, seja lá o que era, correndo atrás de mim. Matt, por Deus, nem sei se acredito nele, é tão burro, mas Matt disse que é possível que esteja mesmo atrás de mim.

Nathan franziu o cenho.

-Você não é a Caçadora? – perguntou – Digo, você é a pessoa mais forte que existe, não é? O que você tem a temer?

-Eu sou a pessoa mais forte. O que eu estou prestes a enfrentar não é uma pessoa, Naty – resmunguei, fazendo bico.

-Você deve ser mais forte que essas coisas. Você é a Caçadora, querida – ele deu um sorriso tranquilizador.

-Sei disso. Mas eu não posso matá-lo. Isso não pode ser uma coisa boa – suspirei pesada e cansadamente – Eu só queria que isso...

E então eu o vi. Parado sobre da sombra que caia em frente ao hall de entrada do colégio, o casaco de couro da noite passada, o mesmo sorriso e um olhar curioso. Meu estômago afundou e soltei a mão de Nathan.

-Fique aqui – sussurrei, arrancando a mochila dos ombros e caminhando lentamente até lá.

Ele não moveu nem um músculo ao ver-me aproximar. Isso me assustou. Algo dentro de mim me mandava correr para longe, mas seu olhar sustentando firme o meu dizia o contrário. Venha, brinque... morra. Apertei o passo, vendo-o recuar para o hall, até ficar conpletamente fora de minha vista. Parei um momento à porta, pensando duas vezes antes de entrar, mas enfim dando o primeiro passo.

Como eu deveria ter imaginado, ele estava fora de vista. O hall estava deserto, quase completamente tomado pelo sol, o que comprovava a teoria de que seria um vampiro. Mesmo sem poder vê-lo, eu sentia sua presença, como se ouvisse sua respiração.

-Ah, qual é! – exclamei, frustrada, torcendo pra que não houvesse ninguém além do vampiro me observando falar sozinha.

Senti-me, então, ser segurada com força pelo antebraço. Apesar de estar usando várias blusas, seu toque frio alcançava minha pele, me deixando arrepiada. Eu sabia que era mais forte, mas de qualquer forma, não me movi. Permaneci com a respiração suspensa até que ele virou meu corpo, nos deixando frente a frente.

Seus olhos castanhos me analisaram de cima a baixo, devagar, como se saboreasse uma refeição antecipadamente, e então se prenderam aos meus.

-Regra número um, sempre ande com uma estaca no bolso. Mesmo que seja dia – disse, o sotaque inglês que eu sabia conhecer de algum lugar.

Ele abriu um sorriso maroto e soltou meu braço, aproximando o rosto do meu. Oh meu Deus, oh meu Deus, oh meu Deus. Com os lábios bem – realmente BEM – próximos ao meu ouvido, sussurrou:

-Está prestes a ficar divertido.

Não pude fazer nada para impedir que ele se voltasse para a porta e saísse, lenta e despreocupadamente. Algo dentro de mim dizia que eu não deveria me preocupar em ir atrás do loiro e perguntar o que ele queria de mim; ele acabaria me contando de qualquer forma, mais cedo ou mais tarde.

No caso, mais cedo do que eu podia imaginar.

Fiquei sozinha, parada por um longo tempo no mesmo lugar, tentando lembrar aonde já ouvi aquela voz. Quando finalmente acordei, vi que além de uma lembrança, o vampiro havia me deixado algo. No chão, caída acidentalmente – tive certeza de que não foi um acidente –, uma foto. Abaixei-me e peguei-a nas mãos.

Uma bela loira me encarava, sorrindo como se zombasse de mim. Sorrindo como se dissesse venha, brinque, morra. Não sei de onde, imagens começaram a aparecer em frente aos meus olhos, como um déja vù. Imagens que eu conhecia da noite em que me tornei oficialmente a Caça-Vampiros.

Subitamente, eu soube o nome da garota da foto.

Buffy.

-Buffy – repeti pra mim mesma, antes de sair correndo.

Simplesmente ignorei os olhares curiosos que caiam sobre mim, a louca desvairada que corria até onde havia deixado Nathan. Ele continuava lá, sim, com uma cara confusa, arrumando minha mochila e encontrando... você. Meu diário.

- – desesperei-me.

Ele fez cara de "ãhm?" e voltou a enfiar o diário na bolsa. Eu a tirei de suas mãos de forma rude, fazendo-o dar de ombros. O fato é que, só de pensar que ele poderia ler meus últimos relatos, o sangue congelava.

-O cara loiro – perguntou ele, mudando bruscamente de assunto – Ele era o cara de ontem?

