Coração Imortal escrita por isabellatmassei


Capítulo 15
Known unknowns


Notas iniciais do capítulo

Gente, to meio chateada com a diminuição dos reviews, mas sei lá, vou relevar. Espero que gostem, nos vemos lá embaixo.
E pra quem não entendeu o nome do capitulo é: Conhecidos Desconhecidos.



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A noite passou devagar e fiquei me perguntando se devia ligar pra conversar com o Edu. A casa estava silenciosa a não ser pelo ronco da Blair. Peguei meu celular e liguei pra Kathy.

- Alô- a Kathy estava com uma voz sonolenta.

- Oi amiga, onde você esta?

- Na minha mãe, o que foi? E porque esta e ligando às três da manhã?- perguntou ela- Estou cansada ainda da minha ida ao High Line. Ash, lá é lindo! Tudo bem que as arvores que plantaram ali ainda estão frágeis, mas tudo lá é encantador. As pessoas, as borboletas, as formigas... Tudo Ash, tudo!

- Estou sem sono e sozinha com a Blair em casa- respondi me arrependendo de ter contado sobre a Blair, poderia ter só dito UAL sobre o parque. Que dizer, eu não contei, eu só transmiti que estava com medo de ficar sozinha com ela, que era normal, certo?

- Meu Deus, vai pra casa do Du ficar com ele- disse ela um pouco nervosa, mas um tanto preocupada.

- Ele saiu daqui a pouco tempo e não acho certo ir pra lá.

- Ela quase te matou e não esta nada possuída- respondeu ela.

- Como assim? Você ta sabendo que o Edu...

- To- sussurrou ela.

Fiquei estática. O Edu já tinha contado pra todo mundo menos pra mim, eu não estava acreditando nisso.

- Há quanto tempo você sabe disso?

- Desde que a Blair veio morar com a gente.

- Não acredito que ele escondeu tudo isso de mim- disse num impulso. Eu tinha que ir lá acertar as contas com ele.

- Ash, a chave do apartamento dele está embaixo do vaso na mesa da sala. Vai até lá conversar com ele.

Fui até o vaso, peguei a chave e estava colocando o chinelo quando a Kathy continuou.

- Eu sinto muito. Amanha estarei com os diários, peguei todos e já botei na bolsa. Eu te amo amiga- e desligou o telefone

Desci até o campus e fui até o bloco dos meninos. Nenhum inspetor a vista, subi de escadas até o sexto andar e quando fui abrir porta o Edu a abriu.

- Não acredito que a Kathy ligou te avisando que eu estava vindo.

Ele me olhou confuso.

- Ela não ligou, eu sabia que estava vindo.

- Como?- perguntei desconfiada. Como eu queria tê-lo de volta por completo.

- Ouvi seus pensamentos. Estava no sofá sem sono e ouvi você se aproximar- explicou ele pedindo que eu entrasse.

Sentei no sofá e fiquei olhando pra ele. Ele parecia cansado, talvez até um pouco mais velho. Estava com os cabelos loiros desgrenhados e tinha olheiras escuras embaixo dos olhos. Quase me aproximei dele para acariciá-lo, mas lembrei de tudo o que ele havia feito.

- Por que contou primeiro pra Kathy? Não confia em mim?- perguntei acariciando meu braço. Estava mais frio do que eu esperava.

- A Kathy precisava saber, mas você não. A Kathy sentia alguma coisa ruim em relação a Blair por isso achei melhor confiar meus segredos nela- explicou ele voltando os olhos pra mim.

Desviei o olhar com uma angustia inevitável. Ele preferia contar um segredo a minha amiga do que a mim.

- Porque não namora ela então?- sussurrei

- Por que é de você que gosto, mas pra te proteger precisava que ela me ajudasse.

- Tem mais alguma coisa que eu precise saber?- perguntei levantando o olhar.

- Nada que você possa saber.

- O que? Mais segredos Eduardo? Já não basta?- me levantei e fui até a sacada- Espero que saiba que a partir de hoje não estarei confiando mais em você.

