Noiva por Herança escrita por Juffss


Capítulo 4
Capítulo 4




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/85503/chapter/4

Agência de Empregos

30 de abril de 2005

14h38min

- Então, senhorita Hale – um senhor grisalho e de terno falou olhando o currículo que lhe entreguei – seu currículo é, no mínimo, curioso.

- Sempre fui fixada na perfeição – justifiquei, mesmo sabendo que não era sobre isso que ele falava. Ele pegou uma caneta e escreveu alguma coisa em uma folha branca que tinha ao lado de algumas pastas. – Principalmente quando têm muitos por menores.

- Dez línguas? – ele perguntou pasmo.

- Alemão, Chinês, Dinamarquês, Espanhol, Francês, Grego, Italiano, Japonês, Português e Russo – sorri – Tirando minha língua nativa, claro, o Inglês.

- Fala essas línguas fluentemente? – seus olhos continuavam fixos no meu currículo e ele permanecia com a caneta sobre a folha escrevendo coisas que não podia ler.

- Sim. – respondi simplesmente.

- Você tem diversos diplomas em diversas áreas. Em qual dessas, você, prefere trabalhar? – seus olhos oscilaram entre me olhar e olhar o currículo.

- Gosto da área empresarial, a parte artística e social eu prefiro utilizar apenas em minha vida. – falei honesta passando a mão pelos meus fios presos em um coque mal feito.

- Defina o porquê de querer usar alguns de seus diplomas apenas para a sua vida pessoal. – ele disse fechando a pasta que continha meu currículo e colocou em cima a folha já escrita pela metade.

- Eu gosto de coisas que me desafie a cada dia – sorri confiante – Teatro, culinária, moda, decoração, economia... Essas coisas são úteis, para minha vida pessoal, porém não são mais desafiadoras.

- Economia é sempre um desafio. – ele jogou.

- Não quando se consegue viver bem com 1/9 do que já viveu mensalmente. – ele me olhou incrédulo e eu confirmei com a cabeça.

- Também faz malabarismo com o dinheiro – ele riu. – Com o seu currículo, sua confiança, sua postura... Senhorita Hale, terá fila de homens te esperando para trabalhar para eles. Não te garanto que poderei compactar todo o seu currículo empresarial, mas farei o possível para te arranjar o melhor dos empregos dessa cidade – disse se levantando e estendendo a mão para que a apertasse – e se não gostar, não tem problema, eu te arranjo mais milhares em um dia. Você vale ouro.

Eu levantei com um sorriso ensaiado no rosto e apertei sua mão da forma mais confiante que consegui. Ele sorriu enquanto me acompanhava até a porta de entrada. Despedi grata a ele, porém eu sabia que ele só faria minhas vontades porque eu daria ouro a ele. Com meu currículo seria fácil ele arrumar comissão por ter entregado “a melhor” para um magnata qualquer. Mas eu não era a melhor, nunca fui e talvez nunca seja.

Deixei meus pés me guiarem para o mesmo local de sempre. O parque parecia mais quente a cada dia e o terno preto que usava estava me fazendo suar. Delicadamente eu desabotoei o blazer e o retirei colocando em cima da bolsa. Depois desabotoei os primeiros botões da minha blusa social e dobrei os seus punhos até o cotovelo. Andei mais alguns metros até sentar no mesmo banco de sempre.

Deixei minha mente viajar pelos rostos de felicidade das crianças a minha frente que brincavam no parquinho com suas mães. Por alguns momentos eu queria me lembrar, ou viver, como é isso. De uma coisa eu poderia ter certeza absoluta: não é como brincar com a babá. Sorri triste quando a bola de um dos meninos parou aos meus pés. Só por uma vez eu queria saber como é brincar com meus pais. Peguei a bola entre as mãos e a joguei para ele. Sua mãe levantou o braço agradecendo e eu sorri. Dessa vez, um sorriso sincero.

Talvez, ter perdido meus pais tão cedo, tenha trago algumas conseqüências. Eu nunca mais teria alguém para me defender dos meus medos ou para me contar uma história mesmo que de mentira. E sobre isso só me restavam memórias, doces memórias.

Fechei meus olhos tentando imaginar como seria ter momentos familiares. A imagem da minha mãe sorrindo e de meu pai mandando uma bola em minha direção invadiu minha cabeça de um modo avassalador. Eu não estava fazendo um bom trabalho em bloquear esses pensamentos ultimamente.

Algum dia talvez eu tivesse uma família, se algum dia eu me visse longe de Royce, claro. Eu não queria me encostar a ele dessa maneira, nunca. Mas se algum dia eu puder montar uma família como ela seria?

Minha mente vagou pelos olhos de cada criança procurando alguma família unida. E eu a encontrei entre o balanço e o escorregador. O pai segurava a filha menor enquanto ela descia no escorregador, e a mãe brincava de esconder com o filho entre os balanços. A criança maior se escondeu entre as pernas do pai e a mãe correu em direção a menor a pegando e a levantando no ar enquanto o pai fazia a mesma coisa com o menino. Os dois colocaram os filhos em seus colos e se beijaram carinhosamente. Sorri involuntariamente para a cena.