-Eu sei quem ele é – não, eu não sabia – Quer dizer, eu não sei. Mas algo me diz que a informação está no meu subconsciente. Só preciso falar com Matt.

Nathan concordou com a cabeça, me olhando como se eu fosse uma aberração. O que, na verdade, eu era. Fiquei rodando no lugar, feito uma barata tonta, até que o sinal bateu, indicando o fim do intervalo.

-Eu preciso ir – falei, baixo – Ouça, diz que eu fiquei doente, ou que eu morri, sei lá. Inventa alguma coisa – Nathan mentindo? Isso não iria acabar bem – Nos vemos mais tarde, okay?

Sem esperar resposta, dei-lhe um beijo na bochecha e saí.

É uma verdadeira sorte que eu seja rápida, pois olhei para os dois lados e saltei o muro alto diretamente para o lado de fora. Ninguém teve a chance de ver que eu não estava mais ali, tão rápido aconteceu – acho que finalmente comecei a usar a agilidade da Caçadora para coisas úteis, como gazear aula.

Próxima parada: casa do Matthew. Do outro lado da cidade. Tentei não correr, caminhar tranquilamente pelas ruas semidesertas, mas a ansiedade tomava conta de mim. Eu queria lembrar – eu estava tentando lembrar –, mas meu instinto de Caça-Vampiros disse que apenas quando eu chegasse até Matt conseguiria.

Sobre essa coisa do instinto, é algo que Matt me disse numa de nossas primeiras patrulhas. Toda Caçadora o tem e é a mais importante fonte de poder. É de onde vem a força, falando de forma psicológica. Andei pensando sobre isso e cheguei à conclusão de que o instinto da Caça-Vampiros é uma pessoa. Uma pessoa que está presa em um manicômio e que, às vezes, tem uma crise de loucura, grita sem parar e só pára de se descabelar quando alguém atende sua vontade – ou seja, eu.

Bati à porta com tanta força que, novamente, quase a quebrei. Matt apareceu à janela, ajeitando os óculos sobre o nariz delicadamente, antes de abrir a porta para mim. Ignorei sua expressão de "o que diabos você está fazendo aqui?" e entrei como um furacão.

-É por isso que eu gosto de vampiros – resmungou ele – Precisam ser convidados para entrar.

-Matt, o que você sabe sobre Buffy? – perguntei, sem perder tempo.

Oh, eu não imaginava que sal reação seria essa. Matthew simplesmente arregalou os olhos, abriu a boca, ficou branco e tombou sobre o sofá. Fiquei tão sem ação que só consegui fazer o mesmo.

-Eu deveria ter te falado sobre Buffy, é claro – disse ele, depois de um longo tempo, mas ainda meio atrapalhado.

-Quem é Buffy?

-Buffy é uma Caça-Vampiros – Matt pigarreou – Mas, até onde eu sei, ela está viva.

Okay, eu não era única?

-Não foi a morta dela que ocasionou os meus poderes? – indaguei, rouca.

-A Caça-Vampiros que veio antes de você se chamava Faith. Uma garota brilhante, realmente – abriu um leve sorriso, como quem lembra algo realmente bom – Faith veio antes de Buffy. Veja, é uma história complicada, nem eu mesmo sei direito. Algo sobre um afogamento, o apocalipse, um portal interdimensional e Buffy voltando da morte. Duas vezes.

Minha boca se abriu, em surpresa.

-Faith foi chamada – uma pausa longa demais – A morte de Faith ocasionaria uma nova Caça-Vampiros. Ou seja, você.

-Buffy. Me fale sobre Buffy – exigi.

-Buffy, bem, ela continua viva. Até uns tempos atrás, não existia apenas Buffy e Faith, mas sim várias Caçadoras, chamadas de Potenciais. Você foi uma espécie de Potencial de Reserva, por isso não foi despertada juntamente com as outras.

-Por que elas não existem mais? – eu estava certa de que tinha alguma coisa a ver com a criatura que sonhei noite passada.

-É tudo parte de um plano – disse, sério – Aquela coisa que você viu, a morte de Faith, Buffy e as outras Caça-Vampiros perdendo seus poderes, os sonhos de Tristan e dos demais...

-Sonhos? Que sonhos? – meu coração se apertou.

-Todos os vampiros estão tendo sonhos. Sendo chamados – explicou –, mas Tristan não soube, ou não quis, me explicar para quê.

-Buffy perdeu os poderes, então – murmurei comigo mesma – Ela não é mais uma Caçadora. Seus poderes passaram para mim.