Ele foi até a sacada e apoiou a mão em meus ombros.

- Eu preciso que confie- disse ele me abraçando.

- Não- respondi indo até a porta da sala- Não me procure, entendeu? Você e a Kathy não perdem por esperar.

Ele não disse nada, não tentou me impedir. Ele não se importou com minha angustia, com minha tristeza. Deixou-me ir sem sequer dizer uma palavra, sem se desculpar. Não achei ruim ele ter me escondido que era estranho ou diferente. Eu achei ruim ele me esconder mais uma coisa.

Quando cheguei em casa estava tudo quieto, mas haviam turbilhões e turbilhões de coisas rodando em minha cabeça. Fui em silencio até o quarto e quando estava deitando em minha cama a luz se acendeu.

- Desculpe ter te acordado- disse me cobrindo com o cobertor

- Não me acordou, eu só estava te esperando chegar pra conversar- disse ela se sentando no pé de minha cama.

Fiquei olhando pra cara dela. Não, ela não podia ser tão ruim assim. Talvez só um pouco, mas não tanto.

- Sobre o que?- perguntei curiosa

- Eu sei que seus amigos não gostam de mim, e eu quero me desculpar.

- Não, não é isso. O problema é que eles acham que você fingiu toda aquela história de possuída e tal- expliquei.

Ela ficou olhando pra minha cara um pouco assustada, mas logo suavizou a expressão e manteve um sorriso de canto de boca.

- Eu nem sei o que dizer. Eles devem estar com raiva de você estar me defendendo.

- Pode ser, mas você não tem culpa Blair- disse pousando minha mão na dela.

- Obrigada por estar do meu lado Ash. Vamos ser grandes amigas.

- Espero - concordei

Fizemos pipoca e assistimos Crepúsculo. Ela contou dos amigos da outra escola e que o namorado dela jogava no time de futebol americano. Rimos muito com as histórias que os pais dela haviam contado, e quando contei que meus pais estavam mortos ela me abraçou e disse que entendia meu sofrimento. Enfim, ela foi mais amiga minha do que a própria Kathy ultimamente. Quando fomos dormir já se passava das sete da manhã. Ficamos fofocando boa parte do tempo, mas logo cochilamos.

Sonhei que estava em minha casa quando morava em Delaware com mamãe e ela ria de minhas piadas. Papai estava do outro lado da sala e olhava de canto de olho pra mim.

- Acho melhor você ir ver o que seu pai tem- disse mamãe acariciando meu rosto.

- Tudo bem! - disse indo até papai- O que foi pai?

Ele olhou pra mim com uma cara de desgosto, me afastei dele e ele me segurou pelo braço.

- Ashley, eu te criei e pensei que você saberia tomar as decisões certas no futuro, mas vejo que você não entendeu nada- disse ele balançando a cabeça

- Papai, eu não fiz nada- expliquei deixando uma lagrima cair

Ele me fuzilou com o olhar e enfim me soltou. Eu esfreguei minha mão no vermelho de meu braço e desviei o olhar.

- Filha, me desculpe se fui rude. Mas às vezes as nossas decisões nos custam caro- disse ele colocando uma mecha de meu cabelo atrás da orelha- Poderia dizer um dia você saberá, mas o problema é que esse dia já chegou.

- O que você quer dizer pai?- perguntei levantando os olhos para olhar nos dele.

- Quero dizer que você tomou uma decisão ruim e que deve voltar atrás enquanto é tempo. Eu e sua mãe não podemos te ajudar mais, então antes de fazer alguma coisa pense se seria isso que gostaríamos- ele disse e num passe de mágica virou fumaça.

Quando olhei em volta na casa, tudo virava fumaça também. Suspirei e sentei no chão branco e frio. Eu tinha feito algo muito ruim e tinha que consertar o erro antes que isso me custasse muito caro.

