ivy escrita por rare


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Querida amiga oculta,

Espero que você goste desse presente tanto quanto eu amei criá-la e escrevê-la!



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Um soluço escapou dos lábios finos e arroxeados enquanto tentava correr com o mais rápido que podia, os pulmões e as pernas ardendo pelo esforço e, por vezes, sentia-as quase parando. Os pés afundando na neve a cada passo.

Já não conseguia precisar quão distante estava de sua casa ou em qual direção ficava. O corpo exausto demais para continuar enquanto ela se forçava a dar o próximo passo.

E o próximo. E o próximo. E o próximo.

Um rugido soou alto e ecoou pela floresta quando o longo e esvoaçante vestido branco enroscou em uma das raízes sobressalentes e, com um puxão agressivo ela escutou outro rasgo na saia, abrindo uma fenda que ia do chão até o meio da coxa esquerda.

Tropeçando nos próprios pés ela pulou de outra das diversas raízes, parando por um segundo para retomar ao menos um pouco do folego perdido quando, como um flash, lembrou dos dedos gentis da própria mãe tateando os cabelos dela para colocar o enfeite de diamantes e safiras da bisavó nas ondas feitas por Angie com todo esmero no início da tarde.

A dor que atravessou e queimou em seu peito a fez parar por mais segundos do que podia dar-se o luxo, as lágrimas rolando livremente e, junto com o suor, fazendo a maquiagem escorrer por todo o rosto dela. A sensação contra os flocos de neve e o frio que fazia era congelante, parecendo rasgar o rosto dela como filetes de navalha.

Por um segundo os joelhos fraquejaram e ela pôde sentir todos os cortes nos braços, pernas, rosto e couro cabeludo. O vestido de noiva, antes de um branco brilhoso e ofuscante, tornara-se cinza, marrom e vermelho. A saia e as mangas longas rasgadas, as rosas do decote pendendo frouxas e quase totalmente desmanchadas. O véu já não existia mais, havia ficado em algum lugar no início da corrida por sua vida, quando tropeçara nele, caira e quebrara os dentes incisivos centrais superiores. Ela podia sentir o gosto de sangue na boca.

Estava congelada no mesmo lugar, ajoelhada e sangrando, quando aquela risada soou próxima demais para seu próprio bem – Bella... Bella... Bella... – a gargalhada que soou arrepiou os cabelos da nuca e fez Bella empertigar a postura e retornar à posição de corrida, mesmo que o corpo protestasse – Está tão próxima de mim e tão distante... Tsc tsc. – Uivos ecoaram pela floresta quando voltou a correr.

Quanto mais corria mais animados e altos os uivos tornavam-se e, apesar das pernas parecerem pesar uma tonelada cada, Bella tentava mover-se o mais rápido que podia conforme afundava contra a neve.

O grito soou alto até para os próprios ouvidos quando uma pata gigantesca a empurrou, rolando e escorregando contra a fina camada de gelo contra a pedra, ela parou em uma pequena clareira que dava direto para um dos penhascos da região. A dor na garganta e na cabeça pareciam explosivas, mas não o suficiente para a distrair da dor no pulso direito que pendia de ângulo estranho demais para ser normal.

Bella podia escutar o coração pulsando rápido nos ouvidos, não tentava esconder as lágrimas e os soluços que saiam livremente dela. Olhou para a saia do vestido, sentindo um ponto mortalmente doloroso nas pernas, avistando apenas o vermelho de um dos talhos na perna direita, desviou rapidamente o olhar ao visualizar a tíbia, o osso ensanguentando, despontando. O estomago embrulhou e ela pode sentir a bile subindo a garganta mas a engoliu com resignação, orgulhosa demais para dar a qualquer um deles o gosto de vê-la quebrando.

Os hematomas adquiridos nas surras diárias agora pouco apareciam, cedendo espaço para ferimentos mais graves, mais doloridos. Ela podia sentir os próprios olhos pesados, não podia conceber a ideia de conseguir manter-se acordada numa situação daquelas.

O puxão dolorido no cabelo, arrastando-a para a beirada do penhasco não parecia nada diante das demais dores que arrastavam-se por seu corpo. Os dentes do pente do enfeite enterravam-se no couro cabeludo e encharcavam o cabelo com seu sangue conforme ele a deixava de costas para o penhasco, permitindo que obtivesse uma boa vista do semicírculo que formara-se diante dela.

— Veja só, Bella! – os dedos estreitaram-se nos fios, fazendo-a soltar um gemido de dor – Estão todos aqui por você, para prestigiá-la! Não era isso que você queria? – as palavras saiam com mais aspereza do que aquela que ela estava acostumada quando, ao final da frase, todos os lobos uivaram em conjunto, concordando com a fala. Ela pôde sentir a respiração próxima ao pescoço dela, deixando-a saber que ele estava cheirando aquela mistura de terra e sangue impregnada no cabelo dela, no fim emitindo um gemido de satisfação – E pensar que tudo que eu queria era você... – ele sussurrou junto da orelha dela e ela sentiu aquele arrepio de nojo tão característico – Agora ninguém a terá! – a risadinha soou intimista.

Com um gemido ela tentou se soltar, emitindo um grito abafado pela dor de apoiar-se na perna direita – Me solte agora! – Bella cuspiu o sangue dos machucadas da boca no chão – Me solte! – repetiu enquanto ele ria.

Um beijo molhado estralou nos lábios arroxeados de Bella, que fechou os olhos e apertou os lábios numa linha fina, o nojo estampado no rosto dela – Você não tem direito a palavra, querida. E você sabe disso, não sabe? – a mão dele parecia tatear o corpo dela despreocupadamente quando todos os lobos ajoelharam-se diante deles e ele virava-a para fitar o penhasco. – Isso poderia ter sido tão, tão mais fácil. É realmente uma pena. – Ele parecia lastimar-se e ela fitava apenas o horizonte com as lágrimas escorrendo pelo rosto pálido.

A vista, sempre de tirar o fôlego pela beleza estonteando agora arrancava o fôlego pela adaga que enterrava-se na carne dela. Com a boca cheia de sangue ela finalmente vomitou uma mistura de fluídos avermelhados, enquanto ele a ajoelhava de costas para ele – Eu disse a você, não disse? Você vai ceder a mim ou tirarei de você o que você mais quer. – A risada agora parecia seca enquanto pontos brilhavam diante dos olhos de Bella – Você não está impressionada, querida? Eu fiz os dois, eu sou bom assim. É realmente uma pena! – ele sussurrou para ela enquanto os lobos agora batiam as patas no chão.

Com os olhos castanhos arregalados em ódio ela virou a cabeça apenas o suficiente para encará-lo, as lágrimas correndo livremente por seu rosto e colo, junto de seu sangue e toda a sua dor quando gritou – Você vai se arrepender disso, eu queimarei suas almas e as levarei até a porra do inferno! – pôde ouvir, entretanto, apenas a risada e os uivos quando seu corpo foi lançado em queda livre por um chute em suas costas.

De olhos bem abertos ela caiu n’água, a sensação da camada de gelo quebrando-se contra a pele enquanto era aos poucos sufocada pela dor e pelas lembranças.

Apenas a voz suave e desconhecida ecoava em seus ouvidos quando finalmente permitiu-se descansar – Lhe darei mais uma chance para que floresça, Isabella. O brilho incandescente de um toque brilhante a libertará dos túmulos. – A última coisa que sentiu foi o toque suave em seu peito.


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