Os filhos então foram colocados no chão e enquanto o menino pedia ao pai para balançá-lo a menina pedia colo para a mãe e coçava seus olhinhos. Aquilo me fez lembrar o passado, minha pequena mania infantil. Mordi os lábios enquanto repelia, mais uma vez, a imagem de meus pais na cama de casal, felizes e me esperando para conversar algumas coisas por alguns minutos. Era minha hora favorita do dia.

Lembrei também das diversas vezes, após a morte da mamãe, que caminhei com passos lentos e bati na porta do quarto do papai e ele não abriu e nem me respondeu. Normalmente uma babá vinha atrás de mim e me levava para o quarto na tentativa de me recolocar para dormir. Foi um período difícil para mim. E para papai também, mesmo assim, isso não justifica o que ele fez.

Noiva. A palavra soou novamente em minha cabeça. Parecia que ela fazia questão de me lembrar o quão infeliz eu sou. Onde meu pai estava com a cabeça? Meus olhos foram tomados por lágrimas que fiz questão de não derramar. Olhei para o céu tentando me concentrar em outra coisa e uma nuvem em formato de coração me chamou a atenção.

Amor... O que era o amor e por que eu nunca senti isso? Talvez não tenha sido escolhida para amar, só isso. Mas sempre me falaram que o amor era essencial... Mas cadê ele na minha vida?

O amor é a união de corações, um sentimento abstrato, troca de olhares. Amor é o mais importante, não se dá pra viver sem ele.

Estou vendo como eu não vivo sem ele... Qual é? Amor é só uma coisinha a toa que me tira do sério, dispensável, pra não falar inexistente. Mas também não quero me casar sem ele. Isso é, se ele existir. Mas, mesmo assim, entre nós não há nenhuma qualidade de uma relação, de mim por ele, pelo menos.

Para mim uma relação consiste em vontade, paixão e espaço. Temos que ter vontade de ficar perto da pessoa, e tem que ser uma vontade de ficar perto dela todos os dias de sua vida. Temos que ter paixão para esquentar as coisas, é, sem ela não dá mesmo para viver em um relacionamento... E o espaço, pois ficar grudado enche o raio do saco. Mas não será isso o amor? Não, isso é só uma relação.

Onde estão todos os olhares do amor? Tudo o que minha mãe me ensinou, mesmo que seja por um curto período, sobre ele? Eu ainda acredito em contos de fadas, mas, do jeito que as coisas resolveram vir, cada vez mais eu passo a não acreditar... Mas existem pessoas felizes e pessoas com quem devemos nos casar, isso é um fato!

Se eu pudesse escolher alguém para me casar, com quem seria afinal?

Antigamente eu achava que o meu príncipe encantado tinha que ser grande e forte, com olhos bonitos e um sorriso perfeito, mas não sei se tenho as mesmas preferências atualmente... Talvez olhos marcantes que me queimem por dentro e me consumam toda a felicidade existente em mim em apenas olhá-los, ou um corpo que me atrai fisicamente e que me faça sentir protegida de todos, poderia ter ainda um sorriso que me contagie. Ok, talvez minhas preferências não tenham mudado tanto.

Ele não precisaria ser rico ou só ficar comigo, nem sei se gosto de tanto carinho para falar a verdade. Meus lábios se contorceram negando uma pessoa muito... Melosa. Com certeza eu não quero um cachorrinho que fique atrás de mim 24 horas por dia e sete dias por semana, nos feriados e nas férias. Eu só quero saber que eu sou importante para alguém mesmo com todos os meus defeitos. E também sentir que existe uma pessoa que seja importante para mim como homem.

Sem questionar o meu controle minha cabeça vagou por cenas de um passado não tão distante. O estranho de covinhas que acabei descobrindo se chamar Emmett era tão... Perfeito. Eu puxei o ar e o soltei enquanto meus lábios se contorceram em um sorriso. Coloquei as mãos sobre meu lábio imaginando o que poderia ser se o celular não tivesse tocado. Eu o teria beijado sem nenhuma dúvida, e tenho certeza que iria gostar.

A lembrança de seus braços me apertando contra seu corpo me fez estremecer por dentro, ele, definitivamente, tinha pegada, e não era pouca. Dedilhei meus lábios imaginando sua proximidade naquela noite. Era estranho saber que nada aconteceu entre a gente e que agora tudo estava completamente diferente dentro de mim.

Eu estar ali talvez tenha sido uma dessas mudanças. Não costumava a passar minhas tardes no parque esperando que ele passasse por entre as pessoas e me visse sentada em uma cadeira o esperando. Ok, seria muito estranho esperar por ele sem conhecê-lo, mas eu estar no parque agora, era culpa dele.

            Só Deus sabe como desejo encontrar aquele homem de novo, mas quem sabe quando tudo com Royce acabar... Eu só preciso de tempo e dinheiro. E ai sim eu vou querer reencontrá-lo, rezando para que ele realmente tenha achado todas as mulheres que passaram em sua mira, incrivelmente chatas e indignas de sua companhia.



Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Noiva por Herança" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.