Acordei com a Blair me chamando pra tomar café. Perguntei da Kathy, mas ela disse que não havia chegado. Não lembrava muito do sonho, apenas de alguns detalhes. O que eu sabia é que tinha alguma coisa errada e que eu deveria agir o quanto antes. Talvez eu devesse voltar a falar com o Edu, talvez não. Se meus pais estivessem aqui e eu contasse a eles que ele tinha me escondido muitas coisas, eles provavelmente não deixariam que eu continuasse com ele. Então eu e o Edu não daríamos certo ficando juntos. A Kathy também mentiu pra mim, então nem pensar acreditar nela. A única pessoa que me restava era a Blair, e ela parecia ser muito boa agora. Tudo bem, ela quase me matou, mas não era ela e outra, eu quase a matei também, e olha que eu não estava possuída nem nada do tipo. Caramba, como eu queria minha vidinha de antes. Respirei fundo e continuei a comer meu misto quente.

- Tudo bem Ash?- perguntou Blair botando sua mão na minha

- Tudo ótimo, eu só estou um pouco confusa. Acho que terminei com o Edu.

- Acha?

- Eu disse que não queria segredos entre nós e ele continuou me escondendo coisas então disse pra ele que não iria mais ter confiança nele- expliquei deixando de lado o pão. Não, eu não estava com fome.

Ela olhou pra mim como se estivesse me consolando.

- É melhor assim. Se ele não confia em você os segredos dele ele não serve- disse ela fechando os olhos. Não, eu não entendi porque de tudo isso, mas quando ela voltou a abri-los estava com um olhar frio e penetrante.

Levantei e fui até o quarto, iria pegar um dinheiro qualquer pra dar uma saída. Estava precisando pensar um pouco.

- Vai sair?- perguntou ela entrando no quarto

Olhei pra ela e fiz que sim com a cabeça. Espero que ela não queira ir, tenho muito em que pensar.

- Não se preocupe, deixarei você ficar sozinha. Você precisa resolver muita coisa em uma tacada só- explicou ela girando em direção à porta- Alias, porque não dá uma volta no parque ou quem sabe pelas ruas movimentadas de Newark?- perguntou-me ela pelo ombro

- Ótima idéia. Preciso fazer compras mesmo- respondi colocando minha bolsa no ombro- Nos veremos mais tarde?

- Não, vou dormir na casa de uma conhecida.

- Ah, tudo bem então- disse saindo com ela do quarto- Desculpe ser intrometida, mas quem é essa conhecida?

- Uma amiga minha esta morando aqui perto- respondeu ela me dando um beijo- Não se preocupe se eu não vir hoje, é possível que eu durma na casa dela.

Assenti com a cabeça.

- Tudo bem então, tchau!

Sai de casa com destino a compras. Eu não tinha carro, e o único meio de transporte era o carro do Edu, da Kathy ou do Beto. Já que não tinha nenhuma possibilidade de sair com o carro de algum deles, decidi ir de ônibus.

No caminho de Newark fui pensando no que poderia comprar. Ultimamente não tinha mais opções de roupas, era sempre jeans com um camisetão. Eu precisava de alguma roupa mais própria pra uma mulher. Minhas roupas sempre foram das piores, nunca me importei também. O negócio era comprar blusinhas e quem sabe uns tops. Por mais que não tivesse mais namorado eu tinha que me importar com minha aparência, ele podia até achar que eu ficaria na deprê e coisa e tal, mas não é bem assim.

Eu sentia muito estar separada dele. Ele era boa pessoa, e por mais que tivesse escondido de mim tudo aquilo eu queria poder não ligar. Mas ele não só deixou de me contar como preferiu contar á minha amiga a mim. Eu o perdoaria, e até tentaria ouvi-lo se ele tivesse corrido atrás de mim quando sai do apartamento dele ontem. Aquele lance dos diários eu vou esquecer, não acredito em mais nada. A Kathy deveria estar sabendo de tudo o que se passou ontem e agora deveria estar arrumando uma desculpa qualquer pra que eu amolecesse meu coração e a perdoasse. Eu sabia que era o que definitivamente ia acontecer, porque eu e a Kathy éramos mais que simples colegas de quarto. Esse negocio de ficar brigada não vai durar muito.

