Meu Colega de Sala é um Androide escrita por Lord Iraferre


Capítulo 2
02 – Super Reflexos




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/812529/chapter/2

Mesmo parecendo um cientista louco a aparência do Professor Ravi era a de alguém que levava sua profissão a sério, o mesmo não podia ser dito de Yuri Vladimirovich o Professor de Educação Física. Quando alguém pronúncia as palavras Educação Física você imagina algo como esportes, exercícios e atletismo, mas essa seria a última coisa que você relacionaria com a figura do Professor Yuri. Ele era quase da altura da porta, tão largo quanto uma morsa e tão ativo quanto um iceberg.

Sua aula era a última daquela segunda-feira fatídica na qual Kentaro havia se introduzido em minha vida.

O professor se sentou sobre sua cadeira com um suspiro e anunciou para a classe:

— Bom, já que estamos retornando as aulas hoje — ele fez uma pausa enquanto secava sua calva testa com um lenço, como se o esforço de chegar até a sala houvesse sido a última parte de uma maratona. — Eu decidi fazer algo especial hoje.

A falta de atletismo do Professor Yuri não afetava em nada a sua capacidade de ser um tirano em suas aulas, sua ideia de diversão envolvia desde centenas de flexões até fazer os alunos correrem ao redor da quadra até suas pernas caírem. Por isso a classe não recebeu suas palavras com muito entusiasmo.

Tudo mudou quando ele retirou de sua mala uma barra de Toblerone e colocou ela sobre a mesa a sua frente como se fosse o item mais valioso de um leilão. Os alunos que até ali estavam cansados se viram com o ânimo renovado diante de tal visão e eu não fui uma exceção, chocolate é para mim o que a ambrosia é para os deuses do Olimpo.

— Quem vencer o desafio de hoje ganhará esse troféu. — disse o professor ajeitando seus óculos escuros, que ele sempre usava mesmo dentro da sala, dizia a lenda que ele os usava até mesmo durante o sono.

— E qual vai ser o jogo? — perguntou algum aluno aleatório.

— Queimada. — disse o professor tocando a ponta dos dedos de uma mão com a outra. — Mas de um jeito um pouco diferente.

E assim todos se dirigiram para a quadra sem saber ao certo o que esperar da próxima atividade, ansiando apenas pelo prêmio. Após trocar de uniforme eu devo dizer que cheguei na quadra pronta não apenas para ganhar, mas também crendo que aquela seria uma ótima oportunidade de vencer Kentaro. Existe a chance de eu ter provocado metade da sala até nos reunirmos na quadra, mas quem não gosta de uma competição amistosa, não é?

— A partida vai funcionar da seguinte maneira — disse o professor gesticulando para garantir a atenção dos alunos. — Todos vocês irão ficar dentro do círculo que eu marquei no chão, e eu irei com esta bola acertar um de vocês, quem for atingido irá sair do círculo e junto comigo irá tentar acertar outra pessoa dentro do círculo, aquele que for o último a permanecer no círculo ganha o jogo.

Todos então se reuniram dentro do círculo, eu esfreguei as mãos pronta para mais essa aventura, porque mesmo que eu perdesse eu teria a chance de atingir Kentaro o que me colocava em uma posição vantajosa de testar seus limites físicos. Como diria Sun Tzu quem conhece a si mesmo e a seu inimigo não deve temer o resultado de cem batalhas.

Porém, Sun Tzu não tinha um androide como adversário, e aquele dia estava destinado a ser um desastre desde o começo.

Focada em não perder Kentaro de vista eu acabei não ouvindo o apito do professor quando ele iniciou a partida, e digamos que no meio da confusão e empurrões que se seguiu eu tomei uma bolada na cabeça. Você deve estar se perguntando, no caso de eu ter sido a primeira a ser pega então obviamente eu devo ter tido a oportunidade de atingir Kentaro logo em seguida, não é? A questão é que a vida não é tão simples quanto parece.

A bola lançada pelo professor me atingiu na nuca de tal maneira que eu acabei tropeçando e batendo o rosto no chão, machucando meu nariz. Meu nariz inchou, para valer, Pinóquio não conseguiria um nariz daquele nem mesmo se fosse um político em época de eleição.

