My Abyss escrita por Minny


Capítulo 5
Fifth




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#05 episode 




“E o rumor triste, vago, brando,
Das cortinas ia acordando
Dentro em meu coração um rumor não sabido
Nunca por ele padecido.
Enfim, por aplacá-lo aqui no peito,
Levantei-me de pronto e: "Com efeito
(Disse) é visita amiga e retardada
Que bate a estas horas tais.
É visita que pede à minha porta entrada:
Há de ser isso e nada mais."





          Era uma bela noite atormentada pelo eclipse ao alto. A escuridão tomava conta aos poucos da região; o evento era uma amostra simplória do que ainda estava por vir. A medida que a lua se apagava, a esperança lúgubre de um novo dia se deteriorava. Os camponeses se recolhiam timidamente as suas casas, assim como os animais ordenhados entravam sem cerimônia em seus celeiros. Até mesmo os cachorros vira-latas buscavam um local para ampará-los até o sol raiar mais uma vez. Pombos, andorinhas e bem-te-vis voavam rapidamente para o Norte. Mesmo sendo inverno, mudavam a rota por intervenção de um instinto maior. 

 Aos poucos, a pequena cidade de Stevenston - Escócia penetrava na solidão, ao menos até aquele instante. O medo conturbado que dominava todos ali presentes, influenciava na tamanha angustia agora dominante, levando o local de aparência agora medonha aos prantos. 

 No momento que o astro fora encoberto pela negritude, as trevas ressurgiam pelas valas de esgoto. Uma rajada do que parecia ser uma ventania obscura rodopiava sombriamente pela cidade; até que por fim chegaram ao seu destino. Uma das duas únicas mansões do local, a Mansão Nortbreak, da nobre família de igual nome. 

   A rajada se tornou uma fúria - até então encoberta - que pôs-se a destruir vitrais e janelas. Não era necessário encostar no belo jardim para que tal logo falecesse. As plantas, e flores agora podres, soltavam-se dos galhos secos e rodopiavam pela mansão irracionalmente. Em outras palavras, quem estivesse do lado de fora, tampouco veria o acontecimento seguinte. 

Lampiões e velas acenderam-se por si próprios, e chamas ruborizadas se puseram à dominá-los; até que fugiram do controle, e incendiaram toda a mansão. O primeiro quarto a ser cremado foi o dos proprietários. O Senhor e a Madame Nortbreak foram queimados junto com suas maculadas almas. Os empregados sumiram com um estalar de dedos, com exceção do mordomo que tivera o mesmo destino que seus senhores. 

Os jarros, castiçais, arranjos e lustres "pipocavam" em meio a tragédia. Algumas rosas apodrecidas do jardim tiveram a audácia de entrar na casa; os espinhos das mesmas destruíam valiosas obras de artes, além de conseguirem a proeza inexplicável de "cerrar" as portas dos cômodos. Ao que parecia, uma força maior as dominava e controlava todo o fenômeno que acontecia naquele instante. 

O aroma impecável de lágrimas dominava o olfato daquela força. Lágrimas são estilhaços de uma alma ferida, por essa razão, diziam que o valor de um homem era medido conforme a quantidade de lágrimas que conseguisse derrubar durante sua morte. O odor tornara-se mais intenso, sinal de que havia mais de uma pessoa que as derrubavam. Foi justamente no terceiro andar da mansão, na penúltima porta que ele as encontrou. As herdeiras trigêmeas Nortbreak. 


- Que pecado abandoná-las em meio a essa destruição. Três garotinhas tão formosas... 

"Formosas" era pouco ao descrever as trigêmeas. As garotas não deviam ter mais de sete meses de nascidas, as almas das mesmas clamavam por piedade, coisa que estava fora de cogitação com aquele ser. 

Sim. Aquela força sobrenatural nada mais era do que um demônio. Não um qualquer. Somente um do alto escalão, a poderosa elite demoníaca, teria capacidade para tamanha destruição em sua forma nevasca. E somente um único seria tão dramático e caótico para todo aquele teatro. Ah, sim. Um dos primórdios. Mais exatamente, Chaos Untitled.