Respirei fundo e peguei meu celular pra ver a hora. Havia cinco chamadas perdidas. Três da Kathy e duas do Edu. Nem me dei ao luxo de retornar, eles não poderiam simplesmente me deixar pensar um pouco?

As compras estavam uma grande merda, não tinha nada que eu gostasse. Se a Kathy estivesse aqui ela me ajudaria e eu sairia daqui com pelo menos umas duas sacolas de roupas e sapatos. Ficar brigada com ela era horrível.

Meu celular tocou mais uma vez e vi que era o Edu tentando pela terceira vez falar comigo. Suspirei e atendi.

- Que foi?- perguntei firmemente.

- Ainda brava comigo?           

- O que você acha?

Ele esperou um minuto pra ver se eu continuava, mas vendo que não continuou.

- Como estamos?

- Não sei de você, mas eu estou ótima- menti descaradamente.

- Mentira, você não esta nada bem- respondeu ele

Fiquei indecisa se desligava ou não na cara dele. Como ele podia ter se tornado tão irritante?

- Ash, eu passei a noite toda na porta de seu apartamento captando seus pensamentos.

Paralisei ao ouvir isso. Ele havia me perseguido praticamente e ainda se entregava. E ele tinha ouvido eu com a Blair. Pelo menos agora ele deveria saber a merda que ele era pra mim.

- O que foi, está me perseguindo agora? Não me diga que esta aqui perto de mim também.

- Pode se dizer que sim- respondeu ele.

Olhei pra todos os lados e fiquei tensa ao ver que estava sozinha em toda a rua.

- Onde você está?- perguntei continuando a olhar todos os lados.

- No seu coração!

Fiquei aliviada, era isso, ele queria mexer comigo emocionalmente.

- Não faça isso Edu, não me esconda às coisas- disse me levantando e indo até o ponto de ônibus.

- Estou te poupando problemas, você poderia me entender se quisesse- explicou ele.

- Eu queria te entender, queria de verdade. Mas você tem que me contar o que se passa porque eu não posso ficar com uma pessoa que não confia em mim.

- A Blair disse isso?- perguntou-me ele com um tom de voz acusatório.

- Disse, mas não tem nada a ver. Eu já pensava nisso.

Ele esperou um minuto como se estivesse pensando no que dizer a respeito.

- Ash...

- O que?- disse esperando que ele fosse contar tudo o que se passava.

- Eu consigo ouvir seu coração batendo pelo telefone- contou-me ele num sussurro.

Aquilo mexeu comigo mais do que eu esperava. Eu não sabia exatamente o que ele queria dizer com tudo aquilo, mas tinha me tocado profundamente. Ele ouvir meu coração á distância significava pra mim que ele conseguia entende-lo. Ele queria dizer que só ele me entenderia daquele modo.

- Isso mesmo- disse ele.

Sabia que ele estava respondendo ao meu pensamento, e poderia até me sentir ofendida, mas só concordei por mim mesma com tudo isso.

- Posso te ver?- perguntou ele

- Não, eu acho que nem pra casa vou- respondi sem saber o que estava dizendo.

- Como assim não vem pra casa?

- Eu acho que vou ficar na rua essa noite, hoje é sábado- expliquei pronta pra desligar. Eu sabia que viriam turbilhões de perguntas agora.

- Não, eu posso ir até ai e ficamos na rua juntos, mas você sozinha não- disse ele quase gritando- Em que lugar de Newark você está?

Como ele sabia que estava em Newark?

- Não vou dizer e, por favor, não venha atrás de mim- disse desligando o telefone.

Ele poderia ligar o quanto quisesse que eu não iria atende-lo. Fui até o ponto de ônibus e jurei a mim mesma que não amoleceria o coração para aquele idiota do Edu. Ele me magoou e deveria ser magoado.

O telefone não parava de tocar, era Do ya tocando a todo o momento. Pelo menos eu gostava dessa musica do Mc Fly. Iria deixá-la tocar até que acabasse a bateria.

