A primeira luta dos gêmeos escrita por Yue Hai


Capítulo 1
Capítulo Único




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A princípio fui o campeão da grande “corrida”. 

Cheguei ao centro do ponto de chegada e lá me tornei campeão. Tão campeão que ganhei a graça de me dividir em dois. A princípio, sempre juntinhos, naquele ambiente quentinho e aconchegante, tendo um ao outro como companhia, além daquela cordinha que nos acompanhava.

Brincávamos muito um com o outro. Estávamos sempre bem alimentados e conforme crescíamos, sentíamos carícias vindas do mundo externo. Alguém do lado de fora conversava com a gente. 

Ela se chamava mamãe. Sempre dizia: “Eu amo você”. 

No começo não sabíamos o que significava, mas, depois... Ondas de calor podiam ser sentidas por nossas almas. Isso acontecia com mais intensidade quando ela dizia: “Eu amo você”.

Um dia, estávamos quietinhos descansando, de repente sentimos um gosto adocicado, delicioso. Ela chamava aquilo de chocolate. Sempre que ela comia, nós começamos a dar cambalhotas de alegria e ela perguntava: “Então você gosta de chocolate?”. 

Pois bem, neste dia sentimos o gosto maravilhoso do chocolate. Subitamente, sentimos algo gelado, vindo da parede externa. Era tão frio que a baixa temperatura chegou até nós. Ficamos com medo, bravos e agitados. Se não fosse o chocolate, teríamos esperneado para chutar a Mamãe. 

Então, ouvimos uma voz distante dizendo “Parabéns, mamãe! A senhora está grávida de não apenas um, mas de dois meninos!” 

Sentimos uma sensação estranha. 

Ouvimos a outra voz perguntar “Calma, não precisa chorar. Está com medo por serem gêmeos? Pelo pai não estar mais entre nós?” Ao que Mamãe respondeu “Não! Estou emocionada e feliz! Ele pode ter partido, porém deixou não apenas um, mas dois presentes para mim! Por Athena! Que se pareçam com o pai. Sejam lindos, saudáveis, corajosos e fortes. A Mamãe ama muito vocês. Sempre amarei. Meus queridos Saga e Kanon”. 

A médica exclamou: “Nossa! Já têm nomes?”. “Sim! – dizia Mamãe – Meu marido e eu tínhamos dúvidas sobre qual nome pôr se fosse menino. Poderei usar os dois, sem precisar escolher. O primeiro se chamará Saga e o caçula Kanon”

— Aposto que eu serei o Kanon – dizia meu irmão – Você está sempre rodando por cima de mim e quem me disse “Oi” primeiro.

— Talvez. Gostei do meu nome. Saga! Por um instante pensei que Mamãe estava triste.

— Você viu? Ela não sabia que éramos dois! Espera... O que elas estão conversando?

— Mamãe falou que está ansiosa para ver nossos rostos? Que não vê a hora de sairmos?

— Sair? Então não vamos ficar aqui para sempre? LEGAL!

— Legal? E se for perigoso? Aqui é tão seguro e quentinho. A Mamãe é só da gente. Na hora que sairmos teremos que conhecer essa dona que passa essa coisa gelada na Mamãe e que vive cutucando a gente?

— Está com medinho? Não seja frouxo. Lá fora deve ser legal. Também quero conhecer o rosto da Mamãe.

— Bem, isso eu também quero. Pena que não dá para ver a face dela daqui de dentro...

— Deixe disso! Estaremos sempre juntos.

— Sempre? É, sempre! Prometo cuidar de você.

— E eu de você!

— Te amo, Kanon!

— Te amo, Saga!

E o tempo foi passando. 

Eu e Kanon fomos crescendo, tendo novas experiências, nos divertindo dentro daquele espaço que estranhamente ficava tão pequeno. Chegou uma hora, que já não conseguíamos mais nos mexer direito. Podíamos sentir as costelas de mamãe e o chiar de seus pulmões.

Kanon era um tanto folgado. Vivia se espreguiçando, sem se importar se batia a mão ou pé na minha cara. Em retribuição batia nele também. Quanto mais tempo passava, mais intensa ficava nossa “luta” lá dentro. Acusando um ao outro de ser folgado ou espaçoso.

Um dia, um dos mais difíceis, precisei me mexer para ficar mais confortável. Estava doendo demais naquela posição. Sentia a mão de Mamãe massageando parte de meu corpo por fora. Meu pezinho se enroscou em sua costela. Com falta de ar, ela começou a cutucar o local, nos empurrando levemente para baixo. Não sei como aconteceu. Na hora que meu pé soltou-se de sua costela, eu girei fortemente para baixo e minha cabeça se encaixou num espaço que eu já não consegui mais mudar de posição. Podia me mexer, mas não livremente. E não via mais Kanon. Isso me deixou muito triste. Eu apenas o ouvia ou sentia parte de seu corpo. 

— Saga! Saga! O que aconteceu? Por que não consigo mais te ver? Não consigo mais girar...

— Nem eu!

— Saga... Estou com medo. Não quero mais ficar aqui.

— Acalme-se. Ficará tudo bem. Eu ainda estou aqui. E mamãe não deixará que aconteça nada conosco. 

Passaram mais algumas semanas e as coisas começaram a ficar insuportáveis. 

— Chega! Eu não fico mais um minuto aqui.

— Do que está falando, Kanon? Acalme-se! Ei! Pare de me chutar! Ai! Minha cabeça! Pare de empurrar, está me machucando.