As trigêmeas berravam em meio o desastroso destino da mansão. Ele as mirava complacente, por quem deveria começar? As três pareciam intensamente suculentas. Ainda não tiveram contato com o mal do mundo, suas almas seriam ainda mais puras do que a da camponesa. Para azar delas, ele decidiu não fazer mais cerimônias. 

Chaos, por fim, materializou-se. As mãos esbranquiçadas eram donas de garras mortais, ainda que parecessem normais. Lambeu suas unhas da mão esquerda, e no mesmo instante elas se tornaram afiadas. Dirigiu-se até o berço, os lábios esticados num triunfante sorriso não conseguiriam expressar tamanho êxtase em que ele se encontrava. 

Com a mão direita, pegou a criança do meio. Seus olhos brilhavam bruscamente ao sentir a aproximação de sua presa. E foi com a mesma mão que a pegou, que ele a estrangulou sem dó. Foi a sua mão esquerda que penetrou a boca da menina, e desceu garganta abaixo para buscar o que tanto almejava. Somente alguns milésimos de segundo até que puxasse seu alvo. A primeira alma. Ele a olhou agraciado, e num rompante sugou-a por completo. 

Dirigiu-se então, para a próxima. Na verdade, teve uma ideia melhor. Ele guardaria uma das meninas para uma emergência. Suas garras estraçalharam o dorso pequenino da mais alta, e ele logo pode sentir outro aroma. A alma se misturava com o sangue da falecida, e ele demorou-se para capturá-la. O fato é que o sangue era capaz de "endurecer" o espectro, tornando a alma palpável para um demônio de baixo escalão, sendo assim propicia a uma modelação. O que foi exatamente que ele o fez. Enrolou a alma em forma esférica, e num estalar de dedos ela sumira de sua vista. 

Restava apenas uma. Era com pesar que ele a comeria, não por arrependimento, mas sim porquê a sua diversão encerrar-se-ia no mesmo instante em que a devorasse. 

- Hey, você! 

Sem que tivesse notado, um corvo posou em seu ombro. Estaria ele de tal forma inebriado com seu drama que não teria notado aquela presença? Provavelmente, sim. 


- Ora, ora... Que temosss aqui?! Vocccê não ssse arrepende do que fezzz? Isssssso é um pecado, rapazzz.

- É justamente o pecado que me trouxe a existência. Assim como você.

O corvo grasnou, era sua forma sombria e irritavél de gargalhar. 

- De cccerto. Sssendo assssssim, sssomos irmãosss. Deveria repartir esssa caççça.

- E por que eu o faria?

- Ora, vamosss lá. Vocccê ainda tem dezzzessssssete almasss quando retornar ao sssubmundo. Isssssso sssem contar com uma réplica dessssssa messsma aqui presssente.

O sorriso que até pouco preservava se desfez. Sua face tornara-se enraivecida. Odiava ser espionado, ainda mais por um desconhecido. Chaos era o tipo de dramático que reivindicava qualquer tipo de platéia. Peculiar, não?

- Essscute, faççça essssse favor para mim. Prometo que ssserá recompensssado divinamente.

- Nome.

- No momento cccerteiro, sssaberásss.

- E o que me levaria a confiar num demônio tão misterioso? 

- Exxxatamente o que eu esssperava de Chaosss Untitled. Façççamos um pacto, então.

- Recompensado divinamente, certo?

- Que o Sssenhor das Trevasss nosss amaldiçççoe por toda eternidade. 

- Para que assim o bem não nos corroa.

- E este pacto por fim venha ser concretizado.

O bico do corvo tomou forma humana, revelando lábios grossos e bem desenhados. Ele sorrira, e os dois selaram o pacto com um beijo. Ao menos, assim pensaria que estivesse vendo de fora. Para ser mais exato, Chaos penetrava suas presas no lábio inferior do corvo, o qual revidou logo em seguida. Um líquido gosmento gotejava da boca dos dois, entreolharam-se e por fim, beijaram-se os misturando. 

- Mas que tamanha honra ter meu ser fundido com o seu, Chaos Untitled.

- Não maior que a minha, Meu Senhor.


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