Peguei um ônibus com destino à Delaware, eu precisava voltar pra lá. Precisava ver as luzes da cidade e relembrar minha vida de antes. Acho que o único jeito de descobrir o que papai queria dizer era indo até onde morávamos.

A ida até lá foi silenciosa, as pessoas não falavam, não faziam nenhum ruído. Era como se respeitassem meu momento de admiração. A cidade continuava linda, mas eu via algumas mudanças. As placas, as casas, os outdoors, as ruas estavam mais convidativas. Eu queria ir até minha antiga casa e vê-la mais uma vez. Queria deitar no gramado e rolar que nem uma louca. Eu queria sentir a presença de meus pais ali. Eu queria sentir um pouquinho da minha vida normal denovo.

Desci do ônibus e andei dois quarteirões olhando pela janela as famílias em volta da mesa jantando, assistindo TV, lavando a louça, arrumando a bagunça. Não via à hora de chegar à minha antiga casa. Cheguei a chorar um pouco quando entrei no meu quarteirão. Tudo estava quieto, mas as luzes denunciavam as pessoas. Corri até minha casa e quando cheguei até ela me deixei levar pela emoção.

Foi ali que morei desde nascida. Foi naquele jardim que mamãe e papai improvisavam um acampamento nas férias. Foi naquela sala que papai nos surpreendia com uma grande caneca de chocolate quente. Foi lá em cima naquele quarto de meus pais que eu entrava de madrugada dizendo que estava com medo do escuro. Foi naquela cozinha que tivemos os melhores jantares, preparado pela mamãe.

Eu estava tão desnorteada lembrando tudo o que tinha passado ali que nem havia percebido a nova família na sala. Era uma família igual a minha, mãe, pai e filha. Eles estavam no tapete da sala rindo e se divertindo. Às vezes o pai abraçava a filha e depois fazia cócegas nela. A mãe ria sentada na outra ponta do tapete e de vez em quando arriscava chegar perto do pai fazendo cócegas nele também.

Fiquei olhando eles por bastante tempo, talvez até uma hora. Eles não pareciam cansar daquela brincadeira. Enfim desisti daquilo e sentei na calçada da casa. A fachada estava definitivamente mudada, mas continuava acolhedora. Se pudesse estaria lá dentro agora olhando cada detalhe da casa e me agarrando em cada lembrança que ela me proporcionasse.

Estava me sentindo péssima de ficar ali sentada em um lugar que nem me pertencia mais. Foi quando a porta se abriu. A mãe saiu de lá de dentro e veio se sentar ao meu lado. Fiquei desesperada, ela não deveria estar assustada com uma menina sentada na frente da casa dela?

- Me desculpe senhora, eu só me sentei aqui por que... Ahn desculpe- disse me levantando.

Ela automaticamente segurou meu braço gentilmente e fez que eu continuasse sentada.

- Por favor, eu não ligo de ter você aqui- explicou ela acariciando meu braço- Meu nome é Cintia.

- Prazer, meu nome é Ashley.

Ela pareceu olhar dentro de mim quando sorria e acariciava meu rosto.

- O que te traz aqui minha querida?- perguntou-me ela

Eu sentia que podia confiar nela, talvez fosse bom contar a ela tudo o que ocorria. Eu poderia ter uma amiga.

- Tudo bem se não quiser contar, mas saiba que pode confiar em mim- disse ela afastando uma mecha de cabelo de meu rosto.

- Obrigada- respondi abaixando a cabeça. Ela parecia ser uma pessoa muito boa. Gostei dela desde quando a vi lá de dentro da casa- Eu morava aqui antes de vocês.

Ela me olhou assustada e enfim abriu os braços para um abraço. Eu abracei-a e imaginei o que ela queria com isso afinal.

- Oh minha querida, eu sinto muito- disse ela acariciando meu cabelo

Ela sabia de meus pais, é claro que sabia. Minha tia Vera provavelmente tinha contado a ela. Eu só queria ser confortada. Todo mundo na escola pensava que eu já tinha superado, mas o lance é que não. Eu sou muito boa em esconder tristeza, mas não consigo evitá-las.

