Metalwillverso escrita por Metal_Will
Notas iniciais do capítulo
"Procurando" foi uma das minhas histórias mais curtas, mas também foi uma das melhores. Por outro lado, também foi uma das mais subestimadas. Contava a história de João, um jovem universitário que estava em um curso que não gostava. Após reflexões e conversas com pessoas experientes que conheceu na cidade em que estava estudando, ele finalmente tomou uma decisão e escolheu o caminho que achava melhor.
Talvez essa história não tenha feito muito sucesso por ser séria e nos fazer pensar sobre o futuro. Tem uma pegada filosófica sobre o sentido da vida e a busca pela felicidade como realização pessoal e contribuição com o mundo. Acho que poderia virar um filme mais cult.
Neste capítulo especial, após ter se tornado um professor, João aconselha um de seus alunos a não cometer seu erro e pensar na carreira que está mais vocacionado.
Boa leitura! :)
O sinal da última aula tocou naquele último dia letivo do ano. Todos estavam ansiosos para as férias, mas o terceiro ano do ensino médio tinha mais uma razão para ansiedade: era o dia da despedida. Muitos tinham planos de trabalho, outros estavam aguardando resultados de exames vestibulares, outros ainda ficariam uns dias a mais para a recuperação. De qualquer modo, os alunos do terceiro ano já estavam às margens de encerrar mais um ciclo de suas vidas e começar outro. Alguns estavam alegres da vida por finalmente se verem livres da escola. Outros, mais maduros, tinham uma visão um pouco diferente. Era o caso de Plínio, um estudante sério, calado, mas preocupado com o que faria da vida.
Enquanto os alunos do terceirão aproveitavam a aula vaga para assinar camisetas, abraçar os amigos e realizar despedidas, Plínio apenas ficou sentado na sala mais ao fundo. Não estava mexendo no celular, nem lendo, nem nada. Estava apenas olhando para tudo e suspirando. Eis que seu professor de artes, João, percebeu que ele destoava um pouco do resto da sala e resolveu interagir um pouco.
—Não está se sentindo bem? - perguntou o professor - Se for isso, pode pedir autorização para a direção para ir embora.
—Ah, não - falou Plínio - Estou tranquilo.
—Já se despediu de todo mundo? - perguntou João.
—Acho que sim - falou ele - Não tenho muitos amigos. E não faço questão de assinar camisetas, nem nada.
—Sei como é - falou o professor - Também era meio antissocial na sua idade. Essa coisa "do terceirão para a vida" nunca me convenceu.
—É, também acho que isso é só coisa de momento - falou Plínio - Depois de uns três anos a maioria já vai perder contato. Acho que a vida é assim. Um ciclo depois do outro.
—Sim. A vida é cheia de fases. Passamos por umas e logo entramos em outras. Não dá muito para fugir disso.
—O pior é quando você nem sabe que fase entrar...
—Como assim?
—Ah, eu prestei vestibular para letras, sabe? - falou Plínio - Sempre gostei de escrever e vou bem em português. Mas meus pais queriam que eu fizesse medicina.
—Medicina? É, é bem diferente.
—Só que eu não tenho a menor vontade de ser médico - disse Plínio - Meu pai e minha mãe são médicos, eles amam a profissão e eu sei que já teria um consultório garantido se me formasse. Mas..
—Mas não é o que você quer - completou o professor - Sei bem como é isso.
—Sabe?
—Eu acho que ja contei isso uma vez - disse João - Depois que saí da escola, ser professor de artes não foi meu primeiro plano.
—Não? O que o senhor queria ser?
—Eu não tinha ideia - disse ele - Ao contrário de você, eu ainda não tinha um norte. Entrei em engenharia química porque meus pais acharam que eu teria um emprego garantido, mas com certeza não era o que eu queria.
—Caraca, ficar em um curso que não gosta deve ser horrível.
—É sim- confirmou João - Posso falar isso por experiência própria. Não sei onde eu queria estar, mas com certeza não queria estar ali.
—E como o senhor decidiu mudar para artes?
—Só depois que eu percebi o quanto a vida é curta para ficarmos naquilo que não é nossa vocação.
—É, a gente nunca sabe quando vai morrer, né?
—Não é só isso - falou o professor, lembrando com clareza de algo que ouviu no passado - Mesmo que você viva por uns 80 anos, a vida ainda será curta. Quando você é jovem, parece que o tempo não passa, né? Três anos parecem muita coisa para uma criança de seis anos, afinal, é metade do que ela viveu. Mas conforme o tempo passa, vemos que três anos passam muito rápido. Se esses 80 anos fossem, na verdade, um dia. A cada três anos e meio, mais ou menos, seria uma hora desse dia. Quando se tem um dia inteiro pela frente, uma hora não parece muito. Só que quanto menos esperamos, o dia já está acabando e já está chegando a hora de dormir.
—É mesmo - concordo Plínio - A vida é bem curta para ser desperdiçada, mas vai ser difícil falar isso para os meus pais.
—Seus pais certamente querem o melhor para você - disse João - Mas nem sempre eles estão certos. Eles acham que o que funcionou para eles também funcionará para você, mas não é assim que as coisas são.
—Bem, eles dizem que o mundo precisa de médicos.
—Sim, precisa - concordou João, sorrindo ternamente - Mas o mundo precisa de médicos que amam o que fazem. Assim como o mundo precisa de bombeiros, professores, escritores, artistas, faxineiros, pedreiros, engenheiros, padeiros, vendedores, desde que eles amem o que fazem. O que você faz é o que deixará sua marca no mundo. Uma vez alguém me disse algo que nunca esqueci: o que você faz por você, morre com você, mas o que você faz para os outros, não morre.
João falou essas últimas palavras com um sorriso. Plínio também sorriu ao ouvir isso.
—É verdade - concordou o aluno - Acho que...vou ter uma conversa séria com os meus pais.
—Faça isso. Se precisar de mim, estarei aqui para ouvi-lo.
—Obrigado, professor.
E assim foi. Plínio conversou melhor com seus pais e, após alguns atritos, conseguiu a aprovação deles para seguir a carreira que desejava. Assim, Plínio entrou em letras e também se tornou um professor, onde, talvez, poderia dar o mesmo conselho para seus alunos em dúvida. O conselho de seu professor João ainda ecoa em sua mente: a vida é muita curta para perder tempo no que não é sua vocação.
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Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!Notas finais do capítulo
Foi um capítulo bem curto, mas a história também era bem curta, né?
No próximo capítulo, vamos voltar a falar de viagens no tempo com Mind Clock. Até lá!