Escutamos a Mamãe gritar e sentimos uma grande pressão, como se estivéssemos sendo espremidos. Escutei um som rasgando acima de minha cabeça e um barulho... Líquido? Então, um show de sons começou. 

Alguém falava para Mamãe se acalmar que a ambulância havia chegado. O barulho prosseguiu e pude sentir alguém cutucando a Mamãe e... Minha cabeça?

— Está tudo bem, mãe. – dizia a voz – Seus bebês já estão chegando. A cabeça do primeiro está encaixada e em instantes eles estarão em seus braços.

Eu só ouvia a Mamãe gritar. Ela sentia muita dor. Nós também. Uma parte de mim queria sair dali, outra parte tinha medo. A dor piorava e meu medo cresceu a tal ponto que gritei para Kanon:

— Não! Isso é tudo muito assustador. E se você não conseguir sair? Quero ficar com você. Deixe-me ficar. DEIXE ME AQUI!

Já era tarde demais. A pressão era forte e minha cabeça passou por um espaço diminuto. Comecei a ter uma sensação fria na minha fronte, algo tocava minha cabeça e... Meu ombro? Alguém estava “cutucando” meu ombro esquerdo. De repente o ombro direito também saiu e escorreguei para fora e aparado por duas... O que era aquilo? Pareciam com as minhas mãozinhas mas eram enormes. Fui puxado para fora e minha cordinha, amiga de todas as horas, foi amarrada e... O que estão fazendo?

— NÃÃÃÃÃÃO!

Tarde demais, minha cordinha foi cortada e alguém deu tapinha entre o meu bumbum e em minhas costas. Não tive outra alternativa senão chorar. Aqueles tapinhas, aquela claridão, tudo tão confuso. Não enxergava nada e não o ouvia.

— Kanon? Kanon? KANON!

Fui colocado sob uma superfície macia e quentinha, alguém passava a mão em mim... E então abri um pouquinho meus olhos e a vi... Mamãe?

— Oh! Meu bebê! Meu lindo bebê! Seja bem-vindo Saga! Mamãe te ama...

De repente tiraram-me de seu colo e ela começou a gritar. Parecia sentir uma dor terrível. 

— Ahhhhhhhhh! Doutor! O que está acontecendo? Tem algo de erro com meu outro bebê. Por que esta dor é diferente?

— Acalme-se, Mãe. Seu outro bebê não está sentado, mas também não está em posição de encaixe. Não poderemos realizar uma cesariana, então, teremos que terminar de girar seu bebê. Aguente firme, irá doer, mas seu bebê irá nascer.

Foi horrível. Mamãe não gritava, berrava. Foi quando vi um brilho dourado sendo emanado por mim, em ressonância com Kanon. Pude ouvi-lo.

— Socorro! Estou sufocando! Me tira daqui! TIRIMIDAQUI!

Pareceu uma eternidade, contudo, finalmente Kanon foi retirado de Mamãe. 

Também cortaram a cordinha dele e pude ouvi-lo chorar muito. Colocaram no colo da Mamãe! Que chorava muito. Pude ouvi-la claramente:

— Por Athena! São idênticos! E iguais ao Pai! Athena ouviu as minhas preces...

 E de repente Mamãe se calou. Só então percebi que havia muitas pessoas nos cercando e Kanon sendo arrancado às pressas do colo dela. 

Ela já não estava mais acordada. Um barulho intenso de líquido caindo ressoou e o médico gritou. 

— Ela está sangrando muito. Precisamos conter a hemorragia. Levem os bebês para a pediatria.

E aquela foi a última vez que a vimos...

Fomos banhados, vestidos e colocados numa espécie de cestinho. Embora separados, podia ver Kanon no cestinho ao lado. Sempre estivemos juntos. Como se tivéssemos combinado, começamos a chorar. Não sei quanto tempo se passou até que uma moça resolveu nos colocar num cestinho maior, juntos. Sentir o calor de meu irmão me acalmou. 

— Calma, Kanon! Não chore mais. Estou aqui...

— Por Athena! — Ele disse, repetindo o que costumávamos ouvir de nossa Mãe — Pensei que não ficaríamos mais juntos.

Não sei quanto tempo passou... Horas, dias... Sei que vinham de tempos em tempos nos dar um líquido esbranquiçado, levemente docinho e nos limpavam.

Então, uma pessoa alta com duas pintinhas na testa veio por nós,

— Aqui estão eles Sr. Shion. Saga, à direita, é o mais velho. Kanon, à esquerda, é o mais novo. Estes foram os nomes escolhidos por sua mãe.

— Eles não têm familiares, não é mesmo?

— Não. Infelizmente, a Mãe não sobreviveu ao parto.

— Não se preocupe. Athena me guiou até estes bebês. Um grande destino os espera. Pode deixar, eu cuidarei deles.

— Sente-se aqui – dizia a enfermeira. Qual o senhor quer segurar primeiro?

— Traga-me os dois.

Kanon e eu fomos entregues a esse tal de Shion, que nos olhou com carinho e... O que seria aquilo? Tristeza?

— Sei que vocês devem estar com medo. Mas, não estão sozinhos. Estou aqui e cuidarei para que fiquem bem. Não lhes faltará nada. Eu prometo.

— Saga, será que podemos confiar nele?

— Não sei. Mas o colo dele é quentinho e parece que ficaremos juntos.

— Promete nunca me abandonar?

— Prometo. Sempre estarei ao seu lado, Kanon. Eu te amo!

— Também te amo, Saga!

FIM


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado. Fiz com muito carinho.

1ª Fanfic
Feita em 30/06/2021.



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