- Eu sei da morte de seus pais. Até imaginei que você viesse aqui algum dia desses, mas depois de tanto tempo achei que você tinha desistido.

- Eu precisava vir aqui, são tantas as coisas que andam acontecendo que eu precisava reviver um pouco o passado- disse chorando.

Ele pareceu absorver tudo o que eu disse, mas respeitou meu silencio. Ela sabia me consolar, e ela me esperou por todo esse tempo. Eu gostava dela.

- Você é uma criança, não devia ter problemas.

- Eu também achava que era assim, mas ultimamente mudei de idéia- respondi saindo do abraço apertado- Eu estava perdida.

- Perdida aqui em Delaware ou na vida?- perguntou ela com um olhar preocupado

- Na vida- respondi limpando as lagrimas

Ela assentiu e colocou as mãos na perna. Esperou que eu quebrasse o silencio, mas vendo que eu estava perdida em lembranças, decidiu falar.

- Você dorme aqui?- perguntou-me ela levantando o rosto

- NÃO- respondi num impulso- Quer dizer, eu nem conheço vocês e é errado isso.

Ela pareceu me entender.

- Te entendo, mas não posso deixar que você durma na rua.

- Eu vou pra casa, na verdade, pra meu colégio- respondi levantando

Ela levantou junto e perguntou:

- Colégio interno? Onde?

- É mais ou menos isso. Um pouco mais liberal- respondi com um sorriso gentil no rosto- Fica em Harrison, a Purnell School.

- Gosto desse tipo de colégio, mas acho que não viveria longe de minha pequena- disse ela apontando para a janela onde estavam o pai e a filha de Cintia olhando pra mim.

Acenei para eles e eles retribuíram o aceno com um sorriso no rosto.

- O que não serve pra mim- sussurrei para mim mesma.

- Não entendi.

- Você disse que não viveria longe dela, mas como não tenho pais...

- Mas você tem aquela tia maravilhosa. Ela deve ser com uma mãe para você, não?

Fiquei olhando pra cara dela. Queria rir e poder perguntar se ela estava louca, mas não faltaria com a educação.

- Não Cintia, ela não mora perto e não a vejo a mais ou menos um ano e meio.

- Mas há um mês entrei em contato com ela pra perguntar sobre um documento da casa e ela me disse que você estava ótima e que a tinha visto no final de semana - contou-me ela com olhos esbugalhados.

Concordei com a cabeça. Não com toda aquela história que Cintia havia me contado, mas com a mentira esfarrapada de minha tia.

- Ela não gosta de você minha querida?

- Não acho que seja isso, só acho que deve ser ruim ter de cuidar de uma criança por obrigação- expliquei dando de ombros.

- Ela poderia ter te dado para a adoção, e não fez...

- É por isso que não a critico. Afinal até escola ela paga. Sem contar a mesada também.

- Ela não é tão ruim- disse ela.

- Não, não é- concordei com a cabeça.

Aquela família era muito unida e percebi apenas pelos pequenos gestos. Eu havia dito ao Edu que não iria voltar para casa, mas não queria ficar na rua a noite toda, pode parecer mentira, mas estava esgotada. Ultimamente tudo me cansava. Cintia me deu um abraço forte e pediu que eu fosse embora pela hora, mas que voltasse se quisesse. Ela disse que sempre me receberiam de braços abertos e me deu seu numero de telefone. Fui embora com o coração mais leve. Não havia contado tudo a ela, mas a grande razão de eu estar ali ela sabia.

Andei pela rua pensando no que faria em relação ao Edu. Se era verdade que ele sentia minha presença eu não sei, mas eu tenho que admitir que o queria por perto agora. A noite já tinha chegado e a rua estava deserta, eu só precisava voltar para aquele ponto de ônibus e ir para casa.


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Notas finais do capítulo

Gostaram? Obrigada pelos reviews que me deixaram ao longo dos posts, não sou nada sem eles. Beijos ♥