-Geralmente, os poderes da Caça-Vampiros que morre é passado para a próxima, mas no seu caso, não só os poderes de Faith chegaram até você. Os de Buffy e das outras também.

-Quer dizer, eu sou a mais forte Caça-Vampiros que existiu? – tive que abrir um sorriso.

-Mais forte, mais ágil, mas rápida, mais precisa, mais tudo. Inclusive, mais humana. E mais demoníaca, se preciso – Matt franziu o cenho e coçou o queixo, pensativo – Você não me disse o que sabia sobre Buffy.

-Ah, sim – fuçei o bolso da jaqueta e tirei a foto – Essa era ela, certo? Eu... – algo me disse para ficar calada sobre o vampiro loiro – eu encontrei-a.

-Encontrou-a onde? – perguntou, as sobrancelhas erguidas e um ar desconfiado.

-Por aí, mas de qualquer forma – me apressei em mudar de assunto –, assim que vi a foto, soube que seu nome era Buffy e que ela foi importante.

-É o instinto. Com os poderes das Caçadoras que você herdou, certas lembranças se tornam vivas também.

Concordei com a cabeça, enfiando a foto novamente no bolso. Buffy, Buffy, Buffy. Havia algo naquele nome que me ligava ao vampiro loiro, sim. Mas o quê? Matt havia acabado de dizer que eu heradara as lembranças junto com os poderes, mas eu precisaria de muito mais que isso para descobrir quem era o vampiro loiro que me lembrava Tristan.

Ou talvez umas poucas lembranças fossem o suficiente.

-Eu lembro de Buffy por que, apesar de viva, tenho as lembranças de seu tempo de Caça-Vampiros? – perguntei, uma idéia se formando em minha mente bagunçada.

-Acho que sim. Mas você também pode conhecê-la pelas lembranças de Faith – explicou.

-Há algum jeito de trazer essas lembranças à tona? – era uma pergunta idiota, mas o que posso fazer? Eu sou uma idiota.

Uma idiota forte, ágil, precisa e que precisava desesperadamente abrir uma arca cheia de segredos.

-É a mesma coisa que montar um quebra-cabeça. Você só precisa de uma referência, um ponto de partida, e terá as quatro pontas. Então, é só preencher o meio.

Isso era confuso, mas eu entendi. Eu precisava encontrar aquele loiro de novo e nenhuma pergunta precisaria ser feita. O instinto se encarregaria disso. Estava certa disso.

De qualquer forma, pareceu-me que a noite chegou mais cedo que o normal. Eu estava ansiosa, mas ainda assim, estranhamente calma. Sabia que minha ronda seria emocionante – muito, muito emocionante – e isso simplesmente valia a espera.

Quando o relógio bateu as oito, horário da primeira ronda da noite, eu saí. Sentado na escadinha que dá para o jardim, encontrei Tristan. Meu coração disparou ao vê-lo, mas eu estava tão focada sobre resgatar as lembranças de Buffy que não demonstrei.

Ah, quem eu quero enganar. Comecei a suar frio, minhas pernas bambearam, a estaca em minha mão tremeu e eu perdi a fala. O fato foi que, apesar disso, ele pareceu não perceber – ou pelo menos disfarçou melhor que eu.

-Tem algo errado – disse, dando um salto e ficando cara a cara comigo.

Oh Deus, dê-me ar.

-Você sabe alguma coisa sobre... Buffy? – perguntei, arfando.

Tristan uniu as sobrancelhas e me encarou, como se perguntasse "o que diabos ela tem a ver com isso?". Eu bati o pé no chão insistentemente, fazendo-o perceber que precisava da resposta para aquela noite.

-Buffy, a Caça-Vampiros. (N/A: desculpem, não resisti :~). Todo mundo nessa área a conhece.

-Conhece algum vampiro loiro que tenha a ver com o caso?

-Vampiro loiro que tenha a ver com Buffy? – ele deu uma risada rouca – O que ele tem a ver com isso?

-Está por aqui – respondi.

Trip sorriu.

-Bom saber. Ele me deve duzentos dólares e dois gatinhos.

Duzentos dólares e dois gatinhos? Bem, resolvi não perguntar o que os gatinhos tinham a ver com a dívida.

-Sabe onde posso encontrá-lo?

Por que eu não perguntei quem ele era de uma vez?

Porque eu tinha esperanças de que Tristan dissesse o que ele disse:

-Um lugarzinho unerground, com muita bebida e uma banda indie. Bat's Pub – se eu sabia o que era o Bat's Pub? Não, eu não sabia – Vamos, eu te levo até lá. Preciso cobrar aquele infeliz.

