A garota mais popular da escola estava em sua própria festa de aniversário, rodeada por amigos e bajuladores. Era uma comemoração especial na mansão dos Durless, uma festa que ficaria lembrada para sempre. E sua irmã sabia disso. Ela mesma garantiria que isso acontecesse.

Algo especial te preparei
E sei que vou te surpreender
No seu aniversário

Angelina, conhecida por Anne, odiava seu nome, a cor de seu cabelo, a popularidade de sua irmã. Sua vida fora reduzida à sombra da primogênita, a mais talentosa, a mais perfeita... Era a Mary Sue do século XXI. Conseguia qualquer coisa que quisesse, sem exceções. Até mesmo o jovem Earl Phantomhive, rapaz mimado que vivia à custa do pai, dono de uma multinacional do ramo de Brinquedos. Angelina imaginou que ele fosse sua única glória em toda a vida. Earl a fazia sentir bela, especial, diferente. Na escola, quando se aproximavam acidentalmente, trocavam uma energia que ela não poderia descrever. Mas, óbvio, sua irmã resolveu retirar-lhe esse pequeno deleite também.

Não precisa mais fingir um grande amor
Já não ha motivo nem razão
É por isso que essa farsa já se acabou

Não que Rachel fosse má, mas era o que Angelina pensava. Dois anos mais nova, ainda sonhava com o príncipe encantado, o homem dos sonhos cuja existência ela afirmava sempre que podia. Aos quinze anos, não pedia muito da vida: apenas que tivesse um terço da generosidade com a qual sua irmã era agraciada.

Sei que assim vou me rebaixar
Mas desta vez eu vou ser má
E nesse aniversário eu comerei seu coração

Todos já haviam chegado. A turma do terceiro ano já estava mergulhada no cheiro impregnante do álcool. Seria melhor assim, ela parecia ser a única sóbria na mansão. E, logo, logo, colocaria seu plano em prática.

Todos vão se aborrecer
O seu aniversário
Vai ser de longe o pior

A música parou abruptamente. A gritaria foi unânime; os jovens, revoltados, bradavam impropérios enquanto Angelina se dirigia ao centro do salão, subindo, ao final, na mesinha de centro. Ela segurava uma garrafa de absinto, adquirida por meio de um amigo que possuía contatos com contrabandistas. Ela ergueu a bebida verde ao alto, e gritou, fingindo-se de bêbada:

– Hoje, gente, vocês sabem que é um dia pra lá de especial. É o aniversário da minha mana, Rachel, e eu tô aqui em cima pra pedir pra ela vir aqui pra eu falar uma coisa.

Sua irmã, que estava até agora se agarrando com Earl em um recamier no corredor, achou a ideia desafiadora, e foi ao encontro da irmã, que ainda estava sobre a mesinha.

– Hoje é o dia da celebração da sua nova vida, mana. É por isso que eu vim comemorar com você esse renascimento. Todo mundo grita parabéns pra Rachel!

Dizendo isso, virou a garrafa. O líquido verde desceu por todo o corpo de Rachel, que dançava alegre. Ela estava adorando aquela suposta trégua com a irmã. Parecia que as duas nunca mais iriam brigar. Rachel saiu, encharcada de absinto, entorpecida pelo cheiro fortíssimo do líquido, andando em direção ao corredor. Na outra sala, estavam esperando sua chegada para cantar os parabéns. Rachel se posicionou à frente do bolo, e aguardou que alguém viesse acender a velinha. A última cena que ela viu.

Desculpe…
Desculpe…

Por algum motivo, a vela incandesceu mais do que o esperado. O jato de fagulhas foi alto, com força suficiente para atingir o corpo embebido em álcool. A aniversariante pode sentir uma onda de ar fugir de si, enquanto sua visão escurecia e o corpo ardia.

Bye, bye, feliz aniversário

– Minha filha vai ficar bem, doutor? – Rachel podia ouvir sua mãe perguntando. Logo, notou que a voz materna vinha acompanhada de uma sequência ininterrupta de bipes. À medida que ela tentava compreender o que acontecia, a frequência de bipes aumentava.

– Não sabemos com precisão – uma voz masculina, desconhecida, disse – Ela sofreu queimaduras de terceiro grau por todo o corpo, e, infelizmente, não voltará a enxergar.

O choro da mãe tomou conta do quarto. Rachel não tinha forças para gritar, chorar, levantar-se; queria apenas morrer. Entendeu rápido o que estava acontecendo.

– Você vai ficar bem, mana – Angelina falou, segurando sua mão. – Aconteça o que acontecer, ficaremos juntas.

Rachel estava feliz. Ao menos, sua família estaria lá para apoiá-la.

Por complicações em seu estado clínico, a aniversariante morreu sem saber que a vela não fora um acidente.

Happy birthday to you...