Cravos escrita por AHB


Capítulo 1
Cravos




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Elas não estavam prestando atenção no velho professor. Talvez ele estivesse falando sobre o autor do texto indicado para aquela aula e era tão arrastado... Decididamente faculdade não era para isso.

Trocavam bilhetinhos, entre risos. Trocavam confidências, escreviam qualquer bobagem, não fazia diferença. Toda graça residia em ser um ato pueril. A que sentava mais a frente era morena e gordinha. Logo atrás dela estava sentada uma mocinha de cabelos castanho-avermelhados e era delicada feito uma boneca de porcelana. Bonitas. Exalavam juventude nos risos, na pele macia e modos despreocupados.

De repente a ruivinha quis espremer um cravinho no ombro da amiga. Ferrou os dedos feito garras no braço da outra. Espremeu um, dois e três, deixando marquinhas avermelhadas sobre a pele cor-de-jambo.

A moça morena prendeu o cabelo cacheado e farto em um coque. Quase uma sacerdotisa grega. Como vestia uma regata amarela bastante justa, parte das costas e a nuca ficaram expostas, disponíveis às mãos ágeis da colega.

De fato, a ruiva esfregou as pontas dos dedos ao longo da porção superior das costas da amiga, em busca de mais cravinhos. Se demorou na elevação dorsal, traçando linhas imaginárias na parte superior da coluna da moça. Teria a morena se arrepiado?

Como podiam fazer algo assim em uma sala de aula abarrotada de gente? Era como se houvesse apenas elas e eu fosse uma intrusa trespassando a indiferença com que ambas tratavam o resto do mundo.

Com todo cuidado para não ser notada, para não as atrapalhar, assisti a moça ruiva tocar a cintura da amiga, que havia apoiando o corpo de tal forma na carteira, que era possível ver parte da roupa íntima – preta com bolinhas brancas – escapando dos limites do cós da jeans. As mãos pequenas da jovem acarinharam toda parte nua ao alcance, ainda caçando cravinhos. Tinha que expurgá-los dali porque eram um claro acinte a figura bela da outra.

Com os indicadores rastreava as impurezas e então as espremia com os polegares, quase obsessiva indo de um pontinho a outro.

“Menina, desse jeito você vai deixá-la toda marcada!” pensei, ainda observando em silêncio a sequência de gestos delicados e toques.

A morena murmurou algo que só a amiga pode ouvir. Devia estar quente a pele dela e quem sabe os dedinhos lhe causassem mais arrepios?

Logo a blusa amarela estava dobrada até quase a altura do soutien, agora todo dorso ao alcance da pequena. A morena deitou a cabeça sobre os braços cruzados sobre a mesa, o corpo parecia uma ponte em arco pelo qual os dedinhos da colega caminhavam enlevados. Quase antevi a moça tocar com os lábios cor de cereja cada uma das marcas que fizera na pele bronzeada.

Antes que isso acontecesse, porém, as duas repentinamente voltaram a sentar-se de maneira adequada e, feito uma cortina amarela, o tecido em segundos já voltara a cobrir as costas.

Ainda sorriram de maneira cúmplice e ficaram por pouco de dar as mãos por baixo das carteiras. Apenas elas, eu de testemunha de um indiscreto ato secreto de amor.

Logo em seguida o professor anunciou o fim da aula. Soube que não as veria novamente, não mais sob a luz de uma espantosa naturalidade, agora obscurecida no véu de decência, perdidas na busca de algum motivo inocente para se aproximar.

14 de maio de 2010.


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