Quando me viram no chão todos paralisaram, se alguém de fora tivesse chegado na quadra naquele momento pensaria que a brincadeira era estatua e não queimada. Professor Yuri abriu caminho entre os alunos com seu enorme corpo enquanto apitava como a sirene de uma ambulância. Quem me ajudou a me levantar foi ninguém menos que Kentaro e seu rosto inexpressivo me encarou com tamanha intensidade que me pegou desprevenida, como se ele fosse um paparazzi tirando fotos com sua mente e guardando as imagens em seu arquivo particular para o resto de sua vida.

Eu não precisei ir para a enfermaria, mas com um pouco de gelo, algodão e gazes eu estava praticamente recuperada. E pode ser que durante todo esse processo... Eu tenha chorado um pouquinho, mas não vamos focar nisso. O fato é que eu fiquei fora da brincadeira, o professor sugeriu que eu apenas assistisse a distância pelo resto da aula.

Assim eu me sentei na arquibancada, pronta para assistir ao jogo se desenrolar e quem sabe dentro de alguns minutos eu poderia ter Kentaro ao meu lado com um saco de gelo tão grande quanto o meu.

Ao longe pude perceber que Kentaro ainda estava me encarando quando o professor reiniciou a partida com o apito.

Durante os próximos dez minutos houve muita gritaria e correria por isso não pude ver com clareza o que estava acontecendo, mas tive o privilégio de ver Anna ser atingida no estomago e o azar de ver Rosa ser atingida quase tão facilmente quanto eu. Com o tempo o número de pessoas fora do círculo era maior do que as que se encontravam dentro, mas Kentaro continuava sobrevivendo de forma irredutível.

Nos minutos que se seguiram, pela segunda vez naquele dia se sucederam eventos que questionaram as leis naturais e me deram a evidencia necessária de que realmente Kentaro era diferenciado, roboticamente falando. No meio do círculo se encontrava Kentaro, sozinho, e fora do círculo se encontrava todos os outros alunos da sala, ele já havia ganhado o jogo, mas se recusava a ser pego mesmo assim. Sempre que desviava de uma bola ou outra ele lançava um olhar em minha direção. Você não faz ideia do que tive que presenciar, era como se Kentaro fosse Neo do Matrix se desviando das balas, ninguém conseguia acertá-lo nem mesmo o professor.

Com o fim da aula se aproximando o professor completou a brincadeira com uma gargalhada e entregou o Toblerone para Kentaro, sem cerimônia, percebendo que ninguém teria a capacidade de atingi-lo, todos os alunos o cercaram rindo e o parabenizando. Diante de tal cena eu decidi ir para o vestiário me trocar. Quando saí o sinal já havia batido e todos os alunos já tinham ido para casa. Caso esteja se perguntando o que me fez ficar tanto tempo no vestiário, vou logo lhe explicando que não tem nada a ver com o fato de eu estar me escondendo dos outros alunos, e sim com o fato de que eu não conseguia trocar de camiseta por causa do meu ferimento de guerra.

Quando entrei na sala para pegar minha mochila encontrei sobre a minha mesa nada mais nada menos do que o Toblerone. Sim, Kentaro não apenas tinha me humilhado duas vezes na frente da sala aquele dia, a cereja no topo do bolo era ceder a seu inimigo o prêmio final. Porque no fim das contas androides não gostam de chocolate. Eu conseguia imaginá-lo naquele exato momento em alguma base secreta me observando através de uma câmera espiã, rindo com sua risada mecânica até a sua bateria acabar.

Você deve estar se perguntando se eu joguei o chocolate fora, ou se o devolvi para Kentaro no dia seguinte. Como Sun Tzu diria “nunca deixe o seu adversário saber seu próximo passo”, por isso eu levei o chocolate para casa e o comi. Porque no fim das contas ao contrário de Kentaro eu sou humana.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Se está gostando da história deixe um comentário. Eu pretendo publicar um capítulo a cada dois dias e ficaria grato de saber sua opinião.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Meu Colega de Sala é um Androide" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.