Eu sorri internamente e passei a caminhar lentamente ao seu lado. As ruas estavam desertas, somente o som de nossos passos era audível. Eu queria quebrar aquele silêncio, mas como era ele quem havia mentido pra mim, esperei que o fizesse.

-Obrigado por ter me salvado, aquela noite – disse, depois de um longo tempo.

-É a minha função – encolhi os ombros, achando ali uma brecha para perguntar o que estava com vontade – Matt me contou que você anda tendo sonhos.

-É. Acho que todos os vampiros estão tendo esses sonhos.

-Sobre o quê?

Ele me encarou, me fazendo parar no lugar. Então desviou o olhar e continuamos a andar calmamente. Foi quando percebi que não me contaria.

-Eu também estou tendo sonhos. Com aquela coisa – contei.

-Deixe-me adivinhar. Está correndo atrás de você? – seu tom possuia a frieza da certeza; me limitei a lhe lançar um olhar breve – Matt te contou...

-Que ele está mesmo correndo atrás de mim? Sim – respondi, amarga.

-Ele não está correndo atrás de você, ou você estaria morta – arrepiei-me – Ele só está brincando um pouco antes do grande plano.

Eu parei no caminho. De novo. Desta vez, pelo tom de voz que Tristan usou. Era como se estivesse... fascinado. Fascínio. Ele parou ao meu lado, com uma expressão de "o que foi?".

-O que seria o "grande plano"? – perguntei, numa frieza que não era minha.

-Não sei. Mas será grande. Escreva o que estou dizendo.

Fascínio, de novo.

-Me leve até o vampiro – falei, sem emoção, querendo acabar logo com aquela maldito passeio.

Porque, pela primeira vez, Tristan estava me dando medo.

-O que foi? – indagou, enquanto caminhávamos novamente em silêncio.

Apenas balancei a cabeça, sem responder. Tristan continuou me encarando, mas evitei seu olhar, olhando bravamente para frente (Nota mental: isso pode ser usado como uma metáfora durante meu caminho como Caça-Vampiros).

-É aqui – sussurrou ele.

O Bat's Pub era um lugar underground, ouvia-se uma banda indie tocando e havia muita gente bêbada, sim. Ah, e eu tive nojo de botar meus pés lá dentro – juro que vi uma barata passar por mim quando o fiz. (N/Fani: saudades das festas de detetização do Bronze *.*).

Dei um olhar geral e, sem dificuldades, eu o vi. Os cabelos loiros penteados para trás, o casaco de couro preto, o corpo debruçado sobre um balcão, lentamente molhando os lábios num corpo do que deveria ser... Não sei, não entendo sobre bebidas. Mas, certamente, não era Coca-Cola.

Ele virou-se para mim como se houvesse me sentido. Então sorriu, pousou o copo vazio sobre o balcão e caminhou em direção a uma porta, no outro extremo do pub. Tristan balançou a cabeça, abrindo caminho por entre a multidão e fazendo sinal para que eu fosse atrás dele. Era a porta dos fundos, que dava para um beco. Não, não era simplesmente um beco. Era o beco.

O beco do sonho.

-Tristan, eu já estive aqui – falei, segurando-o pelo braço.

Trip colocou a mão sobre a minha, como se isso fosse me acalmar.

-Vamos. Ele ainda está aqui.

Sem soltar minha mão – oh-meu-Deus! –, caminhamos pelo beco, devagar, até uma lixeira cheia até a boca. Não, ele não estava ali.

-Lá em cima – disse Tristan – Venha, eu te levo.

Oh, medo de altura. Medo de altura. Medo de altura.

-Qual é, feche os olhos – ele crispou os lábios e me pegou no colo, dando aquele salto que faz meu estômago se embrulhar.

Quando abri os olhos, estávamos lá em cima. O vento mais forte castigava meu rosto, enquanto eu saía – sem querer sair, que fique bem claro – dos braços de Tristan.

E ali, bem à nossa frente, estava ele.

-Tristan. Caçadora – deu um sorriso e fez um pequeno gesto com a cabeça, como se nos cumprimentasse.

Eu estou me afogando em você.

-Eu estou me afogando em você – sussurrei para mim mesma, me aproximando devagar. Ele não fez menção de recuar – Eu estou me afogando em você.

-Olá, Anne – disse, como um pai que encontra um filho depois de muito tempo.

Eu estou me afogando em você.

É, eu conhecia aquela voz. Era inesquecível.

-Olá, Spike.


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